RESENHAS BOOK REVIEWS

 

 

Estevão Rafael Fernandes

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, FundaçãoOswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil. estevao@ensp.fiocruz.br

 

 

BIBLIOGRAFIA CRÍTICA DA SAÚDE INDÍGENA NO BRASIL (1844-2006). Buchillet D. Quito: Abya-Yala; 2007. 614 pp.

ISBN: 978-9978-22-679-7

O livro de Dominique Buchillet é resultado de mais de 15 anos de reflexões sistemáticas da autora sobre o assunto. Baseando-se em sua experiência na área, pesquisas em bases de dados disponíveis na Internet, bibliotecas e obras correlatas, a autora levantou 3.222 títulos de trabalhos (desde resumos em eventos científicos e cartilhas até teses e livros) referentes a estudos realizados em povos indígenas no Brasil e em países vizinhos, no caso de terem, também, representantes no país (como os Guaraní, Yekuána, Desána, dentre outros). A obra se divide em três partes.

A primeira parte, intitulada Bibliografia Crítica da Saúde no Brasil (1844-2006). Introdução, se divide em três outras partes. Na primeira delas, a autora traça um histórico sobre as políticas de atenção à saúde indígena no país, resumindo, em alguns parágrafos, os percursos que levaram à atual configuração dessas políticas, desde que a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) era responsável pelo atendimento à saúde dos povos indígenas, por meio das Equipes Volantes de Saúde até o modelo gerido pela Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), baseado em Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs). Na segunda parte da Introdução, intitulada Questões de Diversidade, Buchillet traça um panorama sobre o mosaico ambiental, demográfico e histórico que caracteriza o contexto indígena brasileiro; sendo a diversidade temática dos textos trazidos por ela, de certa forma, um reflexo dessa heterogeneidade. Na última parte da Introdução, a autora busca organizar o material apresentado, dividindo as pesquisas em oito partes: antropologia física/antropologia biológica; genética humana e de populações; epidemiologia; demografia; nutrição; xamanismo e sistemas indígenas de saúde; políticas de saúde e serviços de saúde; e temas específicos em saúde (incluindo aqui suicídio, alcoolismo, saúde bucal, impactos advindos de mudanças ambientais, e implicações éticas de pesquisas com povos indígenas). Essa última parte da introdução talvez seja tão ou mais interessante que o levantamento bibliográfico que a ele se segue.

Nela a autora traz uma síntese sobre cada uma dessas temáticas: os períodos que marcaram as pesquisas sobre antropologia física e biológica em povos indígenas até meados do século passado e as características dos atuais trabalhos, já com o advento da genética. Espaço de destaque mereceram as pesquisas sobre epidemiologia em populações indígenas, com cinco principais linhas de investigação detectadas, aqui, pela autora: perfil epidemiológico e saúde; biologia, clínica e/ou histórico de determinadas doenças; características sócio-culturais com relação a determinados patógenos; reações imunológicas à vacinação; e avaliação das conseqüências do contato interétnico. A autora dá, também, lugar de destaque aos estudos sobre Xamanismo e sistemas indígenas de saúde, os quais florescem a partir da década de 1980, em alguma medida impulsionados pela discussão na Antropologia brasileira sobre o corpo nas sociedades ameríndias, havendo também trabalhos sobre representações de determinadas doenças, medicamentos e uso de plantas na medicina indígena.

A segunda parte do livro é a bibliografia, propriamente dita: mais de 3.200 títulos organizados por ordem alfabética de sobrenome do autor, com respectivo resumo - no caso de não haver resumos nos trabalhos consultados, a própria autora o redigiu. Como mencionado, é perceptível a diversidade nos assuntos abordados nos trabalhos, bem como sua abordagem. No entanto, três pontos merecem destaque. Em primeiro lugar, Buchillet traz ao leitor uma lista que abrange textos que não se pretendem estudar a saúde indígena, propriamente dita - como a Enciclopédia Bororo, publicada por Albisetti & Venturelli 1 ou Os Índios e Nós, de Anthony Seeger 2 - mas, apesar disso, fornecem subsídios importantes aos estudiosos daqueles que porventura queiram dar a suas pesquisas uma abordagem interdisciplinar. Em segundo lugar, na bibliografia constam diversos títulos que, por sua antiguidade ou por não versarem especificamente sobre saúde (como nos casos mencionados) que não constam em bases de dados disponíveis online ampliando as possibilidades das atuais pesquisas (especialmente as que buscam uma abordagem a partir de uma série histórica ou com outras áreas além da saúde). Finalmente, merece também destaque o aumento no número de pesquisas envolvendo povos indígenas nas últimas décadas, bem como o número crescente de pesquisas transdisciplinares relacionadas à botânica, ecologia, antropologia, educação, dentre outras.

Na última parte do livro, a autora traz três índices: por assunto; autor; e povo e sub-povo. Tal organização permite ao pesquisador ter, em suas mãos, uma importante referência para os estudos antropológicos e em saúde indígena. Contudo, pelo crescente número nas pesquisas envolvendo povos indígenas (seja pela mudança nas políticas de saúde indígena, pelo aumento no número de pesquisadores e grupos de pesquisa sobre o assunto, aumento nas pesquisas antropológicas sobre corporalidade indígena, entre outras), a obra nasce já com o desafio de se atualizar constantemente, merecendo certamente uma reedição ampliada em alguns anos, como tem ocorrido com outras publicações sobre povos indígenas (como a coleção Povos Indígenas no Brasil, publicada pelo Instituto Socioambiental) a fim de dar conta de pesquisas ainda incipientes, como comunicação em saúde em povos indígenas; etnias emergentes, corporalidade e saúde; dentre outras.

 

1. Albisetti C, Venturelli AJ. Enciclopédia bororo. Campo Grande: Instituto de Pesquisas Etnográficas; 1962.         

2. Seeger A. Os índios e nós: estudos sobre sociedades tribais brasileiras. Rio de Janeiro: Editora Campus; 1980.        

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