ARTIGO

 

Oferta tecnológica para o desenvolvimento em saúde: o caso da FIOCRUZ*

 

 

Marilia Bernardes MarquesI; Cristina de Albuquerque PossasII; Carlos A.G. GadelhaII; Maria Celeste EmerickII; Maria Elide BortolettoIII

ICoordenadora do Núcleo de Estudos Especiais da Presidência (NEP)
IIPesquisadores do NEP
IIIAssessora da Superintendência de Informação Científica (SIC)

 

 


RESUMO

O presente trabalho apresenta a proposta metodológica e os resultados consolidados do levantamento realizado, de modo descontínuo, ao longo de período de 6 meses (outubro de 86 a março de 87) da oferta tecnológica da FIOCRUZ.
As definições conceituais e os procedimentos utilizados são apresentados de modo detalhado, por tratar-se de trabalho inédito na área de saúde. Também são apresentadas as 76 ofertas mapeadas, tecendo-se breves comentários, sobre sua relevância para o quadro sanitário nacional, bem como sobre a importância da pesquisa para as atividades de gestão tecnológica em saúde.


ABSTRACT

The present work presents the methodological proposal and the consolidated results of the survey done, in a discontinue manner, during 6 months (from October 86 to march 87) of the FIOCRUZ technological supply.
The conceptuals definitions and the procedures utilized are presented in a detailed manner, due to the fact that is an unplublished work in the health area. It also presents 76 listed supplies doing short comments about its importance to the national sanitary chart, and also about the importance of the research to the activities o f technological management in health.


 

 

1. INTRODUÇÃO

A Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), cuja tradição remonta ao princípio do século, surgiu com a responsabilidade de produzir soros e vacinas para o combate das doenças epidêmicas que flagelavam a nação, especialmente a febre amarela e a peste bubônica.

A característica essencial da FIOCRUZ é sua dimensão pública, que reflete a mesma vocação histórica desde o princípio do século, quando viabilizou, possibilitando e participando do controle de epidemias, a urbanização associada à industrialização nascente.

Transformou se, ao longo de sua história, em uma instituição complexa e moderna, da área de saúde, nela coexistindo as mais diversas atividades de ensino, pesquisa, desenvolvimento experimental, produção e controle de qualidade de produtos e assistência médica ambulatorial e hospitalar.

A peculiar coexistência de atividades de pesquisa, desenvolvimento experimental e produção industrial, confere à instituição caráter estratégico para uma política tecnológica direcionada ao desenvolvimento social em saúde no país.

Buscando contribuir para a consolidação de mecanismos institucionais facilitadores de uma maior interação entre as atividades de pesquisa e produção, o que permitirá projetar para as próximas décadas o desenvolvimento institucional na área tecnológica, o Núcleo de Estudos Especiais da Presidência da FIOCRUZ (NEP) realizou amplo levantamento das atividades tecnológicas desenvolvidas nas várias Unidades Técnicas da instituição, no período de 6 meses, entre outubro de 1986 a março de 1987.

Com este levantamento pretendeu-se, além da difusão e promoção do potencial tecnológico da FIOCRUZ, examinar sua articulação com as demandas sociais e sanitárias existentes no país. Procedeu-se, com este objetivo, a uma série de visitas às diversas Unidades Técnicas localizadas no Rio de Janeiro e aos Centros Regionais de Pesquisa de Belo Horizonte, Salvador e Recife.

Ao longo destas visitas, estabeleceu-se contatos com os dirigentes das Unidades visitadas (Institutos, Departamentos, Centros, etc.) e com os responsáveis pelas linhas de pesquisa em andamento na instituição.

Este levantamento permitiu que se realizasse, pela primeira vez de forma sistemática, um trabalho exploratório para mapeamento e análise do que é desenvolvido internamente.

O primeiro resultado foi uma identificação mais clara do perfil tecnológico de cada Unidade, contribuindo, dada a heterogeneidade existente, para um auto-reconhecimento da instituição como um todo. Posteriormente, como decorrência, chegou-se à localização dos principais pontos de estrangulamento na articulação entre as atividades de pesquisa, desenvolvimento e produção nas várias Unidades Técnicas.

Deste modo, foi possível explicitar ao longo da investigação, os principais entraves identificados e necessidades manifestadas pela comunidade da FIOCRUZ, cuja resolução será decisiva para o desenvolvimento institucional e para a produção científica e tecnológica no país.

Embora o estímulo inicial para o desenvolvimento deste projeto tenha sido a necessidade de atendimento a convênio firmado entre a FIOCRUZ e a Rede de Tecnologia do Rio de Janeiro, organizada pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, com o intuito de incentivar maior interação das instituições de pesquisa sediadas no Município com o sistema produtivo1, a abrangência do trabalho realizado permitiu que se pudesse avançar para além dos objetivos inicialmente estabelecidos.

 

2. METODOLOGIA

2.a. Considerações Conceituais

A conceituação geral proposta pela Rede de Tecnologia do Rio de Janeiro define oferta tecnológica como aquela que:

  1. os resultados constituíssem algo novo, aplicável, capaz de satisfazer uma necessidade, resolver um problema ou melhorar um produto, processo ou sistema;
  2. os pesquisadores estivessem interessados na transferência;
  3. não existissem obstáculos legais ou de outra natureza a esta transferência;
  4. fosse constatada, ao menos preliminarmente, a viabilidade técnica e econômica e garantidos os direitos de propriedade.

Partindo de uma ampla discussão desta conceituação, a equipe do NEP procurou adequá-la à realidade da FIOCRUZ, considerando sua característica de instituição pública voltada à atividade científica e tecnológica em saúde. Por esta razão, optou-se pela ampliação do conceito de oferta tecnológica, evitando restringi-lo à simples possibilidade de comercialização na transferência de tecnologia às empresas privadas do setor produtivo. Passou-se a considerar, portanto, como oferta tecnológica todos aqueles processos e produtos com potencial de transferência para os sistemas público e privado em saúde.

Levou-se em conta ainda uma dimensão temporal não explicitada na proposta da Rede, selecionando-se aqueles processos e produtos com perspectiva de aplicação a médio prazo, tomando-se como parâmetro - não necessariamente excludente, como se verá mais adiante - um prazo de até 5 anos.

É importante ressaltar que a percepção dos próprios pesquisadores na avaliação do potencial de transferência de cada um dos seus projetos, obtida a partir de entrevistas individuais segundo roteiro próprio (Anexos I e II), foi decisiva para fundamentar os critérios flexíveis que orientaram o trabalho da equipe.

Da mesma forma, quanto aos conceitos de pesquisa básica aplicada e desenvolvimento experimental que orientaram a classificação inicial, a opção foi não adotar prévias definições rígidas, mas considerar a classificação dada por cada um dos pesquisadores envolvidos em função da natureza de cada projeto.

2.b. Considerações Metodológicas

A definição da oferta tecnológica da FIOCRUZ envolveu, pelas características institucionais anteriormente apontadas, um extenso e complexo processo metodológico para a identificação das pesquisas que apresentam conteúdo de natureza tecnológica em termos de produtos e processos.

A conceituação de tecnologia, especialmente nas áreas onde a geração de novos conhecimentos científicos se traduz num alto grau de inovação, é particularmente problemática e necessariamente subjetiva.

Grande parte dos avanços tecnológicos obtidos neste século basearam-se no aprofundamento prévio de conhecimentos científicos que, num primeiro momento, aparentemente, não apresentavam nenhum potencial tecnológico.

Deste modo, empregou-se, como referido anteriormente, conceito ampliado e flexível de oferta tecnológica, definindo-a como "atividade de pesquisa e desenvolvimento com potencial de geração de produtos e processos capazes de serem utilizados ao nível produtivo/industrial". A partir daí, adotou-se alguns critérios básicos que permitiram classificar e selecionar as tecnologias, a saber:

  1. Tempo de Aplicação Industrial - muitas vezes a distinção entre pesquisa de natureza básica e aplicada vincula-se sobretudo ao tempo envolvido para gerar um resultado em termos produtivos. Foram identificadas, por exemplo, pesquisas com potencial de desenvolvimento de produtos (novas drogas) com prazo previsto de aplicabilidade superior a 15 anos, pois dependiam de conhecimentos científicos prévios, estando, portanto, momentaneamente, numa fase de pesquisa mais fundamental.
  2. Potencial Inovador - Pesquisas com alto potencial de geração de inovações, considerando-se o atual estágio científico e tecnológico do Brasil, foram fortemente consideradas mesmo que não houvesse uma precisão definida em termos de aplicabilidade industrial, em decorrência do próprio risco envolvido nas atividades de fronteira.
  3. Impacto Produtivo - pesquisas que envolvem conhecimentos estratégicos para o desenvolvimento de setores industriais nacionais (por exemplo, o de química fina) que apresentam dificuldade de acesso à tecnologia externa, mesmo que tradicional, foram consideradas no processo seletivo.
  4. Impacto Social - em decorrência da natureza pública da FIOCRUZ, não poder-se-ia restringir a seleção de tecnologias a uma ótica exclusivamente privada o que significaria confundir o conceito de oferta tecnológica com o de potencial de comercialização. Deste modo, pesquisas com alta capacidade de utilização em programas de saúde, relacionadas ao quadro sanitário nacional, mesmo que não envolvam necessariamente perspectivas de lucratividade e, conseqüentemente, de apropriação privada, foram consideradas.
  5. Interesse no Sigilo - pesquisas que atendiam a outros critérios e que naturalmente seriam selecionadas, muitas vezes não o foram em função da necessidade atual de sigilo, por razões de natureza legal (possibilidade de patenteamento, por exemplo), científica ou de política institucional.

É importante frisar que estes critérios, à exceção do último, não são excludentes em relação ao processo seletivo. Quando uma pesquisa atendia, de forma clara a pelo menos um dos quatro primeiros critérios, poderia ser selecionada.

Cabe ressaltar ainda que levou-se em consideração pesquisas e desenvolvimentos já finalizados há algum tempo, estando, muitas vezes, em estado de produção industrial, envolvendo, no máximo, atividades de aperfeiçoamento. Estes foram selecionados quando representavam um potencial tecnológico da FIOCRUZ em termos de "estado-da-arte" nacional, como é o caso das tecnologias de produção de vacinas dominadas por Bio-Manguinhos.

A base de informação que permeou todo o processo de identificação e de seleção foi, como já referido antereiormente, o próprio pesquisador, tecnólogo e/ou o responsável pela atividade de alguma Unidade ou Subunidade da FIOCRUZ (Departamento ou Laboratório, por exemplo)2 . Este procedimento foi o mais adequado, pois garantiu a confiabilidade das informações levantadas, bem como o respaldo dos próprios envolvidos nas atividades da FIOCRUZ ao processo de identificação das tecnologias.

Não obstante, algumas considerações metodológicas relativas às implicações do procedimento adotado necessitam ser efetuadas para que a leitura, análise e utilização dos dados apresentados não incorram em imprecisões e conclusões indevidas.

O fato de nossa fonte básica de informações ser o pesquisador (ou o envolvido com a atividade) teve como contrapartida a impossibilidade de manter um nível homogêneo de agregação das informações, na medida em que a delimitação do conceito do que seja a "tecnologia em desenvolvimento" foi subjetiva. Explicando melhor, dependendo da ótica em que se avalia uma atividade tecnológica, esta pode ser desmembrada em diferentes tecnologias (ou "ofertas tecnológicas") ou agrupada numa única. Exemplificando, o desenvolvimento de um conjunto diagnóstico pode ser desmembrado em todos os componentes e técnicas utilizáveis no conjunto - antígenos, anticorpos, técnica de ELISA, imunofluorescência, etc. - ou ser apresentado como uma única tecnologia. E mais, diversos conjuntos aplicáveis a diferentes doenças podem, inclusive, ser agrupados numa tecnologia, caso se considere que o mesmo processo tecnológico desenvolvido permite uma múltipla aplicação.

Deste modo, a leitura das tecnologias apresentadas tem que ser necessariamente qualitativa. Não se pode tomar o número das tecnologias - segundo a Unidade da FIOCRUZ, o tipo de tecnologia ou o tipo de doença - como um índice de eficiência, impacto econômico e social, setorial ou de qualquer outra mensuração qualitativa das atividades tecnológicas da FIOCRUZ- Ao contrário, a análise das tecnologias, relacionando-as com um determinado fim (importância econômica, epidemiológica, etc.) tem que ser efetuada a partir do conhecimento da relevância da tecnologia e da amplitude efetiva e potencial de seu impacto, independentemente de sua apresentação em termos numéricos. Por exemplo, uma única tecnologia de produção de anticorpos monoclonais, aplicáveis a diversos fins, pode ter um impacto social futuro muito superior em termos do grau de inovação e de sua aplicabilidade em comparação com diversas tecnologias específicas que foram apresentadas.

De um ponto de vista mais teórico, pode-se afirmar que a impossibilidade não decorre somente do procedimento metodológico adotado. Na realidade, pensamos que seria impossível um levantamento das tecnologias desenvolvidas ou em desenvolvimento que permitisse uma interpretação quantitativa, pois a avaliação de uma inovação tecnológica é algo necessariamente qualitativo, que envolve um mínimo de avaliação do grau de inovação da atividade "vis-à-vis" o contexto histórico em que se insere. Obviamente, após esta interpretação prévia poder-se-ia pensar, em termos quantitativos, o número de pesquisadores envolvidos numa determinada linha de pesquisa, o número de produtos em que a tecnologia pode ser aplicada, a amplitude do impacto epidemiológico em termos de doenças, etc.

Isto posto, a apresentação dos dados em quadros-síntese que relacionam o número de projetos levantados e o número de tecnologias segundo as Unidades da FIOCRUZ, o tipo de tecnologia e de doença, tem que ser visto como um meio de entender sinteticamente a produção da FIOCRUZ de acordo com o critério analítico desejado. Vale dizer, a leitura dos quadros possibilitará uma primeira abordagem da oferta tecnológica da FIOCRUZ ao nível de suas Unidades, tomando-se o indicador numérico simplesmente como um meio de entender que atividades são realizadas e suas relações e possibilidades em termos do quadro econômico, tecnológico e sanitário nacional.

2.c. Procedimentos

Especificamente com relação ao procedimento adotado no levantamento das tecnologias percorreu-se as seguintes etapas:

  1. Levantamento abrangente dos projetos de pesquisa da Fundação, a partir das várias fontes existentes na instituição;
  2. Seleção preliminar pelo NEP daqueles projetos mais aplicados, tentando ser o menos restritivo possível;
  3. Entrevista junto aos responsáveis pelas Unidades da Fundação (Superintendentes, Chefes de Departamentos, Diretores de Centros Regionais e Institutos) com a finalidade de fazer uma nova seleção e de obter a indicação sobre os responsáveis diretos pelas pesquisas selecionadas;
  4. entrevista junto aos pesquisadores responsáveis de modo a obter informações sobre as pesquisas (antecedentes, estágio, descrição da tecnologia, interesse no sigilo, etc.) e de, assim, proceder a uma avaliação mais pormenorizada da natureza tecnológica das pesquisas;
  5. Seleção final pelo NEP,
  6. Sistematização das informações e preparação das fichas-resumo das tecnologias; e
  7. Volta ao pesquisador para aprovação das fichas e correção de eventuais erros ou imprecisões.

A identificação inicial do universo de projetos institucionais considerados para cada uma das Unidades da FIOCRUZ, a partir das quais se passou à seleção das possíveis ofertas tecnológicas, foi feita tomando-se por base duas fontes de informação: inicialmente, os Relatórios de Atividade apresentados pelas várias Unidades à época à Superintendência de Planejamento da instituição e constantes do cadastro deste órgão; e, posteriormente, os projetos apresentados às várias financiadoras (FINEP, FIPEC, OPAS, etc.), observando-se, neste último caso, as cláusulas referentes à propriedade dos resultados.

Nesta etapa inicial, foi necessário contornar dificuldades relacionadas à própria identificação dos projetos, uma vez que, freqüentemente, a necessidade de captação de recursos para linhas de pesquisa científica e tecnológica já em andamento exigia uma nova nomenclatura, levando à duplicação dos projetos reapresentados a diferentes fontes financiadoras.

Após esta depuração inicial, foi realizado o mapeamento de projetos e pesquisadores, conforme o "Roteiro para Levantamento de Projetos e Processos - Roteiro I" (Anexo I). Isto permitiu uma primeira classificação segundo tipo de pesquisa (básica e aplicada) e desenvolvimento experimental que foi, na etapa seguinte, avaliada em conjunto com os próprios pesquisadores envolvidos.

Em etapa subseqüente, deu-se início ao trabalho de campo propriamente dito, a partir do "Roteiro de Entrevista para Levantamento da Oferta Tecnológica - Roteiro II" (Anexo II).

Como primeiro passo, realizou-se com os Diretores de cada Unidade para introdução dos pesquisadores e estagiários do NEP e apresentação dos objetivos do trabalho, destacando-se sua relevância para a instituição.

Posteriormente, passou-se às entrevistas com os Chefes de Departamento e Laboratórios, adotando-se, como critério, a visita àqueles setores em que houvesse sido identificada, a partir da sistemática referente ao Roteiro I, pelo menos um projeto com potencial de oferta tecnológica.

Estas entrevistas com os pesquisadores contaram com ampla receptividade que foi fundamental para que se chegasse paulatinamente à seleção realista das ofertas tecnológicas existentes.

Tais contatos prévios, pela ampla gama de informações estratégicas fornecidas, permitiram sistematizar o processo de coleta de dados referente ao potencial da oferta tecnológica da FIOCRUZ, segundo os procedimentos que seguem.

Um primeiro ponto relevante foi a necessidade de assegurar o sigilo, para proteção da instituição e dos pesquisadores; tal cuidado foi necessário pela ampla divulgação que a veiculação das informações pela Rede de Tecnologia propiciava, exigindo que o conteúdo do material coletado naquelas entrevistas fosse apresentado de forma bastante sucinta. Para tanto, adotou-se o Roteiro III (Anexo III), que gerou a publicação citada na Nota 1.

Ainda com a preocupação de garantir o sigilo e para efetuar a correção dos dados fornecidos, submeteu-se novamente o resumo de cada oferta à apreciação dos pesquisadores para autorização final, antes da divulgação.

O procedimento final foi a constituição de um Arquivo Básico, estratégico e sigiloso, contendo toda a informação primária coletada, o qual vem sendo objeto de inúmeros estudos e pesquisas pela equipe do NEP, no sentido da sistematização e construção de cenários institucionais.

 

3. RESULTADOS

Os resultados obtidos são aqui apresentados de forma sucinta, de modo a permitir uma visão abrangente do potencial da oferta tecnológica das diferentes Unidades Técnicas da instituição.

Dentre os inúmeros cortes possíveis, privilegiamos três variáveis fundamentais na descrição e análise do material coletado: a vinculação institucional, por Unidade Técnica, o tipo de processo ou produto gerado e o tipo de doença a que se destina.

A tabela I resume o levantamento efetuado, apresentando o universo inicial composto de 503 projetos e de 76 ofertas tecnológicas selecionadas em cada Unidade Técnica da FIOCRUZ. Esta tabela aponta, de inicio, para a heterogeneidade das diferentes Unidades da instituição quanto ao seu potencial tecnológico: do total de projetos institucionais, 15% se revelaram com potencial de oferta tecnológica, tendo-se, num extremo, Unidades com claro perfil tecnológico como Bio-Manguinhos, com 100% de projetos selecionados como ofertas tecnológicas e, noutro extremo, Unidades onde, por sua característica de prestação de serviços ou por suas criações recentes, não houve, no momento da pesquisa, identificação deste potencial.

 

 

Nos Quadros I e II é apresentado o quadro geral das ofertas tecnológicas da instituição, distribuídas por tipo, por doenças e por Unidade Técnica.

Quanto ao tipo de oferta, destacam-se em primeiro lugar os reagentes e métodos para diagnóstico, que correspondem a 40 ofertas, num total de 76 (53%); em segundo lugar aparecem 9 ofertas referentes ao controle biológico de insetos e vetores (12%); finalmente, em terceiro lugar, aparecem 8 ofertas referentes a vacinas (10,5%), seguidas de 3 ofertas (4%) com potencialidade tanto para desenvolvimento de reagente para diagnóstico como de vacina.

Embora pouco expressivas do ponto de vista quantitativo, merecem destaque ofertas com possibilidade diversificada de aplicação, como os insumos para engenharia genética, com 3 ofertas (4%), a produção de anticorpos monoclonais por hibridomas, com 2 ofertas (2,6%), o desenvolvimento de novas drogas, com 3 ofertas (4%) e os padrões de referência, com 4 ofertas (5,2%).

Finalmente cabe destacar ofertas isoladas, como o Desenvolvimento de Modelo Animal, com 1 oferta (1,3%) com ampla possibilidade de aplicação em pesquisa e a criação de nova tecnologia de saneamento, também com 1 oferta, cuja importância social é desnecessário enfatizar.

Quanto à distribuição por doenças, destaca-se de início a importância das doenças infecciosas e parasitárias no conjunto da oferta tecnológica da FIOCRUZ, com 65 ofertas num total de 76 (85,5%).

As demais doenças, abrangendo diabetes, intoxicação alimentar por bactéria e diversas doenças não infecciosas e parasitárias, totalizaram 11 ofertas no total de 76 (14,5%).

Nas doenças infecciosas e parasitárias, destacaram-se, em primeiro lugar, as ofertas tecnológicas sem destinação específica quanto à morbidade abrangendo um conjunto variado de doenças "diversas", com 11 ofertas em 65 (17%) em seguida, 10 ofertas voltadas à doença de Chagas (das quais 9 eram reagentes e métodos para diagnóstico), representando 15,5% do total; e, finalmente, 7 ofertas voltadas à esquistossomose (5 das quais relacionavam-se a controle biológico de insetos e vetores), que representavam 11% das ofertas.

 

4. DISCUSSÃO

A ênfase na atuação voltada às doenças infecciosas e parasitárias revela a importância da FIOCRUZ no campo da saúde pública Doenças como a AIDS, a Leishmaniose, a Hanseníase, a Cólera, a Febre Amarela, a Dengue, a Pólio, a Hepatite, o Sarampo, a Meningite Meningocócica, a Febre Tifóide, a Leptospirose, a Rubéola, a Malária, a Peste, a Filariose, as doenças infecciosas perinatais, as infecções bacterianas e as diarréias virais, além das doenças anteriormente mencionadas, vêm sendo objeto de atividades diversificadas de P&D na instituição e constituem, hoje, como procuraremos demonstrar a seguir, um dramático problema de saúde pública em todo o país.

Como se verificou, a grande maioria das ofertas tecnológicas da FIOCRUZ está relacionada a processos e produtos voltados à proteção, diagnóstico e tratamento das principais doenças infecciosas e parasitárias e o atual quadro sanitário brasileiro justifica plenamente esta prioridade institucional. A morbi-mortalidade por estas doenças mantém-se bastante elevada em todo o país, em que pese sua redução nas últimas décadas associada ao intenso processo da industrialização e urbanização.

As doenças infecciosas e parasitárias ainda representam no Brasil a terceira causa de morte com cerca de 10% do total de óbitos, atingindo sobretudo a população infantil. Em 1980, representavam a 2ª causa de morte na faixa de até 1 ano de idade, a 1ª causa na faixa de 1 a 4 anos, a 3ª causa na faixa de 5 a 19 anos, a 5ª causa na faixa de 29 a 49 anos e a 6ª causa na faixa de mais de 50 anos3 . Especificamente no que diz respeito às infecções perinatais, cabe destacar sua importância na mortalidade infantil, representando as causas perinatais como um todo a principal causa de morte em menores de 1 ano no país.

Ao relativo decréscimo ocorrido na mortalidade pelas doenças infecciosas e parasitárias não correspondeu o simultâneo decréscimo na morbidade. Ao contrário, os indicadores de morbidade existentes apontam para o agravamento do quadro sanitário associado a estas doenças em todo o país.

As estatísticas oficiais existentes para o período de 1970/19844, revelam, apesar do sub-registro, o recrudescimento destas doenças no Brasil. Observa-se de início o expressivo aumento de doenças evitáveis por vacina, como a Tuberculose, cuja incidência de 39,4 por 100 mil habitantes em 1970 elevou-se para 66.7 em 1984 e o Sarampo, que passou de 38,3 para 61 por 100 mil, entre outras. Quanto às demais doenças de notificação compulsória, verifica-se tendência semelhante, como a Hanseníase (5,9 para 14,2). as Meningites (2,3 para 13,3), as Leishmanioses Tegumentares (3,6 em 1971 para 4,8 em 1984) e Visceral (0,2 em 1971 para 1,4 em 1984), merecendo, finalmente, destaque a Malária que em 15 anos passou de 56,6 por 100 mil em 1970 para 285,3 em 1984. Quanto à Doença de Chagas, estima-se 20 mil casos novos por ano transmitidos por transfusão de sangue, apresentando elevada incidência em 15 Estados. Merecem ainda destaque inúmeras outras doenças, como a Peste, com 135 casos em 1986; a Febre Amarela, com 17.000.000 de indivíduos expostos em 8 Estados e a Dengue, com 500 mil casos no Rio de Janeiro em 1986 e a Filariose com uma estimativa de 9.000 doentes no Pará e em Pernambuco.

E, finalmente, entre os 8 milhões de brasileiros infectados pelas várias doenças transmissíveis, merece destaque como área de atuação da FIOCRUZ, a AIDS, que vem atingindo cerca de 1.300 pessoas ao ano, em progressão geométrica.

Uma característica importante da pesquisa, desenvolvimento e produção de imunobiológicos no Brasil, em especial de vacinas, é a importância estratégica da participação estatal nesta área, justificada pelo pequeno interesse que o setor tem despertado ao nível da iniciativa privada e por seu caráter estratégico para a saúde pública5.

A Fundação Oswaldo Cruz, juntamente com o Instituto Butantan - instituições nacionais com maior potencial imunobiológico em soros e vacinas - já possuem uma considerável capacitação nesta área, incorporando procedimentos característicos da nova biotecnologia.

Com relação à situação nacional atual, o período previsto para a aplicação industrial das novas técnicas é inferior a 05 anos para as vacinas antipertussis, dupla (antidiftérica e antitetânica), toxóide tetânico e contra Hepatite B. Para as vacinas antipólio, contra Febre Amarela, Malária e Leishmaniose, estima-se um intervalo superior a 05 anos para introdução industrial de novas técnicas.

Não obastante esta potencialidade, ainda se verifica no cenário nacional relativo "hiato" entre o nível de pesquisa laboratorial e o desenvolvimento tecnológico. Na realidade, as articulações do parque produtor com as atividades de P&D ainda são bastante tênues. Uma proposta de criação de um Centro de Biotecnologia para articular pesquisa e produção industrial bem como para absorver tecnologia de ponta está em andamento na FIOCRUZ.

A inexistência de significativas relações de mercado e concorrência empresarial na produção de soros e vacinas no Brasil torna a expansão da atividade biotecnológica no setor praticamente função direta de decisão de política econômica, tecnológica e de saúde.

Além da necessidade de incentivar a capacitação científica e tecnológica nacional na área, inclusive com a promoção de intercâmbios internacionais, adquirem importância-chave as relações internacionais de tecnologia. Vale dizer, um dos elementos mais estratégicos para o desenvolvimento do setor vincula-se à aquisição externa da tecnologia — muitas vezes de grandes empresas multinacionais com interesses comerciais bastante solidificados —, que deve ser negociada adequadamente de modo a permitir a escolha das opções mais favoráveis à realidade nacional, bem como a efetiva absorção e capacitação interna naquela tecnologia transferida. Neste sentido, um esforço conjunto de aquisição, transferência e intercâmbio de tecnologia por parte dos países latino-americanos certamente traria grandes benefícios.

No Brasil, as possibilidades de desenvolvimento biotecnológico no campo dos reativos para diagnóstico são promissoras. Apesar das inúmeras dificuldades existentes, importantes avanços já estão sendo obtidos no preparo e purificação de antígenos por engenharia genética e por síntese química, no desenvolvimento de hibridomas secretores de anticorpos monoclonais e de sondas de DNA para uso diagnóstico, que são as novas biotecnologias que apresentam potenciais de impacto na área.

Uma importante particularidade do setor de reativos para diagnóstico é a convivência, num mesmo mercado, de produtores privados e públicos, bem como a presença de destaque de algumas universidades e instituições de pesquisa na etapa de pesquisa e desenvolvimento. A FIOCRUZ se destaca neste campo.

Vale ressaltar que o desenvolvimento em diagnóstico pode ser facilitado pela proximidade entre a pesquisa e a produção, a partir da articulação das universidades e institutos de pesquisa com o setor produtivo público e privado nacional.

Esta aproximação assume caráter estratégico pela grande dependência de importações vigente no setor, o que eleva consideravelmente os custos, constituindo sério obstáculo para o atendimento adequado das urgentes necessidades dos programas de saúde pública em todo o país.

Além disso, dadas as peculiaridades do quadro sanitário nacional, esta dependência de importações pode implicar na adoção de metodologias inadequadas à nossa realidade e mesmo na não disponibilidade de reativos básicos para doenças tropicais com grande incidência no Brasil, como é o caso da Doença de Chagas. Isto porque a oferta mundial depende majoritariamente das grandes multinacionais farmacêuticas que atuam principalmente nos mercados dos países desenvolvidos que possuem necessidades radicalmente distintas das dos países latino-americanos.

Assim, é de fundamental importância incentivar a capacitação e desenvolvimento de reativos adequados à realidade econômica, social e epidemiológica do Brasil. As necessidades sociais — que configuram um importante mercado potencial — são inquestionáveis. Somente os diagnósticos onde a FIOCRUZ atua, relevantes para as doenças transmissíveis por transfusão de sangue (Doença de Chagas, Hepatite, Malária e AIDS) representam um mercado vigoroso, na medida em que ocorrem no Brasil cerca de 5 milhões de transfusões anuais com controle de qualidade ainda bastante precário. Se ainda adicionarmos as necessidades diagnósticas para diarréia em criança, Febre Amarela, Dengue, Leishmaniose, entre outras doenças, teremos claro o grande potencial da FIOCRUZ e a importância estratégica do desenvolvimento nacional neste setor como suporte a uma efetiva política de saúde pública.

Além de fornecer uma visão quantitativa e qualitativa do potencial e da oferta tecnológica da FIOCRUZ, este levantamento acabou suscitando, pela relação de estreita colaboração estabelecida com os pesquisadores e tecnólogos, inúmeras questões de natureza institucional e política, relativas às condições em que esta oferta se realiza, como veremos a seguir.

Relacionadas às formas de articulação entre pesquisa e tecnologia, à administração e à propriedade industrial, entre outras, tais questões não se limitaram aos entraves institucionais internos, o que coloca a necessidade de seu equacionamento no âmbito de uma política científica e tecnológica com prioridade para o desenvolvimento social em saúde no país.

Constatou-se que diversas pesquisas estão atrasadas e, às vezes, praticamente paralisadas, em decorrência das dificuldades burocráticas dos órgãos governamentais de comércio exterior para a liberação de reagentes, equipamentos e outros insumos estratégicos para as pesquisas em desenvolvimento.

Obviamente, a estes problemas referidos pelos pesquisadores, acrescenta-se a falta de divisas da nação, como conseqüência da crise do balanço de pagamentos, a qual, além de gerar dificuldades na disponibilidade de moeda estrangeira para importar insumos essenciais às pesquisas, faz com que as perspectivas futuras de acesso das pesquisas aos bens e serviços importados não sejam nada promissoras.

Tendo em conta esta realidade, a equipe do NEP propõe a discussão de estratégias de curto e longo prazos que permitam a remoção dos entraves citados:

  1. a curto prazo, deve-se estabelecer diretrizes institucionais que permitam encaminhar canais de importação mais ágeis e desburocratizados, buscando-se, de um lado, a articulação com organismos públicos habituados a transações com o exterior e, de outro, o estabelecimento de canais diretos de importações;
  2. a longo prazo, considerando-se o provável prolongamento das restrições externas, deve-se realizar gestões junto aos organismos governamentais para estabelecimento de programa de substituição de importações por produção local de equipamentos e reagentes largamente utilizados em pesquisas. No campo dos reagentes, poder-se-ia pensar na hipótese de um programa integrado de Biotecnologia e de Química Fina (áreas prioritárias da política governamental atual) no sentido de promover a produção de reagentes estratégicos atualmente importados (meios de cultura, soros, enzimas, peroxidase, etc.).

Identificou-se, pela crescente importância que vêm adquirindo na FIOCRUZ os campos da Biotecnologia e da Química Fina na geração de processos e produtos comercializáveis, a necessidade de definição de normas institucionais quanto à propriedade intelectual, em especial as que assegurem os privilégios quanto à propriedade industrial ( marca e patentes). Tais normas deverão:

  1. indicar condições de participação, nos resultados do processo de geração de tecnologia na instituição, das Unidades Técnicas e dos profissionais envolvidos;
  2. estabelecer mecanismos de proteção às inovações efetuadas na instituição, tanto ao nível nacional, quanto internacional (registro e patenteamento de inovações, normas de sigilo, etc.).

Com a finalidade de avançar neste particular, o NEP promoveu em abril de 1987 contrato entre a FIOCRUZ e o INPI, para acesso ao Banco de Patentes do Programa de Fornecimento Automático de Informações Tecnológicas (PROFINT). O referido contrato já permite o acesso, pela comunidade da FIOCRUZ, a um acervo de cerca de 18 bilhões de informações sobre patentes, registradas em todo o mundo, bem como os 30 mil dados novos em média, por ano.

No que diz respeito especificamente ao levantamento da oferta tecnológica, aqui apresentado, cabe ressaltar que muitas das ofertas identificadas não foram patenteadas por força da atual legislação nacional. No entanto, é importante lembrar que há a possibilidade de realização deste patenteamento no exterior, em países onde não existem tais restrições, através do INPI.

O debate acerca da política de propriedade industrial nos países em desenvolvimento, principalmente nos aspectos relacionados aos setores tecnologicamente de ponta, como os acima mencionados, tem sido bastante polêmico.

De um lado, alega-se que a concessão de patentes é algo imprescindível ao desenvolvimento tecnológico nacional, pois garante a proteção às atividades dos agentes responsáveis pela evolução da capacitação tecnológica nacional. De outro lado, existe a posição, já disseminada, de que o patenteamento em áreas cuja tecnologia passa por um processo revolucionário só favorece aqueles agentes já capacitados, em geral localizados ou provenientes dos países desenvolvidos. Ou seja, a incapacidade nacional de competir nestas áreas de fronteira, recomendaria uma política prudente de propriedade industrial que evite o surgimento de monopólios que obstaculizem a capacitação tecnológica local.

Nos campos mencionados, relacionados à saúde humana, estas questões são ainda mais complexas, pois as atividades ligadas à saúde são, em geral, consideradas em particular por envolverem aspectos de natureza pública, social ou mesmo de segurança nacional6.

Em franco contraste com o potencial configurado na coexistência no espaço institucional da FIOCRUZ, de atividades diversificadas da pesquisa à produção industrial, observou-se significativa desarticulação entre suas várias Unidades Técnicas.

Maior articulação deve ser procurada, avaliando-se o possível aproveitamento das complementariedades existentes, em especial nas seguintes Unidades:

  1. departamento de pesquisa do IOC com Bio-Manguinhos;
  2. articulação dos Centros Regionais com os Departamentos do IOC e Bio-Manguinhos;
  3. participação de Far-Manguinhos num programa de desenvolvimento de insumos químicos estratégicos para as outras Unidades da Fundação;
  4. articulação do INCQS com as demais Unidades científicas e tecnológicas da Fundação.

Atualmente a FIOCRUZ vem se defrontando, de forma crescente, com diversas solicitações públicas e privadas de articulação tecnológica com o setor industrial. Torna-se, portanto, necessário o estabelecimento de normas e mecanismos institucionais que definam as condições para:

  1. comercialização de produtos com o setor privado;
  2. prestação de serviços ao poder público e ao setor privado (controle de qualidade, microscopia eletrônica, etc.);
  3. transferência da tecnologia desenvolvida na instituição para Unidades produtivas públicas e privadas.

Notou-se, em diversos laboratórios visitados, carências acentuadas de equipamentos e de recursos humanos:

  1. quanto aos equipamentos, uma solução sugerida por vários pesquisadores foi a de que a Presidência da FIOCRUZ passasse a promover a criação de Laboratórios Centrais, equipados com equipamentos estratégicos e de alto custo que seriam de uso comum pelos laboratórios ou departamentos localizados proximamente, a exemplo do Laboratório Central do Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães;
  2. com relação aos recursos humanos, além da pequena disponibilidade de técnicos e pesquisadores, foram referidas inúmeras distorções de cargos e funções e nos critérios de seleção de pessoal de nível técnico e superior. O novo Plano de Cargos e Salários que vem sendo implementado pela atual administração, deverá criar formas de absorção e de participação mais próximas das Unidades e dos Centros Regionais.

Finalmente, foram apontados problemas de caráter administrativo a serem avaliados em conjunto com a administração da FIOCRUZ para a sua superação, a saber:

  1. necessidade de maior participação das Unidades e Centros Regionais na definição do orçamento da FIOCRUZ;
  2. morosidade burocrática (liberação de recursos, compras, atraso no pagamento aos Centros Regionais, etc).

A dificuldade de acesso às informações disponíveis na Biblioteca Central da FIOCRUZ, localizada no campus de Manguinhos, foi apontada com ênfase nos Centros Regionais. Torna-se, portanto, necessário assegurar o acesso dos Centros Regionais às informações cientificas de interesse.

 

5. CONCLUSÕES

Os dados apresentados ao longo deste trabalho demonstram o enorme esforço da FIOCRUZ no sentido de direcionar sua capacidade científica e tecnológica para a mudança do dramático quadro sanitário brasileiro.

O desenvolvimento de processos e produtos diversificados nas várias Unidades Técnicas da instituição, especialmente no campo das vacinas, reagentes para diagnóstico, novas drogas e padrões de referência, entre outros, indica sua grande vitalidade, que se traduz na capacidade de absorção criativa e geração de novos conhecimentos em áreas de fronteira.

Sua característica de principal órgão de ciência e tecnologia em saúde no país tem estimulado demandas crescentes da política governamental e da opinião pública, no sentido de resposta rápida a problemas emergenciais, cuja dimensão é, muitas vezes, imprevisível.

Problemas como, entre outros, a Febre Amarela e a AIDS, para dar exemplos recentes, vêm requerendo da FIOCRUZ grande flexibilidade operacional para expansão e criação, a curtíssimo prazo, de novas linhas de produção, controle de qualidade, desenvolvimento experimental e investigação, o que demanda a aquisição de equipamentos adequados e contratação de pessoal especializado.

Esta peculiaridade do complexo FIOCRUZ requer política de desenvolvimento institucional com visão estratégica e gestão tecnológica de suas atividades, criando mecanismos de estímulo e proteção às inovações geradas internamente.

Para tanto, faz-se necessário, ao nível da política governamental, romper as amarras que têm atado, especialmente nas duas últimas décadas, o desenvolvimento científico e tecnológico dos laboratórios oficiais de saúde pública. Seu esvaziamento, incompatível com a condição do país de 8ª economia mundial, certamente vem contribuindo para a atual dependência nacional em setores estratégicos para a saúde da população brasileira.

A característica essencial da FIOCRUZ é sua dimensão pública, não se configurando, portanto, como empresa produtiva, voltada para o mercado. É vinculada ao Estado, através do Ministério da Saúde, e seu principal cliente é o próprio Estado.

Parcela considerável de sua receita operacional ("diretamente arrecadada") provém de recursos do Programa Nacional de Imunizações para compra de imunobiológicos, através do repasse aos demais laboratórios e à produção interna.

A instituição está, portanto, engajada no esforço nacional em direção à autonomia progressiva no campo dos imunobiológicos e reagentes, em boa parte importados, que são indispensáveis para os programas de controle de doenças transmissíveis formulados pelo Ministério da Saúde.

No entanto, este esforço da FIOCRUZ no sentido da expansão das atividades nas suas diferentes áreas de atuação não tem sido acompanhado da necessária prioridade e injeção de recursos por parte dos órgãos federais.

Ao contrário, a instituição tem se ressentido - da mesma forma que os demais laboratórios oficiais - das restrições que a política governamental de contenção do gasto público tem imposto às suas atividades, identificadas pelo próprio governo como prioritárias e de segurança nacional7.

Além do estabelecimento de tetos orçamentários e de medidas de contenção salarial que propiciaram, até bem pouco tempo, a evasão de inúmeros pesquisadores e tecnólogos em áreas estratégicas, o recente decreto 94.667 de 23 de julho deste ano impede a continuidade e desenvolvimento de boa parte das atividades institucionais mencionadas ao longo deste trabalho.

Ao proibir contratações ou admissões de pessoal a qualquer titulo nas empresas estatais, o referido decreto traz novamente à baila a discussão das distorções e prejuízos que uma política governamental de contenção indiscriminada do gasto público em setores estratégicos para o bem-estar da população brasileira, como a saúde pública, pode acarretar para uma instituição como a FIOCRUZ.

A série histórica da evolução do orçamento da instituição nos últimos anos evidencia as conseqüências de tais restrições. É possível identificar clara tendência da diminuição da participação do Tesouro no financiamento de suas atividades, que decrescem - em apenas um ano - de 42% do orçamento de 1985 para 36% em 1986.

A este decréscimo correspondeu a elevação no mesmo período da participação de outras fontes (58% para 64%), que incluem os recursos diretamente arrecadados, provenientes principalmente do Programa Nacional de Imunizações, para compra de imunobiológicos, através do repasse aos demais laboratórios e à produção interna8.

É importante ressaltar ainda que a maior parte dos recursos de terceiros captados pela FIOCRUZ provém de financiamentos a fundo perdido, obtidos através de convênios com instituições financeiras nacionais e internacionais para o desenvolvimento de projetos prioritários. Apenas uma parcela reduzida destes financiamentos é obtida através de empréstimos, limitados a obras financiadas pelo Fundo de Apoio Social da Caixa Econômica Federal.

Desta forma, pode-se concluir que se, como foi amplamente demonstrado9, a participação de "estatais típicas de governo" como a FIOCRUZ (conceito que as diferencia de empresas estatais produtivas) no chamado "déficit camuflado" é ínfima, o peso da própria FIOCRUZ, nesse conjunto, é praticamente inexistente, o que comprova o caráter socialmente injusto dos cortes efetuados.

A importância para a nação do desenvolvimento e da expansão da FIOCRUZ em programas prioritários de saúde pública impõe uma revisão da política adotada, rompendo com o círculo vicioso existente, em que as restrições do Tesouro levam à independência de terceiros, sujeita, por sua vez, a teto, cortes e outras medidas de contenção.

O quadro até aqui apresentado aponta, portanto, para a urgência de uma política governamental que assegure excepcionalidade e tratamento diferenciado a instituições como a FIOCRUZ, evitando os prejuízos sociais resultantes da fixação de limites de dispêndio e dos cortes horizontais que vêm sendo aplicados indistintamente às empresas estatais.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Rede de Tecnologia do Rio de Janeiro - Ofertas Tecnológicas do Rio de Janeiro, 1986. Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Prefeitura do Rio de Janeiro.        

2. CIS/FIOCRUZ - Brasil: Indicadores de Mortalidade, 1986.        

3. IBGE, Anuário Estatístico do Brasil, 1985.        

4. IBGE, Indicadores Sociais, Tabelas Selecionadas; Vol. 2, 1984.        

5. NEP/FIOCRUZ - Biotecnologia em Saúde no Brasil: Limitações e Perspectivas, Série Política de Saúde nº 3, Ministério da Saúde/Fundação Oswaldo Cruz.        

6. FIOCRUZ - Relatório Anual de Atividades - 1985 e 1986.        

 

 

(*) Trabalho apresentado no XII Simpósio Nacional de Pesquisas de Administração em Ciência e Tecnologia. PACTo/IA/FEA/USP, São Paulo 19 a 21 de outubro, 1987.
1 O resultado deste levantamento inicial está incluído no Catálogo "Ofertas Tecnológicas do Rio de Janeiro", 1986, para o qual a FIOCRUZ contribuiu diretamente, através do NEP.
2 Vide a descrição mais detalhada do processo adiante.
3 Fonte: SNABS, Ministério da Saúde - Estatísticas de Mortalidade, 1982. Extraída de CIS/ FIOCRUZ, Brasil: Indicadores de Mortalidade, 1986.
4 IBGE, Anuário Estatístico do Brasil, 1985 e IBGE, Indicadores Sociais, Tabelas Selecionadas, Vol. 2, 1984.
5 As considerações apresentadas neste item, foram extraídas de documento anterior produzido pela equipe do NEP, Biotecnologia em Saúde no Brasil: Limitações e Perspectivas, Série Política de Saúde nº 3, Ministério da Saúde, Fundação Oswaldo Cruz.
6 Os comentários aqui apresentados sobre a questão da propriede industrial foram extraídos do documento anteriormente referido, elaborado pela equipe do NEP, Série Política de Saúnº 3, op. cit.
7 Uma análise detalhada das aplicações de tais restrições foi realizada em 1985 pela equipe da então Superintendência de Planejamento da FIOCRUZ, no documento intitulado "Fundação Oswaldo Cruz: as distorções de seu controle como estatal".
8 As informações aqui apresentadas foram obtidas a partir dos Relatórios Anuais de Atividades da Instituição.
9 Ver "Fundação Oswaldo Cruz": as distorções de seu controle como estatal", op. cit.

 

 

ANEXO I - ROTEIRO PARA LEVANTAMENTO DE PROJETOS E PROCESSOS (ROTEIRO I)

• Identificação:
• Denominação
• Objetivos:
• Pesquisador(es) responsável(eis):
• Equipe envolvida:
• Área de atuação do Projeto:
• Duração:
• Outros Projetos da equipe:
• Financiamento:
      • órgão:
      • valor:
       • há quanto tempo vem obtendo financiamento:
• Propriedade dos resultados:
      • a quem pertence:
      • registro ou patente requerida nº:
• Divulgação:
      • resultados divulgados (tese, livro, revista, congresso, etc.):

 

ANEXO II - ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA LEVANTAMENTO DA OFERTA TECNOLÓGICA (ROTEIRO II)

1. DENOMINAÇÃO:
2. ANTECEDENTES (início/origem/motivação):
3. CARACTERIZAÇÃO:
      • Doença
      • Agente etiológico ou processo
      • Grupo pesquisado
      • Área geográfica
      • Disciplinas envolvidas
4. DESCRIÇÃO E MÉTODO
5. APLICABILIDADE
      • Estágio de desenvolvimento
      • Principais aplicações
      • Principais vantagens
      • Grau de inovação
      • Grau de dependência (insumos/tecnologia)
      • Tempo previsto para término da pesquisa
      • Tempo previsto para aplicação industrial
6. COMERCIALIZAÇÃO
      • Usuário da tecnologia
      • Consumidor:
      • Unidade produtiva:
      • Estimativa do mercado (potencial):
      • Custo do desenvolvimento industrial:
      • Fontes alternativas dessa tecnologia:
      • Contatos já realizados (acordos, transferência, etc.):
7. PROPRIEDADE INDUSTRIAL
      • Direitos sobre o resultado
      • Patente (nacional/internacional)
      • Divulgação/interesse no sigilo
8. CONTATO

 

ANEXO III - FICHA RESUMO PARA CADA UMA DAS OFERTAS TECNOLÓGICAS

CENTRO DE PESQUISA:
LABORATÓRIO:
DENOMINAÇÃO DA OFERTA TECNOLÓGICA:
DESCRIÇÃO: Etapas da pesquisa e descrição do produto final. (máximo de 16 linhas)
PRINCIPAIS VANTAGENS (máximo de 8 linhas)
PRINCIPAIS APLICAÇÕES (máximo de 8 linhas)
ESTÁGIO DE DESENVOLVIMENTO: Estágio da pesquisa e prazo para desenvolvimento final do produto. (máximo de 4 linhas)
PESQUISADOR RESPONSÁVEL:
CONTATO:

 

ANEXO IV - UNIDADES TÉCNICAS DA FIOCRUZ

• Instituto Oswaldo Cruz (IOC).
• Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos).
• Instituto de Tecnologia em Fármacos (FAR-Manguinhos).
• Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS).
• Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP).
• Centro de Pesquisas René Rachou (CPq RR).
• Centro de Pesquisas Gonçalo Moniz (CPq GM).
• Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães (CPq AM).
• Instituto Fernandes Figueira (IFF).
• Casa de Oswaldo Cruz (COC).
• Superintendência de Informação Científica (SIC).
• Centro de Informação em Saúde (CIS).
• Centro Biomédico Gaspar Viana.
• Politécnico da Saúde.

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br