ARTIGO ARTICLE

 

Desigualdades sócio-econômicas do baixo peso ao nascer e da mortalidade perinatal no Município do Rio de Janeiro, 2001

 

Socioeconomic inequalities and low birth weight and perinatal mortality in Rio de Janeiro, Brazil

 

 

Carla Lourenço Tavares de AndradeI; Célia Landmann SzwarcwaldII; Silvana Granado Nogueira da GamaIII; Maria do Carmo LealIII

IDepartamento de Administração e Planejamento em Saúde, Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil
IIDepartamento de Informações em Saúde, Centro de Informação Científica e Tecnológica, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil
IIIDepartamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em Saúde, Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO  

Desigualdades sócio-econômicas na mortalidade infantil precoce têm sido evidenciadas no Brasil, indicando que o maior risco de morte se relaciona com o nível sócio-econômico das mães. Apontam-se, neste trabalho, as desigualdades do baixo peso ao nascer e da mortalidade perinatal no Município do Rio de Janeiro, discutindo-se a adequação das principais medidas de desigualdades em saúde propostas na literatura. Como fonte de informações, utilizam-se os dados coletados em inquérito realizado em cerca de dez mil parturientes nas primeiras 48 horas após o parto, em maternidades públicas e privadas da cidade. Considerando o grau de instrução da mãe e a renda do chefe da família como indicadores do nível sócio-econômico, bem como o risco atribuível populacional relativo e o coeficiente angular de desigualdade como medidas de desigualdade em saúde, constata-se grande gradiente sócio-econômico da proporção de baixo peso ao nascer e, especialmente, da taxa de mortalidade perinatal. A associação persistente entre os fatores sócio-econômicos e os resultados adversos da gravidez reflete, pelo menos em parte, a ineficácia do sistema de saúde em minorar as desigualdades da saúde perinatal no Rio de Janeiro.  

Mortalidade Infantil; Baixo Peso ao Nascer; Fatores Sócio-Econômicos


ABSTRACT  

Socioeconomic inequalities in early infant mortality have been evidenced in Brazil, with a greater mortality risk associated with the mother's socioeconomic status (SES). The aim of this paper is to identify socioeconomic inequalities in relation to low birth weight and perinatal mortality in the City of Rio de Janeiro, Brazil, discussing the appropriateness of the main health inequality indexes proposed in the international literature. As the information source, we use data collected in a survey of approximately 10,000 mothers selected for interview within 48 hours after delivery in public and private hospitals in the city. Using educational level and head of household's income as indicators of SES, as well as population attributable risk and slope index of inequality as health inequality measures, the results show a steep socioeconomic gradient in the proportion of low birth weight, and especially in the perinatal mortality rate. The persistent association between socioeconomic indicators and adverse results in pregnancy indicates (at least partially) the health system's inefficacy in diminishing perinatal health inequalities in Rio de Janeiro.  

Infant Mortality; Low Birth Weight Infant; Socioeconomic Factors


 

 

Introdução  

O estudo sistematizado das desigualdades em saúde tomou maior vulto a partir da publicação do Black Report, quando Townsend & Davidson 1 mostraram grandes disparidades sociais na situação de saúde da população britânica.

Desde então, diversos pesquisadores têm se dedicado a analisar as diferenças nas condições de saúde ou no acesso aos serviços de saúde de acordo com a partição da população por nível sócio-econômico, seja este mensurado por renda, educação, ocupação ou posição na hierarquia social 2,3,4,5,6,7,8,9,10. Todos apontaram para um forte e persistente gradiente sócio-econômico em saúde, com as classes menos favorecidas sempre em desvantagem em relação às mais ricas.

Evidências recentes não só de persistência, mas também de aumento das desigualdades em saúde, em vários países, ao longo do tempo, têm chamado mais ainda a atenção sobre o tema 11,12,13.

Apesar das disparidades presentes, historicamente, na nossa sociedade, que se manifestam das mais diferentes formas, a investigação das desigualdades em saúde na população brasileira não tem merecido a atenção necessária, tendo em vista a importância da questão. Embora já tenha despertado o interesse de alguns pesquisadores 14,15, a mensuração das desigualdades em saúde no Brasil ainda carece de maior sistematização e estudo.

Especificamente no tocante à mortalidade infantil, os diversos estudos realizados no País, consistente e persistentemente, têm demonstrado padrões de desigualdades que se expressam entre regiões mais e menos desenvolvidas 16, entre as áreas urbanas e rurais 17 e entre os diferentes níveis de pobreza no âmbito das grandes cidades 18.

Quanto à mortalidade infantil precoce, desigualdades sócio-econômicas também têm sido evidenciadas, indicando que maior risco de morte se relaciona com o nível sócio-econômico das mães. Pesquisando fatores de risco para a mortalidade perinatal em Pelotas, Rio Grande do Sul, Menezes et al. 19 mostraram que, para as famílias com renda abaixo de um salário mínimo, a mortalidade perinatal foi três vezes maior quando comparada com a das famílias de maior renda. De forma semelhante, Almeida & Mello-Jorge 20, em investigação no Município de Santo André, São Paulo, mostraram que o nível de escolaridade inferior ao ensino fundamental completo foi um fator de risco relevante para baixo peso ao nascer.

Em estudo realizado no Município do Rio de Janeiro sobre a mortalidade neonatal precoce, Andrade & Szwarcwald 21 encontraram variações espaciais importantes para o período 1995-1996, com a presença de aglomerados de taxas elevadas. O excesso de óbitos foi explicado por um conjunto de problemas que se referem, sobretudo, às características sócio-econômicas das mães, refletidas tanto na ausência de acompanhamento pré-natal, como no acesso dificultado à assistência ao parto.

No que se refere às medidas de desigualdades em saúde, diversos métodos podem ser utilizados. As vantagens e desvantagens das distintas estratégias metodológicas têm sido discutidas na literatura especializada recente 7,22,23.

O projeto "Estudo da Morbi-mortalidade e Atenção Peri e Neonatal no Município do Rio de Janeiro" trouxe a oportunidade de estudar as desigualdades sócio-econômicas da mortalidade perinatal e do baixo peso ao nascer neste município, sob a ótica individual. Utilizando-se o grau de escolaridade da mãe e a renda do chefe da família como indicadores do nível sócio-econômico, objetiva-se, no presente trabalho, discutir a adequação das principais medidas de desigualdade em saúde propostas na literatura para mensurar as desigualdades da saúde perinatal no Município do Rio de Janeiro.  

 

Material e método  

A fonte de informações utilizada neste trabalho foi composta pelos dados coletados na pesquisa "Estudo da Morbi-mortalidade e Atenção Peri e Neonatal no Município do Rio de Janeiro", por inquérito realizado em cerca de dez mil parturientes nas primeiras 48 horas após o parto, em maternidades públicas e privadas do Município do Rio de Janeiro.

A amostragem foi estratificada, agrupando-se os estabelecimentos de saúde em três estratos: maternidades municipais e federais, maternidades estaduais, militares, filantrópicas e privadas conveniadas com o SUS e maternidades privadas não conveniadas com o SUS. Em cada estrato, foi selecionada uma amostra de, aproximadamente, 10% de parturientes do número previsto de partos no ano 2000 em todos os hospitais de cada estrato, exceto naqueles com menos de duzentos partos por ano.

Como variáveis sócio-econômicas, foram utilizados o grau de escolaridade da mãe e a renda do chefe do domicílio, que foi aqui definida como sendo o maior valor entre a renda da mãe e a renda do pai, quando ambos eram conhecidos; igual a um dos dois valores, quando apenas a renda do pai ou da mãe era conhecida, e ignorada, no caso da renda do pai e da mãe não informados.

O grau de escolaridade da mãe foi categorizado em: analfabetas ou primeira a quarta série do ensino fundamental; quinta a oitava série do ensino fundamental; ensino médio e superior. A variável renda foi categorizada em: menor ou igual a R$ 200,00; de R$ 201,00 a R$ 400,00; de R$ 401,00 a R$ 1.000,00; de R$ 1.001,00 a R$ 2.000,00 e R$ 2.001,00 e mais.

Foram considerados como desfechos adversos: o baixo peso ao nascer (< 2.500g); o óbito perinatal (morte entre a 22a semana de gestação até o sétimo dia após o parto) e a ocorrência de um dos dois eventos, ou seja, baixo peso ao nascer ou óbito perinatal. A análise restringiu-se às gestações únicas. Os óbitos perinatais foram identificados valendo-se do preenchimento de um resumo de alta que era feito para cada recém-nascido por ocasião da alta, transferência ou do óbito.

Para mensurar as desigualdades sócio-econômicas da mortalidade perinatal e do baixo peso ao nascer, foram utilizadas as seguintes medidas:

• Diferença relativa entre as taxas (%) - Calculada como a proporção (%) representada pela diferença dos valores do indicador de saúde encontrados nos dois grupos sócio-econômicos extremos em relação ao indicador no nível sócio-econômico inferior.

• Razão de taxas - Definida como a razão entre a taxa de mortalidade do grupo de pior nível sócio-econômico e a taxa do grupo de melhor nível sócio-econômico.

• Risco atribuível populacional relativo - Definida como a presumível redução proporcional na mortalidade geral caso todos os indivíduos estivessem expostos ao mesmo risco de mortalidade do grupo de melhor nível sócio-econômico. O método de cálculo deste indicador encontra-se descrito na Figura 1.

• Índice de dissimilaridade relativo (%) - Definido como o percentual de casos que devem ser redistribuídos para obter-se a mesma taxa de mortalidade em todos os grupos sócio-econômicos. O método de cálculo desta medida também está descrito na Figura 1.

• Coeficiente angular de desigualdade - Definido como o coeficiente angular da regressão linear entre o indicador de saúde e o nível sócio-econômico, levando em consideração o tamanho de cada grupo sócio-econômico.

• Índice de concentração - Desenvolvido como um aprimoramento do coeficiente de Gini, incorpora a dimensão sócio-econômica na construção da curva de Lorenz 23. O índice é definido como o dobro da diferença entre as áreas limitadas, respectivamente, pela diagonal (reta de 45o) e a curva de Lorenz.

 

 

Na presente análise, para a construção da curva de Lorenz, primeiramente, foram obtidos os valores dos decis de renda do chefe do domicílio. A partir das categorias compostas pelos decis de renda, foram calculadas as proporções acumuladas dos desfechos adversos. As áreas limitadas pela curva de Lorenz foram estimadas por aproximações das áreas dos trapézios correspondentes, compostos pela partição em decis. A diferença entre as áreas limitadas pela diagonal principal e a curva de Lorenz resultou no índice de concentração.

Para calcular o coeficiente angular de desigualdade, ajustou-se um modelo de regressão logística usando o desfecho adverso baixo peso ao nascer ou óbito perinatal como variável dependente e, como variável independente, a renda do chefe do domicílio. Para visualização do gradiente social, elaborou-se um gráfico representando os valores preditos das probabilidades do desfecho adverso por renda.

 

Resultados  

Pelos dados dispostos na Tabela 1, evidenciam-se as grandes desigualdades do baixo peso ao nascer (BPN) e da mortalidade perinatal, segundo as categorias da variável grau de escolaridade da mãe. As proporções mais elevadas são encontradas para a categoria analfabetas ou primeira à quarta série do ensino fundamental e para quinta à oitava série do ensino fundamental, e as menores, para as mães que têm nível superior.

 

 

Com relação à renda do chefe da família (Tabela 2), o gradiente por nível sócio-econômico ainda é mais nítido, com a proporção de ocorrência dos desfechos adversos decrescendo a cada nível de renda. Para baixo peso ao nascer, por exemplo, a proporção varia de 10,73%, para a categoria de renda inferior a R$ 200,00, a 5,88% para a categoria de renda superior a R$ 2.000,00. Cabe destacar que comparando os dois desfechos, BPN e mortalidade perinatal, esta última apresenta gradiente ainda mais acentuado, com proporção que se reduz a quase zero (0,4) na categoria superior de renda.

 

 

As Tabelas 3 e 4 mostram os resultados obtidos no cálculo das diferentes medidas de desigualdade por aplicação aos dados deste estudo. Considerando o grau de escolaridade da mãe (Tabela 3), a diferença relativa de 64% entre as taxas obtidas na categoria de menor nível de instrução e as obtidas na de maior nível mostra a enorme desigualdade da mortalidade perinatal no Rio de Janeiro. De forma semelhante, a razão de taxas entre a categoria de menor escolaridade e a de maior escolaridade, atingindo valor próximo a 3, indica o grande diferencial sócio-econômico. Embora todas as medidas apresentadas mostrem que a mortalidade perinatal apresenta maior desigualdade do que o baixo peso ao nascer, as desigualdades para este indicador são também bastante relevantes.

O risco atribuível populacional relativo mede a redução na proporção do desfecho adverso se todas as mães experimentassem o melhor nível sócio-econômico. No caso do grau de escolaridade, 51,05% dos óbitos perinatais poderiam ser evitados se todas as mães tivessem o nível superior de instrução.

O índice de dissimilaridade relativo é uma medida similar, porém, por considerar a média populacional como padrão, seus resultados são menos enfáticos. No caso do baixo peso ao nascer, este índice é de 17,01%, e de 28,49%, para a mortalidade perinatal.

Considerando renda do chefe da família como indicador do nível sócio-econômico, os resultados apresentados na Tabela 4 evidenciam de forma ainda mais acentuada o gradiente de desigualdade. A diferença relativa entre as taxas de mortalidade perinatal é de 76,88%, e de 45,20%, para baixo peso ao nascer. Chama-se a atenção para o fato de que a razão de taxas é de 4,33 para a mortalidade perinatal. Considerando o risco atribuível populacional relativo, 70,68% dos óbitos não ocorreriam se todas as mães tivessem o melhor nível de renda.

As curvas de Lorenz correspondentes ao cálculo do índice de concentração para os desfechos adversos baixo peso ao nascer e mortalidade perinatal são mostradas, respectivamente, nas Figuras 2 e 3. Se não existisse desigualdade em saúde, os gráficos coincidiriam com a diagonal (linha pontilhada). Corroborando a grande desigualdade sócio-econômica para a mortalidade perinatal já detectada pelas outras medidas, nota-se que as 50% mães mais pobres detêm 64% dos óbitos perinatais, enquanto as 10% mais ricas, somente 2,5% desses óbitos. O índice de concentração para BPN é de 0,1170 e para a mortalidade perinatal é de 0,1642.

 

 

 

 

Na Figura 4, é apresentado o coeficiente angular de desigualdade para o desfecho adverso definido pela ocorrência de baixo peso ao nascer ou ocorrência de óbito perinatal. Esse coeficiente indica claramente o gradiente social presente nos dados, com a probabilidade de o desfecho ir decrescendo continuamente à medida que a renda do chefe da família aumenta. Por exemplo, no caso de renda igual a R$ 1.000,00, a probabilidade predita de ocorrência do desfecho está em torno de 8%, enquanto para o valor de renda de R$ 4.000,00, a probabilidade predita é de cerca de 5%. Para valores de renda acima de R$ 15.000,00, observa-se uma tendência de estabilidade de ocorrência do desfecho, em patamar próximo de zero.

 

 

Discussão  

Considerando tanto o grau de escolaridade da mãe, quanto a renda do chefe da família como variáveis sócio-econômicas, os resultados deste trabalho evidenciaram pronunciadas desigualdades na saúde perinatal, no Município do Rio de Janeiro, no ano de 2001.

Uma das maneiras mais utilizadas para medir o nível sócio-econômico é através da renda, individual ou familiar, que é relacionada à situação corrente do indivíduo. Diferentemente da renda, o grau de escolaridade não depende das condições atuais, sendo também um importante indicador social por ser relacionado ao nível de conhecimento e ao estado de cognição pessoal. Pesquisadores americanos como Pappas et al. 12 introduziram o uso das variáveis renda e grau de escolaridade conjuntamente para a classificação de posição social ou nível sócio-econômico. Já investigadores britânicos utilizam majoritariamente a variável ocupação 24,25, ao passo que os europeus tendem a usar a ocupação juntamente com o grau de escolaridade 26,27.

No presente estudo, renda e grau de escolaridade foram os indicadores escolhidos para detectar as desigualdades dos resultados adversos do nascimento. Embora ambos fossem capazes de evidenciar a desigualdade em saúde, a renda foi o indicador que captou mais pronunciadamente as desigualdades do baixo peso ao nascer e da mortalidade perinatal.

Dentre os desfechos adversos considerados, a mortalidade perinatal foi a que, nitidamente, mostrou as maiores disparidades, para qualquer das medidas de desigualdades em saúde aqui consideradas.

Em relação às distintas medidas de desigualdade em saúde, algumas delas podem ser consideradas simples, já que se baseiam, exclusivamente, em calcular razões entre taxas de mortalidade ou diferenças nas taxas de mortalidade em grupos situados em pontos extremos das sociedades 1. Todavia, as medidas de desigualdades em saúde baseadas apenas na comparação de dois grupos extremos não permitem estabelecer se existe um gradiente social contínuo no estado de saúde da população.

Já as medidas mais sofisticadas utilizam a ordenação dos valores do nível sócio-econômico, medido como uma variável contínua ou ordinal, de modo a relacionar quantitativamente a variação dos indicadores de saúde com a variação do nível sócio-econômico, como, por exemplo, o coeficiente angular da desigualdade ou outras medidas baseadas em procedimentos de regressão 8.

O índice de concentração igualmente reflete as experiências da população como um todo e mede as variações conjuntas do desfecho com o nível sócio-econômico. Seu uso é desvantajoso somente quando se comparam populações distintas, pois este indicador utiliza percentis de renda, que podem ser bem diferentes, dependendo das distribuições de renda das populações sob análise.

Outras medidas de desigualdade em saúde integram o elenco de medidas utilizadas habitualmente pela Epidemiologia para avaliar diferenças nos riscos de morte ou de doença, como o risco atribuível populacional 22. A utilização dessa medida é preferível à utilização do índice de dissimilaridade, já que este último capta as diferenças da saúde por nível sócio-econômico em relação ao padrão médio da população. Portanto, de acordo com o índice de dissimilaridade, a igualdade poderia ser atingida pela redistribuição dos eventos adversos das classes sociais menos favorecidas para as mais favorecidas socialmente, que, no caso da saúde, é um pressuposto não verdadeiro 28.

No presente estudo, utilizando diversas medidas de desigualdades em saúde como amplitude, razão de taxas, risco atribuível populacional relativo, índice de dissimilaridade, índice de concentração e coeficiente angular de desigualdade, evidenciou-se o enorme gradiente sócio-econômico da mortalidade perinatal e do baixo peso ao nascer no Município do Rio de Janeiro. A associação persistente entre os fatores sócio-econômicos e os resultados adversos da gravidez (baixo peso ao nascer e o óbito perinatal) reflete, pelo menos em parte, a ineficácia do sistema de saúde em minorar as desigualdades.

Constata-se, assim, que a desigualdade no âmbito da saúde infantil deve ser enfrentada não apenas pelo compromisso ético com a maior eqüidade social e econômica, mas, sobretudo, porque é preciso definir claramente estratégias de redução das desigualdades, através de ações objetivas e exeqüíveis em circunstâncias de restrição orçamentária. É necessário estabelecer o mais explicitamente possível como e em que medida as desigualdades sócio-econômicas se inter-relacionam à iniqüidade da mortalidade perinatal, identificando os segmentos mais vulneráveis ao impacto de políticas compensatórias e priorizando ações que encontrarão maior repercussão nesses subgrupos populacionais.

 

Colaboradores  

C. L. T. Andrade foi reponsável pelo tema central do estudo, realizou a análise dos dados e redação do artigo. C. L. Szwarcwald contribuiu na construção dos indicadores, na análise dos dados e na revisão da redação final do artigo. S. G. N. Gama participou na construção do banco de dados e na redação dos resultados obtidos. M. C. Leal colaborou na redação e discussão dos resultados.

 

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Endereço para correspondência
Carla Lourenço Tavares de Andrade
Rua Leopoldo Bulhões 1480
Rio de Janeiro, RJ
21041-210, Brasil
carlamv@ensp.fiocruz.br 

Recebido em 24/Jan/2003
Versão final reapresentada em 14/Mai/2003
Aprovado em 04/Ago/2003

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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