ARTIGO ARTICLE

 

Amostragem por saturação em pesquisas qualitativas em saúde: contribuições teóricas

 

Saturation sampling in qualitative health research: theoretical contributions

 

 

Bruno José Barcellos FontanellaI; Janete RicasII; Egberto Ribeiro TuratoIII

IDepartamento de Medicina, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, Brasil
IIFaculdade de Medicina, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil
IIIFaculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, Brasil

Correspondência

 

 


RESUMO

A transparência e a clareza dos relatórios de pesquisa, destacando a etapa de coleta de dados, são consideradas parâmetros importantes de avaliação do rigor científico dos estudos qualitativos. Este texto visa a refletir sobre o emprego do conceito metodológico de amostragem por saturação teórica, empregado freqüentemente nas descrições de pesquisas qualitativas nas diversas áreas do conhecimento, relevantemente, no campo da atenção à saúde. Discutimos e problematizamos os seguintes tópicos: definição de fechamento amostral por saturação teórica; dificuldades de aceitação e operacionalização de amostras intencionais (exemplificando-as), o tamanho adequado da amostra intencional, o significado de valorizar o que se repete ou as diferenças contidas nos relatos da amostra, os usos inadequados de expressões que empregam o termo saturação e, finalmente, possíveis metáforas para compreender o conceito.

Amostragem; Pesquisa Qualitativa; Metodologia


ABSTRACT

The transparency and clarity of research reports, emphasizing the data collection stage, are considered important parameters for evaluating the scientific rigor of qualitative studies. The current paper aims to analyze the use of saturation sampling as a methodological concept, frequently employed in descriptions of qualitative studies in various areas of knowledge, particularly in the field of health care. We discuss and confront the following topics: definition of sampling closure by theoretical saturation; difficulties in the acceptance and operationalization of intentional samples (with examples), adequate size of the intentional sample, the significance of valuing what is repeated or the differences contained in the sample reports, inadequate uses of expressions containing the term saturation, and finally possible metaphors for understanding the concept.

Sampling Studies; Qualitative Research; Methodology


 

 

Introdução

Amostragem por saturação é uma ferramenta conceitual freqüentemente empregada nos relatórios de investigações qualitativas em diferentes áreas no campo da Saúde, entre outras. É usada para estabelecer ou fechar o tamanho final de uma amostra em estudo, interrompendo a captação de novos componentes. Objetivamos, neste artigo, refletir criticamente sobre alguns fundamentos metodológicos e técnicos de seu emprego.

O fechamento amostral por saturação teórica é operacionalmente definido como a suspensão de inclusão de novos participantes quando os dados obtidos passam a apresentar, na avaliação do pesquisador, uma certa redundância ou repetição 1, não sendo considerado relevante persistir na coleta de dados. Noutras palavras, as informações fornecidas pelos novos participantes da pesquisa pouco acrescentariam ao material já obtido, não mais contribuindo significativamente para o aperfeiçoamento da reflexão teórica fundamentada nos dados que estão sendo coletados. Esta conotação/definição já vinha presente no texto que parece ter inaugurado o uso da expressão saturação teórica (theoretical saturation) 2.

No entanto, é necessário problematizá-la porque, embora possa parecer um procedimento decorrente de uma constatação facilmente atingível, muitas vezes a averiguação de saturação pode ser feita de maneira acrítica ou excessivamente subjetivista. No extremo, o emprego da expressão pode se apoiar apenas no consenso que atualmente existe, entre os pesquisadores qualitativistas, sobre a propriedade de utilização deste recurso metodológico, faltando, entretanto, suficiente discriminação quanto ao seu significado, ferindo assim a transparência da investigação.

Glaser & Strauss 2 originalmente conceituaram saturação teórica como sendo a constatação do momento de interromper a captação de informações (obtidas junto a uma pessoa ou grupo) pertinentes à discussão de uma determinada categoria dentro de uma investigação qualitativa sociológica. Na expressão dos autores, tratar-se-ia de uma confiança empírica de que a categoria está saturada, levando-se em consideração uma combinação dos seguintes critérios: os limites empíricos dos dados, a integração de tais dados com a teoria (que, por sua vez, tem uma determinada densidade) e a sensibilidade teórica de quem analisa os dados.

 

Amostragem como fonte de validação das pesquisas

A importância do estudo dos processos de amostragem relaciona-se estreitamente ao conceito de validade científica 3. Sem dúvida, a forma de constituição de um subconjunto supostamente representativo do contexto sob investigação (isto é, da realidade empírica pesquisada) é um importante recurso de validação de estudos científicos, uma vez que os dados a serem trabalhados emergem fundamentalmente – embora parcialmente – dos elementos que compõem tal subconjunto. A constituição desse subconjunto transcorre paralelamente à de outros elementos cruciais de validação científica: o desenho da pesquisa (seja experimental ou de campo), o recorte do objeto e formulação do problema, a formulação dos pressupostos ou hipóteses, a escolha dos instrumentos de coleta de dados e os quadros de referenciais teóricos de interpretação dos resultados.

O supracitado advérbio "parcialmente" lembra que o campo de observação não é a fonte exclusiva dos achados e explica-se pelos questionamentos sobre o que seriam as essências dos diferentes objetos científicos, suas propriedades e determinações básicas, bem como das possibilidades de conhecimento sobre eles, ou seja, por questões de natureza ontológica. Tais propriedades, determinações e conhecimentos são organizados psicológica e socioculturalmente, sendo impossível desconsiderar que os dados não advêm passivamente da realidade, mas são construídos a partir de conceitos prévios do pesquisador 4.

Os diferentes paradigmas científicos comportam e prescrevem diferentes tipos de construção de amostras. Aquelas utilizadas nas pesquisas qualitativas são, talvez, as mais controversas aos olhos de leitores e pesquisadores acostumados às ciências de inspiração positivista, historicamente hegemônicas na produção científica na área da saúde. Tais ciências supõem que o fato existe por si, cabendo ao observador descrevê-lo e enunciar seus nexos causais, não importando a imaginação e outras questões subjetivas na elaboração das teorias na consciência do cientista.

 

Amostragens intencionais são válidas?

Nesta linha argumentativa, são comuns as asserções de que as amostras não probabilísticas não são subconjuntos suficientemente representativos da realidade empírica em foco e das populações estudadas, porque suas características inviabilizariam um tratamento estatístico dos resultados, de modo a permitir sua generalização. A aplicação ficaria, assim, limitada à própria amostra (isto é, teria uma baixa validade externa, embora com adequada validade interna) 5,6.

Esse tipo de argumento enfatiza, a nosso ver equivocadamente, a idéia de que a representatividade é alcançada apenas por algo como uma imagem em tamanho reduzido do contexto, tomado como tendo seus atributos homogeneamente distribuídos no universo de seus componentes. Bastaria, por isso, selecionar aleatoriamente um número suficiente deles para evitar, estatisticamente, que as exceções fossem tomadas como regra.

Essa visão não valoriza o fato de que, quando se trata de questões psicossociais do ser humano, o desempenho de um atributo, mesmo que de maneira superdimensionada por indivíduos típicos quanto a determinado parâmetro em investigação (e, talvez por isso mesmo, especiais candidatos a serem selecionados), revele funções ou características representativas daquele mesmo contexto. Por exemplo, em um estudo sobre crenças que sustentam as práticas curativas alternativas de uma comunidade rural, poderiam ser entrevistados, como informantes-chave, uma benzedeira, um raizeiro e um curandeiro aos quais a comunidade recorresse. As crenças que sustentam suas práticas estariam difundidas na comunidade, mas concentradas nestes indivíduos.

A despeito desse tipo de crítica, a maioria dos estudiosos de metodologia científica prevê o emprego de amostras não probabilísticas, dependendo dos objetivos da investigação.

Já sob a ótica dos pesquisadores que utilizam métodos compreensivo-interpretativos – ou qualitativos – os processos não probabilísticos de amostragem também podem representar uma fase difícil de planejar e empreender. Tais dificuldades muitas vezes parecem se relacionar à fundamentação teórica que constrói o objeto em investigação e, portanto, quais os indivíduos mais adequados para serem incluídos na amostra (ou seja, a adequação da amostra ao objeto de estudo). Para garantir qualidade às pesquisas qualitativas, é necessário congruência entre os paradigmas teóricos (que fundamentam a definição do objeto e a formulação do problema) e os métodos e técnicas empregados (para abordar a realidade empírica) 7.

Em termos operacionais, a questão que orienta a amostragem não probabilística relaciona-se à homogeneidade fundamental 8,9 que deveria estar presente na amostra, isto é, aos atributos definidos como essenciais, presentes na intersecção do conjunto de características gerais dos componentes amostrais. Ocorrida essa definição, a escolha dos elementos amostrais advirá de um caminho mais prático, na dependência direta dos objetivos da investigação, pois a um mesmo objeto podem corresponder diferentes objetivos de pesquisa.

 

O objeto, os objetivos e os componentes da amostra

Para esclarecimento, citemos um exemplo hipotético:

Trabalhando em hospital para pacientes com tuberculose, um pesquisador preocupado com adesão ao tratamento (® objeto de pesquisa) verifica que a maioria dos casos internados relaciona-se à reagudização do quadro clínico, aparentemente relacionada ao abandono de tratamento proposto (® problema delimitado).

Um exemplo de questionamento central a ser investigado poderia ser assim redigido: "Que fatores o paciente associa ao fenômeno de sua não-adesão ao tratamento e que sentidos psicológicos e socioculturais tais motivos têm para si?" (® problema formulado).

As hipóteses poderiam ser as mais variadas: dificuldades objetivas de acesso ao tratamento (físicas, sociais, econômicas, relacionais etc.), efeitos colaterais percebidos como da medicação, falta de motivação psicológica (por não acreditar na eficácia, não acreditar que conseguiria seguir à risca o tratamento, não desejar se curar, ou ainda, querer morrer ou contaminar outras pessoas), co-morbidade psiquiátrica que dificultasse a persistência no tratamento, negação psicológica da doença, família não colaboradora, unidades de saúde com falha na gestão do cuidado, entre outras.

Diante do problema e das hipóteses, o pesquisador decide, então, entrevistar indivíduos ou realizar grupos focais, isto é, elege uma técnica de coleta de dados. A questão que se segue é: quais devem ser os participantes?

Neste ponto da elaboração do projeto de pesquisa, pensa-se nos seguintes subgrupos que poderiam fornecer dados para responder ao problema formulado:

  • pacientes sem adesão ao tratamento e hospitalizados por esse motivo;
  • pacientes sem adesão ao tratamento, mesmo não hospitalizados;
  • pacientes com boa adesão ao tratamento, mas que poderiam relatar as dificuldades práticas para manterem o seguimento ambulatorial;
  • familiares desses pacientes;
  • profissionais de saúde que sabem informar estas questões pela experiência acumulada na abordagem dessa clientela.

Como referido, o subgrupo que constituirá a amostra não poderá ser casualmente escolhido, porque deve corresponder ao objeto de pesquisa, já que este é o mesmo e está presente em todos os subgrupos (adesão ao tratamento para tuberculose). A escolha deverá recair no subgrupo que melhor atender aos objetivos específicos da pesquisa. Estes, por sua vez, dependem dos pressupostos e dos limites que se quer dar ao estudo. Pode-se escolher conhecer especificamente o ponto de vista dos agentes comunitários, ou de outros trabalhadores da saúde, ou da família, ou do paciente que não abandonou ou do que abandonou etc.

Portanto, embora o recorte do objeto determine indiretamente os componentes amostrais, estes são mais especificamente definidos pelos objetivos. Na situação exemplificada, aceitando-se que o objeto-tema é adesão ao tratamento da tuberculose, a amostra deveria ser constituída por quem tem um discurso sobre o assunto, sejam profissionais de saúde, agentes comunitários, familiares e amigos, sejam, evidentemente, os próprios doentes.

 

Tamanho adequado da amostra intencional

Até aqui, discutimos a primeira de duas perguntas que devem ser feitas na busca de uma amostra adequada aos objetivos de uma pesquisa: quem selecionar? Outra pergunta crucial é: quantos selecionar? Isto é, qual o tamanho do grupo desses sujeitos.

Nos estudos qualitativos, a questão "quantos?" nos parece de importância relativamente secundária em relação à questão "quem?", embora, na prática, representem estratégias inseparáveis. Afinal, o que há de mais significativo nas amostras intencionais ou propositais não se encontra na quantidade final de seus elementos (o "N" dos epidemiologistas), mas na maneira como se concebe a representatividade desses elementos e na qualidade das informações obtidas deles.

Apesar desta importância secundária, o estabelecimento de um número amostral fechado é inevitável (como em qualquer empreendimento investigativo não censitário). Um erro metodológico no estabelecimento desse número final pode comprometer a credibilidade dos achados e das análises realizadas 10.

Nas pesquisas qualitativas, de qualquer forma, este fechamento amostral ocorrerá por critérios de seleção que não consideram mensurações das ocorrências estudadas, ao contrário das pesquisas quantitativas que, ao utilizarem amostragem probabilística, não devem prescindir desta caracterização ao calcularem o "N" adequado aos cálculos estatísticos.

Diferentemente das pesquisas quantitativas, a seleção dos elementos amostrais em pesquisas qualitativas não decorre da mensuração da distribuição de categorias como nos estudos matematizados de características clínicas e bio-sociodemográficas (como diagnósticos nosográficos, perfis de personalidade, eficácia de terapêuticas medicamentosas, idade, sexo, procedência, tipo de moradia, situação conjugal, escolaridade etc.). Isso não é necessário porque os critérios a que os estudos qualitativos visam não obedecem aos mesmos padrões de distribuição de parâmetros biológicos ou dos fenômenos naturais em geral. A seleção dos elementos decorre, sobretudo, da preocupação de que a amostra contenha e espelhe certas dimensões do contexto 8, algumas delas em contínua construção histórica.

A desnecessária representatividade estatística é um dos motivos pelos quais as amostras qualitativas são menores do que as necessárias nos estudos quantitativos. No entanto, a necessidade de "fechamento" amostral exige do pesquisador a explicitação dos critérios para interromper a seleção de casos novos, tornando-os inteligíveis aos futuros leitores dos relatórios e norteadores do andamento prático dos procedimentos de captação.

Variadas são as técnicas para realizar uma amostra intencional, tendo Patton 11 listado mais de uma dezena de possibilidades – porém seu fechamento freqüentemente se dará por redundância de informações ou saturação, tema maior da presente discussão.

Outras técnicas de interrupção de captação de elementos amostrais podem ser confundidas com a técnica da saturação. Foge do escopo deste artigo discuti-las, não obstante serem freqüentemente empregadas: o fechamento por exaustão (em que são incluídos todos os indivíduos disponíveis) e por cotas (em que se pré-determina a necessidade de contemplar algumas características secundárias dos elementos amostrais – faixa etária e sexo, por exemplo, cujos indivíduos que as retêm serão deliberadamente procurados). Em nenhuma delas há a procura apriorística por seguir uma lógica probabilística, ainda que os participantes da pesquisa possam advir de uma seleção desse tipo. Quando, por exemplo, num mesmo grande empreendimento de pesquisa convivem projetos de tratamentos quantitativos e qualitativos, a praticidade pode fazer que a fonte de recrutamento dos sujeitos seja a seleção randômica (por exemplo, no estudo de Loyola Filho et al. 12).

 

Saturação: exemplo operacional de como constatar

A avaliação da saturação teórica a partir de uma amostra é feita por um processo contínuo de análise dos dados, começado já no início do processo de coleta. Tendo em vista as questões colocadas aos entrevistados, que refletem os objetivos da pesquisa, essa análise preliminar busca o momento em que pouco de substancialmente novo aparece, considerando cada um dos tópicos abordados (ou identificados durante a análise) e o conjunto dos entrevistados.

Propomos na Tabela 1 uma representação esquemática de um processo de coleta de informações, em que os participantes apresentam suas percepções e atribuições de significados sobre determinado tópico.

 

 

Note-se que nenhum dos discursos é igual a outro, no entanto todos apresentam elementos comuns com algum outro. No início, os acréscimos aos anteriores são evidentes. Posteriormente, os acréscimos vão se rareando até que deixam de aparecer a partir da entrevista 9. Após mais seis entrevistas confirmou-se a repetição.

Nesse momento, poderíamos dizer que o discurso do grupo amostral sobre o tópico em questão era {a,b,c,d,e,f,g,h,i,j,k,l}. Seria improvável que novas idéias aparecessem, mesmo que chegássemos ao dobro das entrevistas.

Entretanto, se na entrevista 25 aparecesse o conjunto de informações {r,t,z}, poderíamos supor que o informante pertence a outro grupo cultural ou que está à margem de sua cultura (podendo, por exemplo, ser considerado portador de graves problemas mentais, ou um sujeito cuja particular visão de mundo aponta para uma tendência futura do grupo). Não sendo uma descoberta deste tipo o nosso objetivo, poderíamos ter parado na entrevista 15 ou 13.

Expomos na Tabela 2 uma análise preliminar de entrevistas de um estudo qualitativo sobre adesão de pais de crianças deficientes ao tratamento, em realização na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A categoria em questão é "sentimentos dos pais diante da constatação de ter um filho deficiente".

 

 

Obsserve-se que a entrevista 2 acrescenta bastante à primeira, mas a 3 e 4 já acrescentam menos, considerando o conjunto de informações obtidas na duas primeiras. Daí por diante,o acréscimo ou não existe ou é considerado pequeno. Diante disso, existe uma possibilidade de que a saturação tenha ocorrido com relação a este objetivo nas 11 primeiras entrevistas, o que pode e deve ainda ser confirmado com mais entrevistas, talvez uma ou duas.

Os sentimentos de tristeza, negação, desespero, decepção, susto, frustração, medo, revolta, vergonha, rejeição, culpa, resignação, aceitação com o passar do tempo e desenvolvimento de apego excessivo são os que o grupo manifesta diante dessa vivência, ou permite que o pesquisador infira estarem presentes. Com esse conjunto de dados, este poderá considerar ter elementos suficientes para novas e substanciais elaborações teórico-conceituais sobre a categoria em questão, aprofundando o conhecimento sobre o tema geral investigado.

Porém, se também for de seu interesse a forma como tais sentimentos são expressos pelos informantes (por exemplo, que comportamentos pregressos são associados pelos informantes a esses sentimentos), a pré-análise em busca de saturação deve recomeçar. Para esta nova categoria, e para as demais que sejam elaboradas, a saturação poderá ocorrer em outro ponto do processo de coleta de dados, não necessariamente na entrevista 11.

Note-se que tratamos neste exemplo de uma pré-categoria, pois, diante do objeto de pesquisa "adesão de pais de deficientes ao tratamento", é de certa forma previsível que os sentimentos vivenciados pelos participantes da amostra venham a se constituir como uma categoria de análise ou mesmo um objetivo específico do estudo.

 

Indo a campo sem pré-categorias

Diferentemente deste exemplo, há situações em que o pesquisador vai a campo sem pré-categorias explicitadas. É o caso de estudos com um caráter exploratório ainda mais marcante, nos quais a população é desconhecida, e não existem problemas ou objetivos específicos nitidamente delimitados, tampouco hipóteses ou pressupostos claramente definidos.

Este pode ser o caso de muitos estudos etnográficos na área da saúde, os quais pressupõem a imersão parcial ou total do pesquisador na cultura abordada. Dos fenômenos observados, reportados e vivenciados, ele fará necessariamente, mesmo que não intencionalmente, um recorte, que constituirá o seu relato e será objeto de suas reflexões, constituindo objetivos declarados a posteriori. Esses objetivos, embora não anteriormente explicitados ou discerníveis, já faziam parte ou então passaram a fazer parte do estudo, à medida que este se desenvolveu.

Numa situação desse tipo, o pesquisador provavelmente não interromperia sua busca enquanto novas explicações, significados ou visões de mundo estivessem surgindo sobre os assuntos e fatos focalizados. Diante disso, diríamos que o pesquisador sempre virá a julgar, mesmo de forma não intencional, se houve saturação teórica dos significados, representações e simbolizações que a cultura estudada atribui aos fenômenos focados.

 

Empregos polêmicos de saturação

Consideramos cabível, neste ponto, comentar alguns empregos polêmicos do termo saturação. Eles têm sido observados por nós, algumas vezes, em situações de exposição oral de argumentos em eventos ou reuniões científicas e em relatórios escritos (artigos e teses).

Primeiramente, o termo pode assumir uma conotação que sugere que o pesquisador ficou saturado, ou seja, farto de entrevistar e ouvir respostas semelhantes, resolvendo então interromper a coleta de dados. Caso ocorra, tal fenômeno estaria situado na esfera mental do pesquisador e não seria, obviamente, um parâmetro metodológico para encerrar a captação de novos elementos. Tratar-se-ia possivelmente de um estado de impaciência, reflexo de uma predisposição para perceber somente alguns fenômenos 10, talvez mais aderidos à realidade empírica.

Por outro lado, o eventual emprego da expressão pesquisador saturado pode corresponder a uma figura de linguagem referente à percepção, avaliação e tratamento mental dos dados pelo pesquisador com base em seu escopo teórico e que, a partir deste, julga-os já suficientes.

Um segundo emprego controverso, e talvez equivocado, refere-se à expressão amostra saturada quando, na prática, o fechamento amostral se deu por exaustão (os participantes foram todos os que faziam parte do universo definido pelo pesquisador). No estudo de Goulart et al. 13, por exemplo, sobre as representações das mães quanto ao processo de morte de seus filhos no primeiro ano de vida, num bairro de Belo Horizonte, Minas Gerais, todas aquelas cujos filhos faleceram num determinado período foram entrevistadas. Neste caso, a palavra utilizada para descrever seu fechamento não parece corresponder ao efetivamente realizado. É possível, porém, que uma amostra fechada por exaustão seja suficiente para saturar algumas ou todas as categorias formuladas pelo pesquisador. Tratar-se-ia, no entanto, de uma constatação de saturação não decorrente do próprio processo de pesquisa.

A expressão "pouco a acrescentar" pode igualmente ser problematizada: o que seriam "poucos" dados novos ou "certa reincidência das informações" 8, as quais justificariam a interrupção de coleta de dados?

"Pouco a acrescentar" toma como referência aquilo que o pesquisador objetivou atingir, um certo grau de aperfeiçoamento teórico da discussão de uma categoria. O conteúdo das respostas dos informantes às questões formuladas (e implícitas nos objetivos) "pouco acrescentam" a tal aperfeiçoamento. Contudo, outro pesquisador ou o mesmo, achando necessário aprofundar a discussão ou se apoiando em referenciais teóricos diferentes, podem sentir que necessitam de mais ou de outros dados.

Além disso, dependendo dos objetivos da investigação, no momento em que fica bem caracterizado que um determinado conjunto de percepções a partir da amostra é repetitivo, as diferenças que venham a se apresentar podem ser mais valorizadas e exploradas. Pode ser um momento de questionar sobre um possível movimento que esteja levando o pesquisador a simplificar excessivamente sua análise. Casos desviantes ajudariam a melhor demarcar a extensão das análises, apontando seus limites, e uma maior variedade da representação (incluindo esses casos extremos ou negativos, maximizando a representação de grupos numericamente minoritários da população em estudo 14) mostraria o compromisso com a transparência da investigação.

 

Valorizar o que se repete ou as diferenças?

Observe-se, então, que o fechamento da amostra resulta de um balanço que o pesquisador faz sobre valorizar, no conjunto das informações obtidas, as diferenças ou, em contraposição, o que se repete. Isso leva à reflexão sobre a relação indivíduo-grupo e sobre qual desses aspectos a abordagem teórica do pesquisador privilegia.

Segundo os teóricos da Análise do Discurso, lê-se na fala de um indivíduo o discurso do grupo e o seu próprio discurso 15. Diz-se "seu próprio discurso" não no sentido de ter sido construído fora de um contexto histórico e interacional, independente das condições de sua produção e das determinações históricas e sociais de sua formação, mas no sentido da forma original pela qual esse discurso mais amplo foi assimilado e organizado pelo indivíduo. As diferenças (o que se percebe como individualizações da fala) seriam as nuances que a linguagem adquire ao ser assimilada às vivências pessoais e aos contornos que o enunciado adquire, determinados pelas condições imediatas da enunciação. Tais condições imediatas (onde se diz, de onde se diz e para quem se diz) definem para o sujeito o que pode, o que deve e como pode ser dito naquele momento e situação. Mas as possibilidades de um indivíduo dizer são limitadas pelo tempo e espaço social a que pertence, o que o leva a ser identificado, pelo observador, como pertencente a um determinado grupo.

Dessa forma, as semelhanças predominantemente indicarão, na perspectiva social, o discurso do grupo, da formação social à qual pertence o sujeito ou, na perspectiva psicanalítica, as estruturas do aparelho psíquico mais universais ou gerais. Por sua vez, as diferenças marcarão as vivências pessoais e as condições imediatas de produção da fala, podendo incluir os fenômenos ditos transferenciais na relação com pesquisador ou com a instituição onde a pesquisa é conduzida.

Logo, a constatação de saturação depende dos objetivos do pesquisador: se ele tem como objetivo a captação daquilo que caracteriza o grupo, a saturação amostral se dá num determinado nível. Este nível poderá garantir maior validade externa, ou seja, maior transferibilidade das interpretações para contextos mais amplos. Porém, se lhe interessa o conhecimento aprofundado do sujeito, essa saturação poderá, hipoteticamente, nunca ocorrer. Buscar-se-ia, neste último caso, uma maior validade interna das interpretações, ou seja, um aprofundamento nos sujeitos que compõem a amostra, sem a preocupação precípua de ampla generalização. Tal aprofundamento pode corresponder a diferentes fenômenos, de acordo com a linha teórica adotada. Em sociologia, por exemplo, corresponderia à investigação dos modos como se concretizam, nos indivíduos, os comportamentos inerentes à estrutura de uma sociedade 16. Em psicanálise, por seu turno, corresponderia à investigação da dinâmica transferencial ímpar entre um entrevistado e um pesquisador 17.

Considerando um mesmo estudo, diferentes tipos de informações e objetivos específicos terão diferentes momentos de saturação. Por exemplo, numa pesquisa sobre acidente escolar, da qual um de nós participou (J. R.) 18, considerou-se que todos os conceitos sobre o que é acidente apareceram nas primeiras 11 de um total 17 entrevistas realizadas com coordenadores de escolas de ensino fundamental. Já as diferentes atribuições de responsabilidade sobre a prevenção de acidente apareceram nas 13 primeiras. A maior ou menor homogeneidade da amostra no que diz respeito à cultura, tradição, gênero, faixa etária, experiência vivida etc., também influenciará o momento de saturação. No estudo citado, sendo todos os entrevistados profissionais de escolas privadas, de classes sócio-econômicas média e alta, presume-se que a saturação tenha ocorrido mais rapidamente do que se tivessem sido entrevistados também coordenadores de escolas públicas de bairros pobres. Uma amostra constituída somente de jovens adultos diabéticos, com o objetivo de captar representações relativas à restrição de alimentos, estaria saturada mais rapidamente do que se lá inseríssemos jovens adultos não diabéticos, e assim por diante.

Num extremo deste raciocínio, estaria um processo de amostragem que não se satura ou que "satura o pesquisador". Seria o caso, por exemplo, se resolvêssemos pesquisar em profundidade as vivências de luto pela perda de um filho, obtendo histórias de vida tópicas de pessoas que vivenciaram essa perda. Em tese, tantas seriam as formas quantos seriam os indivíduos.

Consideramos, então, que, dependendo do objeto ou do problema focalizado, diferentes níveis de abrangência do contexto investigado são requeridos, na tentativa de captar os diferentes tipos ou níveis de simbolização presentes nas manifestações individuais dos participantes de uma pesquisa: número de indivíduos representantes desse contexto, diferentes tempos de duração de entrevista ou capacidades de insight dos entrevistados, assim como diferentes níveis de aprofundamento interpretativo por parte do pesquisador. Por exemplo, em pesquisa sobre vivências emocionais a respeito de determinado problema de saúde, dependendo do nível focado, nova entrevista com um mesmo sujeito pode ser necessária para que o pesquisador conclua a respeito de determinado mecanismo de defesa utilizado pelo entrevistado que, por sua vez, poderia também precisar de mais tempo para tornar tal mecanismo evidente.

 

Abrangência da generalização

Do primeiro exemplo mencionado (acidente escolar), teríamos resultados que se aplicariam ao grupo como um todo e, mesmo que parcialmente, a cada indivíduo. A generalização se apoiaria na análise das semelhanças históricas, sociais e culturais entre o grupo estudado e o foco da aplicação. Do segundo caso (luto), quanto mais aprofundássemos, mais teríamos resultados que se restringiriam aos indivíduos pesquisados. A generalização possível, aqui, apoiar-se-ia na avaliação caso a caso dos sujeitos que compuseram a amostra e no julgamento dos leitores do relatório de pesquisa sobre a plausibilidade de aplicação dos resultados apresentados em casos e settings específicos. Essas diferenças nos remetem novamente à afirmação de que saturar ou não, bem como o momento em que isto acontece, depende dos objetos e dos objetivos do pesquisador.

 

Recurso a metáforas para compreender saturação

Com base no exposto, parece inerente à técnica de fechamento amostral por saturação um certo grau de imprecisão ou aproximação quanto a um número ideal de componentes. Isto é exemplificado pelo simples fato de que a constatação de redundância de informações depende diretamente de certa quantidade de entrevistas realizadas posteriormente à saturação. Assim, o ponto exato de saturação amostral é determinado, logicamente, sempre a posteriori, embora sua ocorrência tenha sido prevista no desenho da pesquisa.

Na medida em que as ferramentas utilizadas na constatação de saturação não são de ordem matemática, e sim cognitiva (envolvendo a percepção do pesquisador e seu domínio teórico), vários parecem ser os fatores que intervêm nesse processo, podendo influenciar a decisão de interromper o recrutamento da amostra por considerá-la saturada, usando agora a expressão no sentido de "amostra completa". Cabe ressaltar, ainda, que qualquer projeto de pesquisa se insere num contexto que extrapola questões puramente metodológicas, situando-se num determinado contexto político de produção científica. Os objetivos de pesquisa inserem-se também neste contexto mais amplo e, como vimos, eles influenciam diretamente todos os aspectos do processo de amostragem.

Para ilustração desses fatores, alguns deles imponderáveis, comparamos a saturação, nesse sentido amplo, ao conceito de saturação na área físico-química. Recorremos ao auxílio de metáforas advindas desta área do conhecimento que, ao que nos parece, encontram-se implícitas já na origem da formulação do conceito de saturação teórica 2.

Nesta área do conhecimento, o termo saturação é empregado para descrever comportamentos de materiais (solutos) transferidos para um meio específico (solvente): uma solução está saturada quando a concentração do soluto é a máxima possível para as determinadas condições físico-químicas do solvente (temperatura e pressão, por exemplo). Outra possibilidade de emprego físico-químico dessa expressão se dá quando um determinado material gasoso se encontra em equilíbrio com seu estado líquido, sendo impossível uma transferência maior de um estado para outro, também em determinadas condições.

Dir-se-ia, portanto, que o processo de coleta de dados se satura quando há a percepção de que os dados novos a serem coletados decantam-se, isto é, não são diluídos ou absorvidos na formulação teórica que se processa, não mais contribuindo para seu adensamento. Isso se daria por diferentes motivos:

• Por questões práticas do processo de pesquisa, como possibilidade de acesso aos informantes, tempo disponível para a sua realização ou a abrangência ou tamanho possíveis do relatório. A metáfora química seria a de um continente (um frasco) com pouca capacidade e que comporta pouco solvente e, em decorrência, pouco soluto (em termos absolutos). Exemplificando: em uma pesquisa em andamento sobre violência doméstica contra a criança, da qual um de nós participa, os pais de classe média e alta não foram entrevistados por impossibilidade de acesso.

• Por questões ontológicas, quando o material obtido não é solúvel nas ferramentas ou paradigmas interpretativos disponíveis; isto é, alguns objetos não seriam reconhecíveis e, assim sendo, seria impossível serem utilizados e interpretados (diluídos). Na falta de um referencial teórico suficientemente denso (utilizando termo de Glaser & Strauss 2), o pesquisador não conseguiria transformar certos aspectos do contexto com que se defronta em dados, resultando em pontos-cegos ao conhecimento.

• Por questões cognitivas e das dinâmicas psicológicas e culturais do pesquisador e ou dos pesquisados. Quando essas questões estão presentes, talvez correspondam aos elementos beta conceituados pelo psicanalista Bion 19: elementos dos participantes da pesquisa não apreendidos (neste caso, por quem coleta e analisa os dados), sendo então mentalmente descartados, não absorvidos, rejeitados de antemão por uma simples impossibilidade psicológica de serem percebidos. No caso das pesquisas qualitativas na área clínica, por exemplo, em que os elementos de angústia da dupla pesquisador-entrevistado estão profundamente atuantes, este talvez seja um dos principais determinantes do decantamento (descarte) de possíveis dados. O fenômeno pode decorrer de questões do próprio pesquisador – incapaz de escutar e analisar certos conteúdos, por uma dificuldade de rap-port com determinado entrevistado –, ou dos sujeitos pesquisados – incapazes de transmiti-los de maneira inteligível ou psicologicamente audível, ou mesmo de percebê-los – ou, ainda, da interação entre ambos. Trata-se de fenômeno análogo ao comentado quanto às questões ontológicas, com a diferença de que haveria, neste caso, ferramentas teóricas interpretativas suficientes, não ocorrendo, porém, a apreensão de dados.

Considerando todo o grupo amostral, essa dificuldade é minimizada pelo fato de outras pessoas serem também entrevistadas, já que as informações individuais se complementam e/ou se sobrepõem. O que não foi apreendido a partir da interação com um participante, poderá ser com um outro.

A interrupção da coleta de dados decorre de um juízo consciente do pesquisador. Todavia, no caso supracitado, haveria processos não conscientes influenciando a coleta, representando coisas que "não podem ser ditas ou não podem ser ouvidas", ficando indisponíveis para o pesquisador, para o pesquisado ou para ambos. Isso influenciaria também a análise dos dados efetivamente colhidos, pois essas questões enviesam o olhar e a reflexão do pesquisador. Este poderia, desavisadamente, decidir por um ponto de saturação incorreto para seus objetivos, pois não estaria consciente da presença desse fenômeno. Porém, estando o corpus das entrevistas disponível, outros leitores/analistas de dados poderiam perceber indícios de sua ocorrência e considerar que o mais correto teria sido outro ponto de saturação. Trata-se de um exemplo de como pode se originar a imprecisão no número amostral, comentada anteriormente.

Quando as questões culturais estão presentes, advindas, por exemplo, de posição excessivamente etnocêntrica do pesquisador (pouca familiaridade com o objeto de estudo, barreiras de linguagem, insuficiente aculturação etc.), incapacitando-o a compreender certos valores simbólicos culturais dos participantes, elas podem ser vistas como uma variação dos citados elementos beta: símbolos cognitivamente não perceptíveis ao pesquisador, pontos psicológica e culturalmente cegos.

Nestes casos, a metáfora química seria a de um solvente (pesquisador) que, em virtude da baixa temperatura (isto é, insuficientes condições cognitivas, culturais ou psicológicas), absorve e comporta pouco soluto.

• Por questões metodológicas do desenho da pesquisa: o objetivo geral do estudo é restrito, o caráter exploratório dado à investigação é pequeno, objetivando responder pontualmente a uma ou a poucas questões. Metaforicamente, não haveria incapacidades, insuficiências ou características inerentes aos materiais (solvente/soluto – pesquisador/pesquisados) que os tornariam pouco compatíveis, mas uma opção por restringir o que será utilizado de ambos. Exemplificando: o objetivo pode se limitar à identificação dos termos mais comuns utilizados por uma população, para aperfeiçoar um questionário padronizado. Neste caso, a investigação estaria exposta a dúvidas sobre o seu caráter de pesquisa científica, já que é necessário algum reconhecimento, por parte do meio científico, de que os dados coletados se refiram a um contexto mais amplo em termos de espaço ou tempo do que a dos próprios dados. Talvez possa ser considerado procedimento eminentemente técnico, e não propriamente científico.

 

Conclusão

O conceito de saturação teórica é amplamente utilizado em pesquisas qualitativas na área da saúde, sendo invariavelmente citado em estudos metodológicos que contemplam o tópico amostragem intencional.

O conceito encontra respaldo científico no pressuposto da constituição social do sujeito que, na Teoria das Representações Sociais, reflete-se no conceito de determinação social das representações individuais e, na Análise do Discurso, no conceito de determinação histórica e social das formações discursivas e da fala 15,20.

Amostragem por saturação é uma ferramenta conceitual de inequívoca aplicabilidade prática, podendo, a partir de sucessivas análises paralelas à coleta de dados, nortear sua finalização.

O ponto de saturação da amostra depende indiretamente do referencial teórico usado pelo pesquisador e do recorte do objeto e diretamente dos objetivos definidos para a pesquisa, do nível de profundidade a ser explorado (dependente do referencial teórico) e da homogeneidade da população estudada. Entretanto, por ser uma ferramenta inerentemente influenciada por fenômenos cognitivos e afetivos da dupla pesquisador-pesquisados, na prática da pesquisa qualitativa o encontro desse ponto de saturação está sujeito a imprecisões.

Consideramos fundamental para o rigor científico e transparência das pesquisas qualitativas a menção, no relatório, do conjunto de fatores identificados que possam ter contribuído para a decisão de um determinado ponto de saturação amostral. Deve-se evitar a simples menção à utilização desse recurso metodológico, algo possivelmente representativo de uma ilusão de transparência 21 de um procedimento complexo, que contribui decisivamente para a validade científica do instrumento de coleta e análise de dados.

 

Colaboradores

Os três autores contribuíram igualmente para a redação do artigo, tendo B. J. B. Fontanella compilado e organizado as progressivas modificações que resultaram no texto final.

 

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Correspondência:
B. J. B. Fontanella
Departamento de Medicina
Universidade Federal de São Carlos.
Rodovia Washington Luís, Km 235, São Carlos
SP 13565-905, Brasil
bruno.fontanella@uol.com.br

Recebido em 16/Jan/2007
Versão final reapresentada em 24/Mai/2007
Aprovado em 25/Jun/2007

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br