Variação sazonal na ingestão alimentar de adultos de Niterói, Rio de Janeiro

Amine Farias Costa Edna Massae Yokoo Luiz Antonio dos Anjos Vivian Wahrlich Maria Teresa Anselmo Olinto Ruth Liane Henn William Waissmann Sobre os autores

Resumos

A aferição da ingestão alimentar (IA) usual é necessária para estabelecer, com acurácia, a relação entre a dieta e o aparecimento de doenças. Na maioria dos estudos, os dados de IA usual são coletados referentes ao período de um ano, sem considerar a estação do ano em que o estudo ocorre. O objetivo do presente estudo foi verificar o efeito da sazonalidade na IA de adultos de Niterói, RJ. Um total de 102 sujeitos (69 mulheres) saudáveis, com idade entre 20 e 69 anos, responderam a seis recordatórios dietéticos de 24 horas, três no verão e três no inverno. Em ambas as estações do ano, foi determinada a ingestão energética (IE) e de 23 nutrientes, além do percentual de indivíduos que alcançavam as recomendações dos mesmos. Os dados finais foram deatenuados pela variabilidade intraindividual e ajustados pela energia. A IE e de alguns nutrientes foram significativamente diferentes entre os homens e as mulheres. A IE não se diferenciou entre as estações, para ambos os sexos, porém a ingestão de proteínas, fibras, magnésio, tiamina, piridoxina e niacina foi diferente entre as estações para ambos os sexos. Os resultados do presente estudo sugerem que a sazonalidade seja considerada na aferição da IA, servindo de base para a adequação dos métodos e instrumentos utilizados nos inquéritos dietéticos populacionais.

Epidemiologia nutricional; Dieta; Inquéritos sobre dietas; Consumo de alimentos; Estações do ano; Recomendações nutricionais


Introdução

Usualmente, os dados de ingestão alimentar (IA) avaliados por meio de Questionário de Frequência Alimentar (QFA) são coletados em um único momento. Caso o período de referência da informação de IA seja os 12 meses anteriores poderá ocorrer viés de informação. Por exemplo, se a aplicação do QFA ocorrer no verão, o entrevistado poderá involuntariamente superestimar os alimentos dessa época do ano em detrimento de alimentos mais consumidos no inverno. Por outro lado, se o QFA for referente a um período menor de tempo, por exemplo, três meses, a informação poderá ser afetada pela real variação na IA da estação. Tal fato já é bem documentado e vem recebendo considerável atenção na literatura 11. Capita R, Alonso-Calleja C. Differences in reported winter and summer dietary intakes in young adults in Spain.Int J Food Sci Nutr2005; 56(6): 431-43. , 22. Ma Y, Olendzki BC, Li W, Hafner AR, Chiriboga D, Hebert JR et al. Seasonal variation in food intake, physical activity, and body weight in a predominantly overweight population.Eur J Clin Nutr2006; 60(4): 519-28. . Similarmente, isso poderia ocorrer na aplicação de outros instrumentos de avaliação de IA como o diário alimentar ou o recordatório alimentar de 24h (RA). Este último, dependendo do número de aplicações ao longo do ano, poderia ser mais ou menos afetado pelas estações.

Há controvérsias sobre o efeito da sazonalidade sobre a IA. Alguns estudos sugerem que a ingestão energética (IE) diária, por exemplo, varia significativamente de acordo com a estação do ano 11. Capita R, Alonso-Calleja C. Differences in reported winter and summer dietary intakes in young adults in Spain.Int J Food Sci Nutr2005; 56(6): 431-43. , 22. Ma Y, Olendzki BC, Li W, Hafner AR, Chiriboga D, Hebert JR et al. Seasonal variation in food intake, physical activity, and body weight in a predominantly overweight population.Eur J Clin Nutr2006; 60(4): 519-28. . Outros não observaram tal variação na IE 33. Subar AF, Frey CM, Harlan LC, Kahle L. Differences in reported food frequency by season of questionnaire administration: The 1987 National Health Interview Survey.Source Epidemiol1994; 5(2): 226-33. , 44. Shahar DR, Froom P, Harari G, Yerushalmi N, Lubin F. Changes in dietary intake account for seasonal changes in cardiovascular disease rizk factors.Eur J Clin Nutr1999; 53: 395-400. , mas identificaram diferenças no padrão alimentar entre estas estações 55. Mitchikpe CES, Dossa RAM, Ategbo EAD, Van Raaij JMA, Kok Fj. Seasonal variation in food patern but not in energy and nutrient intakes of rural Beninese school-aged children.Public Health Nutr2009; 12(3): 414-22. . A maioria das diferenças sazonais na IA, contudo, é encontrada em regiões onde as estações do ano são claramente definidas, influenciando, assim, a disponibilidade de determinados alimentos ao longo do ano11. Capita R, Alonso-Calleja C. Differences in reported winter and summer dietary intakes in young adults in Spain.Int J Food Sci Nutr2005; 56(6): 431-43. , 66. Fowke JH, Schlundt D, Gong Y, Jin F, Shu X, Wen W et al., Impact of Season of Food Frequency Questionnaire Administration on Dietary Reporting.Ann Epidemiol2004; 14: 778-85. , 77. Westerterp KR, Plasqui G, Goris AHC. Water loss as a function of energy intake, physical activity and season.Br J Nutr2005; 93: 199-203. .

Considerando os aspectos mencionados, o objetivo do presente estudo foi avaliar o efeito da sazonalidade na IE, de macro e micronutrientes de uma amostra de adultos da cidade de Niterói, Rio de Janeiro, localizada em região tropical.

Métodos

No presente estudo utilizou-se uma coorte prospectiva originária da pesquisa “Construção e validação de um instrumento de avaliação da ingestão alimentar da população”, * cujo objetivo foi a construção e validação de um QFA 88. Anjos LA, Wahrlich V, Vasconcellos MTL, Souza DR, Olinto MTA, Waissmann W et al., Development of a food frequency questionnaire in a probabilistic sample of adults from Niterói, Rio de Janeiro, Brazil.Cad Saúde Pública2010; 26(11): 2196-204. . A amostra utilizada compreendeu a seleção de 150 indivíduos adultos, residentes na cidade de Niterói, Rio de Janeiro. Os indivíduos foram contatados via telefone, a partir de uma lista de participantes de um inquérito domiciliar realizado em amostra probabilística de adultos de Niterói 99. Souza DR, Anjos LA, Wahrlich V, Vasconcellos MTL, Machado JM. Ingestão alimentar e balanço energético da população adulta de Niterói, Rio de Janeiro, Brasil: resultados da Pesquisa de Nutrição, Atividade Física e Saúde (PNAFS).Cad Saude Publica 2010; 26(5): 879-90. , respeitando os seguintes critérios: ter entre 20 e 69 anos de idade; apresentar no mínimo 10 anos de escolaridade, para os três setores de menor renda, ou quatro anos de escolaridade, para os demais setores; não ser obeso ou ter baixo peso, critério avaliado pelo índice de massa corporal (IMC) maior ou igual a 30 e menor do que 18,5 kg.m-2, respectivamente; não apresentar ou não estar em tratamento para diabetes mellitus, doenças renais, doenças cardiovasculares (DCV), doenças gastrintestinais, distúrbios na glândula tireóide ou qualquer outra doença que interferisse no padrão alimentar; não ser gestante ou nutriz; e não estar em dieta alimentar.

Os indivíduos que concordaram em participar do estudo foram convidados a se apresentar no LANUFF (Laboratório de Avaliação Nutricional e Funcional da UFF) em um dia pela manhã, em jejum, e após os esclarecimentos detalhados sobre sua participação assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. As informações sociodemográficas foram obtidas por questionário padronizado, objetivando a classificação das classes socioeconômicas 1010. Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP).Critério de Classificação Econômica Brasil. Disponível em http://www.abep.org/codigosguias/ABEP_CCEB.pdf. (Acessado em 07 de outubro de 2008).
http://www.abep.org/codigosguias/ABEP_CC...
. As medidas de massa corporal e estatura foram obtidas com os indivíduos utilizando roupas padronizadas, seguindo os métodos descritos por Lohman et al. 1111. Lohman TG, Roche AF, Martorell R.Anthropometric standardization reference manual. Champaign, Illinois: Human Kinetics; 1988. . Com essas medidas, calculou-se o IMC e classificou-se o estado nutricional dos participantes como normal (18,5 ≤ IMC < 25 kg.m-2) ou sobrepeso (25   IMC < 30 kg.m-2) 1212. World Health Organization.Obesity: preventing and managing the global epidemic. Geneva: World Health Organization; 2000. (WHO Technical Report Series, 824) .

Após essas medições realizou-se um RA com o uso de um álbum de fotografias especialmente desenvolvido para a pequisa e que foi fornecido para os indivíduos levarem para sua residência. Nesta ocasião, foram agendados três dias não consecutivos para a realização de RA (dois dias de semana e um dia de final de semana), através de ligação telefônica. Após seis meses da realização do primeiro RA, os indivíduos foram novamente contatados e repetidos os procedimentos de obtenção de mais três RA. O período de coleta de dados compreendeu o verão dos anos de 2007 e 2008 (janeiro a abril) e o inverno do ano de 2007 (julho a outubro).

A análise da IA foi realizada, preferencialmente, com base na Tabela Brasileira de Composição de Alimentos – TACO 1313. Universidade Estadual de Campinas.Tabela Brasileira de Composição de Alimentos, Versão II. 2. ed. Campinas: Unicamp; 2006. . Os alimentos que não estavam presentes na TACO foram consultados em outras fontes 88. Anjos LA, Wahrlich V, Vasconcellos MTL, Souza DR, Olinto MTA, Waissmann W et al., Development of a food frequency questionnaire in a probabilistic sample of adults from Niterói, Rio de Janeiro, Brazil.Cad Saúde Pública2010; 26(11): 2196-204. : USDA National Nutrient Database for Standard Reference – Release 20 1414. United States Department of Agriculture (USDA), Agricultural Research Service.USDA National Nutrient Database for Standard Reference, Release 20; 2007. ; Tabela para Avaliação de Consumo Alimentar em Medidas Caseiras 1515. Benzecry EH, Pinheiro ABV, Lacerda EMA, Gomes MCS, da Costa VM.Tabela para Avaliação de Consumo Alimentar em Medidas Caseiras. 5aed. São Paulo: Editora Atheneu; 2005. ; e, por último, consideraram-se as informações dos rótulos, somente em casos muito específicos (por exemplo, suplementos nutricionais e preparações de restaurantes tipo fastfood ).

A partir dos dados de RA dos três dias por estação foram estimadas as variâncias intra e interindividual, bem como os valores individuais de IE, de macro e micronutrientes deatenuados pela variabilidade intraindividual (VI) pelo programa PC-SIDE 1616. Iowa State University.Software for intake distribution estimation version 1.0. Iowa City, IA, USA; 2003. . O programa PC-SIDE prevê a transformação das variáveis dietéticas para permitir simetria da distribuição antes do cálculo das variâncias intra e interindividual e fornece os valores individuais deatenuados pela VI em escala original 1717. Nusser SM, Carriquiry AL, Dodd KW, Fuller WA. A semi parametric transformation approach to estimating usual intake distributions.J Am Stat Assoc1996; 91: 1440-9. , 1818. Nusser SM, Fuller WA, Guenther PM. Estimating usual dietary intake distributions: adjusting for measurement error and no normality in 24-hour food intake data. In: Lyberg L, Biemer P, Collins M, De Leeuw E, Dippo C, Schwarz N, Trewin D.Survey Measurement and Process Quality. New York: Wiley and Sons; 1997. p. 689-709. .

Anteriormente à deatenuação pela VI, os três dias de RA do verão foram comparados entre si (distribuição não normal) e, como não houve diferença significativa entre eles (teste H de Kruskal-Wallis com p > 0,05), foram incluídos em uma mesma estação do ano (verão). Este procedimento também foi realizado para os três dias de RA do inverno.

Os dados deatenuados pela VI foram utilizados para o cálculo do percentual de indivíduos que alcançaram as recomendações (% IAR) de IA. As recomendações de energia foram calculadas pela multiplicação da taxa metabólica basal (TMB) – calculada pelas equações sugeridas pela FAO 1919. Food and Agriculture Organization.Human energy requirements. Report of a joint FAO/WHO/UNU expert consultation.Rome; 2004. (FAO Food and Nutrition Technical Report Series, 1). – pelo nível de atividade física de 1,4, valor sugerido para uso nesta população 2020. Anjos LA, Ferreira BCM, Vasconcellos MTL, Wahrlich V. Gasto energético em adultos do Município de Niterói, Rio de Janeiro: Resultados da Pesquisa de Nutrição, Atividade Física e Saúde – PNAFS.Cien Saude Colet2008; 13(6): 1775-84. . Como recomendações para proteínas, carboidratos e lipídios totais, utilizou-se a faixa de distribuição aceitável, de acordo com as Dietary References Intakes (DRI) 2121. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Energy, Carbohydrate, Fiber, Fat, Fatty Acids, Cholesterol, Protein, and Amino Acids (Macronutrients).Washington, DC, National Academic Press; 2005. . As recomendações da Sociedade Brasileira de Cardiologia 2222. Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Departamento de aterosclerose.V Diretriz brasileira sobre dislipidemias e prevenção da aterosclerose; 2008. para lipídios saturados, mono e poliinsaturados foram utilizadas para estes componentes da dieta. As recomendações de fibra, cálcio, manganês, sódio e potássio foram baseadas nos valores de ingestão adequada, segundo as DRI. Para a ingestão de magnésio, fósforo, ferro, cobre, zinco, retinol, tiamina, riboflavina, piridoxina, niacina e vitamina C foram utilizados os valores da ingestão dietética recomendada2121. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Energy, Carbohydrate, Fiber, Fat, Fatty Acids, Cholesterol, Protein, and Amino Acids (Macronutrients).Washington, DC, National Academic Press; 2005. , 2323. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Calcium, Phosphorus, Magnesium, Vitamin D, and Fluoride.Washington, DC, National Academic Press; 1997.

24. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Thiamin, Riboflavin, Niacin, Vitamin B6, Folate, Vitamin B12, Pantothenic acid, Biotin and Coline. Washington, DC, National Academic Press; 1998.

25. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Vitamin C, Vitamin E, Selenium, and Carotenoids. Washington, DC, National Academic Press; 2000a.

26. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Vitamin A, Vitamin K, Arsenic, Boron, Chromium, Copper, Iodine, Iron, Manganese, Molybdenum, Nickel, Silicon, Vanadium and Zinc.Washington, DC, National Academic Press; 2000b.
- 2727. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Water, Potassium, Sodium, Chloride, and Sulfate. Washington, DC, National Academic Press; 2004. .

A ingestão, deatenuada pela VI, de macro e micronutrientes foi ajustada pela IE, utilizando-se o método dos resíduos 2828. Willett WC, Howe GR, Kushi LH. Adjustment for total energy intake in epidemiologic studies.Am J Clin Nutr1997; 65(S1): 1220-8. . O objetivo do ajuste pela IE foi remover possíveis fatores de confusão que possam ocorrer pela ingestão de energia total, sendo exigência para os estudos de avaliação da ingestão de nutrientes 2828. Willett WC, Howe GR, Kushi LH. Adjustment for total energy intake in epidemiologic studies.Am J Clin Nutr1997; 65(S1): 1220-8. .

O ajuste pela IE não gerou resultados satisfatórios para a ingestão de retinol em homens e mulheres e de cobre e riboflavina em homens; por isso, estes dados não foram apresentados.

As médias (e os desvios-padrão – DP), na unidade de medida mais adequada, e o % IAR foram estimados para a IE, de macro e micronutrientes, no verão e no inverno, para ambos os sexos. As médias de ingestão, somente deatenuadas pela VI e deatenuadas e ajustadas pela IE, foram comparadas entre os sexos e entre as estações do ano. A diferença entre as médias foi testada utilizando-se teste não paramétrico (Wilcoxon), pois as variáveis não apresentaram distribuição normal. Para determinar a significância o valor de α = 0,05 foi utilizado em todos os testes estatísticos.

A análise dos dados foi realizada com auxílio dos programas estatísticos Statistical Analysis System (SAS) versão 9.1, Software for Intake Distribution Estimation (PC-SIDE) versão 1.0 e Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 13.01616. Iowa State University.Software for intake distribution estimation version 1.0. Iowa City, IA, USA; 2003. , 2929. SAS Institute Inc. SAS 9.1. Cary, NC, USA; 2002/2003. , 3030. SPSS Inc. SPSS 13.0 for Windows. Chicago, IL, USA; 2004. .

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense sob o número 163/06. Não houve conflitos de interesses durante a construção do estudo.

Resultados

O número de indivíduos que completaram o presente estudo foi de 102 (69 mulheres). À classe socioeconômica B pertenciam aproximadamente 54% da amostra, a maioria possuía idade entre 40 e 49 anos (25,5%), IMC normal (63,7%) e a prevalência de sobrepeso foi maior nos homens (51,5%) do que nas mulheres (29,0%) ( Tabela 1 ).

Tabela 1
Distribuição das variáveis socioeconômicas, demográficas, e estado nutricional de adultos de Niterói, RJ, Brasil, 2007-08.

A maioria das perdas foi devida à recusa dos indivíduos em participar da segunda etapa do estudo e os indivíduos que foram perdidos durante o seguimento possuíam características semelhantes às dos indivíduos que permaneceram nas análises: maioria de mulheres (56,3%) com idade entre 40 e 49 anos (31,3%), pertencente à classe B (45,5%) e com prevalência de sobrepeso maior nos homens do que nas mulheres.

A IE e de alguns nutrientes (proteínas, lipídios, carboidratos e piridoxina) foi significativamente diferente entre homens e mulheres para os dados deatenuados pela VI e ajustados pela IE. Em geral, os homens ingeriram maior quantidade de energia e nutrientes do que as mulheres. Não se observaram diferenças entre as estações do ano para a IE média deatenuada pela VI, tanto em homens quanto em mulheres ( Tabelas 2 e 3 ).

Tabela 2
Médias de ingestão (e desvio-padrão – DP) de energia, macro e micronutrientes, no verão e no inverno, deatenuadas pela variabilidade intraindividual e ajustados pela energia, de homens de Niterói, RJ, Brasil, 2007-08.
Tabela 3
Médias de ingestão (e desvio-padrão – DP) de energia, macro e micronutrientes, no verão e no inverno, deatenuadas pela variabilidade intraindividual e ajustados pela energia, de mulheres de Niterói, RJ, Brasil, 2007-08.

A ingestão de proteína, entre os homens, foi maior no verão do que no inverno ( Tabela 2 ). Entre as mulheres, a maior ingestão ocorreu no inverno, mas somente para as proteínas ajustadas pela IE ( Tabela 3 ). Não houve diferença entre as estações do ano na ingestão de lipídios pelos homens, porém, nas mulheres, esta ingestão ajustada pela IE foi diferente entre o verão e o inverno. Os homens ingeriram uma quantidade maior de carboidratos no inverno, quando comparada ao verão, para os dados ajustados pela IE ( Tabela 2 ), enquanto a ingestão de carboidratos pelas mulheres não foi diferente entre as estações do ano, tanto para os dados deatenuados pela VI, quanto para os dados ajustados pela IE ( Tabela 3 ).

A ingestão de colesterol, segundo a estação do ano, foi diferente somente entre os homens, sendo maior no verão do que no inverno ( Tabela 2 ), enquanto a ingestão de lipídios saturados, ajustada pela IE, diferiu somente entre as mulheres, porém com maior ingestão no inverno do que no verão ( Tabela 3 ). Para os lipídios monoinsaturados, novamente só houve diferença na ingestão entre as mulheres, sendo maior no inverno do que no verão ( Tabela 3 ). Não houve diferença na ingestão de lipídios poliinsaturados, entre as estações, em homens ( Tabela 2 ). Já, para as mulheres, a diferença ocorreu em ambos os tipos de ajuste ( Tabela 3 ).

Em geral, tanto os homens quanto as mulheres apresentaram maior ingestão de fibras ajustada pela IE no inverno, quando comparada à ingestão no verão. Quanto às diferenças entre as estações na ingestão de minerais e vitaminas, observou-se maior ingestão de magnésio, manganês, ferro, zinco, tiamina e niacina no verão, pelos homens, e maior ingestão de cálcio, magnésio, fósforo, cobre, potássio, tiamina e piridoxina no inverno, por parte das mulheres ( Tabelas 2 e 3 ).

A maioria dos homens e das mulheres, em ambas as estações do ano, não alcançou as recomendações de cálcio, magnésio, potássio, retinol e lipídio poliinsaturado. Além destes nutrientes, maior percentual de homens não atingiu as recomendações para a ingestão de proteína (inverno), piridoxina (inverno), lipídio monoinsaturado (inverno), tiamina (verão), fibra e vitamina C (em ambas as estações) ( Figura 1 a). Para as mulheres, os nutrientes correspondentes foram fibras (verão), lipídios monoinsaturados (verão), ferro e piridoxina (ambas as estações) ( Figura 1 b).

Figura 1
Percentual de homens (a) e mulheres (b) adultos cujas ingestões, deatenuadas pela variabilidade intraindividual 1717. Nusser SM, Carriquiry AL, Dodd KW, Fuller WA. A semi parametric transformation approach to estimating usual intake distributions.J Am Stat Assoc1996; 91: 1440-9. , 1818. Nusser SM, Fuller WA, Guenther PM. Estimating usual dietary intake distributions: adjusting for measurement error and no normality in 24-hour food intake data. In: Lyberg L, Biemer P, Collins M, De Leeuw E, Dippo C, Schwarz N, Trewin D.Survey Measurement and Process Quality. New York: Wiley and Sons; 1997. p. 689-709. , alcançam a recomendação de ingestão energética, de macro e micronutrientes, no verão e no inverno, segundo a Dietary Reference Intakes e a Sociedade Brasileira de Cardiologia 2121. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Energy, Carbohydrate, Fiber, Fat, Fatty Acids, Cholesterol, Protein, and Amino Acids (Macronutrients).Washington, DC, National Academic Press; 2005.

22. Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Departamento de aterosclerose.V Diretriz brasileira sobre dislipidemias e prevenção da aterosclerose; 2008.

23. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Calcium, Phosphorus, Magnesium, Vitamin D, and Fluoride.Washington, DC, National Academic Press; 1997.

24. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Thiamin, Riboflavin, Niacin, Vitamin B6, Folate, Vitamin B12, Pantothenic acid, Biotin and Coline. Washington, DC, National Academic Press; 1998.

25. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Vitamin C, Vitamin E, Selenium, and Carotenoids. Washington, DC, National Academic Press; 2000a.

26. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Vitamin A, Vitamin K, Arsenic, Boron, Chromium, Copper, Iodine, Iron, Manganese, Molybdenum, Nickel, Silicon, Vanadium and Zinc.Washington, DC, National Academic Press; 2000b.
- 2727. Institute of Medicine.Dietary Reference Intakes for Water, Potassium, Sodium, Chloride, and Sulfate. Washington, DC, National Academic Press; 2004. . Niterói, RJ, Brasil, 2007-8.

Discussão

Diversos estudos avaliaram as possíveis fontes de variabilidade capazes de interferir na aferição da IA de populações, como a sazonalidade 11. Capita R, Alonso-Calleja C. Differences in reported winter and summer dietary intakes in young adults in Spain.Int J Food Sci Nutr2005; 56(6): 431-43.

2. Ma Y, Olendzki BC, Li W, Hafner AR, Chiriboga D, Hebert JR et al. Seasonal variation in food intake, physical activity, and body weight in a predominantly overweight population.Eur J Clin Nutr2006; 60(4): 519-28.

3. Subar AF, Frey CM, Harlan LC, Kahle L. Differences in reported food frequency by season of questionnaire administration: The 1987 National Health Interview Survey.Source Epidemiol1994; 5(2): 226-33.

4. Shahar DR, Froom P, Harari G, Yerushalmi N, Lubin F. Changes in dietary intake account for seasonal changes in cardiovascular disease rizk factors.Eur J Clin Nutr1999; 53: 395-400.

5. Mitchikpe CES, Dossa RAM, Ategbo EAD, Van Raaij JMA, Kok Fj. Seasonal variation in food patern but not in energy and nutrient intakes of rural Beninese school-aged children.Public Health Nutr2009; 12(3): 414-22.

6. Fowke JH, Schlundt D, Gong Y, Jin F, Shu X, Wen W et al., Impact of Season of Food Frequency Questionnaire Administration on Dietary Reporting.Ann Epidemiol2004; 14: 778-85.
- 77. Westerterp KR, Plasqui G, Goris AHC. Water loss as a function of energy intake, physical activity and season.Br J Nutr2005; 93: 199-203. . O efeito desta na IA depende, além dos fatores intrínsecos aos indivíduos (sexo e idade), de fatores culturais, ecológicos, geográficos e meteorológicos, assim como do grau de industrialização de um país 3131. Willett WC.Nutritional Epidemiology. 2. ed. New York: Oxford University Press; 1998. .

No presente estudo, a avaliação da IE, de macro e de micronutrientes foi realizada em duas estações do ano: verão e inverno, utilizando-se mais de um ajuste estatístico. Os dados aqui apresentados foram corrigidos pela VI, o que permite que a distribuição na ingestão seja influenciada somente pela diferença entre os indivíduos. As flutuações na ingestão diária individual podem alterar os resultados e o seu ajuste permite a redução das estimativas de variabilidade como o desvio e o erro-padrão 3232. Hoffman K, Boeing H, Dufour A, Volatier JL, Telman J, Virtanen M et al., Estimating the distribution of usual dietary intake by short-term measurements.Eur J Clin Nutr2002; 56(S2): 53-62. , 3333. Carriquiry A. Estimation of Usual Intake Distributions of Nutrients and Foods. J Nutr 2003; 133(S): 601-8. . Os resultados ainda foram ajustados pela IE, fazendo com que a ingestão de homens e mulheres, em ambas as estações do ano, possam ser comparadas, não sofrendo influência do aporte energético 3131. Willett WC.Nutritional Epidemiology. 2. ed. New York: Oxford University Press; 1998. .

A IE não se diferenciou entre as estações para os resultados deatenuados pela VI, em ambos os sexos, mostrando que durante o ano a IE permanece inalterada na amostra de adultos de Niterói. Portanto, a ingestão de diferentes tipos de alimentos em geral não alterará a IE, mas sim a de alguns micronutrientes, confirmando que a qualidade dos alimentos que caracterizam o padrão alimentar dos indivíduos é diferente ao longo do ano, estando de acordo com outros estudos que utilizaram RA 22. Ma Y, Olendzki BC, Li W, Hafner AR, Chiriboga D, Hebert JR et al. Seasonal variation in food intake, physical activity, and body weight in a predominantly overweight population.Eur J Clin Nutr2006; 60(4): 519-28. , 3434. Van Staveren WA, Deurenberg P, Burema J, De Groot LC, Hautvast JG. Seasonal variation in food intake, pattern of physical activity and change in body weight in a group of young adult Dutch women consuming self-selected diets. Int J Obes 1986; 10(2): 133-45. ou QFA 33. Subar AF, Frey CM, Harlan LC, Kahle L. Differences in reported food frequency by season of questionnaire administration: The 1987 National Health Interview Survey.Source Epidemiol1994; 5(2): 226-33. , 3535. Shahar DR, Yerushalmi N, Lubin F, Froom P, Shahar A, Kristal-Boneh E. Seasonal variations in dietary intake affect the consistency of dietary assessment.Eur J Clin Nutr2001; 17: 129-33. .

No Brasil, os estudos que avaliam as variações sazonais na IA são raros. Em geral, as fontes de variação da IA estudadas em brasileiros são restritas a variações metodológicas e intrínsecas aos indivíduos. Dois estudos 3636. Pasqua, IC.Comportamento alimentar e estado nutricional de trabalhadores em turnos: uma abordagem cronobiológica[dissertação de mestrado]. São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Saúde Pública; 2003. , 3737. Rossato SL, Olinto MTA, Henn R, Anjos LA, Bressan A, Wahrlich V. Seasonal Effect on Nutrient Intake in Adults Living in Southern Brasil.Cad Saude Publica2010; 26(11): 2177-87. apresentaram resultados relacionando sazonalidade e IA no Brasil. No primeiro, verificou-se a variação no comportamento alimentar, entre o verão e o inverno, de trabalhadores em turnos fixos de São Paulo, através de registro alimentar administrado durante três dias. A dieta dos trabalhadores apresentou quantidade maior de energia, carboidratos e lipídios no inverno, mostrando a influência da sazonalidade na IA da amostra de homens.

Rossato et al. 3737. Rossato SL, Olinto MTA, Henn R, Anjos LA, Bressan A, Wahrlich V. Seasonal Effect on Nutrient Intake in Adults Living in Southern Brasil.Cad Saude Publica2010; 26(11): 2177-87. analisaram a variação sazonal na IA de adultos saudáveis do Rio Grande do Sul, utilizando seis RA ao longo do ano. A ingestão de carboidratos, ajustada pela IE, foi maior no verão do que nas demais estações, o oposto sendo observado para os lipídios, cuja ingestão foi maior no inverno. De acordo com o presente estudo, não se observaram diferenças na IE entre as estações, para ambos os sexos, fortalecendo a hipótese de que o padrão alimentar é que se diferencia ao longo do ano.

Em estudos internacionais, contudo, encontraram-se valores de IE diferentes ao longo do ano. Avaliando a IA de mulheres norte-americanas com idade entre 51 e 86 anos, através da administração de um questionário de avaliação do padrão sazonal, Lee et al. 3838. Lee CJ, Lawler GS, Panemangalore M, Street D. Nutritional status of middle-aged and elderly females in Kentucky in two seasons: Part 1. Body weight and related factors.J Am Coll Nutr1897; 6(3): 209-15. encontraram maior IE no inverno do que no verão. Com dados de uma coorte realizada em Shanghai, China, Fowke et al. 66. Fowke JH, Schlundt D, Gong Y, Jin F, Shu X, Wen W et al., Impact of Season of Food Frequency Questionnaire Administration on Dietary Reporting.Ann Epidemiol2004; 14: 778-85. encontraram IE, aferida por QFA, maior no inverno do que no verão, em mulheres saudáveis. Da mesma forma, Westerterp et al. 77. Westerterp KR, Plasqui G, Goris AHC. Water loss as a function of energy intake, physical activity and season.Br J Nutr2005; 93: 199-203. encontraram IE, avaliada por registro alimentar de sete dias, maior no inverno do que no verão, em adultos holandeses. Kuhnlein et al. 3939. Kuhnlein HV, Soueida R, Receveur O. Dietary nutrient profiles of Canadian Baffin Island Inuit differ by food source, season, and age. J Am Diet Assoc 1996; 96: 155-62. , entretanto, não encontraram diferenças na IE proveniente de alimentos industrialmente processados, chamados de “market foods” , em relação aos alimentos tradicionais (não industrializados), em mulheres canadenses, com idade entre 40 e 70 anos, avaliadas em seis momentos do ano.

Importantes diferenças sazonais foram encontradas para a ingestão de nutrientes relacionados a doenças carenciais (anemia ferropriva) e doenças crônicas não transmissíveis (hipercolesterolemia, DCV e osteoporose) na presente amostra de adultos de Niterói. A ingestão de ferro e colesterol, nos homens, foi maior no verão, e a ingestão de cálcio, nas mulheres, foi maior no inverno. Este fato merece atenção, pois se reconhece a necessidade de ingestão regular destes nutrientes ao longo do ano, de modo a garantir elevado nível de saúde.

Tokudome et al. 4040. Tokudome Y, Imaeda N, Nagaya T, Ikeda M, Fujiwara N, Sato J et al., Daily, Weekly, Seasonal, Within- and Between-individual Variation in Nutrient Intake According to Four Season Consecutive 7 Day Weighed Diet Records in Japanese Female Dietitians.J Epidemiol2002; 12: 85-92. encontraram resultados similares aos do presente estudo, utilizando registros alimentares com pesagem durante sete dias consecutivos, relativamente à ingestão de potássio, cálcio, magnésio, cobre e lipídios saturados, mono e poliinsaturados em mulheres japonesas, que foi significativamente maior no inverno. Capita & Alonso-Calleja 11. Capita R, Alonso-Calleja C. Differences in reported winter and summer dietary intakes in young adults in Spain.Int J Food Sci Nutr2005; 56(6): 431-43. , na Espanha, também encontraram nos homens ingestão maior no inverno de carboidratos e fibras, e nas mulheres de proteínas, fibras e lipídios poliinsaturados, através de registros alimentares aplicados durante um ano.

Os resultados do presente estudo apresentaram um alto percentual de adultos que não alcançaram a recomendação de determinados nutrientes, com diferenças de acordo com o sexo e as estações do ano, sugerindo a necessidade de intervenções diferenciadas na população. Para as mulheres, a baixa ingestão de ferro foi mais expressiva, enquanto que para os homens evidenciou-se baixa ingestão de fibras, niacina e vitamina C. A baixa ingestão de ferro pelas mulheres pode estar relacionada à ocorrência de anemia ferropriva, situação apresentada em diversos estudos para a população brasileira 4141. Lopes MCS, Ferreira LOC, Batista-Filho M. Uso diário e semanal de sulfato ferroso no tratamento de anemia em mulheres no período reprodutivo.Cad Saude Publica1999; 15(4): 799-808.

42. Nascimento SF.Estado nutricional e anemia em adolescentes do sexo feminino no Estado de Pernambuco, 1997[dissertação de mestrado]. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, Centro de Ciências da Saúde, Departamento de Nutrição; 2000.

43. Olinto MTA, da Costa JSD, Gigante DP, Menezes AMB, Macedo S, Schwengber R et al., Prevalência de anemia em mulheres em idade reprodutiva no Sul do Brasil.Bol Saude2003; 17(1): 135-44.
- 4444. Fabian C, Olinto MTA, da Costa JSD, Bairros F, Nácul L. Prevalência de anemia e fatores associados em mulheres adultas residentes em São Leopoldo, Rio Grande do Sul, Brasil.Cad Saude Publica2007; 23(5): 1199-205. , reforçando a necessidade de intervenções neste grupo.

Maior percentual de homens não alcançou as recomendações de proteínas e lipídios monoinsaturados, no inverno. Entre as mulheres, maior percentual não atingiu as recomendações de fibras e lipídios monoinsaturados, no verão. Nesta amostra, foi possível observar elevado percentual de homens e mulheres, que não atingiram as recomendações de cálcio, retinol e lipídios saturados, em ambas as estações do ano, quadros estes que podem estar associados à osteoporose 4545. Pinheiro MM, Ciconelli RM, Martini LA, Ferraz MB. Clinical risk factors for osteoporotic fractures in Brazilian women and men: the Brazilian Osteoporosis Study (BRAZOS).Osteoporos Int2009; 20: 399-408. , hipovitaminose A 4646. Diniz AS, Santos LMP. Epidemiologia da hipovitamino A e xeroftalmia. In: Kac G, Sichieri R, Gigante D. (Eds).Epidemiologia Nutricional. Rio de Janeiro: Fiocruz/Atheneu; 2007. p. 325-46. e DCV, respectivamente 2222. Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Departamento de aterosclerose.V Diretriz brasileira sobre dislipidemias e prevenção da aterosclerose; 2008. .

Por outro lado, a ingestão de sódio, colesterol e lipídios saturados, muito além da preconizada nas recomendações, para homens e mulheres, em ambas as estações do ano, podem aumentar o risco de DCV, como a hipertensão arterial e a aterosclerose, ambas altamente prevalentes na população brasileira 2222. Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Departamento de aterosclerose.V Diretriz brasileira sobre dislipidemias e prevenção da aterosclerose; 2008. , 4747. Gimeno SGA, Ferreira SRG. Fatores da dieta nas doenças cardiovasculares. In: Kac G, Sichieri R, Gigante D. (Eds). Epidemiologia Nutricional. Rio de Janeiro: Fiocruz/Atheneu; 2007. p. 371-87. . Vale ressaltar, ainda, o alto percentual de homens e mulheres que ingerem uma quantidade de energia maior que a recomendação. Tal achado é preocupante, considerando-se os altos índices de sobrepeso e obesidade na população brasileira 2020. Anjos LA, Ferreira BCM, Vasconcellos MTL, Wahrlich V. Gasto energético em adultos do Município de Niterói, Rio de Janeiro: Resultados da Pesquisa de Nutrição, Atividade Física e Saúde – PNAFS.Cien Saude Colet2008; 13(6): 1775-84. , 2222. Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Departamento de aterosclerose.V Diretriz brasileira sobre dislipidemias e prevenção da aterosclerose; 2008. .

Existem algumas limitações ao se determinar o alcance das recomendações de IA em estudos populacionais. Para nutrientes como cálcio e fibras, a ingestão insuficiente pode, em parte, ser explicada pelas elevadas recomendações nutricionais propostas. Outros nutrientes, como retinol e lipídios poliinsaturados, devido à sua grande concentração em poucos alimentos, poderiam apresentar ingestão subestimada. Um alto percentual de indivíduos que não alcançaram as recomendações também pode estar associado às limitações das tabelas de composição dos alimentos, com a descrição insuficiente de alimentos e valores nutricionais, forçando a utilização de inúmeras fontes, além de informações relativas às preparações dos alimentos 4848. Anjos LA, de Souza DR, Rossato SL. Desafios na medição da ingestão alimentar quantitativa de populações.Rev Nutr2009; 22(1): 151-61. .

O presente estudo apresenta algumas limitações. Os dados são baseados em uma amostra de conveniência, não representativa da população estudada, mas suficiente para atingir o objetivo (validação de um QFA) da pesquisa que lhe deu origem. Além disso, havia um maior percentual de adultos da classe socioeconômica A na amostra estudada (17,7%) em relação aos 5,1% estimados para a população da região metropolitana do RJ1010. Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP).Critério de Classificação Econômica Brasil. Disponível em http://www.abep.org/codigosguias/ABEP_CCEB.pdf. (Acessado em 07 de outubro de 2008).
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. Por outro lado, a maioria da população do presente estudo possuia IMC na faixa normal, devido aos critérios de inclusão propostos, o que diminui as chances de sub-relato da IA devido ao sobrepeso e à obesidade 4848. Anjos LA, de Souza DR, Rossato SL. Desafios na medição da ingestão alimentar quantitativa de populações.Rev Nutr2009; 22(1): 151-61. . Apesar das limitações, fica clara a importância da sazonalidade na aferição da IA da população estudada.

Replicar o número de RA utilizados, em diferentes momentos do ano, e contemplar dias de semana e de final de semana, não consecutivos, ambos realizados adequadamente no presente estudo, são essenciais no planejamento dos inquéritos dietéticos, diminuindo assim as possíveis fontes de erros aleatórios. O erro de aferição causado pela sazonalidade pode ser igualmente diluído entre os indivíduos no caso de uma grande amostra; caso contrário, não se pode garantir que não haja distorção nos resultados de IA devido à sazonalidade 22. Ma Y, Olendzki BC, Li W, Hafner AR, Chiriboga D, Hebert JR et al. Seasonal variation in food intake, physical activity, and body weight in a predominantly overweight population.Eur J Clin Nutr2006; 60(4): 519-28. , 4949. Joachim G. The influence of time on dietary data: differences in reported summer and winter food consumption.Nutr Health1997; 12(1): 33-43. . Além disso, apesar da cidade de Niterói não apresentar estações do ano bem definidas, por estar localizada nos trópicos, diferenças significativas na IA foram encontradas no presente estudo.

Em suma, embora a maioria dos estudos nacionais e internacionais não contemple a sazonalidade, os resultados apresentados sugerem que esta fonte de variação deve ser considerada, mesmo em regiões tropicais.

Contribuições: LA Anjos, MTA Olinto e W Waissmann foram responsáveis pelo planejamento da pesquisa. AF Costa, LA Anjos e V Wahrlich supervisionaram a coleta de dados de campo. EM Yokoo e RL Henn colaboraram nas análises dos dados e na redação do manuscrito. AF Costa analisou os dados, discutiu os resultados e escreveu a primeira versão do manuscrito, que foi revisado e aprovado por todos os autores.

Agradecimentos:

AF Costa recebeu bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). O projeto teve apoio financeiro da CAPES no Programa Nacional de Cooperação Acadêmica (PROCAD; processo 0257052). LA Anjos (proc. 311801/2006-4 e 308489/2009-8) e MTA Olinto (proc. 308833/2006-6) receberam bolsas de produtividade em pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2013

Histórico

  • Recebido
    27 Jan 2011
  • Revisado
    27 Jul 2011
  • Aceito
    8 Set 2011
Associação Brasileira de Pós -Graduação em Saúde Coletiva São Paulo - SP - Brazil
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