Rio + 20: Desenvolvimento sustentável. Há tempo de evitarmos a barbárie?

A Diretoria Nacional

O mundo ainda tropeça para superar a atual crise financeira que eclodiu nos Estados Unidos, em 2008. Por toda a parte, ouve-se dizer que é preciso retomar o crescimento econômico dos países desenvolvidos, para que a catástrofe não atinja proporções insuperáveis. Grécia, Portugal e Espanha entram em depressão com elevadas taxas de desemprego e cortam programas sociais, construídos penosamente após a segunda guerra mundial. Entre as elites dirigentes e econômicas mundiais, avançam as posições conservadoras protecionistas e espalha-se condenação do estado de bem-estar social como um dos focos da crise. Medidas de contenção da escalada financeira não conseguem ser implementadas. Os paraísos fiscais e a circulação sem restrições dos capitais continuam desregulados. Os mais ricos conseguem, em meio à crise, tornar-se mais ricos.

A concentração de riqueza e poder no mundo e os atuais padrões de consumo que a sustentam são incompatíveis com o desideratum da sustentabilidade de garantir padrões de “desenvolvimento que satisfaz às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atenderem às suas próprias necessidades” (COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO, 1991COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso Futuro Comum. 2. ed. Rio de Janeiro: Fundação Gerúlio Vargas, 1991.). Vinte por cenro da população mundial se apropria de três quartos da riqueza produzida no mundo. Oitenta por cento da população mundial vive com menos de dez dólares por dia. Metade da ‘pegada ecológica’, indicador do consumo de biocapacidades planetárias, é impressa por apenas dez países. As ‘necessidades presentes’ guardam relação direta com esses padrões de consumo. Se fôssemos satislàzer essas ‘necessidades presentes’ igualando o mundo aos padrões dos Estados Unidos, precisaríamos, hoje, da capacidade de quatro Terras c meia.

Ocorre que já se consome hoje o equivalente a uma Terra e meia por ano. A retomada do crescimento, nos moldes anteriores, manterá o planeta aceleradamente na direção do exaurimento de suas capacidades. Já somos sere bilhões de pessoas e, mantido O modelo anterior, duas Terras já serão necessárias em 2030, cinco em 2050.

Como ainda há 2,6 bilhões de pessoas vivendo em situação de pobreza no mundo, é impossível pensar que seremos capazes de atender suas necessidades sem uma mudança radical dos padrões de consumo dos países ricos e das elites dos outros países. Caso isso não ocorra c o crescimento dos países centrais retome o esquema atual vigente, canlinharemos para uma situaçáo de terrível aumento da iniquidade e para a condenação de contingentes populacionais crescentes à indigência pelo esgotamento da capacidade produriva de nosso planera. As crescentes testtições de livre citculação das pessoas entte os países, cujo exemplo mais ilustrativo é o vergonhoso muro que separa os Estados Unidos do México, corresponderão a um aumento radical da segregação das populações pobres e dos conflitos armados no mundo.

A Rio + 20, Conferência das Naçóes Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável que se aproxima, poderá ser uma grande oportunidade de trazermos à tona essas preocupaçóes. Se ela ficar restrita à agenda dos Estados Unidos em torno de uma ‘Economia Verde’, de iniciativas locais, de alcance local, que apesar de importantes náo tocam no coraçáo dos dilemas atuais de sustentabilidade planetária, estaremos assistindo seu fracasso. É importante dotar às Naçóes Unidas poderes reais de implementar decisóes e cobrar compromissos. O Brasil também deve rever de maneira profunda os padróes de consumo de suas elites que modelam e emulam os padróes de seus novos segmentos sociais em ascensáo. As vozes que discutem e buscam soluçóes radicais para a crise sáo abafadas.

Devemos reafirmar nossos compromissos com a saúde e a qualidade de vida equitativa dos povos de todo o mundo. O Brasil, nos dias que correm, tem um protagonismo internacional relevante e deve ocupar a liderança desse processo de mudança, e o CEBES pode desempenhar um papel importante nessa luta! É nesse sentindo que convocamos o Movimento Sanitário para participar desse debate, inclusive produzindo artigos para a Saúde em Debate e para a página do CEBES na Internet. Esse processo pode desembocar na e1aboraçáo de um documento crítico e de estratégias de enfrentamento das questóes ambientais. Esperemos que haja tempo de evitar a barbárie.

A Diretoria Nacional

References

  • COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso Futuro Comum. 2. ed. Rio de Janeiro: Fundação Gerúlio Vargas, 1991.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2012
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde RJ - Brazil
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