Implicações das violências contra as mulheres sobre a não realização do exame citopatológico

Franciele Marabotti Costa Leite Maria Helena Costa Amorim Denise Petrucci Gigante Sobre os autores

RESUMO

OBJETIVO

Analisar a associação entre a violência por parceiro íntimo e a não realização do exame citopatológico nos últimos três anos.

MÉTODOS

Estudo transversal, em 26 unidades de saúde do município de Vitória, ES, no período de março a setembro de 2014. A amostra foi constituída por 706 usuárias do serviço de atenção primária, com idade entre 30 e 59 anos. Foram coletados dados sobre o rastreamento do câncer de colo do útero, além da caracterização sociodemográfica, comportamental, obstétrica e ginecológica das mulheres por meio de entrevista e aplicado o instrumento recomendado pela Organização Mundial da Saúde para identificar a experiência de violência. A análise foi realizada por teste de associação do qui-quadrado, tendência linear para variáveis ordinais e análise de regressão de Poisson com variância robusta.

RESULTADOS

Entre as participantes, 14% (IC95% 12,0–17,2) estavam com o exame de Papanicolaou em atraso. A maior prevalência de não realização do exame foi entre mulheres de menor escolaridade, em união consensual, menor renda, fumantes e com histórico de uso de drogas, coitarca antes dos 15 anos, três ou mais gestações e dois ou mais parceiros nos últimos 12 meses. Mulheres em situação de violência sexual e física cometida pelo parceiro íntimo apresentaram, respectivamente, 1,64 (IC95% 1,03–2,62) e 1,94 (IC95% 1,28–2,93) vezes mais prevalência de atraso no exame de Papanicolaou quando comparadas às não vítimas.

CONCLUSÕES

A violência apresenta-se como um agravo importante e com impacto negativo na saúde da mulher. Mulheres vitimizadas, física ou sexualmente, por seus companheiros, estão mais vulneráveis a não realização do exame de Papanicolaou e, consequentemente, têm menos oportunidades de detecção precoce do câncer de colo do útero.

Mulheres Agredidas; Violência contra a Mulher; Violência por Parceiro Íntimo; Violência Doméstica; Neoplasias do Colo do Útero, prevenção & controle; Teste de Papanicolaou; Qualidade, Acesso e Avaliação da Assistência à Saúde

INTRODUÇÃO

O câncer de colo do útero corresponde ao quarto tipo de neoplasia mais comum entre as mulheres no mundo. Aproximadamente 528 mil novos casos deste tipo de câncer ocorreram em 2012, e foram responsáveis pela ocorrência de 266 mil óbitos femininos, representando 7,5% de todas as mortes por câncer no sexo feminino. Cerca de nove em cada 10 (87%) mortes por essa neoplasia ocorre nas regiões menos desenvolvidas. As taxas de mortalidade variam de menos de dois por 100.000 na Ásia Ocidental, na Europa Ocidental e na Austrália, e para mais de 20 por 100.000 na Melanésia (20,6) e na África Oriental (27,6) 11. World Health Organization, International Agency for Research on Cancer. GLOBOCAN 2012: estimated cancer incidence, mortality and prevalence worldwide in 2012. Lyon (FR): IARC; 2012 [cited 2018 Feb 19]. Available from: http://globocan.iarc.fr/Default.aspx
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Estimaram-se 16.340 novos casos de câncer de colo do útero no Brasil para 2016-2017, uma incidência bruta de aproximadamente 16 casos para cada 100.000 mulheres. É o terceiro tipo de câncer mais prevalente, ocupando a primeira posição entre as mulheres da região Norte. Ocupa a segunda posição nas regiões Centro-Oeste e Nordeste, enquanto o câncer de mama é o de maior prevalência, e a terceira e quarta posições nas regiões Sudeste e Sul, respectivamente 22. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Coordenação Geral de Prevenção e Vigilância. Estimativas 2016: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA; 2015 [cited 2018 Feb 19]. Available from: http://www.inca.gov.br/bvscontrolecancer/publicacoes/edicao/Estimativa_2016.pdf
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Uma vez que se trata de um problema de saúde pública, estratégias de prevenção para essa neoplasia são essenciais. A vacinação contra o Papiloma Vírus Humana (HPV), fator de risco para o desenvolvimento da doença 33. Zardo GP, Farah FP, Mendes FG, Franco CAGS, Molina GVM, Melo GN, et al. Vacina como agente de imunização contra o HPV. Cienc Saude Coletiva . 2014;19(9):3799-808. https://doi.org/10.1590/1413-81232014199.01532013
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, destaca-se como forma de prevenção primária e o diagnóstico precoce das lesões antes de se tornarem invasivas como prevenção secundária 44. Pinho AA, França-Júnior I. Prevenção do câncer de colo do útero: um modelo teórico para analisar o acesso e a utilização do teste de Papanicolaou. Rev Bras Saude Mater Infant . 2003;3(1):95-112. https://doi.org/10.1590/S1519-38292003000100012
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O Instituto Nacional de Câncer (INCA) recomenda como estratégia de detecção precoce a realização do exame citológico de colo do útero, também conhecido como exame de Papanicolaou, com intervalo de três anos, quando houver dois exames negativos em intervalo de um ano. A mulher sexualmente ativa deve realizar a primeira coleta do exame aos 25 anos e, a seguir, até os 64 anos. Pode ser interrompido quando, após essa idade, tiver pelo menos dois exames negativos consecutivos nos últimos cinco anos 55. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Coordenação de Prevenção e Vigilância, Divisão de Detecção Precoce e Apoio à Organização de Rede. Diretrizes brasileiras para o rastreamento do câncer de colo do útero. 2.ed.rev.ampl. atual. Rio de Janeiro: INCA; 2016 [cited 2018 Feb 19]. Available from: http://www1.inca.gov.br/inca/Arquivos/Diretrizes_para_o_Rastreamento_do_cancer_do_colo_do_utero_2016_corrigido.pdf
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A não realização do Papanicolaou está associada às características da mulher, como: idade, situação conjugal, escolaridade e renda 66. Borges MFSO, Dotto LMG, Koifman RJ, Cunha MA, Muniz PT. Prevalência do exame preventivo de câncer do colo do útero em Rio Branco, Acre, Brasil, e fatores associados à não-realização do exame. Cad Saude Publica . 2012;28(6):1156-66. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2012000600014
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,77. Gasperin SI, Boing AF, Kupek E. Cobertura e fatores associados à realização do exame de detecção do câncer de colo de útero em área urbana no Sul do Brasil: estudo de base populacional. Cad Saude Publica . 2011;27(7):1312-22. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011000700007
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. Questões culturais, como: receio da dor, vergonha, desconhecimento do procedimento, local de realização e o desencorajamento por parte do parceiro para que a mulher realize o exame também são causas de resistência 88. Ferreira MLSM. Motivos que influenciam a não-realização do exame de papanicolaou segundo a percepção de mulheres. Esc Anna Nery . 2009;13(2):378-84. https://doi.org/10.1590/S1414-81452009000200020
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.

Estudo epidemiológico do tipo caso-controle mostrou que mulheres com histórico de violência sexual na infância têm menor probabilidade de realização do exame Papanicolaou 99. Farley M, Golding JM, Minkoff JR. Is a history of trauma associated with a reduced likelihood of cervical cancer screening? J Fam Pract . 2002;51(10):827-31. . Entretanto, inquérito populacional realizado nos Estados Unidos com mulheres de 18 anos ou mais aponta maior propensão ao rastreamento do câncer de colo do útero entre aquelas com histórico de violência cometida pelo parceiro íntimo 1010. Brown MJ, Weitzen S, Lapane KL. Association between intimate partner violence and preventive screening among women. J Womens Health . 2013;22(11):947-52. https://doi.org/10.1089/jwh.2012.4222
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A violência contra a mulher constitui agravo de saúde pública que atinge cerca de um terço das mulheres no mundo, e tem o parceiro íntimo como o principal perpetrador 1111. World Health Organization. Global and regional estimates of violence against women: prevalence and health effects of intimate partner violence and non-partner sexual violence. Geneva: WHO; 2013 [cited 2018 Feb 19]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/85239/1/9789241564625_eng.pdf
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. Pesquisas mostram o impacto da violência na saúde da vítima, como: distúrbios cardiovasculares, gastrointestinais, aumento de queixa de dores e fadiga 1212. Kernic MA, Wolf ME, Holt VL. Rates and relative risk of hospital admission among women in violent intimate partner relationships. Am J Public Health . 2000;90(9):1416-20. https://doi.org/10.2105/AJPH.90.9.1416
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,1313. Coker AL, Smith PH, Bethea L, King MR, McKeown RE. Physical health consequences of physical and psychological intimate partner violence. Arch Fam Med . 2000;9(5):451-7. https://doi.org/10.1001/archfami.9.5.451
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. Além disso, esse fenômeno poder estar associado a não realização do exame de Papanicolaou 99. Farley M, Golding JM, Minkoff JR. Is a history of trauma associated with a reduced likelihood of cervical cancer screening? J Fam Pract . 2002;51(10):827-31.,1010. Brown MJ, Weitzen S, Lapane KL. Association between intimate partner violence and preventive screening among women. J Womens Health . 2013;22(11):947-52. https://doi.org/10.1089/jwh.2012.4222
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, uma das principais estratégias de detecção precoce da neoplasia de colo do útero que contribui na redução da incidência e mortalidade, bem como, sequelas físicas, sociais e psicológicas à mulher 1414. Mascarello KC, Silva NF, Piske MT, Viana KCG, Zandonade E, Amorim MHC. Perfil sociodemográfico e clínico de mulheres com câncer do colo do útero associado ao estadiamento inicial. Rev Bras Cancerol . 2012 [cited 2018 Feb 19];58(3):417-26. Available from: http://www.inca.gov.br/rbc/n_58/v03/pdf/11_artigo_perfil_sociodemografico_clinico_mulheres_cancer_colo_utero_associado_estadiamento_inicial.pdf
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O presente estudo teve por objetivo analisar a associação entre a violência por parceiro íntimo e a não realização do exame citopatológico nos últimos três anos.

MÉTODOS

Estudo transversal, em 26 Unidades de Saúde (US) de Vitória, ES, que possuíam a Estratégia de Saúde da Família (ESF) ou Programa de Agentes Comunitários (PACS). Os dados coletados de março a setembro de 2014 referiram-se às usuárias do serviço que possuíam parceiro íntimo nos 12 meses anteriores à data da entrevista. Parceiro íntimo foi definido como o companheiro ou ex-companheiro, independentemente de união formal, e namorados atuais, desde que mantendo relações sexuais. Para a definição do desfecho, adotou-se a orientação do Ministério da Saúde para a realização do exame de rastreamento do câncer de colo do útero: dois exames anuais consecutivos negativos, com a repetição após três anos 55. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Coordenação de Prevenção e Vigilância, Divisão de Detecção Precoce e Apoio à Organização de Rede. Diretrizes brasileiras para o rastreamento do câncer de colo do útero. 2.ed.rev.ampl. atual. Rio de Janeiro: INCA; 2016 [cited 2018 Feb 19]. Available from: http://www1.inca.gov.br/inca/Arquivos/Diretrizes_para_o_Rastreamento_do_cancer_do_colo_do_utero_2016_corrigido.pdf
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. A variável dependente “exame citopatológico em atraso” foi definida como exame não realizado nos últimos três anos do momento da entrevista. Considerando o início do exame recomendado a partir dos 25 anos e o intervalo de três anos a partir de dois resultados negativos, foram elegíveis para o presente estudo 706 mulheres com idade igual ou superior a 30 anos que poderiam estar em atraso para a realização do Papanicolaou.

Para identificação das exposições de interesse, a vivência de violências praticadas pelo parceiro íntimo (VPPI) nos 12 meses anteriores à entrevista, foi utilizado o instrumento intitulado “ World Health Organization Violence Against Women ” (WHO VAW Study). Esse instrumento tem por objetivo discriminar as diferentes formas de violência contra mulheres em seus domínios psicológico, físico e sexual. Possui 13 questões relacionadas à violência, com capacidade de discriminar as diferentes formas em contextos sociais diversos; é abrangente e relativamente curto. Foi validado para o português e considerado com elevada consistência interna . As violências psicológica, sexual e física foram consideradas presentes quando a mulher respondeu sim a um dos itens do instrumento e considerada violência geral se tivesse vivenciado pelo menos um dos três tipos de violência 1515. Schraiber LB, Latorre MRDO, França Jr I, Segri NJ, D’Oliveira AFPL. Validity of the WHO VAW study instrument for estimating gender-based violence against women. Rev Saude Publica . 2010;44(4):658-66. https://doi.org/10.1590/S0034-89102010000400009
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Considerou-se qualquer tipo de violência como exposição e suas associações com o desfecho. Para o cálculo do tamanho da amostra para estudo transversal, adotou-se um nível de 95% de confiança, erro aceitável de 5 pontos percentuais, poder de 80%, prevalência de expostos (não vitimas) que realizaram o Papanicolaou de 0,75, e prevalência de não expostos (vítimas) que realizaram o Papanicolaou de 0,65, admitindo uma prevalência de não realização de Papanicolaou em torno de 20% e um risco relativo de aproximadamente 1,2. Foi considerada a população total de 83.160 mulheres adultas que deveriam utilizar as unidades de saúde do município que possuíam ESF ou PACS, variando entre 858 e 12.189 a população segundo a US. O processo amostral foi realizado por meio da amostragem proporcional ao número de mulheres cadastradas nas US, totalizando uma amostra necessária de 690 mulheres.

Além disso, para controle das possíveis variáveis confundidoras foram coletadas as características sociodemográficas (idade, raça/cor, escolaridade, situação conjugal e renda familiar); comportamentais (ingestão de bebida alcoólica, fumo e histórico de uso de drogas); obstétricas e ginecológicas (idade da menarca, uso atual de método contraceptivo, número de gestações, idade da coitarca e número de parceiro sexual nos últimos 12 meses).

Foram utilizados os testes qui-quadrado de Pearson e de tendência linear nas análises bivariadas para investigar as associações de possíveis fatores de confusão com a exposição e desfecho, este último utilizado somente com variáveis ordinais. A regressão de Poisson robusta foi utilizada nas análises, com entrada das variáveis no modelo se p < 0,20 na análise bivariada, por meio da seleção para trás, e permanência no modelo se p < 0,05.

Foram utilizados dois modelos preditivos nas análises ajustadas: modelo 1 (ajuste para as variáveis sociodemográficas); e modelo 2 (ajuste para variável sociodemográfica, comportamental, obstétrica e ginecológica). Utilizou-se razão de prevalência e seus respectivos intervalos de confiança como medida de efeito. As análises foram realizadas no Stata 13.0.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Espírito Santo (Parecer 470.744). Às mulheres elegíveis foi explicada a pesquisa e solicitada a assinatura no termo de consentimento livre e esclarecido. Foi realizada entrevista individual em local reservado na US por entrevistadoras devidamente treinadas. Ao final de cada entrevista, era entregue o folder do Instituto Nacional de Câncer, contendo toda orientação de prevenção e promoção do rastreamento do câncer de colo do útero, além de um folder elaborado pelos autores da pesquisa contendo os principais serviços de atendimento às mulheres vítimas de violência.

RESULTADOS

Participaram do estudo 706 mulheres entre 30 e 59 anos que utilizavam as US do município que possuíam ESF ou PACS. A maior parte tinha de 30 a 39 anos (43,3%), declarou-se parda (52,4%) e possuía mais de oito anos de estudo (63,7%). Metade era casada e um terço tinha renda familiar mensal superior a R$2.924,00. Aproximadamente 34% ingeriam bebida alcoólica, 12% eram fumantes e 9% tinham histórico de uso de drogas. Cerca de 82% tiveram a menarca até os 14 anos e 22% não faziam uso atual de método contraceptivo. Quase metade das entrevistadas teve três ou mais gestações. A primeira relação sexual de 54% ocorreu entre os 15 e 18 anos, mais de 90% tiveram pelo menos um parceiro sexual nos últimos 12 meses.

Não realizaram o Papanicolaou nos últimos três anos 14,5% (IC95% 12,0–17,2) das entrevistadas. Maior prevalência de não realização do exame citopatológico foi observada no grupo de mulheres com até oito anos de escolaridade, que referiam união consensual, pertenciam ao grupo de menor renda, tinham histórico de uso de drogas e fumavam. Maiores prevalências da não realização do exame também foram observadas nas mulheres que tiveram três ou mais gestações, cuja coitarca ocorreu antes dos 15 anos e tiveram dois ou mais parceiros nos 12 meses anteriores à entrevista (p < 0,05) ( Tabela 1 ).

Tabela 1
Característica da amostra e prevalência do exame de Papanicolaou em atraso segundo características sociodemográficas, comportamentais, obstétricas e ginecológicas. Vitória, ES. Março a setembro, 2014. (n = 706)

Maiores predominâncias do exame em atraso foram observadas entre as mulheres que sofreram algum tipo de VPPI comparadas àquelas que não relataram essa experiência ( Tabela 2 ).

Tabela 2
Prevalência da não realização do exame citopatológico nos últimos três anos de acordo com o tipo de violência vivenciada nos últimos 12 meses. Vitória, ES. Março a setembro, 2014. (n = 706)

Mulheres vítimas de VPPI nos últimos 12 meses, independentemente do tipo de violência sofrida, apresentaram maiores prevalências da não realização do Papanicolaou nos últimos três anos em relação àquelas que não sofreram agressão na análise bruta ( Tabela 3 ).

Tabela 3
Análise bruta e ajustada dos efeitos das violências perpetradas pelo parceiro íntimo nos últimos 12 meses, e a não realização de exame citopatológico nos últimos três anos. Vitória, ES. Março a setembro, 2014. (n = 706)

Na análise ajustada para as variáveis sociodemográficas escolaridade, situação conjugal e renda familiar, estar exposta à violência psicológica não se manteve associada à não realização do exame (p = 0,097). Esse resultado foi confirmado pelo modelo 2, que incluiu variáveis comportamentais, obstétricas e ginecológicas como possíveis fatores de confusão para essa associação (p = 0,214) ( Tabela 3 ).

Em relação às implicações da violência sexual e física no rastreamento do câncer de colo do útero, após o ajuste pelo modelo 1 (idade, escolaridade, situação conjugal e renda), observou-se declínio na medida bruta, sugerindo uma confusão positiva dessas variáveis. No ajuste final, também se observou diminuição na medida de efeito, indicando distorção dessa associação pelas variáveis ginecológica e obstétrica. Todavia, mesmo após o controle de todos os possíveis fatores de confusão, as associações permaneceram significativas (p < 0,05), ou seja, mulheres em situação de violência sexual e física pelo parceiro íntimo tiveram, respectivamente, 64% e 94% maiores prevalências de não realização do Papanicolaou nos últimos três anos do que aquelas não vitimizadas ( Tabela 3 ).

DISCUSSÃO

Não realizaram o exame preventivo do câncer de colo do útero nos últimos três anos 14,5% das usuárias dos serviços de saúde de 30 a 59 anos de Vitória, ES. Esse resultado guarda semelhanças com os achados da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel). Segundo o estudo, em 2015, aproximadamente 87% das mulheres de Vitória realizaram o exame citopatológico nos últimos três anos, ou seja, cerca de 13% não foram submetidas ao exame 1616. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos Não Transmissíveis e Promoção da Saúde. Vigitel Brasil 2015: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico: estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal em 2015. Brasília (DF); 2016 [cited 2018 Feb 19]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/vigitel_brasil_2015.pdf
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. Tal achado aponta que os serviços de saúde do município têm alcançado a meta estabelecida pelo Programa Nacional de Prevenção do Câncer de Colo do Útero, que propõe cobertura de exame citopatológico de 80% a 85% da população feminina com um teste a cada três anos 55. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Coordenação de Prevenção e Vigilância, Divisão de Detecção Precoce e Apoio à Organização de Rede. Diretrizes brasileiras para o rastreamento do câncer de colo do útero. 2.ed.rev.ampl. atual. Rio de Janeiro: INCA; 2016 [cited 2018 Feb 19]. Available from: http://www1.inca.gov.br/inca/Arquivos/Diretrizes_para_o_Rastreamento_do_cancer_do_colo_do_utero_2016_corrigido.pdf
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Apesar de os resultados sugerirem que expressiva parcela das mulheres realiza o teste Papanicolaou com intervalo recomendado pelo Ministério da Saúde do Brasil, determinados grupos realizam menos o exame. Isso indica a influência de alguns fatores nas ações de prevenção de câncer de colo uterino.

A prevalência da não realização do Papanicolaou nos últimos três anos associou-se com a situação conjugal da mulher. Mulheres solteiras apresentaram maior prevalência de exames em atraso em pesquisa realizada em Florianópolis, SC 77. Gasperin SI, Boing AF, Kupek E. Cobertura e fatores associados à realização do exame de detecção do câncer de colo de útero em área urbana no Sul do Brasil: estudo de base populacional. Cad Saude Publica . 2011;27(7):1312-22. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011000700007
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. No presente estudo, maior percentual da não realização do exame ocorreu entre as mulheres que vivem com o companheiro, mas não são casadas, ou seja, possuem união consensual. Esse resultado pode estar relacionado a aspectos como, submissão dessas mulheres aos companheiros 1717. Gamarra CJ, Paz EPA, Griep RH. Knowledge, attitudes and practice related to Papanicolaou smear test among Argentina’s women. Rev Saude Publica . 2005;39(2):270-6. https://doi.org/10.1590/S0034-89102005000200019
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, e também à ideia de que a união estável estabelece um obstáculo para a multiplicidade de parceiros e, consequentemente, fornece à mulher um grau de imunidade às Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), o que não se constitui uma verdade 1818. Guedes TG, Pordeus AMJ, Diógenes MAR. Análise epidemiológica do câncer de colo de útero em serviço de atendimento terciário no Ceará – Brasil. Rev Bras Promoç Saude . 2005 [cited 2018 Feb 19];18(4):205-10. Available from: http://periodicos.unifor.br/RBPS/article/view/945/2112
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Assim como a presente pesquisa, estudo realizado em Feira de Santana, BA, mostrou que mulheres com menor escolaridade e maior número de filhos apresentaram maior prevalência da não realização do Papanicolaou 1919. Andrade MS, Almeida MMG, Araújo TM, Santos KOB. Fatores associados a não adesão ao Papanicolau entre mulheres atendidas pela Estratégia Saúde da Família em Feira de Santana, Bahia, 2010. Epidemiol Serv Saude . 2014;23(1):111-20. https://doi.org/10.5123/S1679-49742014000100011
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. Observa-se também maior predominância de atraso no exame entre as mulheres que tiveram a primeira relação sexual antes dos 15 anos e mais de dois parceiros sexuais no ano anterior à entrevista. Esse resultado é particularmente preocupante, pois a multiplicidade de parceiros está associada a um maior risco para a infecção pelo HPV, condição necessária para o desenvolvimento do câncer de colo do útero 2020. Rama CH, Roteli-Martins CM, Derchain SFM, Longatto-Filho A, Gontijo RC, Sarian LOZ, et al. Prevalência do HPV em mulheres rastreadas para o câncer cervical. Rev Saude Publica . 2008;42(1):123-30. https://doi.org/10.1590/S0034-89102008000100016
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Este é o primeiro estudo epidemiológico brasileiro com usuárias da atenção primária que avalia a associação entre a VPPI e a não realização do exame de Papanicolaou. Os resultados são preocupantes e mostram que mulheres vítimas de VPPI são mais propensas a ter seu exame de Papanicolaou em atraso. Mesmo após o controle para os possíveis fatores de confusão, verifica-se, entre as vítimas de violência sexual, prevalência de 64,0% da não realização do exame nos últimos três anos, enquanto naquelas que foram vítimas de violência física, a prevalência de atraso no exame citopatológico chega a ser quase duas vezes maior (p < 0,05). Apesar da não associação com a violência psicológica, 25% das vítimas desse tipo de abuso estão com exames preventivos do câncer de colo do útero atrasados (p = 0,214).

É importante interpretar com cautela as estimativas apresentadas, já que os dados deste estudo são de mulheres usuárias de serviços de atenção primária em saúde de um único município brasileiro e não representam a população de mulheres como um todo. Dessa maneira, a generalização dos resultados deve ser feita com cuidado. Porém, isso deve ser considerado, especialmente quando se analisam as prevalências dos desfechos e das exposições, uma vez que não se faz necessária a realização de estudo de base populacional para a investigação de associações. Ainda, deve-se considerar a possibilidade de viés recordatório, já que as mulheres tendem a subestimar o tempo desde a última realização do teste de Papanicolaou. Entretanto, o autorrelato é bastante utilizado em pesquisas nacionais 77. Gasperin SI, Boing AF, Kupek E. Cobertura e fatores associados à realização do exame de detecção do câncer de colo de útero em área urbana no Sul do Brasil: estudo de base populacional. Cad Saude Publica . 2011;27(7):1312-22. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011000700007
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,1919. Andrade MS, Almeida MMG, Araújo TM, Santos KOB. Fatores associados a não adesão ao Papanicolau entre mulheres atendidas pela Estratégia Saúde da Família em Feira de Santana, Bahia, 2010. Epidemiol Serv Saude . 2014;23(1):111-20. https://doi.org/10.5123/S1679-49742014000100011
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e internacionais 1010. Brown MJ, Weitzen S, Lapane KL. Association between intimate partner violence and preventive screening among women. J Womens Health . 2013;22(11):947-52. https://doi.org/10.1089/jwh.2012.4222
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,2121. Gandhi S, Rovi S, Vega M, Johnson MS, Ferrante J, Chen PH. Intimate partner violence and cancer screening among urban minority women. J Am Board Fam Med . 2010;23(3):343-53. https://doi.org/10.3122/jabfm.2010.03.090124
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,2424. Loxton D, Powers J, Schofield M, Hussain R, Hosking S. Inadequate cervical cancer screening among mid aged Australian women who have experienced partner violence. Prev Med . 2009;48(2):184-8. https://doi.org/10.1016/j.ypmed.2008.10.019
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, as quais foram utilizadas na comparação e na discussão dos resultados do presente estudo.

Não foram encontrados estudos acerca da associação entre a violência contra a mulher e o rastreamento da neoplasia de colo do útero no Brasil. Internacionalmente, os estudos publicados são poucos e apresentam diferenças metodológicas, o que pode justificar as diferenças entre as estimativas e as associações apresentadas. Estudo americano de base populacional com mulheres entre 18 a 45 anos mostrou que a VPPI não esteve associada à realização do exame Papanicolaou (p = 0,623) 2222. McCall-Hosenfeld JS, Chuang CH, Weisman CS. Prospective association of intimate partner violence with receipt of clinical preventive services in women of reproductive age. Womens Health Issues . 2013;23(2):e109-16. https://doi.org/10.1016/j.whi.2012.12.006
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. Pesquisa com 101 mulheres com diagnóstico de câncer de mama, colo do útero, endometrial ou ovário também mostrou não haver diferença no rastreamento do câncer de colo do útero entre mulheres vítimas e não vítimas (p = 0,062) 2323. Modesitt SC, Gambrell AC, Cottrill HM, Hays LR, Walker R, Shelton BJ, et al. Adverse impact of a history of violence for women with breast, cervical, endometrial or overian cancer . Obstet Gynecol . 2006;107(6):1330-36. https://doi.org/10.1097/01.AOG.0000217694.18062.91
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. No mesmo sentido, estudo de base populacional com mulheres na Austrália não encontrou associação significativa entre a violência contra as mulheres e o rastreamento do câncer de colo do útero (OR = 1,18; IC95% 0,99–1,40) 2424. Loxton D, Powers J, Schofield M, Hussain R, Hosking S. Inadequate cervical cancer screening among mid aged Australian women who have experienced partner violence. Prev Med . 2009;48(2):184-8. https://doi.org/10.1016/j.ypmed.2008.10.019
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. As associações estiveram próximas ao limiar da significância nesses dois últimos estudos.

Em contraponto, outros estudos estabeleceram uma relação entre ser vítima e a prática do exame. Mulheres que tiveram experiência de violência física ou sexual, praticada por parceiro íntimo, apresentaram cerca de duas vezes mais chance de ter realizado o Papanicolaou (OR = 2,05; IC95% 1,26–3,31) 1010. Brown MJ, Weitzen S, Lapane KL. Association between intimate partner violence and preventive screening among women. J Womens Health . 2013;22(11):947-52. https://doi.org/10.1089/jwh.2012.4222
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quando comparado àquelas que não foram vítimas. Do mesmo modo, outra pesquisa mostrou que a chance de realização de Papanicolaou foi maior para as mulheres que sofreram violência física por parceiro íntimo (OR = 2,39; IC95% 1,01–5,70) 2525. Lemon SC, Verhoek-Oftedahl W, Donnelly EF. Preventive healthcare use, smoking, and alcohol use among Rhode Island women experiencing intimate partner violence. J Womens Health Gend Based Med . 2002;11(6):555-62. https://doi.org/10.1089/152460902760277912
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.

Apesar das diferenças metodológicas, particularmente quanto à mensuração da violência, esta considerada como evento complexo, os resultados do presente estudo são convergentes em relação às evidências relatadas por alguns autores 99. Farley M, Golding JM, Minkoff JR. Is a history of trauma associated with a reduced likelihood of cervical cancer screening? J Fam Pract . 2002;51(10):827-31.,2121. Gandhi S, Rovi S, Vega M, Johnson MS, Ferrante J, Chen PH. Intimate partner violence and cancer screening among urban minority women. J Am Board Fam Med . 2010;23(3):343-53. https://doi.org/10.3122/jabfm.2010.03.090124
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. Usuárias dos serviços de saúde com idade entre 40 e 74 anos, vítimas de abuso emocional, comparadas às vítimas de abuso físico ou sexual, apresentaram 87% menos chance de estar em dia com o exame Papanicolaou (OR = 0,13; IC95% 0,02–0,86) 2121. Gandhi S, Rovi S, Vega M, Johnson MS, Ferrante J, Chen PH. Intimate partner violence and cancer screening among urban minority women. J Am Board Fam Med . 2010;23(3):343-53. https://doi.org/10.3122/jabfm.2010.03.090124
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. Mulheres abusadas sexualmente antes dos 18 anos também apresentaram menor probabilidade de realizar o rastreamento do câncer de colo do útero (35% versus 51%; n = 694; p = 0,009) 99. Farley M, Golding JM, Minkoff JR. Is a history of trauma associated with a reduced likelihood of cervical cancer screening? J Fam Pract . 2002;51(10):827-31. .

Embora mulheres expostas à violência acessem mais frequentemente os serviços de saúde, por conta das demandas físicas e mentais 2626. Campbell JC. Health consequences of intimate partner violence . Lancet 2002;359(9314):1331-6. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(02)08336-8
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, o acesso muitas vezes não implica no recebimento de serviços preventivos recomendados 2222. McCall-Hosenfeld JS, Chuang CH, Weisman CS. Prospective association of intimate partner violence with receipt of clinical preventive services in women of reproductive age. Womens Health Issues . 2013;23(2):e109-16. https://doi.org/10.1016/j.whi.2012.12.006
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. A vivência da violência, em especial a sexual, pode restringir a busca da consulta ginecológica pela mulher, por vergonha ou medo de retaliação por parte do parceiro, ou ainda por ameaça de desvelamento da violência sofrida. O exame ginecológico entre as vítimas, sobretudo se for realizado sem explicação do procedimento e do seu sentido, de forma fria e descuidada, pode se tornar um momento de revivescência da experiência dolorosa do episódio de violência. Desta forma, em vez de constituir-se num espaço de acolhimento à mulher, a consulta ginecológica pode potencializar o sentimento de medo e rejeição ao exame 44. Pinho AA, França-Júnior I. Prevenção do câncer de colo do útero: um modelo teórico para analisar o acesso e a utilização do teste de Papanicolaou. Rev Bras Saude Mater Infant . 2003;3(1):95-112. https://doi.org/10.1590/S1519-38292003000100012
https://doi.org/10.1590/S1519-3829200300...
.

Além do aumento do risco de lesão física e de danos à saúde mental 1212. Kernic MA, Wolf ME, Holt VL. Rates and relative risk of hospital admission among women in violent intimate partner relationships. Am J Public Health . 2000;90(9):1416-20. https://doi.org/10.2105/AJPH.90.9.1416
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,1313. Coker AL, Smith PH, Bethea L, King MR, McKeown RE. Physical health consequences of physical and psychological intimate partner violence. Arch Fam Med . 2000;9(5):451-7. https://doi.org/10.1001/archfami.9.5.451
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, a VPPI, em especial a violência sexual, faz com que a mulher vivencie situações de relações sexuais muitas vezes forçadas e desprotegidas 2727. Raj A, Santana MC, La Marche A, Amaro H, Cranston K, Silverman JG. Perpetration of intimate partner violence associated with sexual risk behaviors among young adult men. Am J Public Health . 2006;96(10):1873-8. https://doi.org/10.2105/AJPH.2005.081554
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. Isso torna a vítima mais predisposta ao maior risco de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) 2828. Raj A, Reed E, Welles SL, Santana MC, Silverman JG. Intimate partner violence perpetration, risky sexual behavior, and STI/HIV diagnosis among heterosexual African American men. Am J Mens Health . 2008;2(3):291-5. https://doi.org/10.1177/1557988308320269
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, como o HPV, que está associado a um risco aumentado da neoplasia de colo do útero 2929. Pinto AP, Tulio S, Cruz OR. Co-fatores do HPV na oncogênese cervical. Rev Assoc Med Bras . 2002;48(1):73-8. https://doi.orgt/10.1590/S0104-42302002000100036
https://doi.orgt/10.1590/S0104-423020020...
.

Ainda, a complexa interação entre mulheres em situação de violência e a utilização de serviços preventivos pode ser dependente do tipo e da gravidade de violência vivenciada. Todas as formas de violência têm consequências que ultrapassam a esfera da saúde física, repercutindo também na saúde mental das vítimas. Isso incapacita o cuidado de si e de outros, podendo imprimir uma busca diminuída por cuidados preventivos em saúde 44. Pinho AA, França-Júnior I. Prevenção do câncer de colo do útero: um modelo teórico para analisar o acesso e a utilização do teste de Papanicolaou. Rev Bras Saude Mater Infant . 2003;3(1):95-112. https://doi.org/10.1590/S1519-38292003000100012
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.

A hipótese do presente estudo foi confirmada, uma vez que houve associação entre a não realização do exame citopatológico nos últimos três anos e a experiência de VPPI. Deste modo, diante do contexto, e considerando o impacto da violência na saúde da mulher vítima, o serviço de saúde tem um papel importante na promoção de ações de prevenção e rastreamento dos casos de violência contra a mulher, bem como na oferta dos serviços preventivos. Os profissionais devem imprimir esforços para alcançar essas mulheres e promover a oportunidade do rastreamento do câncer de colo do útero e uma assistência de qualidade integral, além de desenvolver nessas usuárias atitudes de procura pelos serviços de prevenção e promoção de saúde.

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  • Financiamento: Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (FAPES – Processo 60530812/12).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Nov 2018

Histórico

  • Recebido
    26 Set 2017
  • Aceito
    8 Jan 2018
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revsp@org.usp.br