ARTIGO

 

Leishmaniose visceral na cidade do Rio de Janeiro — Brasil

 

 

Mauro Celio de A. MarzochiI; Paulo Chagastelles SabrozaII; Luciano Medeiros de ToledoIII; Keyla Belízia F. MarzochiIV; Neide Cássia TramontanoV; Francisco B. Rangel FilhoVI

IInstituto Oswaldo Cruz — FIOCRUZ, Rio de Janeiro
IIEscola Nacional de Saúde Pública — FIOCRUZ, Rio de Janeiro
IIISecretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro — SMSRJ
IVUniversidade Federal do Rio de Janeiro — UFRJ
VSuperintendência das Campanhas do Ministério da Saúde — SUCAM-RJ
VIUniversidade Federal Rural do Rio de Janeiro — UFRRJ

 

 


RESUMO

A recente ocorrência de casos humanos e caninos de leishmaniose visceral, autóctones de áreas peri-urbanas da cidade do Rio de Janeiro, a partir de 1977, motivou pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública e do Instituto Oswaldo Cruz da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), da Universidade Federal do Rio de Janeiro, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, da Secretaria Municipal da Saúde do Rio de Janeiro e da Superintendência das Campanhas do Ministério da Saúde (SUCAM-RJ), a participarem de um programa de estudo dessa zooantroponose, visando a uma abordagem ecológica, epidemiológica, parasitológica, imunológica, clínico-terapêutica e de avaliação das medidas de controle adotadas. Resultados gerais dessas pesquisas são apresentados na presente comunicação.


ABSTRACT

Since 1977 autoctonous cases of human and canine visceral Leishmaniasis have occurred in Rio de Janeiro. These cases have been studied by a group from the Escola Nacional de Saúde Pública, the Instituto Oswaldo Cruz Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), the Universidade Federal do Rio de Janeiro, the Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, the Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro and the Superintendência das Campanhas do Ministério da Saúde (SUCAM-RJ). The zooantroponosis has been subjected to ecological, epidemiological, parasitologica, immunological, clinical and therapeutic studies designed to investigate means of control for the disease. Here we present the general results of this work.


 

 

A leishmaniose visceral (LV) ou Calazar Neotropical, no Brasil, é uma zooantroponose peri-urbana e rural. No âmbito doméstico, o cão é importante reservatório do agente, a Leishmania donovani chagasi, e responsável pelo caráter endêmico-epidêmico da doença. No ambiente silvestre, a raposa Lycalopex vetulus3 e outros canídeos como o Cerdocion thous6 são incriminados como hospedeiros naturais. A única espécie de flebótomo incriminada na transmissão é a Lutzomyia longipalpis, cuja distribuição se superpõe às áreas endêmicas3. Clinicamente, a doença humana pouco difere das outras modalidades clínico-epidemiológicas existentes em outros continentes, incluindo febre, anemia, hepatoesplenomegalia e emagrecimento de caráter progressivo, porém muito sensível ao tratamento pelo antimonial. A taxa de mortalidade dos casos não tratados varia de 75 a 95%, admitindo-se porém a ocorrência de formas oligossintomáticas e assintomáticas23. Segundo o Ministério da Saúde — SUCAM, mais de mil casos humanos vêm ocorrendo anualmente no Brasil. Sua distribuição geográfica vai desde o norte da Amazônia até os estados da região sudeste, passando pelos da região centro-oeste. São mais atingidos os estados da região nordeste (97% dos casos), predominando no Ceará.

Recentemente, além da recrudescência observada nas áreas endêmicas do nordeste, novos focos têm sido detectados no sul do país (Paraná, 3 casos; São Paulo, 2 casos; Rio de Janeiro, 35 casos), sugerindo uma expansão da endemia11.

O calazar humano endêmico é mais freqüente em crianças, na maioria das áreas, correspondendo a menores de 10 anos 80% dos casos, sendo que 60% ocorrem até os 4 anos; é também predominante no sexo masculino1.

O calazar canino enzoótico é mais prevalente que o humano e precede a endemia1. É de evolução lenta, levando a acentuado emagrecimento, perda de pelos e apatia, porém freqüentemente assintomático, embora com alto grau de parasitismo na pele sã e vísceras3.

A L. longipalpis coloniza facilmente o peridomicílio, adaptando-se a temperaturas elevadas e baixo grau de umidade, sendo o período de maior transmissibilidade a estação chuvosa; os insetos invadem o domicílio, picando tanto o homem quanto o cão3.

O aumento verificado em sua distribuição para o sul do país, em áreas onde sua presença não havia sido notada, justificaria o aparecimento de novos focos da doença22.

O calazar humano, nunca antes referido na cidade do Rio de Janeiro, foi detectado ali, pela primeira vez, em 197721. Até outubro de 1983, 35 casos autóctones foram diagnosticados em áreas peri-urbanas da cidade, situadas nas vertentes continentais norte (bairros de Realengo e Bangu), noroeste (Senador Camará), oeste (Campo Grande) e sudeste (Jacarepaguá) do Maciço da Pedra Branca (XVII, XVIII e XXIV RAs) — Mapa e Fig. 1.

 

 

O maciço da Pedra Branca, contraforte da Serra do Mar, situado no Centro do Município, entre os paralelos 22°50' e 23o05' e os meridianos 43o35' e 43o20', é um conjunto montanhoso formado por rochas graníticas e gnaíssicas, o mais alto do município, cujo ponto culminante é o Pico da Pedra Branca (1.024m). O clima predominante nas vertentes norte e noroeste, de maior insolação, é do tipo Aw, com temperatura média anual de 27,7°C; a precipitação pluviométrica total anual é maior que 1.400mm, com menos de 60mm nos meses mais secos (julho e agosto) e a umidade relativa pouco variável, em tomo de 75°C. Nas vertentes atlânticas, onde a umidade proveniente do mar encontra no relevo um obstáculo, acarretando chuvas constantes no sopé, o clima predominante nas baixadas é do tipo Am, mais úmido, e Af, chuvoso, nas encostas19.

Esse maciço, que parece funcionar como uma barreira ecológica, tem suas vertentes atlânticas voltadas para o bairro de Jacarepaguá (XVI e XXIV Regiões Administrativas), onde a leishmaniose tegumentar americana (LTA) é endêmica e bastante antiga, apresentando surtos esporádicos. Mais de 500 casos humanos e mais de 50 casos caninos foram diagnosticados nos últimos 10 anos, e o agente etiológico identificado, bioquimicamente, como Leishmania braziliensis braziliensis10.

As regiões mais atingidas, tanto pela L.V. como L.T.A., são áreas peri-urbanas, com características rurais, geralmente de encostas de morros; a população predominante é de baixa renda, e as habitações são precárias e sem equipamentos sanitários ou iluminação elétrica, porém fixada à terra há várias décadas.

A fauna flebotomínica, na vertente norte, é constituída por um predomínio de L. longipalpis (97,9%) nas cotas de altitude acima de 100m, enquanto, abaixo de 100m, predomina L. intermedia; na vertente oeste, onde são também referidos casos de LTA, a L. intermedia assume proporção de 82,4%, enquanto L. longipalpis é de 4,6%, e na vertente litorânea sul, onde apenas ocorre LTA, predomina L. intermedia (92,6%)6,20,22.

Apesar do pequeno número de casos de calazar humano no Rio de Janeiro, o coeficiente de morbidade nas áreas de risco chegou a 28,1 por 10.000 hab. em 1981 (Campo Grande), declinando com as medidas de controle adotadas pela SUCAM (busca ativa e tratamento dos casos humanos, eliminação dos cães infectados e dedetização dos domicílios) e apresentando uma morbidade média geral, no período de 1977 a 1983, de 4,4 por 10.000 hab. (Tabela I). A distribuição etária nas localidades situadas nas vertentes norte (exclusiva de LV) — 19 casos — correspondeu a 39,3% até 9 anos de idade e 60,7% acima dessa faixa; nas vertentes oeste, (onde também ocorre LTA) — 15 casos — foi de 66,7% abaixo de 9 anos e 33,3% acima de 10 anos. No geral, houve predomínio do sexo masculino (60%). A ocorrência de apenas 25,7% dos casos abaixo de 4 anos e 45,7% acima de 10 anos reforça a possibilidade de implantação recente da endemia (Tabela II).

 

 

De 22 doentes por nós examinados, em 21 (95,5%) evidenciamos Leishmania em material de mielopunção e em 13 (59%) isolamos o parasito em meio de cultivo12.

Todos apresentaram sorologia positiva à imunofluorescência indireta (IF) nas classes IgG, cujos títulos variaram de 1: 90 a 1: 2800, com tendência a manterem-se elevados por mais de 6 meses11. Na classe IgM foram observados 28,5% de resultados falsos positivos, relacionados ao fator reumatóide, embora 35,7% apresentassem anticorpos IgM específicos2.

Além da evidenciação de altos níveis de imunocomplexos (IC) e ocorrência de ativação policlonal, observou-se estreita associação entre IC e auto-anticorpos antimúsculo liso4. No estudo da patogênese da anemia, Pontes de Carvalho et alii17 sugeriram a participação de auto-anticorpos eritrocitários ou da adsorção passiva de imunocomplexos pelos eritrócitos.

A intradermorreação de Montenegro (IDRM), realizada antes do tratamento, foi, surpreendentemente, positiva em um paciente de 19 anos, procedente da encosta norte; após o tratamento, a IDRM foi positiva em 50% dos indivíduos testados, com tendência a permanecer negativa nos indivíduos mais jovens12.

O tempo referido da doença variou de 10 dias a 5 meses; hepatoesplenomegalia e anemia, presentes em todos os casos, foram de intensidade variável, sendo que febre, durante a internação, deixou de ocorrer em apenas um caso que apresentou ictericia à admissão; as alterações laboratoriais clássicas puderam ser observadas na maioria dos casos24.

Cerca de 25% dos pacientes apresentaram alterações hemorrágicas de pele, antes ou durante o tratamento específico; nestes, a plaquetopenia, observada à internação ou concomitante ao agravamento do quadro hemorrágico, associou-se à acentuada elevação de imunocomplexos circulantes8.

Quatro de seis casos (com idades de 22 a 36 anos), reavaliados clinicamente até um ano após o diagnóstico, apresentaram hipertensão arterial persistente; desses, três tiveram a forma sintomática e foram tratados após comprovação diagnóstica, e um, oligossintomático, apenas com IF e IDRM positivas, não foi tratado; porém, três deles eram irmãos (um dos quais oligossintomático), com antecedentes familiares de hipertensão9.

Ao tratamento específico feito pela administração endovenosa de Glucantime (Rhodia-CEME), na dose de 50-100 mg/kg/dia, em dois períodos de 10 dias, com 10 dias de intervalo, não se observou resistência à droga. Os 3 óbitos ocorridos foram associados ao início tardio da terapêutica em pacientes com estado geral muito comprometido e agravado por complicações (sépsis e hemorragia digestiva).

Um inquérito sorológico canino pela reação de imunofluorescência indireta, realizado pela SUCAM com colaboração da FIOCRUZ, evidenciou em cães de áreas exclusivamente com LV (Realengo, Bangu e Senador Camará) uma prevalência de 4,3% de positividade; em cães da área mista de LV e LTA (Campo Grande), uma prevalência de 12,7% e em cães de Pau da Fome (Jacarepaguá), na vertente litorânea sudeste do Maciço da Pedra Branca, onde têm ocorrido apenas casos humanos e caninos de leishmaniose tegumentar, 8,6%.1

Em 40 cães recolhidos das áreas endêmicas, com diagnóstico parasitológico ou sorológico positivos, observamos que, em 19 cães das áreas exclusivas de LV, apenas 36,8% apresentavam sinais clínicos sugestivos da infecção (emagrecimento — 100%; infartamento ganglionar e depilação — 85,7%; apatia — 71,4%; ulcerações, descamações furfuráceas e unhas alongadas — 42,9%); em 21 cães provenientes da área mista de LV e LTA, 76,2% apresentavam sinais sugestivos, predominando, porém, as ulcerações de pele ou mucosas; outros sinais menos freqüentes, como evacuações sanguinolentas, queratoconjuntivite e paresia, foram observados em ambas as áreas; o exame parasitológico, após necrópsia dos 40 cães, evidenciou Leishmania em 39, sendo 42,5% em vísceras e pele normal, 35% somente em ulcerações de pele ou mucosas e 20% somente em vísceras; todas as amostras de Leishmania isoladas da área de Realengo (LV) foram caracterizadas bioquimicamente (isoenzimas, anticorpos monoclonais e kDNA) como L. donovani chagasi; nas amostras isoladas da área de Campo Grande (LV + LTA) e caracterizadas pelos mesmos métodos, observou-se tanto L.d. chagasi como L.b. braziliensis; o tratamento com antimonial (Glucantime) de 3 cães positivos aos exames parasitológicos e sorológicos, porém apresentando regular estado geral, não logrou êxito, observando-se, porém, agravamento das manifestações clínicas e morte precoce de um animal.2

Um inquérito epidemiológico através de exame clínico, IF e IDRM, realizado em 121 moradores da encosta norte (Serra do Barata — Realengo), excluindo-se os 11 indivíduos que tiveram LV na mesma localidade, evidenciou um caso sintomático, com confirmação parasitológica posterior e um caso assintomático, com IF e IDRM positivas e sem confirmação parasitológica, além de três indivíduos — 2,5% (dois adultos e uma criança) com apenas IDRM positiva13.

Na encosta oeste (Rio da Prata — Campo Grande), Toledo et alii25 aplicaram o mesmo tipo de inquérito a duas subáreas distintas, numa (170 indivíduos) predominando LV e noutra (213 indivíduos) predominando LTA; na subárea de LV, a prevalência da IDRM (12%) foi constante em todas as faixas etárias e variou de 9,4% a 18,9%, enquanto na subárea de LTA a prevalência da IDRM (29%) mostrou comportamento crescente em direção aos grupos etários mais altos, variando de 5,4% a 50%.

Na subárea de LV, 75 moradores foram divididos em quatro grupos, de acordo com a ocorrência ou não de casos humanos e caninos em suas residências25. No Grupo I, onde ocorreram casos humanos, a IF foi de zero por cento e a IDRM de 10%, no Grupo II, onde ocorreram apenas casos caninos, a IF foi de 10,3% e a IDRM de 13,8%; no Grupo III, onde ocorreram casos humanos e caninos, a IF foi de 15,4% e a IDRM de 23,1% e, no Grupo IV, onde não ocorreram casos humanos ou caninos, a IF foi de zero por cento e a IDRM de 3,9%. A presença de cinco indivíduos (6,6% da população testada) dos grupos II e III clinicamente normais, mas positivos à IF e à IDRM, sugeriu a ocorrência de formas subclínicas ou oligossintomáticas; o cultivo de mononucleares, separados do sangue periférico em gradiente de Ficoll-Hypaque, de três desses indivíduos, mostrou a presença de formas promastigotas de Leishmania; no entanto, não se encontrou Leishmania em material de medula óssea, tanto no esfregaço corado como no cultivo em meio NNN25

A proximidade da população da encosta oeste com área onde ocorre a LTA humana e canina, ao contrário do observado na encosta norte, poderia justificar a maior prevalência da IDRM positiva e talvez explicar a menor ocorrência de LV em adultos, sugerindo uma proteção imunológica cruzada dos grupos etários mais velhos pela L. b. braziliensis, uma vez que a LTA parece ser de implantação mais antiga e a LV mais recente.

Por outro lado, as formas frustras ou assintomáticas não parecem ser raras e, provavelmente, desempenhem papel de relevo na epidemiologia do calazar.

As amostras de Leishmania isoladas tanto dos casos humanos, como de casos caninos de LV, caracterizadas bioquimicamente como L. donovani chagasi, apresentaram elevado grau de homogeneidade entre elas; foram, no entanto, distintas das amostras de L. braziliensis braziliensis dos casos de LTA de origem humana e canina, isoladas no Rio de Janeiro7,14,16.

Curiosamente, em Campo Grande, na encosta oeste, observou-se um caso humano de infecção concomitante, visceral e tegumentar, correspondente a uma criança de 5 anos que previamente apresentara quadro clínico sugestivo de calazar, veio posteriormente, antes de receber tratamento, a desenvolver lesão cutânea ulcerada (que coincidiu com o aparecimento de lesão do mesmo tipo em uma irmã);abiópsia da lesão cutânea e a punção de medula óssea evidenciaram parasitos caracterizados como L. b. braziliensis e L. d. chagasi, respectivamente15.

As tentativas de encontrar animais silvestres, possíveis reservatórios de Leishmania, têm sido infrutíferas; até o momento, 75 roedores de várias espécies e 13 marsupiais foram examinados, sem resultado positivo (dados não publicados).

A distribuição temporal dos casos humanos, segundo a data de diagnóstico, mostrou uma freqüência maior entre os meses de maio a agosto. Admitindo-se que o período de incubação, somado ao período de doença anterior ao diagnóstico, seja em torno de 6 meses, é provável que a aquisição da infecção ocorra predominantemente entre os meses de novembro a março, correspondentes aos meses mais quentes do ano, quando a pluviosidade é também maior nas áreas de risco (dados não publicados).

Nas áreas onde a LV humana ou canina foram detectadas, o Ministério da Saúde (SUCAM — Regional RJ) adotou as clássicas medidas de controle: busca ativa e tratamento dos casos humanos, inquérito sorológico canino com eliminação dos cães infectados (assintomáticos ou doentes) e dedetização de todos os domicílios e anexos, repetindo-as semestralmente. Isso reverteu a expectativa de aumento dos casos (Tabela I).

A despeito das inúmeras informações acumuladas, carece ainda de estudos a determinação de fatores ambientais, humanos, sociais, econômicos, etc, que possam ter influenciado a instalação e a propagação da leishmaniose visceral nas áreas peri-urbanas da cidade do Rio de Janeiro.

Sabemos que os desmatamentos no Município remontam ao século XVI, quando da doação das Sesmarias e início de plantações de cana de açúcar. O ciclo cafeeiro, a partir do início do século XIX, induziu à ocupação das encostas do Maciço da Pedra Branca até a cota de 200m, sendo substituído, no início do século XX, pela fruticultura e implementado, a partir de 1930, com o cultivo dos laranjais, quando os cafezais foram transferidos para o vale do Paraíba. Com a queda do comércio de exportação das frutas cítricas, nos anos que precederam a 2a Guerra Mundial, grandes áreas passaram a ser utilizadas para o plantio de bananais que, galgando progressivamente as encostas, atingiram, em algumas áreas, a altitudes superiores a 500m e assim se mantêm até os dias atuais19.

No entanto, a Secretaria Municipal de Planejamento e Coordenação Geral, procurando determinar, com utilização dos dados de sensoriamente remoto por satélite (produtos MSS do Landsat), o ritmo atual de desmatamento, demonstrou que a taxa de crescimento das áreas desmatadas acima da cota 100, no município, foi de 10,38% no período de 1972 a 1978; fato esse interpretado como conseqüência do uso indevido do solo, nos maciços da Pedra Branca, Tijuca e Gericinó, apesar da legislação federal e municipal existente fixar normas de conservação e manutenção de cobertura vegetal nas áreas de encostas acima da cota 100, ainda remanescentes da Mata Atlântica19.

Nesse período, coincidentemente, constatou-se desmatamento longitudinal, cortando de leste a oeste a reserva florestal do maciço da Pedra Branca — da Estação de Furnas, instalada em Pau da Fome, Jacarepaguá, na vertente leste, até Rio da Prata, Campo Grande, na vertente oeste — para a instalação de linhas de transmissão de energia elétrica. Segundo informações, várias companhias empreiteras nacionais participaram dessa obra, através do recrutamento de mão-de-obra de várias procedências, inclusive do nordeste do Brasil, e mantiveram os empregados residindo no local de trabalho em unidades de acampamentos móveis, ao longo de todo o trajeto.

A introdução nessa área do homem ou mesmo do cão, provenientes de outras áreas endêmicas e albergando o parasito, poderia justificar a implantação do mais recente e mais meridional foco de leishmaniose visceral no País associado à presença da Lutzomyia longipalpis e à infecção canina.

 

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Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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