O mundo do trabalho não é automático: o que pode operar como dispositivo para a gestão do cuidado em municípios de pequeno porte?11Pereira PBA recebeu apoio financeiro por meio da bolsa de doutorado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)/ PROEX pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, durante a elaboração do presente trabalho.

Paula Bertoluci Alves Pereira Laura Camargo Macruz Feuerwerker Sobre os autores

Resumo

Este artigo pretende explorar experiências de dispositivos para a gestão do cuidado fabricadas pelas equipes gestoras de municípios de pequeno porte que podem ser aprendizados na produção de conhecimento e fazeres no SUS. A abordagem cartográfica foi utilizada para a construção do campo de pesquisa em dois pequenos municípios do estado de São Paulo, percorrendo diferentes espaços, formais e não formais, da saúde e intersetoriais, no período de 2018 a 2020. Analisadores foram produzidos a partir da vivência no campo e discutidos à luz da micropolítica do trabalho e do cuidado em saúde, dando visibilidade aos campos de disputa, desafios e potências dos municípios pequenos articulado à problematização sobre o eixo da integralidade e da gestão do cuidado. O mundo do trabalho está em plena disputa pelos atores-viventes do Sistema Único de Saúde, sendo atravessado pelo instituído e pela força médico-hegemônica. A fabricação de dispositivos para a gestão do cuidado é fundamental para favorecer deslocamentos e escapes em relação às capturas que são muitas e diversas no âmbito do trabalho e cuidado.

Palavras-chave:
Atenção à Saúde; Integralidade em Saúde; Longitudinalidade do Cuidado; Estratégias de Saúde Locais; Sistemas Locais de Saúde

Introdução

Este estudo é fruto da tese de doutorado intitulada Arranjos e dispositivos para a gestão do cuidado em municípios de pequeno porte no estado de São Paulo: entre-laços e nós (Pereira, 2022PEREIRA, P. B. A. Arranjos e dispositivos para a gestão do cuidado em municípios de pequeno porte no estado de São Paulo: entre-laços e nós. 2022. 220 f. Tese (Doutorado em Saúde Pública) - Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2022.), que teve como objetivo dar visibilidade e dizibilidade a apostas, potências e desafios que permeiam a gestão do cuidado em municípios pequenos.

Foi utilizada a abordagem cartográfica para a tessitura do campo de pesquisa em dois pequenos municípios do estado de São Paulo, Ouroeste e Santo Antônio de Posse. No período de 2018 a 2020, a pesquisa percorreu diferentes espaços formais e não formais da saúde e intersetoriais. Alguns, indicados pelos gestores e trabalhadores a partir do que eles identificavam na polissemia das estratégias de cuidado, gestão do cuidado, arranjos cuidadores. Outras aproximações se deram em decorrência dos acontecimentos no campo, em ato. Um rizoma que se ramificou a cada encontro abrindo possibilidades para novas conexões.

A implicação foi a marca da produção de conhecimento, e a pesquisadora assumiu uma postura questionadora frente a si e ao campo em movimento, que se forma/dissolve/desvia/pulula, como um sujeito sobreimplicado (Merhy, 2004MERHY, E. E. O conhecer militante do sujeito implicado: o desafio em reconhecê-lo como saber válido. In: FRANCO, T. B.; PERES, M. A. A.; FOSCHIERA, M. M. P.; PANIZZI, M. (Org.). Acolher Chapecó: uma experiência de mudança do modelo assistencial, com base no processo de trabalho. São Paulo: Hucitec , 2004.). A intenção foi “in-mundizar-se” nos territórios fabricados pela investigação e se interrogar e problematizar sobre o que emerge por meio desses encontros, abrindo espaço para que a vida inunde esses lugares e reconhecendo os atores-viventes do campo como participantes ativos da pesquisa, sejam eles trabalhadores, gestores, usuários (Abrahão et al., 2014ABRAHÃO, A. L. et al. O pesquisador in-mundo e o processo de produção de outras formas de investigação em saúde. In: GOMES, M. P. C.; MERHY, E. E. (Org.) Pesquisadores IN-MUNDO: um estudo da produção do acesso e barreira em saúde mental. Porto Alegre: Rede Unida, 2014. p. 133-144., 2016ABRAHÃO, A. L. et al. O pesquisador in-mundo e o processo de produção de outras formas de investigação em saúde. In: MERHY, E. E. et al (Org.). Avaliação compartilhada do cuidado em saúde: surpreendendo o instituído nas redes. Rio de Janeiro: Hexis, 2016. p. 22-30.).

Essas danças-encontros singulares deixaram suas marcas, que foram traduzidas por esta autora por meio de narrativas verossímeis (Henz, 2022HENZ, A. O. Políticas de pesquisa entre Anton Tchekhov, narrativas, casos infames. Verve, São Paulo, n. 41, p. 73-90, 2022.), dando letra e convidando à reflexão e desacomodação por meio de alguns campos problemáticos/analisadores. Estes sobressaíram na intensidade do vivido e foram analisados pelo referencial da micropolítica do trabalho e cuidado em saúde, e de filósofos contemporâneos como Foucault e Deleuze.

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa no CAAE 10037019.7.0000.5421.

O problema em foco

Os municípios pequenos, com até 20 mil habitantes, correspondem a quase 70% dos municípios do país, embora apenas 15% dos habitantes do Brasil residam neles. Apesar de corresponderem a uma relevante realidade na produção do Sistema Único de Saúde (SUS), há poucos estudos analisando arranjos e modos de fazer a gestão e produzir cuidado a partir desses lugares.

Ainda que haja singularidades regionais, há uma certa composição de forças comuns que atravessam as experiências de SUS em municípios pequenos, implicando regularidades e diferenças na fabricação do cuidado e da integralidade. São campos de disputa que interferem no desenho dos serviços municipais e regionais, bem como nos arranjos para a gestão do cuidado, sendo afetados fortemente não somente pelos efeitos das políticas e das tensões regionais, mas também das forças do mercado, da saúde suplementar e pelas desigualdades socioeconômicas sanitárias. Esse emaranhado de forças obriga municípios pequenos, principalmente os mais distantes, a inventar formas para a gestão do cuidado.

Todos os municípios, incluindo os pequenos, têm um papel fundamental e ativo na produção do SUS, com responsabilidades na assistência direta e na articulação do acesso aos diferentes serviços, elemento fundamental para a universalidade do sistema e para a integralidade. A integralidade implica arranjos em rede e depende dos conceitos de saúde e de relações regionais e interfederativas. Mesmo a atenção básica, cuja oferta é responsabilidade exclusiva dos municípios, supõe cofinanciamento tripartite e ações regulatórias de diferentes âmbitos.

No entanto, são os municípios que recebem a pressão direta dos cidadãos a partir de suas demandas e necessidades de saúde. Também em função disso, a esfera municipal tem sido a única a se comprometer com gastos crescentes em saúde, em um cenário de subfinanciamento crônico do sistema de saúde que se converteu em desfinanciamento a partir da instituição do teto de gastos no âmbito federal.

Ao “carregarem o SUS nos ombros”, ao contrário da caricatura que muitos fazem, os gestores dos municípios pequenos enfrentam desafios que extrapolam a rede básica de saúde e ao mesmo tempo apontam para a necessidade do seu fortalecimento. Por um lado, são acionados fortemente por demandas relacionadas ao acesso aos serviços de saúde, principalmente da atenção especializada e hospitalar de média e alta complexidade (MAC) e de serviços de apoio diagnóstico e terapêutico (SADT). A capacidade dos seus serviços de atenção básica de responder efetivamente e articular o cuidado em rede interfere diretamente nessa demanda.

Pela força das pressões de demanda e pelas tensões nas articulações regionais, muitos municípios pequenos acabam por diversificar a oferta de serviços. Guerra (2015GUERRA, D. M. Descentralização e regionalização da assistência à saúde no estado de São Paulo: uma análise do índice de dependência. 2015. 209 f. Tese (Doutorado em Ciências) - Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015.) aponta que, no estado de São Paulo, apenas um município não fazia uso do recurso MAC. Todos os demais tinham pelo menos um especialista e alguns serviços contratados pelo município, num esforço para ultrapassar os gargalos de acesso e articulação.

A tessitura da gestão do cuidado em saúde está intimamente ligada ao modo como enxergamos as necessidades da população, seja sob a lente do acesso restrito à conquista de vagas ou sob a lente da integralidade do cuidado para além do movimento inicial do acesso. No SUS, assim como em outros sistemas universais de saúde, existe um nó importante no acesso a MAC, sendo que os municípios pequenos são bem mais dependentes de lógicas negociadas, já que nesses âmbitos as ofertas de serviços são principalmente regionais ou estaduais. Entretanto, a aposta na primeira “lente”, que se restringe ao problema do acesso a vagas, não considera intensidades, não favorece a continuidade nem a amplitude do cuidado. A tendência, ao limitar-se à preocupação com o acesso a consultas e exames, é produzir fragmentação, desresponsabilização, filas e descontinuidade do cuidado.

A aposta na “lente da integralidade” do cuidado para além do acesso, requer movimentos no plano municipal e regional com a produção de dispositivos que ampliem e “extraiam” visibilidades e dizibilidades (Deleuze, 1990DELEUZE, G. Michel Foucault, filósofo. Barcelona: Gedisa, 1990.) dos agires em saúde e cuidado. Gestor que se mobiliza pela integralidade favorece rede, articulação viva, põe gente para fabricar interlocuções vivas e acompanhar processos, diversifica arranjos. Persegue integralidade que garanta o cuidado transversal, tendo as equipes como corresponsáveis pelos atos produtivos em saúde, sendo orientadas pela tecnologia leve como primordial à escuta, à consideração mais ampla e contextualizada das necessidades e ao direcionamento responsável, em tempo ótimo e oportuno, acessando as tecnologias em saúde de acordo com o que necessita, articulando diferentes modalidades de suporte.

Os conceitos de integralidade e gestão do cuidado se complementam e dependem desde a construção/ modo de produzir políticas ao sentido que o cuidado irá ressoar no encontro entre trabalhadores e usuários (Cecílio, 2011CECÍLIO, L. C. O. Apontamentos teórico-conceituais sobre processos avaliativos considerando as múltiplas dimensões da gestão do cuidado em saúde. Interface, Botucatu, v. 15, n. 37, p. 589-599, 2011). Todos estão imersos em um jogo de forças, vetores e a produção de valores que marcam as apostas de gestão e suas máscaras-devires-gestoras. Ora predomina a força racionalidade médico-hegemônica, ora a força neoliberal, ora a força governo de si e do outro; ora a força necessidades grita mais alto.

Gestão do cuidado precisa de dispositivo, precisa ser produzida à quente, senão vira apenas resposta no plano formal. Fazer cuidado em rede por meio de papel (ou seja, impressos de referência/contrarreferência) não é efetivamente rede. Contratar profissionais de saúde e ampliar a equipe não garante o cuidado compartilhado. Construir uma Unidade Básica de Saúde ou um hospital de pequeno porte, também não.

Segundo Feuerwerker (2020FEUERWERKER, L. C. M. Da atenção básica à atenção primária - do cuidado integral territorializado à focalização médico-centrada no SUS: AMAQ, PMAQ e remuneração por “resultados”. In: AKERMAN, M. et al (Org.). Atenção básica é o caminho! Desmontes, resistências e compromissos. contribuições das universidades brasileiras para a avaliação e pesquisa na APS: Perspectivas para o cuidado, para avaliação e para pesquisa na APS. São Paulo: Hucitec, 2020. Volume 2.), há também uma tendência na padronização dos arranjos organizativos da atenção, desconsiderando contextos e acumulações locais. Para superar esse vetor, é preciso sair da burocracia e da repetição dos modos hegemônicos do cuidado. Extrapolar a clínica centrada nos núcleos profissionais. Reconhecer que todo mundo faz gestão. A disputa é inerente ao trabalho vivo, e a negociação, necessária para um cuidado mais compartilhado.

Dessa forma, pretende-se explorar experiências de dispositivos para a gestão do cuidado fabricadas por municípios de pequeno porte que podem ser aprendizados na produção de conhecimento e fazeres no SUS.

Cartografia como aposta ético-política de pesquisa

A abordagem cartográfica foi utilizada como aposta metodológica ético-política, reconhecendo que é no encontro entre viventes que se produz conhecimento ao traçar um caminhar ambulante e intuitivo pelos modos de existir, seus saberes e fazeres dos diversos atores-viventes do SUS (Lima; Merhy, 2016LIMA, F.; MERHY, E. E. Produção de conhecimento, ciência nômade e máquinas de guerra: devires ambulantes em uma investigação no campo da saúde coletiva. In: MERHY, E. E. et al. (Org.). Avaliação compartilhada do cuidado em saúde: surpreendendo o instituído nas redes. Rio de Janeiro: Hexis , 2016. p. 18-21.).

Para tanto, supõe abertura para o encontro, porosidade e reflexão e pressupõe um movimento de produção de encontros em que são compartilhados a reflexão, o processamento de incômodos, a produção de perguntas, os deslocamentos, bem como a produção de saberes a partir de tudo isso; é uma produção coletiva em que todos, não somente o pesquisador formal, se tornam investigadores e produtores de reflexões (Moebus; Merhy; Silva, 2016MOEBUS, R. N.; MERHY, E. E.; SILVA, E. O usuário-cidadão como guia: Como pode a onda elevar-se acima da montanha? In: MERHY, E. E. et al (Org.). Avaliação compartilhada do cuidado em saúde: surpreendendo o instituído nas redes. Rio de Janeiro: Hexis , 2016. p. 43-53.; Mendes, Azevedo, Frutuoso, 2019MENDES, R.; AZEVEDO, A. B.; FRUTUOSO, M. F. P. (Org.). Pesquisar com os pés: deslocamentos no cuidado e na saúde. São Paulo: Hucitec , 2019.).

A constituição do sujeito-pesquisador se dá em ato, na experimentação do campo, recolhendo efeitos e marcas que se impregnam no corpo e que abrem a possibilidade de inventar, criar, construir junto o percurso da pesquisa. Nesta perspectiva, a implicação é a marca da produção de conhecimento, e o pesquisador assume uma postura questionadora frente a si e ao campo em movimento, in-mundizando-se nos/pelos territórios fabricados pela investigação e interrogando-se a partir do que emerge por meio desses encontros (Abrahão et al., 2014ABRAHÃO, A. L. et al. O pesquisador in-mundo e o processo de produção de outras formas de investigação em saúde. In: GOMES, M. P. C.; MERHY, E. E. (Org.) Pesquisadores IN-MUNDO: um estudo da produção do acesso e barreira em saúde mental. Porto Alegre: Rede Unida, 2014. p. 133-144., 2016ABRAHÃO, A. L. et al. O pesquisador in-mundo e o processo de produção de outras formas de investigação em saúde. In: MERHY, E. E. et al (Org.). Avaliação compartilhada do cuidado em saúde: surpreendendo o instituído nas redes. Rio de Janeiro: Hexis, 2016. p. 22-30.).

Além disso, uma secretaria de saúde, um espaço de gestão central ou local e um equipamento de saúde qualquer são constituídos por diferentes planos, atravessados por diferentes forças. Há um plano formal que define sua finalidade, estabelece papéis, prescreve modos de operar etc. Mas esse plano é atravessado por muitos outros. Há condicionamentos políticos e materiais que dificultam ou facilitam diferentes dinâmicas e ações. Há a história local; diferentes perspectivas e projetos produzidos pelas diferentes corporações profissionais, assim como pelos movimentos sociais. Há a história de vida de cada um dos participantes, suas convicções políticas, religiosas. Há as marcas deixadas pela formação profissional. Entre muitas outras questões.

Assim, apesar de haver regularidades, há diferenças importantes entre os distintos cenários concretos, decorrentes das combinações múltiplas entre esses e outros planos de constituição. É um mundo em constante movimento de produção, com linhas estruturais, linhas flexíveis, capturas, engessamentos e invenções a depender dos efeitos das diferentes forças que o configuram.

Ao considerar, ainda, que o trabalho em saúde é produzido a partir de encontros em que os distintos sujeitos se afetam e modificam, temos que o cuidado em saúde é produzido “à quente”, em ato. Como pesquisar em profundidade algo que é produzido em ato e cujos registros, em boa parte, estão somente marcados nos “corpos”, nos modos de ser/estar dos participantes dos processos?

A cartografia possibilita recolher ao vivo as diferentes cenas/produções/agenciamentos e colocar seus efeitos em análise de modo coletivo. Por que as coisas aconteceram assim agora, e de outro modo em outro momento? Por que foi possível operar coletivamente aqui, e em outro momento, não? O que a política, a gestão, os diferentes arranjos, os modos de trabalhar mobilizam, potencializam ou aniquilam? Desse modo é possível mapear dispositivos, apostas, estratégias, disputas, enriquecendo muito as aprendizagens e elaborações a partir das experiências (Gomes; Merhy, 2014GOMES, P. C; MERHY, E. E. Uma pesquisa e seus encontros: a fabricação de intercessores e o conhecimento como produção. In: GOMES, P. C; MERHY, E. E. (Org.). Pesquisadores In-mundo: um estudo da produção do acesso e barreira em saúde mental. Porto Alegre: Rede Unida , 2014.; Feuerwerker, 2017FEUERWERKER, L. C. M. Pensando avaliação em políticas e na gestão em saúde numa perspectiva cartográfica. In: TANAKA, O.Y.; RIBEIRO, E.L.; ALMEIDA, C.A.L. Avaliação em saúde: contribuições para incorporação no cotidiano. Rio de Janeiro: Atheneu, 2017. p. 29-36.).

Resultados e discussão: dispositivos que favorecem cuidado e a gestão do cuidado

Ao longo deste estudo, foi possível cartografar dispositivos marcantes para a gestão do cuidado, agenciados pela força necessidades em saúde. Dispositivos estes que compuseram a agenda da equipe gestora pelas apostas e movimentos que cada uma fabricava em seu agir, tanto no plano municipal como no regional, como estratégia para fazer gestão. Diferentes arranjos organizativos e dispositivos foram mapeados, possibilitando a reflexão sobre como estamos produzindo cuidado - para produção de vida ou de morte.

A equipe NASF como lente de aumento para as necessidades e para a gestão

Apesar das regularidades da rede básica, a equipe do Núcleo Ampliado de Saúde da Família (NASF) se destacou como um duplo dispositivo, atuando como apoio à gestão e como apoio matricial à rede intra e intersetorial, amplificando as possibilidades para a gestão do cuidado. Um apoio rizomático, como propõe Bertussi (2010BERTUSSI, D. C. O apoio matricial rizomático e a produção de coletivos na gestão municipal em saúde. 2010. 234 f. Tese (Doutorado em Clínica Médica) - Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010., p. 170), que “não separa os agenciamentos na produção da gestão e do cuidado e os arranjos do matriciamento são produzidos no interior da própria gestão para operar em ambos os campos”.

Em um dos municípios estudados havia claramente um arranjo organizativo do NASF para construírem encontros mobilizadores, sobretudo com as equipes de Saúde da Família (eSF). Também foram ganhando terreno com outras pastas, como Educação e Desenvolvimento Social. É interessante observar que há uma intensa circulação dos profissionais em vários setores do pequeno município, dentro e fora da saúde, o que parece favorecer a aproximação e abertura com outros atores para a produção de parcerias.

Como em outros municípios pequenos, a equipe NASF faz bastante diferença para ampliação das ofertas de cuidado para além do medicocentrado. Dentre as atividades que a equipe geralmente realiza, estão: atendimento individual a alguns casos; atendimento e visita domiciliar compartilhada com trabalhadores da eSF e intersetorial; grupos de prevenção, promoção e reabilitação junto à eSF, voltados à realização de práticas corporais, à assistência a gestantes, ao cuidado da dor crônica, a cuidadores, enfrentamento ao tabagismo etc.; educação permanente das eSF, a partir de temas e/ou casos elencados; articulação entre equipes e serviços intra e intersetoriais disparados pelos casos de maior complexidade; ações junto à comunidade e participação nos conselhos municipais.

Fundamental quando é garantido ao NASF uma agenda de trabalho mais flexível e menos capturada pela agenda de consultas ambulatoriais. Dessa forma, conseguem utilizar a Educação Permanente em Saúde (EPS) como orientadora de sua práxis, ofertando às equipes de saúde a problematização sobre alguns temas caros ao cuidado, que merecem um olhar crítico e cuidadoso, como, por exemplo, as situações relacionadas à violência.

A EPS pode ser uma potente ferramenta para provocar reflexões junto à equipe, conectando as cenas da vida real para aprendizado e produção de conhecimento a partir do que e como se faz. Para tanto é necessário sustentar o espaço vivo na agenda dos profissionais e da equipe, ampliando as possibilidades de cuidado.

A caixa de ferramentas do NASF é construída no cotidiano, acessando o seu núcleo e campo de saberes e fazeres diante da surpresa de cada encontro com usuários, trabalhadores e gestores. Por vezes, capturada pela força racionalidade médico-hegemônica, sendo presidida pelas tecnologias leve-duras como os fluxos e protocolos de acesso e cuidado para dar algumas respostas. Mas, no geral, a equipe NASF opera pelas tecnologias leves, com bastante escuta e porosidade junto à rede, percorrendo os entremeados da produção do cuidado junto às equipes de atenção básica e a rede a partir das situações disparadoras, dentre elas. os casos de saúde mental que agenciam e desterritorializam a todos.

Em particular, é evidente como o cuidado em saúde mental provoca nas equipes várias ações, sendo o NASF o protagonista de uma série de estratégias em rede e de inclusão dessa pauta na agenda gestora. Saúde mental desterritorializa e exige cuidado em rede.

NASF e a saúde mental como disparadora do cuidado em rede

Nas inúmeras movimentações em rede disparadas pelos casos de saúde mental, a mudança da lógica do cuidado persistia como um desafio. A medicalização, o cuidado medicocentrado, a medicamentalização e os juízos morais são questões presentes no modo como as equipes vão armando o cuidado. Eram notáveis a articulação e conexão em rede e a profusão de estratégias em curso, nem sempre suficientes para vencer a disputa.

Dentre as estratégias potentes realizadas, o Setembro Amarelo e o Programa Saúde da Escola (PSE) foram tomados como dispositivos para aproximação com os alunos da rede estadual, desde adolescentes ao Ensino de Jovens e Adultos (EJA), dado o aumento de casos de tentativas de suicídio de jovens no município.

Além do manejo cotidiano realizado pelas equipes, outras articulações se fizeram necessárias para ampliar os espaços de escuta e conversa sobre o sofrimento psíquico na diversidade dos modos de viver. Aproveitando o mês voltado ao Setembro Amarelo e a agenda que a equipe do NASF já realizava permanentemente na escola por meio do PSE, foram organizados encontros nas escolas envolvendo líderes comunitários e voluntários vinculados aos grupos de jovens e de aconselhamento em parceria com o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS). Este último também realizava rodas de conversa sobre intolerância religiosa com pais e membros da comunidade escolar.

Outras estratégias também foram adotadas e mobilizaram atores de diversos pontos de atenção, da rede básica, do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) II e CAPS Álcool e Drogas (AD) - ambos referência regional e alocados em outro município -, de hospital de pequeno porte do município, da Educação e do Desenvolvimento Social. Englobaram ações desde as mais até as menos corriqueiras, como visitas compartilhadas e discussão de casos, atividades do Setembro Amarelo na escola estadual envolvendo a comunidade, elaboração de projeto para cuidado em saúde mental com contratação de uma profissional externa, retomada do matriciamento e discussão de fluxo do atendimento com equipe do CAPS.

Além disso, a equipe NASF chamava atenção para a necessidade de ampliação e fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) na região, como a criação de dois novos CAPS em municípios pequenos distintos, considerando que apenas o município de médio porte possuía o serviço especializado. Mesmo havendo essa referência regional, dificilmente era garantida a intensividade de cuidado da maioria dos usuários pela dificuldade do acesso, tempo e deslocamento, bem como as ofertas de cuidado restritas ao que o serviço compreendia como salutar. Sem produzir linhas de fuga, restava à rede básica e ao NASF a construção de ofertas de cuidado no próprio município, ainda centralizadas na prescrição de fármacos e no acompanhamento individualizado com psicoterapia. Afinal, esse é um campo em intensa disputa.

Ministério Público como produtor de rede

Mirando nos casos complexos, uma outra estratégia foi adotada em um dos municípios pequenos, tendo a equipe do NASF como um dos pontos de conexão. Foram realizadas “reuniões de rede”, que operaram como mais um dispositivo para favorecer relações, cooperação e rede viva.

Essa agenda foi construída a partir dos casos advindos da promotoria, instigando os profissionais a se reunirem em rede para a discussão. Posteriormente, a prática foi instituída através de portaria municipal, tornando um profissional de cada pasta responsável por compor o comitê intersetorial, com encontros semanais/quinzenais. Este foi um dispositivo potente, pois juntava as equipes de referência para a construção de um plano de cuidado mais compartilhado com diferentes atores da rede.

Outra experiência da reunião de rede intersetorial como um dispositivo para gestão do cuidado, vinculada a outro município pequeno, também foi disparada pela promotoria do Ministério Público (MP). Interessante como outros setores fora da saúde também podem operar como dispositivos para gestão do cuidado, mobilizando a rede de trabalhadores contra a captura do trabalho vivo. Neste município, o MP produziu movimentos na lógica da integralidade do cuidado em duas ocasiões distintas: na primeira, com crianças e adolescentes em situação de acolhimento institucional, na segunda, frente às solicitações de internação compulsória e voluntária em hospital psiquiátrico regional.

Como efeitos destes movimentos, muitos dos quais agenciados pela promotoria do MP, houve a redução drástica de novas solicitações de acolhimento e também a revisão de medida das crianças e adolescentes que estavam sob acolhida, reavaliando caminhos possíveis, com pesar à força que também produz “morte”.

Na primeira situação, havia uma grande quantidade de pedidos ao CRAS e ao conselho tutelar do município para o acolhimento institucional, chamando a atenção do MP para as estratégias de acompanhamento e cuidado que deveriam ser realizadas junto à família antes do apelo a uma medida que deveria ser a última. Os questionamentos subsequentes exigiram uma mudança nas práticas, levando à organização de reuniões de rede intersetorial com representantes da Saúde, Educação, Desenvolvimento Social e conselho tutelar.

Primeiro era realizada uma discussão prévia sobre o plano de cuidado e, posteriormente, encontros com as assistentes técnicas do MP para avaliação caso a caso. Apesar da potência da reunião intersetorial que produzia alguns deslocamentos, principalmente provocados pela gestora da saúde e pelas assistentes técnicas do MP, alguns discursos ainda se reduziam à culpabilização familiar e a juízos morais, com pouca visibilidade à vulnerabilização, para o recorte racial e social, para as frequentes situações de violências institucionais e para a falta de acesso às políticas públicas. Havia um esforço importante, da Saúde especialmente, no sentido de ampliar ofertas de cuidado e aproximação junto a essas famílias, mobilizado por uma gestora em seu devir-máscara negociadora-construtora.

Outro aprendizado interessante foi decorrente das experiências de prover profissionais neste município e de negociação junto a Promotoria para sustentar projetos de cuidado no CAPS II e na rede.

A equipe do CAPS ocupava o papel de ordenadora e coordenadora do cuidado para estes usuários, produzindo as relações na rede a partir das necessidades que ali identificavam, principalmente com o Pronto Socorro Municipal (PSM) na atenção à crise. A estratégia de gestão do cuidado foi produzida pelas equipes de saúde mental, do pronto-socorro e também pela gestora de saúde, que, pela vivência como trabalhadora e gestora local do serviço, colocou o problema e o arranjo cuidador na agenda da gestão. Além disso, havia uma parceria interessante na composição de uma certa visibilidade para gestão do cuidado a partir do médico horizontal, que também a apoiava nas negociações e mediações junto ao corpo médico e nos serviços de referência regional.

A experiência favoreceu a aproximação junto ao MP para que, nas situações em que houvesse pedidos de internação psiquiátrica por outros profissionais ou mesmo familiares, a avaliação e o manejo se dessem primeiramente pela equipe do CAPS II. Dispositivo este que sustentou a fabricação de um plano de cuidado no próprio município.

No plano regional, diferenças importantes chamaram atenção: dois municípios de portes distintos e sob a mesma comarca do MP, com apostas bem diferentes nos atos de cuidar em saúde mental - um, manicomializante, e outro, comunitário. A promotora marcava fortemente essa diferença, ressaltando que o município pequeno, com menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da região, produzia muito mais ações no cuidado em saúde mental e no cuidado às crianças e adolescentes em acolhimento institucional, articulado em rede, do que o município de médio porte vizinho. Este último encaminhava a maioria dos casos para as comunidades terapêuticas.

Tecnologia leve, relacional, que radicalizava o cuidado no município pequeno em contraste com o município maior, com orçamento robusto, mas que apostava no (des)cuidado manicomial.

O cuidado domiciliar compartilhado entre PSM e rede básica

O mesmo PSM que articulava e sustentava possibilidades de cuidado na atenção à crise psíquica também compartilhava com a rede básica o cuidado domiciliar de alguns usuários, incluindo ações como a realização de curativos aos finais de semana, após muitos embates e tensões entre estes dois pontos de atenção.

A escala e a sinalização dos usuários eram combinadas entre os serviços, sendo uma enfermeira do PSM a protagonista dessa articulação. Vale sinalizar que muitos desses arranjos foram possíveis pela parceria com trabalhadores que topavam modos outros de produzir cuidado na perspectiva da integralidade, amplificando o agir em saúde e as tecnologias leves colocadas no centro, dando visibilidade às necessidades.

Algumas considerações a modo de fechamento provisório

Cuidado é produção viva, que depende do modo como gestão e trabalhadores se encontram com territórios, usuários e suas necessidades. Há modos de fazer gestão e construir o trabalho que favorecem encontros, indispensáveis para o cuidado.

Apesar de a atenção básica ser o terreno de maior produção cuidadora nos municípios de pequeno porte, não são somente as equipes de saúde da família as decisivas para a produção da saúde. NASF articulando rede, rede que vai além da saúde, conexões com diferentes modalidades de produção de serviços especializados, porosidade aos diferentes problemas, realidades e necessidades. Municípios são a porta em que as necessidades batem.

No campo de pesquisa, nos encontramos com uma vida pulsante e também com muitas forças de ruptura. Ampla conversa, mas neste artigo demos visibilidade aos dispositivos que favoreceram a produção do cuidado em rede. Porque, para fazer gestão do cuidado, para além de providenciar ofertas e vagas nos serviços de saúde, é fundamental a produção de dispositivos que favoreçam arranjos cuidadores.

Estamos falando aqui de uma aposta no eixo da integralidade do cuidado, articulando equipes intra e intersetoriais, provocando a mudança do modo de organizar os processos de trabalhos, dando visibilidade a alguns disparadores que ajudam a interrogar as repetições nos atos de cuidar.

O arranjo e as apostas da gestão são determinantes para colocar na agenda a gestão do cuidado. O mundo do trabalho não é nada automático, está em plena disputa pelos atores-viventes, atravessado pelo instituído, pela força médico-hegemônica que incide fortemente nos corpos e pelas apostas no (des)cuidado. Por isso, dispositivos; por isso, trabalho vivo; por isso deslocamentos e escapes em relação às capturas, que são muitas e diversas.

Agradecimentos

Nossos agradecimentos aos gestores, trabalhadores e usuários de Ouroeste/SP e Santo Antônio de Posse/SP que participaram desta pesquisa.

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

Referências

  • ABRAHÃO, A. L. et al. O pesquisador in-mundo e o processo de produção de outras formas de investigação em saúde. In: GOMES, M. P. C.; MERHY, E. E. (Org.) Pesquisadores IN-MUNDO: um estudo da produção do acesso e barreira em saúde mental. Porto Alegre: Rede Unida, 2014. p. 133-144.
  • ABRAHÃO, A. L. et al. O pesquisador in-mundo e o processo de produção de outras formas de investigação em saúde. In: MERHY, E. E. et al (Org.). Avaliação compartilhada do cuidado em saúde: surpreendendo o instituído nas redes. Rio de Janeiro: Hexis, 2016. p. 22-30.
  • BERTUSSI, D. C. O apoio matricial rizomático e a produção de coletivos na gestão municipal em saúde. 2010. 234 f. Tese (Doutorado em Clínica Médica) - Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010.
  • CECÍLIO, L. C. O. Apontamentos teórico-conceituais sobre processos avaliativos considerando as múltiplas dimensões da gestão do cuidado em saúde. Interface, Botucatu, v. 15, n. 37, p. 589-599, 2011
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    Pereira PBA recebeu apoio financeiro por meio da bolsa de doutorado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)/ PROEX pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, durante a elaboração do presente trabalho.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    04 Abr 2023
  • Revisado
    04 Abr 2023
  • Aceito
    15 Maio 2023
Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. Associação Paulista de Saúde Pública. SP - Brazil
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