EDITORIAL

 

Desafios para o nosso século: um mundo ambientalmente saudável é possível

 

 

Na virada do século XXI cada vez mais os termos "camada de ozônio", "aquecimento global" e "mudanças climáticas" têm saído das revistas científicas para a mídia de forma mais contundente. Este alcance revela a crescente preocupação social com as conseqüências do modelo de desenvolvimento econômico marcado por um ciclo que, da extração intensiva da matéria-prima ao consumo de bens industrializados, vem deixando marcas predatórias no meio ambiente, tais como a contaminação do solo, a qualidade da água, a contaminação do ar, a destruição da biodiversidade e as alterações do clima. As situações de risco decorrentes desse modelo extrapolam os limites do ambiente produtivo, atingindo não só os trabalhadores, mas a população em geral.

O aquecimento global se tornou preocupação dos principais dirigentes das nações desenvolvidas e em desenvolvimento. Mas, apesar dessa preocupação, medidas concretas para o enfrentamento do problema ocupam apenas os discursos governamentais e, enquanto protelam, acentuam-se as desigualdades entre as nações, com 20% da população mundial (quase toda vivendo no Hemisfério Norte) consumindo 80% das matérias-primas e da energia consumidas, ao mesmo tempo em que são responsáveis por mais de 80% da poluição da Terra.

Em 1962, o clássico livro Primavera Silenciosa da jornalista Rachel Carson, chamava a atenção para a perda da qualidade de vida decorrente do uso indiscriminado de substâncias químicas. A publicação impulsionou o movimento ambientalista em todo o mundo. Diversas Conferências Mundiais se seguiram, como a de Estocolmo, em 1972, e desde então os problemas ambientais passaram a ganhar as agendas dos países, dando ênfase de que proteger o ambiente não é só preservar a Natureza, mas promover e garantir a vida. Mais recentemente, o relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas (ONU) colocou a responsabilidade pelo aquecimento global na ação do homem e previu um cenário de catástrofe ambiental. As ações do homem têm contribuído para acelerar o processo de aquecimento global e, ainda que os danos ambientais atinjam todas as populações seus impactos se diferenciam, agravados pela iniqüidade da situação de saúde da população.

A ABRASCO, por meio do GT Saúde e Ambiente, vem discutindo e elaborando documentos para melhor compreender a relação entre o ambiente e a saúde. Este Suplemento de Cadernos de Saúde Pública busca oferecer diferentes ângulos e análises dos impactos ambientais e suas expressões sobre a saúde humana com a complexidade que o tema exige. O artigo de debate traz uma reflexão sistemática sobre a articulação saúde/ambiente/desenvolvimento e dela decorre uma instigante réplica e tréplica sobre problemas da área como, por exemplo, a neutralidade ou não da ciência. O artigo de revisão apresenta uma nova visão sobre economia ecológica, economia política e saúde coletiva, com a interface entre a sustentabilidade do desenvolvimento e a promoção da saúde. Outros temas, tais como poluição do ar, radioatividade, água, substâncias químicas, vigilância ambiental e indicadores em saúde ambiental são alguns dos artigos originais deste Suplemento e que trazem importantes contribuições para a compreensão dos danos causados ao planeta.

Esperamos que a leitura deste Suplemento contribua para uma profunda reflexão, necessária e urgente, na área de Saúde e Ambiente.

 

 

Hermano Albuquerque de Castro
GT Saúde e Ambiente, Associação Brasileira de Pós-graduação em Saúde Coletiva. Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil.
castro@ensp.fiocruz.br

Ary Carvalho de Miranda
Vice-Presidência de Serviços de Referência e Ambiente, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil.

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br