Entrevista com Jairnilson Silva Paim

Jairnilson Silva Paim Sobre o autor

Resumo

Nesta entrevista, Jairnilson Paim, coordenador do Projeto Análise de Políticas de Saúde no Brasil (2003-2017) e do Observatório de Análise Política em Saúde (OAPS), apoiados pelo CNPq, destaca os propósitos do OAPS no sentido de socializar o conhecimento produzido em pesquisa e de estimular a análise política em saúde a partir de fatos na conjuntura. Relata que o Observatório dispõe de três camadas, uma formada por 11 eixos de pesquisa, outra apresentando o acompanhamento de políticas específicas e a mais visível que divulga notícias e análises de conjuntura. Ressalta uma apreciação positiva da experiência do OAPS, destacando o rigor teórico-metodológico e a busca de evidências com maior objetividade possível, inspirados em valores democráticos e emancipadores para a sociedade brasileira.

Você coordena o Projeto Análise de Políticas de Saúde no Brasil (2003-2017), que tem como um de seus produtos o Observatório de Análise Política em Saúde (OAPS). O que motivou a construção do OAPS? Fale um pouco sobre o processo de concepção do Observatório.

Desde a submissão do nosso projeto ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), concorrendo a um edital em 2013, a equipe que o elaborou já apresentava a proposta do Observatório. Tratando-se de uma nova experiência dos docentes, pesquisadores e alunos da pós-graduação do ISC (Instituto de Saúde Coletiva) no sentido de articular uma rede de pesquisa em Política de Saúde, o OAPS foi considerado um dispositivo fundamental para a interação entre os centros de investigação e, sobretudo, um espaço de diálogo e de comunicação com a sociedade, com seus distintos segmentos de público. Na concepção do OAPS encontrava-se a intenção de socializar o conhecimento produzido pelas diferentes investigações e estudos, assim como de configurar um estímulo para a análise política em saúde, especialmente com o acompanhamento de fatos na conjuntura.

Nesse processo foram de grande utilidade as visitas a diversos sites de observatórios da Europa e do Canadá, além de uma viagem da coordenadora executiva do OAPS, a pesquisadora Maria Guadalupe Medina, ao Reino Unido para conhecer as experiências em curso na London School of Hygiene and Tropical Medicine (LSHTM), onde está sediado o Observatório Europeu dos Sistemas e Políticas de Saúde.

Uma vez vencido o edital e aprovados os recursos para o projeto, o Prof. José Carvalheiro, integrante do Conselho Consultivo do OAPS e do Instituto de Saúde de São Paulo, propiciou um encontro in loco da nossa equipe – Mariana Adeodato (comunicação), Gilson Rabelo (webdesign) e Maria Guadalupe Medina (coordenação executiva) – com dirigentes e técnicos do Observatório de Inovação e Competitividade com sede no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP). Esta equipe original convidou outros colegas para construírem o OAPS, realizando um pré-lançamento em Salvador e a instalação definitiva no Abrascão (Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva), em Goiânia, em 2015, já contando com o apoio das nossas jornalistas, Inês Costal e Patrícia Conceição.

Naquela oportunidade, destaquei que o OAPS não era para, metaforicamente, observar as estrelas, mas para examinar, escrupulosamente, a realidade e, se possível, intervir sobre a mesma.

O que as pessoas vão encontrar ao acessar o Observatório de Análise Política em Saúde (OAPS)?

Tenho aprendido muito com a equipe da rede de pesquisadores, mas certamente esta resposta poderia ser mais completa se apresentada pela equipe técnica do OAPS e do Centro de Documentação Virtual (CDV) a ele acoplado. Mesmo correndo o risco de ser superficial, posso afirmar que o nosso Observatório dispõe de três camadas. A primeira, mais profunda e com um ritmo próprio da academia, está formada por 11 eixos de pesquisa nos quais se produzem estudos e investigações que resultam em dissertações, teses, artigos, capítulos e livros. A segunda, intermediária, disponibiliza as linhas do tempo de cada eixo e a matriz de acompanhamento das políticas sob investigação mediante análises de quatro vetores: implantação, financiamento, participação social e resultados alcançados. Para cada ano há atualizações feitas pelas equipes dos eixos de pesquisa sobre os fatos produzidos em relação a esses tópicos. Finalmente, a terceira camada é a mais visível, na qual o trabalho jornalístico no tempo pertinente produz e divulga notícias e análises referentes às políticas de saúde em curso na conjuntura, o que, efetivamente, dá o tom do OAPS. Nessa camada se encontram notícias, entrevistas, banners, boletins bimensais, eventos e o espaço para debates e pensamentos.

O Observatório foi lançado oficialmente no 11º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, em julho de 2015. Como você avalia seu desenvolvimento até então? Foi possível implementar o que foi pensado para o OAPS? Algum objetivo não avançou?

Eu tenho uma avaliação muito positiva desse primeiro ano de existência do OAPS. Aliás, essa é uma apreciação reiterada por muitos membros dos Conselhos Gestor e Consultivo, além dos nossos pesquisadores, técnicos e pós-graduandos. Creio que implementamos muitas atividades não previstas originalmente e a revista especial 1 Ano de experiências, que lançamos como edição de aniversário do OAPS, ilustra as conquistas tanto do Observatório como do CDV, este sob a liderança da Profa. Carmen Teixeira e contando com a colaboração de Maria Clara Guimarães e de Creuza Silva, entre outras pessoas.

Entre os objetivos que ainda não alcançamos está a interlocução com os gestores do SUS, apesar de algumas tentativas, como as audiências solicitadas à Secretaria Municipal de Saúde de Salvador no sentido de apresentarmos a proposta de um seminário entre as suas equipes dirigentes e os integrantes do OAPS. Entretanto, entendemos que a difícil situação política do país nesses dois últimos anos, bem como o processo das eleições municipais de 2016, dificultaram esse propósito. O Conselho Gestor do OAPS vem discutindo o assunto e estamos programando um encontro com os novos gestores municipais para março de 2017.

O que tem sido elaborado no Observatório em relação à produção científica na área de Política, Planejamento e Gestão em Saúde (PPGS)? O que mais deve ser produzido?

Além das dissertações e teses defendidas nos dois últimos anos nessa área disciplinar da Saúde Coletiva, publicamos três livros pela EDUFBA (Editora da Universidade Federal da Bahia) com a produção dos pesquisadores do OAPS. Vários artigos foram submetidos para publicação na Revista Ciência & Saúde Coletiva da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) e encontra-se em andamento a elaboração de um número especial da Revista Saúde em Debate, do Cebes (Centro Brasileiro de Estudos de Saúde), com os resultados dos estudos e pesquisas realizados no OAPS. Este trabalho editorial vem sendo bem conduzido pela Profa. Carmen Teixeira, com a colaboração das Profs. Lígia Vieira da Silva e Isabela Pinto. Nesse particular, cabe mencionar a elaboração do Glossário Análise Política em Saúde conduzido pela Profa. Carmen e por Paloma Silveira, pesquisadora do OAPS e bolsista do CNPq, contando com a colaboração de vários integrantes da rede de pesquisa. Este texto foi submetido ao Conselho Consultivo e posto para consulta pública por mais de um mês, recebendo excelentes contribuições de interessados que foram incorporadas ao texto original, acrescentando os respectivos nomes na lista dos autores de verbetes. Este produto será publicado sob o formato de e-book pela EDUFBA. Vários trabalhos de pesquisadores, pós-graduandos e graduandos dos onze eixos também foram apresentados em eventos científicos. E o acompanhamento realizado pela Profa. Ana Luiza Vilasbôas indica que devemos alcançar as metas estabelecidas no projeto inicial.

A partir da experiência de pesquisa acumulada na rede, pensamos em produzir até o final do projeto uma sistematização dos aportes teórico-metodológicos mais promissores para a investigação de políticas de saúde e para a análise política em saúde.

O OAPS tem divulgado notas e posicionamentos de entidades e de pesquisadores sobre assuntos que envolvem o Sistema Único de Saúde (SUS) ou a conjuntura político-econômica do país. O Observatório é neutro ou ele tem posição?

O OAPS tem como missão proporcionar um espaço de reflexão e análise crítica das políticas de saúde no Brasil, através da articulação de uma rede de pesquisadores brasileiros da área de Política, Planejamento e Gestão em Saúde (PPGS) de diversos centros de pesquisa.

O regimento aprovado pelo Conselho Gestor e pelo Conselho Consultivo apresenta no Art. 5º os princípios que orientam a posição do OAPS, a saber: a) comprometimento com a defesa da saúde como direito das pessoas e com a cidadania como princípio na relação dos indivíduos com o Estado; b) compromisso com a construção e o fortalecimento de sistemas universais de saúde, de natureza pública, baseados nos princípios da solidariedade, equidade, universalidade e integralidade da atenção à saúde; c) produção de pensamento crítico sobre a realidade, alicerçado em bases científicas e eticamente responsáveis; d) autonomia de pensamento em relação a interesses particulares de grupos ou instituições.

Portanto, o OAPS não é neutro, ainda que esteja pautado pelo rigor teórico-metodológico e pela busca de evidências com maior objetividade possível. Está assentado em valores democráticos e emancipadores que pretendemos, também, difundir para a sociedade brasileira.

Pessoalmente, entendo que em situações críticas, como a que vivemos no Brasil após as eleições presidenciais de 2014, neutralidade pode ser sinônimo de conivência. E todos que defendem a democracia e o direito à saúde precisam tomar posição. O OAPS tem se posicionado a respeito das recentes ameaças aos direitos sociais, ao SUS e à democracia divulgando oportunamente textos analíticos e de posição dos mais variados sujeitos individuais e coletivos, assim como postando mensagens no seu site e no outdoor do ISC no campus do Canela. Entretanto, tem evitado assinar manifestos e documentos de posição políticos por não se constituir numa entidade da sociedade civil e face às dificuldades em construir posicionamentos em rede numa conjuntura acelerada. Podemos, no entanto, esperar manifestações do Conselho Consultivo da rede de pesquisa que compõe o OAPS diante de ações e propostas que ferem os princípios de seu regimento. No que diz respeito ao OAPS enquanto “um espaço de diálogo e de comunicação com a sociedade”, além da divulgação de textos e vídeos no site, estamos programando a elaboração de pelo menos quatro documentários tendo como alvos públicos diversos, tais como gestores, trabalhadores de saúde, estudantes de graduação e organizações da sociedade civil.

  • Entrevistado por: Inês Costal e Patrícia Conceição

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2017
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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