Tendência temporal e distribuição espacial do aborto inseguro no Brasil, 1996-2012

Francisco Rogerlândio Martins-Melo Mauricélia da Silveira Lima Carlos Henrique Alencar Alberto Novaes Ramos Jr Francisco Herlânio Costa Carvalho Márcia Maria Tavares Machado Jorg Heukelbach Sobre os autores

Resumo

OBJETIVO

Analisar tendências temporais e padrões de distribuição espacial do aborto inseguro no Brasil.

MÉTODOS

Estudo ecológico realizado com base nos registros das internações hospitalares de mulheres por abortamento no Brasil, no período de 1996-2012, obtidos do Sistema de Informações Hospitalares do Ministério da Saúde. Estimou-se o número de abortos inseguros segundo local de residência, utilizando-se técnicas de estimativas indiretas. Foram calculados os indicadores: razão de aborto inseguro por 100 nascidos vivos e coeficiente de aborto inseguro por 1.000 mulheres em idade fértil. As tendências temporais foram analisadas por regressão polinomial e a distribuição espacial utilizando os municípios brasileiros como unidade de análise.

RESULTADOS

Foram registradas 4.007.327 internações hospitalares por abortamento no Brasil no período. Estimou-se um total de 16.905.911 abortos inseguros, com média anual de 994.465 abortos (coeficiente médio de aborto inseguro de 17,0 abortos/1.000 mulheres em idade fértil e razão de 33,2 abortos inseguros/100 nascidos vivos). O aborto inseguro apresentou tendência de declínio em nível nacional (R2: 94,0%; p < 0,001), com padrões desiguais entre as regiões. As regiões Nordeste (R2: 93,0%; p < 0,001), Sudeste (R2: 92,0%; p < 0,001) e Centro-Oeste (R2: 64,0%; p < 0,001) apresentaram tendência de declínio, enquanto a região Norte (R2: 39,0%; p = 0,030), tendência de aumento, e a região Sul (R2: 22,0%; p = 0,340), de estabilidade. A análise espacial identificou a presença de clusters de municípios com altos valores de abortos inseguros, localizados especialmente em estados das regiões Norte, Nordeste e Sudeste.

CONCLUSÕES

O aborto inseguro se mantém como problema de saúde pública no Brasil, com marcantes diferenças regionais e concentradas nas regiões socioeconomicamente menos favorecidas do País. A qualificação da atenção à saúde da mulher, em especial aos aspectos reprodutivos e de atenção aos processos pré e pós-abortamento, são estratégias necessárias e urgentes.

Aborto Induzido; Estatística & dados numéricos; Epidemiologia; Análise Espaço-Temporal


INTRODUÇÃO

O aborto inseguro representa uma questão polêmica e desafiadora, que incorpora aspectos de justiça social em países de baixa e média renda, 7 Cook RBB, Tathala M. Saúde reprodutiva e direitos humanos: integrando medicina, ética e direito. Rio de Janeiro: Cepia; 2004. envolvendo uma complexa rede de fatores legais, econômicos, sociais e psicológicos. 7 Cook RBB, Tathala M. Saúde reprodutiva e direitos humanos: integrando medicina, ética e direito. Rio de Janeiro: Cepia; 2004. , 1717  Mello FMB, Sousa JL, Figueroa JN. Magnitude do aborto inseguro em Pernambuco, Brasil, 1996 a 2006. Cad Saude Publica . 2011;27(1):87-93. DOI:10.1590/S0102-311X2011000100009
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O aborto inseguro é definido como a interrupção de uma gravidez realizada por pessoas/profissionais sem habilidades técnicas necessárias e/ou em ambientes sem padrões sanitários adequados. aa World Health Organization. Safe abortion: technical and policy guidance for health systems. Geneva; 2003 [citado 2013 jan 10]. Disponível em: http://whqlibdoc.who.int/publications/2003/9241590343.pdf Por outro lado, o aborto considerado seguro é aquele realizado em situações previstas em lei, possibilitando às mulheres o atendimento necessário e qualificado por parte de serviços de saúde estruturados, os quais devem oferecer assistência psicossocial no momento da decisão e garantir a qualidade da atenção à saúde necessária para o atendimento e acompanhamento do evento. 1717  Mello FMB, Sousa JL, Figueroa JN. Magnitude do aborto inseguro em Pernambuco, Brasil, 1996 a 2006. Cad Saude Publica . 2011;27(1):87-93. DOI:10.1590/S0102-311X2011000100009
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, aa World Health Organization. Safe abortion: technical and policy guidance for health systems. Geneva; 2003 [citado 2013 jan 10]. Disponível em: http://whqlibdoc.who.int/publications/2003/9241590343.pdf

Abortos inseguros ocorrem principalmente em países onde as leis são restritivas ao procedimento ou naqueles onde é legal, porém, o acesso das mulheres aos serviços de saúde é dificultado. 1212  Faúndes A. Strategies for the prevention of unsafe abortion. Int J Gynaecol Obstet . 2012;119(Suppl 1):68-71. DOI:10.1016/j.ijgo.2012.03.021
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Como consequência, o aborto inseguro é uma das principais causas de morbidade e mortalidade materna nesses países. 1 Ǻhman E, Shah IH. New estimates and trends regarding unsafe abortion mortality. Int J Gynaecol Obstet. 2011;115(2):121-6. DOI:10.1016/j.ijgo.2011.05.027
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, 1010  Diniz D, Medeiros M. Aborto no Brasil: uma pesquisa domiciliar com técnica de urna. Cienc Saude Coletiva . 2010;15Suppl 1:959-66. DOI:10.1590/S1413-81232010000700002 
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, bb Singh S, Wulf D, Hussain R, Bankole A, Sedgh G. Abortion worldwide: a decade of uneven progress. New York: Guttmacher Institute; 2009 [citado 2013 jan 10]. Disponível em: http://www.guttmacher.org/pubs/Abortion-Worldwide.pdf Em 2008, estimou-se que aproximadamente 22 milhões de abortos inseguros ocorreram em todo o mundo, sendo 97,0% em países emergentes. 2222  Shah I, Ǻhman E. Unsafe abortion in 2008: global and regional levels and trends. Reprod Health Matters . 2010;18(36):90-101. DOI:10.1016/S0968-8080(10)36537-2
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, 2323  World Health Organization. Unsafe Abortion: global and regional estimates of the incidence of unsafe abortion and associated mortality in 2008. 6th ed. Geneva; 2011[cited 2013 Jan 10]. Available from: http://www.who.int/reproductivehealth/publications/unsafe_abortion/9789241501118/en/index.html
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Cerca de 13,0% das mortes maternas no mundo estão relacionadas ao aborto inseguro, resultando em 47 mil mortes de mulheres anualmente, principalmente em países da América Latina. 2222  Shah I, Ǻhman E. Unsafe abortion in 2008: global and regional levels and trends. Reprod Health Matters . 2010;18(36):90-101. DOI:10.1016/S0968-8080(10)36537-2
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, 2323  World Health Organization. Unsafe Abortion: global and regional estimates of the incidence of unsafe abortion and associated mortality in 2008. 6th ed. Geneva; 2011[cited 2013 Jan 10]. Available from: http://www.who.int/reproductivehealth/publications/unsafe_abortion/9789241501118/en/index.html
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No Brasil, a ilegalidade do aborto inseguro torna sua real magnitude e repercussões pouco conhecidas. No País, a prática do aborto é considerada crime, sendo permitida pela lei penal em casos de violência sexual (estupro) ou risco de vida materna 8 Diniz D. Quem autoriza o aborto seletivo no Brasil? Médicos, promotores e juízes em cena, Brasil. Physis . 2003;13(2):13-34. DOI:10.1590/S0103-73312003000200003
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, cc Decreto-lei no2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código penal. Diario Oficial Uniao . 31 dez 1940:2391. e, mais recentemente, em casos de gravidezes de fetos anencéfalos. 2121  Pacagnella RC.Novamente a questão do aborto no Brasil: ventos de mudança? Rev Bras Ginecol Obstet. 2013;35(1):1-4. DOI:10.1590/S0100-72032013000100001
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Diante das dificuldades de registrar o número de abortos, as estimativas são baseadas em internações por abortamento registradas no Sistema Único de Saúde (SUS). 1717  Mello FMB, Sousa JL, Figueroa JN. Magnitude do aborto inseguro em Pernambuco, Brasil, 1996 a 2006. Cad Saude Publica . 2011;27(1):87-93. DOI:10.1590/S0102-311X2011000100009
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, 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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Estima-se que ocorram anualmente no Brasil entre 729 mil e 1,25 milhão de abortos inseguros, 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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onde, ao final da vida reprodutiva, calcula-se que uma em cada cinco mulheres já realizou aborto. 1010  Diniz D, Medeiros M. Aborto no Brasil: uma pesquisa domiciliar com técnica de urna. Cienc Saude Coletiva . 2010;15Suppl 1:959-66. DOI:10.1590/S1413-81232010000700002 
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A curetagem pós-aborto é o segundo procedimento obstétrico mais frequente na rede pública de saúde. No País, são realizadas cerca de 240 mil internações anuais para tratamento de complicações decorrentes de abortamento no SUS, gerando custos anuais de aproximadamente 45 milhões de reais. dd Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Atenção humanizada ao abortamento: norma técnica. Brasília (DF); 2005.

Além disso, indicadores relacionados ao aborto revelam fortes desigualdades sociais e regionais. Estados das regiões Norte e Nordeste apresentam coeficientes de aborto inseguro mais elevados, 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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o que constitui a principal causa de mortalidade materna em algumas capitais desses estados. dd Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Atenção humanizada ao abortamento: norma técnica. Brasília (DF); 2005.

O conhecimento sobre a magnitude e tendências do aborto inseguro é necessário para monitorar o progresso em direção à melhoria da saúde materna e do acesso ao planejamento familiar. Além disso, pode contribuir para a construção de políticas públicas que promovam a discussão, prevenção e atenção integral e humanizada às mulheres em situação de abortamento. 1414  Juarez F, Singh S, Garcia SG, Olavarrieta CD. Estimates of induced abortion in Mexico: what’s changed between 1990 and 2006? Int Fam Plan Perspect . 2008;34(4):158-68. DOI:10.1363/3415808
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, 1717  Mello FMB, Sousa JL, Figueroa JN. Magnitude do aborto inseguro em Pernambuco, Brasil, 1996 a 2006. Cad Saude Publica . 2011;27(1):87-93. DOI:10.1590/S0102-311X2011000100009
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Diante das dificuldades para obtenção de dados, estimativas indiretas têm representado importante ferramenta, e diferentes metodologias foram desenvolvidas e testadas. 2 Alan Guttmacher Institute. Clandestine abortion: a Latin American reality. New York: Alan Guttmacher Institute; 1994. , 1111  Diniz D, Corrêa M, Squinca F, Braga KS. Aborto: 20 anos de pesquisas no Brasil. Cad Saude Publica . 2009;25(4):939-42. DOI:10.1590/S0102-311X2009000400025
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, 1414  Juarez F, Singh S, Garcia SG, Olavarrieta CD. Estimates of induced abortion in Mexico: what’s changed between 1990 and 2006? Int Fam Plan Perspect . 2008;34(4):158-68. DOI:10.1363/3415808
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O objetivo do presente estudo foi analisar tendências temporais e padrões de distribuição espacial do aborto inseguro no Brasil, no período de 1996 a 2012.

MÉTODOS

Estudo ecológico, de série temporal e análise espacial, utilizando dados secundários de internações hospitalares por abortamentos ocorridos no Brasil, no período de 1996 a 2012. A base de dados foi composta a partir do número de internações hospitalares por abortamento, número de nascidos vivos e população de mulheres de 10 a 49 anos. Os dados foram obtidos do Sistema de Informações Hospitalares (SIH) e do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), do Departamento de Informática do SUS/Ministério da Saúde (DATASUS) ee Ministério da Saúde, Departamento de Informática do SUS. DATASUS. Brasília (DF): 2013 [citado 2013 out 15]. Disponível em: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=02 e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). ff Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. População Residente. 2013 [citado 2013 dez 15]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?ibge/cnv/popuf.def Os dados populacionais foram coletados dos Censos Demográficos da População Brasileira (2000 e 2010), da Contagem Populacional (1996) e das estimativas populacionais para os anos intercensitários (1997-1999, 2001-2009 e 2011-2012). ff Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. População Residente. 2013 [citado 2013 dez 15]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?ibge/cnv/popuf.def Os dados de nascidos vivos foram provenientes das declarações de nascidos vivos (DN), padronizada em todo o território nacional (dados disponíveis até 2011). ee Ministério da Saúde, Departamento de Informática do SUS. DATASUS. Brasília (DF): 2013 [citado 2013 out 15]. Disponível em: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=02 As informações sobre internações hospitalares por abortamentos foram obtidas por meio das Autorizações de Internações Hospitalares (AIH) registradas entre 1996 e 2012, ee Ministério da Saúde, Departamento de Informática do SUS. DATASUS. Brasília (DF): 2013 [citado 2013 out 15]. Disponível em: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=02 segundo local de residência. Aborto e suas complicações correspondem aos códigos O00-O08 (Gravidez que termina em aborto), do Capítulo XV – Gravidez, parto e puerpério, da Décima Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10). gg Word Health Organization. Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems (ICD): 10threv. Geneva; 2007 [citado 10 jan 2013]. Disponível em: http://apps.who.int/classifications/apps/icd/icd10online/

O número de internações hospitalares por abortamento (NIH) subsidiou a construção das estimativas de aborto inseguro (NAI) por ano e local de residência. Para isso, utilizou-se a metodologia do Instituto Alan Guttmacher 2 Alan Guttmacher Institute. Clandestine abortion: a Latin American reality. New York: Alan Guttmacher Institute; 1994. baseada na seguinte fórmula:

NAI = (5)*(1.125)*(0.75) NIH

Essa metodologia estima o cálculo de abortos inseguros, considerando: 20,0% de hospitalizações em consequência de complicações do aborto (uma internação para cada cinco abortos); parâmetro de 12,5% como estimativa de sub-registro (internações realizados fora do SUS); e o desconto de 25,0% de abortos por causas espontâneas. 1717  Mello FMB, Sousa JL, Figueroa JN. Magnitude do aborto inseguro em Pernambuco, Brasil, 1996 a 2006. Cad Saude Publica . 2011;27(1):87-93. DOI:10.1590/S0102-311X2011000100009
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, 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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Foram calculados os indicadores: coeficiente de aborto inseguro por 1.000 mulheres em idade fértil (10 a 49 anos), medida que descreve o nível de abortos inseguros em uma população feminina em idade reprodutiva, e razão de aborto inseguro por 100 nascidos vivos (2000-2011), que indica a probabilidade de uma gravidez terminar em aborto inseguro em vez de um nascimento vivo. 2323  World Health Organization. Unsafe Abortion: global and regional estimates of the incidence of unsafe abortion and associated mortality in 2008. 6th ed. Geneva; 2011[cited 2013 Jan 10]. Available from: http://www.who.int/reproductivehealth/publications/unsafe_abortion/9789241501118/en/index.html
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A análise dos dados foi realizada em duas etapas. Na primeira, foram analisadas as tendências temporais dos indicadores de aborto inseguro utilizando como unidade de conceito as cinco regiões geográficas (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sul e Sudeste) e as 27 unidades federativas. A análise das tendências temporais foi realizada utilizando modelos de regressão polinomial, 1515  Kleinbaum DG, Kupper LL, Nizam A, Muller KE. Applied regression analysis and other multivariable methods.4th ed. Boston; Duxbury Press; 2007. com o objetivo de identificar a curva que melhor se ajustava aos dados, de modo a descrever a relação entre a variável dependente Y (indicador de aborto inseguro) e a variável independente X (ano de estudo). Para evitar a autocorrelação entre os termos da equação de regressão, foi utilizado o artifício de centralizar a variável ano, transformando-a em ano calendário menos o ponto médio da série histórica. Foram testados os modelos de primeira ordem (linear simples) (Y = β0+ β1X), segunda ordem (Y = β0+ β1X + β2X2), terceira ordem (Y = β0+ β1X + β2X2+ β3X3), onde β0é o coeficiente médio do período e β1, β2e β3representam o incremento médio anual. A escolha do melhor modelo foi baseada na melhor função de acordo com o diagrama de dispersão, melhor ajuste pela análise dos resíduos, maior significância estatística e maior coeficiente de determinação (R2). Em casos de modelos estatisticamente semelhantes, optou-se pelo mais simples. As tendências foram consideradas estatisticamente significativas quando os modelos apresentaram valor de p < 0,05.

Na segunda etapa, os padrões de distribuição espacial do aborto inseguro no Brasil foram analisados utilizando os municípios de residência (5.565; divisão territorial de 2010) como unidade de análise. Métodos de análise espacial e técnicas de geoprocessamento foram utilizados para avaliar a distribuição geográfica e a dependência espacial dos indicadores de aborto inseguro no Brasil.

Duas estratégias foram utilizadas como base para a construção de mapas temáticos. Para corrigir as flutuações aleatórias e proporcionar maior estabilidade dos coeficientes de aborto inseguro, sobretudo em municípios com populações pequenas, os coeficientes médios foram estimados em três subperíodos (1996-2000, 2001-2006 e 2007-2012) e período total (1996-2012). Os coeficientes de aborto inseguro foram novamente estimados (coeficientes suavizados) por meio do método Bayesiano Empírico Local. 5 Assunção RM, Barreto SM, Guerra HL, Sakurai E. Maps of epidemiological rates: a Bayesian approach. Cad Saude Publica . 1998;14(4):713-23. DOI:10.1590/S0102-311X1998000400013
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A presença de dependência espacial global foi analisada com base no Índice Global de Moran I sobre os coeficientes brutos. 6 Cliff AD, Ord JK. Spatial processes: models & applications. London: Pion; 1981.  A autocorrelação local ( Local Index of Spatial Association – LISA) foi avaliada pelo Índice Local de Moran. 3 Anselin L. Local indicators of spatial association-LISA. Geogr Anal . 1995;27(2):93-115. DOI:10.1111/j.1538-4632.1995.tb00338.x
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Para identificar as áreas críticas ou de transição, utilizou-se o diagrama de espalhamento de Moran, com base no Índice Local de Moran. 3 Anselin L. Local indicators of spatial association-LISA. Geogr Anal . 1995;27(2):93-115. DOI:10.1111/j.1538-4632.1995.tb00338.x
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Para a representação espacial do diagrama de espalhamento de Moran, foi utilizado o Moran Map, que considera o mapeamento apenas dos municípios com diferenças estatisticamente significativas (p < 0,05).

Utilizou-se o programa SPSS versão 15.0 na elaboração dos modelos de regressão polinomial e dos gráficos de dispersão. Os softwares ArcGIS versão 9.3 ( Environmental Systems Research Institute, ESRI, Redlands, CA ) e TerraView versão 4.2 (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, INPE) foram utilizados para processamento, análise e apresentação de dados cartográficos, cálculo dos indicadores de autocorrelação espacial e construção dos mapas temáticos.

Por tratar-se de estudo ecológico com dados secundários acessíveis ao público e sem identificação dos indivíduos, houve dispensa da submissão ao Comitê de Ética em Pesquisa.

RESULTADOS

Foram registradas 4.007.327 internações hospitalares por abortamentos no SIH/SUS entre 1996 e 2012, com média anual de 235.725 internações. Estimaram-se 16.905.911 abortos inseguros no Brasil, com média anual de 994.465 (IC95% 961.767;1.027.163).

Internações por abortamento, estimativas de abortos inseguros e indicadores de aborto inseguro por regiões e unidades federativas estão representados na Tabela 1 . O coeficiente médio anual de aborto inseguro foi de 17,0 abortos/1.000 mulheres em idade fértil, enquanto a razão de abortos inseguros foi de 33,2 abortos/100 nascidos vivos. A maior proporção de casos de internações hospitalares e de abortos inseguros foi registrada na região Sudeste (39,2%), sobretudo no estado de São Paulo (19.0%). A região Nordeste apresentou os valores mais elevados dos indicadores de aborto inseguro (coeficiente: 21,6 abortos/1.000 mulheres em idade fértil; razão: 39,7 abortos/100 nascidos vivos). A maioria dos estados das regiões Norte (6/7) e Nordeste (6/9), além do Distrito Federal e do Rio de Janeiro, apresentaram coeficientes de aborto inseguro superiores à média nacional, enquanto a maioria dos estados das regiões Nordeste (6/9) e Sudeste (3/4), além de Amapá, Acre e Distrito Federal, apresentaram valores da razão de abortos inseguros superiores aos do País ( Tabela 1 ). O estado do Amapá apresentou o maior coeficiente de aborto inseguro (35,9 abortos/1.000 mulheres em idade fértil) e o estado da Bahia, a maior razão de abortos inseguros por nascidos vivos (53,6 abortos/100 nascidos vivos) ( Tabela 1 ).

Tabela 1
Distribuição das internações por abortamento, estimativa de abortos inseguros e indicadores de aborto inseguro segundo regiões e unidade federativa. Brasil, 1996-2012.

As tendências dos indicadores de aborto inseguro, agrupados por regiões e unidades federativas, são apresentadas nas Tabelas 2 e 3. O coeficiente de aborto inseguro apresentou tendência de declínio significativo e constante no País (R2: 94,0%; p < 0,001) (modelo linear), com padrões distintos entre as regiões e unidades federativas. Semelhante ao padrão nacional observado, as regiões Nordeste (R2: 93,0%; p < 0,001), Sudeste (R2: 92,0%; p < 0,001) e Centro-Oeste (R2: 64,0%; p < 0,001) apresentaram tendência de declínio significativo e constante no período (modelo linear). A maior queda foi observada na região Nordeste, com uma redução anual de 0,63 abortos/1.000 mulheres em idade fértil. Em contraste, a região Norte (R2: 39,0%; p = 0,030) apresentou tendência de aumento significativo e não constante (modelo de segunda ordem), enquanto a região Sul (R2: 22,0%; p = 0,340) apresentou tendência de estabilidade ( Tabela 2 ). A maioria das unidades federativas (16/27) apresentou tendência de declínio do coeficiente de aborto inseguro no período. Os estados de Amazonas, Amapá, Tocantins, Maranhão, Paraíba e Rio Grande do Sul apresentaram tendências de aumento significativo no período ( Tabela 2 ).

Tabela 2
Análise das tendências dos coeficientes médios de aborto inseguro segundo regiões e unidades federativas. Brasil, 1996-2012.

Diferente do padrão de declínio observado com o coeficiente de aborto inseguro, a razão de aborto inseguro/nascidos vivos apresentou tendência de estabilidade em nível nacional (R2: 46,0%; p = 0,052). As regiões Norte (R2: 60,0%; p < 0,001), Sul (R2: 78,0%; p < 0,001) e Centro-Oeste (R2: 23,0%; p = 0,006) apresentaram tendências de aumento significativo e constante no período (modelo linear). As regiões Nordeste (R2: 57,0%; p = 0,001) e Sudeste (R2: 25,0%; p = 0,047) apresentaram tendência de declínio significativo e constante desse indicador (modelo linear) ( Tabela 3 ). Mais de 40,0% das unidades federativas (12/27) apresentaram tendência de aumento no período. Os estados de Rondônia, Amazonas, Roraima, Amapá, Tocantins, Paraíba, Paraná, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Goiás apresentaram tendência de aumento constante (modelo linear) ( Tabela 3 ).

Tabela 3
Análise das tendências da razão de abortos inseguros segundo regiões e unidades federativas. Brasil, 1996-2011.

No período, 99,9% (5.560/5.565) dos municípios registraram pelo menos um caso de internação hospitalar por abortamento. A distribuição dos coeficientes médios de aborto inseguro entre os municípios variou de zero a 124,5 abortos/1.000 mulheres em idade fértil, enquanto os coeficientes suavizados variaram de 0,4 a 122,3. As Figuras 1 e 2 apresentam os mapas da distribuição espacial dos coeficientes médios de aborto inseguro bruto e ajustado pelo método Bayesiano Empírico Local, respectivamente. De uma forma geral, ambos os mapas apresentam municípios e/ou agrupamentos de municípios com elevados coeficientes de aborto (> 20 abortos inseguros/1.000 mulheres em idade fértil) em quase todas as unidades federativas, localizados principalmente nas regiões Norte, Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste ( Figuras 1 e 2 ). As regiões Nordeste e Norte concentram a maior parte desses municípios, abrangendo importantes áreas com elevados coeficientes em todos os estados (Figuras 1 e 2). Além disso, encontraram-se importantes agrupamentos de municípios com elevados coeficientes na região oeste de Mato Grosso do Sul, sul de Mato Grosso, leste de Goiás, Distrito Federal e norte de Minas Gerais ( Figuras 1 e 2 ).

Figura 1
Distribuição espacial dos coeficientes de aborto inseguro por 1.000 mulheres em idade fértil, por municípios de residência. Brasil, 1996-2012.

Figura 2
Distribuição espacial dos coeficientes de aborto inseguro por 1.000 mulheres em idade fértil após suavização pelo método Bayesiano empírico local, por municípios de residência. Brasil, 1996-2012.

O Índice Global de Moran para os subperíodos e período total apresentaram valores positivos (variando de 0,18 a 0,28) e significativos (p < 0,01), indicando autocorrelação espacial global com padrões semelhantes no Brasil. A Figura 3 apresenta os clusters dos municípios, identificados segundo os índices Locais de Moran para os coeficientes de abortos inseguros e visualizados pelo Moran Map. Nesse período, foram identificados clusters de municípios com altos coeficientes (alto/alto) localizados desde o norte e o leste de São Paulo, estendendo-se até o norte do Ceará e o leste do Piauí. Um importante cluster concêntrico abrangeu municípios no sul, leste e nordeste da Bahia, englobando a maioria dos municípios dos estados de Alagoas, Sergipe e Pernambuco e margeando o sul dos estados da Paraíba e Ceará. Na região Norte, outras quatro áreas com altos valores desse indicador foram identificadas, destacando-se o cluster que abrange quase todo o estado do Acre e o noroeste do Pará ( Figura 3 ). Clusters de municípios com baixos valores (baixo/baixo) foram localizados abrangendo quase toda a região Sul, grande parte da região Centro-Oeste e estado do Maranhão, bem como em áreas isoladas nos estados das regiões Norte, Nordeste e Sudeste ( Figura 3 ).

Figura 3
Moran Maps dos coeficientes de aborto inseguro nos municípios de residência. Brasil, 1996-2012.

DISCUSSÃO

O presente estudo de base populacional nacional fornece uma visão abrangente do aborto inseguro e dimensiona sua magnitude como problema de saúde pública no Brasil. Embora o aborto inseguro apresente tendência nacional de declínio, há padrões diferenciados entre as regiões. O aborto inseguro possui ampla distribuição geográfica no País, com registros em quase todos os municípios. Identificou-se ainda a existência de clusters de municípios com altos valores de abortos inseguros, especialmente em estados das regiões Norte, Nordeste e Sudeste.

Uma rede de alta complexidade de fatores determinantes e condicionantes, incluindo aspectos sociais, culturais, religiosos, morais e legais, inibe as mulheres de declararem seus abortamentos, comprometendo a existência de informações mais precisas, dificultando a sua real magnitude. hh Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Atenção humanizada ao abortamento: norma técnica. Brasília (DF); 2011. A situação da ilegalidade na qual o aborto é realizado no Brasil afeta a confiabilidade das estatísticas que subsidiariam potencialmente a implementação de políticas públicas mais precisas para as diferentes realidades regionais e faixas etárias. 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro...
, hh Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Atenção humanizada ao abortamento: norma técnica. Brasília (DF); 2011.

Apesar da ilegalidade do aborto induzido no Brasil, assim como em outros países com leis restritivas, 1 Ǻhman E, Shah IH. New estimates and trends regarding unsafe abortion mortality. Int J Gynaecol Obstet. 2011;115(2):121-6. DOI:10.1016/j.ijgo.2011.05.027
https://doi.org/10.1016/j.ijgo.2011.05.0...
, 2222  Shah I, Ǻhman E. Unsafe abortion in 2008: global and regional levels and trends. Reprod Health Matters . 2010;18(36):90-101. DOI:10.1016/S0968-8080(10)36537-2
https://doi.org/10.1016/S0968-8080(10)36...
, 2323  World Health Organization. Unsafe Abortion: global and regional estimates of the incidence of unsafe abortion and associated mortality in 2008. 6th ed. Geneva; 2011[cited 2013 Jan 10]. Available from: http://www.who.int/reproductivehealth/publications/unsafe_abortion/9789241501118/en/index.html
http://www.who.int/reproductivehealth/pu...
, aa World Health Organization. Safe abortion: technical and policy guidance for health systems. Geneva; 2003 [citado 2013 jan 10]. Disponível em: http://whqlibdoc.who.int/publications/2003/9241590343.pdf , bb Singh S, Wulf D, Hussain R, Bankole A, Sedgh G. Abortion worldwide: a decade of uneven progress. New York: Guttmacher Institute; 2009 [citado 2013 jan 10]. Disponível em: http://www.guttmacher.org/pubs/Abortion-Worldwide.pdf foi verificado elevado número de internações hospitalares por abortamento. A criminalização do aborto não impede que as mulheres interrompam uma gestação indesejada ou não planejada, apenas as expõe a práticas indiscriminadas, inseguras, desumanizadas e com elevado risco de morte, gerando altos custos econômicos, políticos e sociais. 9 Diniz D. Aborto e a saúde pública no Brasil. Cad Saude Publica. 2007;23(9):1992-3. DOI:10.1590/S0102-311X2007000900001
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, 2020  Olinto MTA, Moreira-Filho DC. Fatores de risco e preditores para o aborto induzido: estudo de base populacional. Cad Saude Publica . 2006;22(2):365-75. DOI:10.1590/S0102-311X2006000200014
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Observou-se marcante heterogeneidade da estimativa do aborto inseguro entre as regiões brasileiras e, dentro destas, com as unidades federativas. As regiões Norte e Nordeste apresentaram os maiores valores dos indicadores analisados. A distribuição dos indicadores segundo unidade federativa é consistente com as regiões com elevados indicadores, principalmente nas regiões Norte e Nordeste. 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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O coeficiente de aborto inseguro apresentou declínio em nível nacional e na maioria das regiões (Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste), enquanto na região Norte houve tendência de aumento. O número estimado de abortos inseguros foi equivalente a 33,2% do total de nascidos vivos no período. Esse indicador apresentou tendência de estabilidade em nível nacional e de aumento nas regiões Norte, Sul e Centro-Oeste. O padrão observado sugere que, apesar do declínio de aborto inseguro em relação à população de mulheres em idade reprodutiva na maioria das regiões e unidades federativas, em algumas dessas áreas geográficas há um aumento do número de gravidezes que terminam em abortos em vez de nascidos vivos. 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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A redução no número de abortos inseguros pode ser explicada pela melhoria do acesso a métodos contraceptivos modernos e eficazes, declínio da taxa de fecundidade, aumento do aborto medicamentoso (misoprostol) e ampliação da jurisprudência em casos de abortos legais previstos por lei. 1212  Faúndes A. Strategies for the prevention of unsafe abortion. Int J Gynaecol Obstet . 2012;119(Suppl 1):68-71. DOI:10.1016/j.ijgo.2012.03.021
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, 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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, hh Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Atenção humanizada ao abortamento: norma técnica. Brasília (DF); 2011. Atualmente, mulheres que sofrem violência sexual já podem recorrer a serviços públicos de saúde para realizar a interrupção da gestação de forma assistida e segura. 1717  Mello FMB, Sousa JL, Figueroa JN. Magnitude do aborto inseguro em Pernambuco, Brasil, 1996 a 2006. Cad Saude Publica . 2011;27(1):87-93. DOI:10.1590/S0102-311X2011000100009
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As diferenças regionais podem ser atribuídas, em parte, ao maior acesso e adesão aos métodos contraceptivos nas regiões/unidades federativas com os menores indicadores de abortos inseguros. 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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Ressalta-se ainda o efeito do possível aumento do uso do misoprostol na indução do aborto, reduzindo a frequência de complicações e, consequentemente, resultando em menor número de internações, o que poderia explicar em parte a redução no período estudado. 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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A Pesquisa Nacional do Aborto no Brasil, realizada em 2010, constatou que o uso do misoprostol foi o método de escolha mais citado por parte das mulheres para a prática de indução de abortamento. 1010  Diniz D, Medeiros M. Aborto no Brasil: uma pesquisa domiciliar com técnica de urna. Cienc Saude Coletiva . 2010;15Suppl 1:959-66. DOI:10.1590/S1413-81232010000700002 
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O misoprostol diminui a frequência de complicações causadas pelo uso de métodos relacionados a altos índices de infecção, como introdução de corpos estranhos e utilização de outras técnicas invasivas para a indução do abortamento. 1919  Nader, PRA, Blandino, VRP, Maciel, ELN. Características de abortamentos atendidos em uma maternidade pública do Município da Serra - ES. Rev Bras Epidemiol . 2007;10(4):615-24. DOI:10.1590/S1415-790X2007000400019
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No entanto, são necessários estudos adicionais que avaliem o impacto do uso do misoprostol na indução e incidência do aborto no Brasil. 1010  Diniz D, Medeiros M. Aborto no Brasil: uma pesquisa domiciliar com técnica de urna. Cienc Saude Coletiva . 2010;15Suppl 1:959-66. DOI:10.1590/S1413-81232010000700002 
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, 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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As taxas mais elevadas de fecundidade podem tornar a população feminina mais vulnerável aos riscos de um aborto inseguro. 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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Embora a taxa de fecundidade tenha diminuído em todas as regiões brasileiras entre 2000 e 2010, ainda há expressivas desigualdades regionais, com maiores níveis de fecundidade nas regiões Norte e Nordeste. 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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É inegável que houve melhorias no acesso ao planejamento familiar, sobretudo devido à expansão da Política Nacional de Planejamento Familiar, bem como da disponibilização quantitativa de alguns métodos anticoncepcionais eficazes distribuídos gratuitamente pelo SUS. ii Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Ciência e Tecnologia. PNDS 2006: Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher. Brasília (DF); 2008. No entanto, houve pouca mudança na diversidade de opções para contracepção utilizada por mulheres com menor nível socioeconômico. 2121  Pacagnella RC.Novamente a questão do aborto no Brasil: ventos de mudança? Rev Bras Ginecol Obstet. 2013;35(1):1-4. DOI:10.1590/S0100-72032013000100001
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Em 2006, os principais métodos usados pela população com maior vulnerabilidade social e econômica eram a esterilização feminina e o anticoncepcional oral. ii Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Ciência e Tecnologia. PNDS 2006: Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher. Brasília (DF); 2008. Os resultados do presente estudo sugerem que ainda há lacunas importantes na prestação de serviços de saúde reprodutiva e que são necessários maiores esforços para melhorar o acesso e a adesão ao uso de contraceptivos. 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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Neste estudo, foram verificados padrões espaciais de coeficientes entre os municípios, identificando-se clusters de municípios com altos coeficientes de aborto inseguro em estados das regiões Norte, Nordeste e Sudeste. As análises revelaram padrão de extrema concentração de municípios com altos coeficientes de aborto inseguro em faixa geográfica que vai do norte de São Paulo ao norte do Ceará, além da presença de clusters em áreas da região Norte. Esses achados reiteram as desigualdades regionais marcantes para a ocorrência do aborto inseguro no Brasil, apresentando peso maior em municípios com precárias condições socioeconômicas e de acesso aos serviços de saúde. 1717  Mello FMB, Sousa JL, Figueroa JN. Magnitude do aborto inseguro em Pernambuco, Brasil, 1996 a 2006. Cad Saude Publica . 2011;27(1):87-93. DOI:10.1590/S0102-311X2011000100009
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, 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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O aborto realizado em condições inseguras se figura entre as principais causas de mortalidade materna no Brasil 1616  Laurenti R, Jorge MHPM, Gotlieb SLD. A mortalidade materna nas capitais brasileiras: algumas características e estimativa de um fator de ajuste. Rev Bras Epidemiol . 2004;7(4):449-60. DOI:10.1590/S1415-790X2004000400008
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e é causa importante de discriminação e violência institucional contra mulheres nos serviços de saúde. Violência representada pelo retardo do atendimento, pela falta de acesso facilitado e com qualidade da atenção ou pela discriminação explícita com atitudes negativas, preconceituosas e de julgamento, 4 Aquino EML, Menezes G, Barreto-de-Araújo TV, Alves MT, Alves SV, Almeida MCC, et al. Qualidade da atenção ao aborto no Sistema Único de Saúde do Nordeste brasileiro: o que dizem as mulheres. Cienc Saude Coletiva . 2012;17(7):1765-76. DOI:10.1590/S1413-81232012000700015
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além da negligência de ações de prevenção da recorrência de abortos. hh Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Atenção humanizada ao abortamento: norma técnica. Brasília (DF); 2011.

Apesar de o Brasil ser signatário em acordos internacionais, o impacto do aborto inseguro sobre a morbimortalidade materna compromete o alcance de metas dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) e a não garantia, em sua totalidade, dos direitos reprodutivos e sexuais das mulheres. hh Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Atenção humanizada ao abortamento: norma técnica. Brasília (DF); 2011. O enfrentamento desse problema perpassa por questões profundas de justiça social, ética, legislação civil e cidadania. 1717  Mello FMB, Sousa JL, Figueroa JN. Magnitude do aborto inseguro em Pernambuco, Brasil, 1996 a 2006. Cad Saude Publica . 2011;27(1):87-93. DOI:10.1590/S0102-311X2011000100009
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Independentemente da questão legal que engloba o aborto, ressalta-se a relevância da garantia de acesso e assistência qualificada à saúde materna. 1212  Faúndes A. Strategies for the prevention of unsafe abortion. Int J Gynaecol Obstet . 2012;119(Suppl 1):68-71. DOI:10.1016/j.ijgo.2012.03.021
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, 2121  Pacagnella RC.Novamente a questão do aborto no Brasil: ventos de mudança? Rev Bras Ginecol Obstet. 2013;35(1):1-4. DOI:10.1590/S0100-72032013000100001
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As estratégias para prevenção do abortamento inseguro e, consequentemente, de suas mortes envolvem ações integradas em todos os níveis de prevenção da rede de serviços de saúde: redução da gestação indesejada, assistência à saúde de qualidade ao abortamento, reconhecimento e manejo adequado das complicações e planejamento familiar pré e pós-aborto. 1212  Faúndes A. Strategies for the prevention of unsafe abortion. Int J Gynaecol Obstet . 2012;119(Suppl 1):68-71. DOI:10.1016/j.ijgo.2012.03.021
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A necessidade de atenção oportuna é imperiosa, dada a dificuldade das mulheres em reconhecer sinais de possíveis complicações aliada a fatores que podem retardar a busca de cuidados. Na perspectiva da integralidade do atendimento, os profissionais de saúde devem oferecer não apenas atenção imediata individualizada às mulheres em situação de abortamento, mas também disponibilizar alternativas contraceptivas, evitando o recurso a abortos repetidos, e envolver a família, sobretudo, os parceiros. hh Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Atenção humanizada ao abortamento: norma técnica. Brasília (DF); 2011. Para mulheres com abortamentos espontâneos e que desejem nova gestação, deve ser garantido atendimento adequado às suas necessidades. A qualidade da atenção almejada inclui aspectos relativos à sua humanização, estimulando os profissionais de saúde, independentemente dos seus preceitos morais e religiosos, a apresentar postura ética, garantindo o respeito aos direitos humanos das mulheres. hh Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Atenção humanizada ao abortamento: norma técnica. Brasília (DF); 2011.

Políticas públicas somente serão efetivas quando pautadas em maior conhecimento sobre a cadeia de causalidade do aborto inseguro, o que pode ser alcançado a partir de um maior número de estudos com metodologia específica. Há a necessidade de realização de estudos com técnicas diretas de estimação para determinação da real magnitude do aborto inseguro. 1717  Mello FMB, Sousa JL, Figueroa JN. Magnitude do aborto inseguro em Pernambuco, Brasil, 1996 a 2006. Cad Saude Publica . 2011;27(1):87-93. DOI:10.1590/S0102-311X2011000100009
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Além disso, há clara necessidade de ampliação de esforços para o desenvolvimento de pesquisas para analisar melhor o real impacto do aborto inseguro sobre as mulheres, famílias e o setor saúde. 1414  Juarez F, Singh S, Garcia SG, Olavarrieta CD. Estimates of induced abortion in Mexico: what’s changed between 1990 and 2006? Int Fam Plan Perspect . 2008;34(4):158-68. DOI:10.1363/3415808
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Este estudo tem algumas limitações que devem ser levadas em consideração na interpretação dos resultados. A técnica de estimativa indireta aplicada depende da qualidade dos dados de internações hospitalares. 1414  Juarez F, Singh S, Garcia SG, Olavarrieta CD. Estimates of induced abortion in Mexico: what’s changed between 1990 and 2006? Int Fam Plan Perspect . 2008;34(4):158-68. DOI:10.1363/3415808
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, 1717  Mello FMB, Sousa JL, Figueroa JN. Magnitude do aborto inseguro em Pernambuco, Brasil, 1996 a 2006. Cad Saude Publica . 2011;27(1):87-93. DOI:10.1590/S0102-311X2011000100009
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, 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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A utilização de dados secundários pode apresentar inconsistência na quantidade e qualidade das informações. 1919  Nader, PRA, Blandino, VRP, Maciel, ELN. Características de abortamentos atendidos em uma maternidade pública do Município da Serra - ES. Rev Bras Epidemiol . 2007;10(4):615-24. DOI:10.1590/S1415-790X2007000400019
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Foram utilizados dados oriundos do SIH que registra os procedimentos realizados em unidades hospitalares vinculadas ao SUS, não sendo consideradas as internações por aborto realizadas em unidades hospitalares sem vínculo com o SUS. 1717  Mello FMB, Sousa JL, Figueroa JN. Magnitude do aborto inseguro em Pernambuco, Brasil, 1996 a 2006. Cad Saude Publica . 2011;27(1):87-93. DOI:10.1590/S0102-311X2011000100009
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, 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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Além disso, esse sistema de informação pode não detectar inconsistências na classificação da causa de internação registrada, i.e., falhas na codificação da causa de internação podem interferir nos resultados, exigindo cautela na interpretação. Devido ao estigma associado ao procedimento e à ilegalidade do aborto, pode ter havido subnotificação no registro da ocorrência do aborto por parte das mulheres e prestadores de serviços de saúde, mesmo quando eles estão diretamente envolvidos no atendimento. 1313  García SG, Tatum C, Becker D, Swanson KA, Lockwood K, Ellertson C. Policy implications of a national public opinion survey on abortion in Mexico. Reprod Health Matters . 2004;12(24 Suppl):65-74. DOI:10.1016/S0968-8080(04)24003-4
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Métodos indiretos para estimar a magnitude do aborto inseguro por meio de dados secundários são aproximados e baseados em suposições assumidas para realização do cálculo. 1313  García SG, Tatum C, Becker D, Swanson KA, Lockwood K, Ellertson C. Policy implications of a national public opinion survey on abortion in Mexico. Reprod Health Matters . 2004;12(24 Suppl):65-74. DOI:10.1016/S0968-8080(04)24003-4
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Empregou-se método desenvolvido em 1994 2 Alan Guttmacher Institute. Clandestine abortion: a Latin American reality. New York: Alan Guttmacher Institute; 1994. e previamente utilizado em estudos de larga escala no Brasil. 1717  Mello FMB, Sousa JL, Figueroa JN. Magnitude do aborto inseguro em Pernambuco, Brasil, 1996 a 2006. Cad Saude Publica . 2011;27(1):87-93. DOI:10.1590/S0102-311X2011000100009
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, 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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Essa técnica assume que 20,0% dos abortos resultaram em internações registradas pelo SUS. 2 Alan Guttmacher Institute. Clandestine abortion: a Latin American reality. New York: Alan Guttmacher Institute; 1994. , 1818  Monteiro MFG, Adesse L. Estimativas de aborto induzido no Brasil e Grandes Regiões (1992-2005). Rev Saude Sex Reprod [periódico na Internet]. 2006[citado 2012 dez 10];26. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_252.pdf
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No entanto, esse parâmetro pode não ser válido, principalmente pelas variações regionais e temporais da razão de internações por abortos, bem como pelo aumento da utilização do misoprostol e diminuição da taxa de fecundidade ocorrida nos últimos anos. Apesar dessas limitações, fornecem-se estimativas aproximadas que contribuem para o conhecimento, mesmo que ainda insuficiente, da distribuição do aborto inseguro no Brasil.

Conclui-se que o aborto inseguro, apesar do declínio em nível nacional, ainda representa importante problema de saúde pública e um evento negligenciado no Brasil. São necessárias ampliação do acesso à atenção, qualificação e humanização da assistência às mulheres em situação de abortamento, incluindo serviços de aconselhamento contraceptivos pós-aborto.

DESTAQUES

Os resultados deste artigo mostram que o aborto inseguro é um importante problema de saúde pública, caracterizado como evento negligenciado no País que, apesar de seu declínio no período estudado, apresenta importantes diferenças regionais, estando mais concentrado em regiões socioeconomicamente mais pobres.

A magnitude e a relevância social do problema indicam a necessidade de construir estratégias de enfrentamento.

O contexto de desigualdades indica a necessidade de fortalecer as ações de saúde nas áreas de maior risco, oferecendo alternativas seguras.

É urgente que o sistema de saúde amplie o acesso, qualifique a atenção e humanize as ações de saúde da mulher, em especial nos aspectos reprodutivos e na atenção pré e pós-abortamento.

Profa. Rita de Cássia Barradas Barata Editora Científica

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2014

Histórico

  • Recebido
    4 Abr 2013
  • Aceito
    10 Fev 2014
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revsp@org.usp.br