ARTIGO ARTICLE

 

Prevalência de sintomas de asma e fatores de risco associados em adolescentes escolares de 13 e 14 anos dos municípios de Tubarão e Capivari de Baixo, Santa Catarina, Brasil

 

Prevalence of asthma symptoms and risk factors among adolescents in Tubarão and Capivari de Baixo, Santa Catarina State, Brazil

 

 

Daiane BredaI, II; Paulo Fontoura FreitasI; Emílio PizzichiniI; Fabiano Rosa AgostinhoIII; Marcia Margaret Menezes PizzichiniI

IUniversidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil
IIUniversidade do Sul de Santa Catarina, Tubarão, Brasil
IIIUniversidade do Extremo Sul Catarinense, Criciúma, Brasil

Correspondência

 

 


RESUMO

O objetivo deste estudo foi medir a prevalência, a gravidade dos sintomas de asma e investigar fatores de risco associados entre a presença de chiado nos últimos 12 meses (asma atual) e fatores pessoais, geográficos e sócio-econômicos em adolescentes escolares de 13 e 14 anos matriculados em sétimas e oitavas séries dos municípios de Tubarão e Capivari de Baixo, Santa Catarina, Brasil. Este é um estudo transversal que utilizou o questionário ISAAC (International Study of Asthma and Allergies in Childhood), aplicado em 1.870 adolescentes de 42 escolas dos dois municípios, entre os meses de março a maio de 2005. A prevalência de asma atual foi de 11,8% e de asma "alguma vez na vida" foi 7,8%. A prevalência de despertar uma ou mais noites na semana foi de 2,1%; 8,1% tiveram 1-3 crises de chiado nos últimos 12 meses e 3,7% apresentaram limitação da fala. Na análise multivariada sexo feminino, história familiar, pai e mãe com asma, moradia alugada e fumante dentro de casa foram fatores de risco para asma atual. A prevalência de asma atual e a gravidade dos sintomas foram comparativamente menores em relação ao encontrado em outros estudos brasileiros.

Asma; Sons Respiratórios; Saúde do Adolescente


ABSTRACT

This study aimed to measure the prevalence and severity of asthma symptoms and to investigate the association between asthma symptoms and personal, geographic, and socioeconomic variables in 13-14-year-old schoolchildren enrolled in the 7th and 8th grades in Tubarão and Capivari de Baixo, Santa Catarina State, Brazil. This was a cross-sectional study using the ISAAC (International Study of Asthma and Allergies in Childhood) written questionnaire, applied to 1,870 adolescents enrolled in 42 schools in the two cities, from March to May 2005. Prevalence of current asthma (defined as wheezing in the previous 12 months) was 11.8%, and there was a 7.8% lifetime prevalence of physician-diagnosed asthma. Prevalence of wheezing that interrupted sleep (one or more nights per week) was 2.1%; 8.1% had 1-3 wheezing attacks per year; and 3.7% had wheezing that disturbed their speech. According to multivariate analysis, female gender, family history, parental asthma, rental housing, and smoking inside the home were risk factors for current asthma. Prevalence and severity of current asthma were less than in other Brazilian studies.

Asthma; Respiratory Sounds; Adolescent Health


 

 

Introdução

A asma é considerada uma das principais doenças da infância, sendo certamente a principal doença respiratória crônica da criança 1,2 e do adolescente 2. A asma é caracterizada como uma reação inflamatória acompanhada de hiper-responsividade brônquica 3, limitação variável ao fluxo aéreo, reversível espontaneamente ou com tratamento 4. Clinicamente se manifesta por episódios recorrentes de sibilância, dispnéia, opressão torácica e tosse, particularmente à noite e pela manhã ao despertar 4.

A asma é uma condição cuja fisiopatologia é multifatorial, influenciada por características étnicas, genéticas, ambientais e sócio-culturais 5. Ela freqüentemente provoca impacto sobre a qualidade de vida e sobre a demanda no Sistema de Saúde 6. Segundo o DATASUS (Departamento de Informática do SUS. http://www.datasus.gov.br, acessado em 02/Mar/2006), em 2005 as hospitalizações por causa da asma corresponderam a 18,7% das por causas respiratórias, com custo anual de 96 milhões de Reais, correspondendo a 1,4% do gasto total anual com todas as doenças.

Apesar de ser freqüente e ter apresentado um aumento internacional em sua prevalência 7,8,9 e severidade 9, ainda não há uma definição de consenso que englobe os diversos fenótipos da asma de crianças e adultos 10. A variabilidade da expressão clínica, a falta de especificidade dos sintomas e a ausência de um marcador biológico ou fisiológico exclusivo da asma tornam essas definições insatisfatórias, por serem mais descritivas do que assertivas, dificultando a investigação epidemiológica 10. Assim, o estudo epidemiológico da asma fundamenta-se particularmente no emprego de questionários.

O International Study of Asthma and Allergies in Childhood (ISAAC) foi desenvolvido no intuito de maximizar as pesquisas epidemiológicas da asma e determinar a prevalência e gravidade de seus sintomas em diferentes países 11,12,13. No Brasil, existem alguns estudos epidemiológicos de asma utilizando a metodologia do ISAAC 2,3,14,15,16, porém no Estado de Santa Catarina são poucos os locais de levantamento epidemiológico já divulgados até o momento. Os locais são Florianópolis 17, Itajaí 18 e Criciúma 19, com prevalências de chiado nos últimos 12 meses (asma atual) de 18,8%, 12,5% e 10,5%, respectivamente.

Em função desses poucos dados, há interesse sobre a prevalência de sintomas respiratórios nos municípios catarinenses de Tubarão e Capivari de Baixo, já que em Capivari de Baixo encontra-se o Complexo Termoelétrico Jorge Lacerda, considerada a maior termoelétrica da América do Sul. Dessa forma, o presente estudo teve por objetivo medir a prevalência e a gravidade de sintomas de asma em adolescentes escolares de 13 e 14 anos matriculados em sétimas e oitavas séries dos municípios de Tubarão e Capivari de Baixo e investigar a existência de fatores de risco entre a presença dos sintomas e fatores pessoais, geográficos e sócio-econômicos.

 

Métodos

Delineamento, local e população do estudo

Este é um estudo transversal, em que a população alvo compreendeu os adolescentes escolares com idade entre 13 e 14 anos matriculados em turmas de sétimas e oitavas séries dos municípios de Tubarão e Capivari de Baixo. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE. Censo demográfico 2000. http://www.ibge.gov.br, acessado em 15/Mar/2007), Tubarão possui cerca de 88.470 habitantes, numa área correspondente 300.273km2, e o Município de Capivari de Baixo possui 18.561 habitantes, numa área de 53.165km2, ambos localizados no sul do Estado de Santa Catarina, distantes entre si cerca de seis quilômetros.

O ISAAC estabeleceu como amostra um número entre 1.000 e 3.000 alunos, prevendo uma taxa de não resposta de 20%. Este número foi considerado para permitir a análise de subgrupos e estabelecer comparações com outros centros nacionais e internacionais nos quais essa mesma metodologia já foi aplicada 20. Com base nessas premissas e no levantamento realizado nas Secretarias de Educação do Estado e dos municípios estudados e nas escolas privadas destes municípios, os alunos de 13 e 14 anos, matriculados em sétimas e oitavas séries de escolas públicas e privadas, foram convidados a participar do estudo porque em função do tamanho populacional dos dois municípios inviabilizaria a determinação de um valor amostral.

Este estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (CEP) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). As escolas e os alunos receberam um termo de consentimento livre e esclarecido, e o termo dos alunos foi assinado pelos pais ou responsáveis.

Questionário ISAAC e variáveis

O questionário ISAAC é estruturado, auto-aplicável e validado para aferir diferenças de prevalência de asma e rinite em países com língua e culturas diferentes. Ele já foi validado em relação à avaliação médica, apresentando sensibilidade de 0,85 e especificidade de 0,81 ao ser comparado ao diagnóstico de especialistas em pneumologia 21,22, caracterizando o valor epidemiológico deste instrumento.

O desfecho do estudo foi a prevalência de chiado nos últimos 12 meses, que tem sido considerada como a prevalência de asma atual 23. Para o diagnóstico de asma, foi considerada a questão "alguma vez na vida você teve asma" 15 e a investigação da gravidade dos sintomas de asma, para fins epidemiológicos, foi realizada mediante a resposta afirmativa a qualquer um dos seguintes sintomas nos últimos 12 meses: freqüência das crises de chiado (1-3 crises ou > 4 crises de chiado), freqüência de despertares noturnos causados por sintomas de asma (1 ou mais noites na semana) e sintomas de asma suficientemente intensos para limitar a conversação 11. O absenteísmo escolar nos últimos 12 meses devido a problemas respiratórios foi investigado pela ausência escolar 1-2 vezes na semana ou mais de 2 vezes na semana.

A versão do questionário utilizada no estudo foi adaptada para conter informações adicionais que pudessem detectar potenciais fatores confundidores como: localização geográfica da moradia (área urbana ou rural); moradia (própria ou alugada); existência de qualquer familiar com asma (sim ou não): pai, mãe, irmãos ou qualquer outro familiar asmático; se alguém fuma dentro de casa; se tem animal de estimação (cachorro, gato, passarinho ou qualquer outro animal); e se este animal vive dentro de casa, que também foram consideradas variáveis independentes do estudo. Tal procedimento tem sido adotado em diversas outras publicações em que o questionário ISAAC foi utilizado, pois adaptações dele são permitidas desde que a parte central permaneça inalterada 11.

No modelo multivariado, foram incluídas as seguintes variáveis: o sexo, idade (13 e 14 anos) e rede de ensino (pública e privada), qualquer familiar com asma, pai com asma, mãe com asma, moradia própria ou alugada, localização geográfica (urbana ou rural), se alguém fuma dentro de casa, se tem animais de estimação, presença de gato e se o animal de estimação vive dentro de casa.

Para a coleta de dados, foi realizado um treinamento prévio dos responsáveis pela pesquisa de campo, conforme as orientações do manual do ISAAC. Quando no dia da visita não estavam presentes todos os alunos, uma segunda ou terceira visita era realizada, com a aplicação do questionário aos indivíduos ausentes na primeira visita. Para controle da qualidade dos dados ao serem digitados os questionários, um segundo pesquisador os conferia. Também foi realizada uma amostra aleatória de 581 (23,5%) questionários para conferência de possíveis erros de digitação do banco de dados em relação ao questionário.

Análise estatística

Toda a informação obtida foi processada e analisada usando o pacote estatístico SPSS versão 15.0 (SPSS Inc., Chicago, Estados Unidos). Foram apresentadas as freqüências absolutas e relativas para todas as variáveis. A existência de associações entre as variáveis que potencialmente influenciavam uma maior ocorrência de asma atual (chiados nos últimos 12 meses) foi, num primeiro momento, avaliada pela análise bivariada. A razão de chances (RC) foi usada para medir a magnitude na ocorrência do desfecho relacionada à exposição. Análise multivariada por regressão logística foi aplicada na avaliação do efeito independente das variáveis de interesse. As variáveis independentes foram incluídas no modelo quando alcançavam significância de p < 0,20. Para os ajustes das razões de chance, realizaram-se as entradas das variáveis previamente selecionadas pela utilização do método Enter em SPSS versão 15.0. A significância estatística para cada uma das variáveis independentes foi expressa pelas razões de chance e seus intervalos de confiança. O teste de Wald foi utilizado pra testar a significância de cada um dos coeficientes no modelo, no nível de significância de 95%.

 

Resultados

Entre os meses de março a maio de 2005, foram visitadas as 44 escolas dos dois municípios, encontrando um total de 2.064 alunos elegíveis para o estudo. Duas escolas privadas não consentiram em participar da pesquisa. Das 42 escolas participantes, 27 (64,2%) eram estaduais, 11 (26,2%) municipais e quatro (9,5%) privadas. Nestas escolas restantes, estavam matriculados 1.879 (91%) que consentiram em participar da pesquisa e responderam ao questionário. Nove (0,4%) alunos não produziram informações que pudessem ser utilizáveis na análise. Portanto, foram analisados 1.870 questionários de adolescentes na faixa etária de 13 e 14 anos. Quanto à distribuição por gênero, 998 (53,4%) eram do sexo feminino e 872 (46,6%) eram do sexo masculino, com a razão sexo masculino/feminino de 0,87 (Tabela 1). Foi encontrado maior número de alunos em localização urbana (81,6%) e em moradias próprias (88,1%) (Tabela 1).

A prevalência de chiado nos últimos 12 meses (asma atual) foi um pouco mais elevada em Tubarão do que em Capivari de Baixo, contudo sem significância estatística (11,9% e 11,4%, respectivamente, p = 0,439). Este dado e a análise de outras variáveis que não apresentaram evidência de heterogeneidade quanto à exposição e características sócio-demográficas permitiram a combinação dos dados para os dois municípios. Assim, para a população total estudada, a prevalência de chiado nos últimos 12 meses (asma atual) e a asma "alguma vez na vida" (diagnóstico médico de asma) foram, respectivamente, de 11,8% (n = 220) e 7,8% (n = 146).

Em relação aos sintomas sobre gravidade da asma, a prevalência de despertar noturno (1 ou mais noites na semana) foi de 2,1%; 8,1% tiveram 1-3 crises de chiado nos últimos 12 meses, 3,3% relataram > 4 crises de chiado nos últimos 12 meses e 3,7% apresentaram limitação da fala (Tabela 1). Quanto ao absenteísmo escolar, observou-se que 1,4% da população esteve ausente na escola 1 ou 2 vezes na semana e apenas 0,1% referiu ausência escolar em mais de 2 vezes na semana em razão de problemas respiratórios (Tabela 1).

Na análise bivariada, as variáveis independentes de acordo com chiado nos últimos 12 meses (asma atual) que se mostraram estatisticamente significativas foram presença de familiar com asma (IC95%: 14,72-21,57), pai com asma (IC95%: 17,80-45,09), mãe com asma (IC95%: 15,71-30,05) e moradia alugada (IC95%: 13,13-23,61) (Tabela 2).

Na Tabela 3, verifica-se que a razão de chance bruta para chiado nos últimos 12 meses (asma atual) foi maior entre escolares do sexo feminino (RC: 1,35; IC95%: 1,02-1,80), que tem qualquer familiar com asma (RC: 2,07; IC95%: 1,55-2,78), pai com asma (RC: 3,33; IC95%: 1,75-6,32), mãe com asma (RC: 2,31; IC95%: 1,51-3,55), entre aqueles vivendo em moradia alugada (RC: 1,73; IC95%: 1,16-2,59), vivendo em área urbana (RC: 1,58; IC95%: 1,04-2,40) e com fumante dentro da casa (RC: 1,51; IC95%: 1,18-2,03) (Tabela 3).

Após ajuste para fatores de confusão, sexo feminino (RC: 1,33; IC95%: 1,00-1,81), qualquer familiar com asma (RC: 1,47; IC95%: 1,03-2,09), pai com asma (RC: 2,79; IC95%: 1,40-5,55), mãe com asma (RC: 1,72; IC95%: 1,05-2,81), moradia alugada (RC: 1,55; IC95%: 1,02-2,35) e fumante dentro de casa (RC: 1,48; IC95%: 1,08-2,01) continuaram significantes. Alunos cujo pai apresentava asma tiveram duas vezes mais chance de serem asmáticos do que os outros alunos (Tabela 3).

 

Discussão

Os resultados do presente estudo mostram que a prevalência de chiados nos últimos 12 meses (asma atual), nos adolescentes escolares de 13 e 14 anos de idade dos municípios de Tubarão e Capivari de Baixo foi de 11,8%. Além disso, a chance de chiado nos últimos 12 meses (asma atual) na análise multivariada foi mais elevada em adolescentes do sexo feminino, com qualquer familiar com asma, pai e mãe portadores de asma, que residem em moradia alugada e que possuem familiar que fuma dentro de casa.

Sabe-se que as comparações regionais e internacionais de prevalência são essenciais para o entendimento da asma. O objetivo principal é adquirir informações sobre esta condição no maior número possível de pessoas 2. Nesse sentido, o ISAAC permite investigar a prevalência da asma em indivíduos com faixa etária entre 6 a 7 anos e 13 a 14 anos ao usar amostras com 1.000 a 3.000 crianças. A prevalência 'ponto de asma' pode ser identificada pela questão sobre chiados nos últimos 12 meses 23. Esta pergunta tem sido considerada a mais sensível do questionário ISAAC, por ser mais reprodutível e diminuir o viés de memória 11,12,23.

A escolha da faixa etária entre 13-14 anos neste estudo se deveu ao fato da dificuldade antecipada em coletarmos informações em indivíduos de 6-7 anos de idade em nosso meio, visto que os respondentes são os pais, geralmente com baixa taxa de retorno 24. Além disso, Beasley et al. 7 afirmam que a faixa etária entre 13 e 14 anos é representativa do período em que a morbidade por asma é mais comum e possibilita o uso de questionários auto-aplicáveis. A taxa de resposta obtida foi de 91%, semelhante a outros estudos que utilizaram a mesma metodologia 1,3,25, o que possivelmente não influenciou nas análises efetuadas.

A prevalência mundial de asma na última década, analisada pelo estudo ISAAC fase I 26, detectou variações de 1,9% a 34,1% para prevalência de sintomas de asma nos últimos 12 meses e 1,8% a 30,2% para "alguma vez na vida" você teve asma (diagnóstico médico). Este levantamento envolveu aproximadamente 500 mil crianças de mais de 155 diferentes centros colaboradores, localizados em 56 países 26. As maiores taxas foram encontradas na Austrália, Inglaterra, Nova Zelândia, Irlanda e em alguns países latino-americanos, como Brasil e Costa Rica, enquanto na Europa Oriental e em países como a Indonésia, Grécia, China, Taiwan e Índia foram encontradas as menores prevalências de asma 13,26.

Os resultados deste estudo situaram Tubarão e Capivari de Baixo entre os locais de prevalência mais baixa para chiado nos últimos 12 meses (asma atual) no Brasil (11,8%) quando comparados à prevalência desta condição no Distrito Federal, com 19,5% 14, e em municípios como Montes Claros (Minas Gerais) com 15,8% 2, Curitiba (Paraná) com 18,5% 3, São Paulo com 23,3% 15, Recife (Pernambuco) com 19,1% 16, Florianópolis (Santa Catarina) com 18,8% 17, Goiânia (Goiás) com 18,5% 27 e Maceió (Alagoas) com 14,7% 28. Houve pouca diferença em relação às prevalências encontradas em Itajaí (Santa Catarina) com 12,5% 18, Criciúma (Santa Catarina) com 10,5% 19 e Nova Iguaçu (Rio de Janeiro) com 11,7% 29.

Observamos que dos 220 indivíduos que relataram chiado nos últimos 12 meses (asma atual), apenas 146 relataram asma "alguma vez na vida", considerada a questão que investigaria o diagnóstico médico de asma 15. Tal informação reflete um subdiagnóstico para a asma, o que também ocorreu em Florianópolis 17. Segundo Sears 30, a análise dos estudos epidemiológicos constatou que os sintomas mais graves estão entre os indivíduos com asma diagnosticada por médico. O subdiagnóstico da asma tem sido uma preocupação recente 25, pois muitos asmáticos deixam de receber tratamento adequado, fato que determina o aumento da morbidade, resultando em internações desnecessárias e freqüentes visitas aos serviços de emergência dos hospitais. Essas informações foram confirmadas por um estudo realizado em Pelotas (Rio Grande do Sul) em crianças com faixa etária entre 4-5 anos, identificando-se uma alta morbidade por asma nesta população por causa do aumento de consultas nas emergências e internações hospitalares 31.

Analisando por gênero, a prevalência de chiado nos últimos 12 meses (asma atual) neste estudo foi maior no sexo feminino, concordando com diversos trabalhos publicados 1,2,16,17,28. Na análise multivariada, o sexo feminino tornou-se fator de risco para asma. Ainda não há consenso em relação à prevalência de asma por gênero, tendo estudos que encontraram maior prevalência no sexo feminino enquanto outros, como o de Kuschnir et al. 29, realizado em Nova Iguaçu, encontraram prevalência significativamente maior no sexo masculino. Possivelmente, alterações hormonais possam estar envolvidas no processo 32.

Na população estudada verificamos que as variáveis clínicas que apontam a gravidade da asma não apresentaram diferenças expressivas, quando comparadas a outros municípios brasileiros, sendo levemente inferiores. Por exemplo, para despertar noturno (mais de uma noite na semana) tivemos uma prevalência de 2,1%, enquanto Curitiba 3 e Florianópolis 17 apresentaram, respectivamente, 2,8% e 2,6%. A variável limitação da fala devido a chiado nos últimos 12 meses teve prevalência de 3,7%, e, em Curitiba 3, Florianópolis 17 e Maceió 28, as prevalências encontradas, respectivamente, foram de 4,6%, 5,8% e 4,9%. Na variável número de crises de chiado nos últimos 12 meses, os municípios de Recife 16, Florianópolis 17 e Maceió 28 tiveram maior prevalência de 1-3 crises de chiado com 15,2%, 13,9% e 15,1%, respectivamente, quando comparadas a Tubarão e Capivari de Baixo que apresentaram apenas 8,1%. Estes dados mostram que a população em estudo não apresentou sintomas mais graves em relação a outros locais.

Em relação ao absenteísmo escolar nos últimos 12 meses, constatou-se que apenas 1,4% faltaram a escola em razão de problemas respiratórios, possivelmente não interferindo nas atividades escolares. Santos & Soares 33 investigaram entre alunos asmáticos e não asmáticos se havia diferenças no desempenho e absenteísmo escolar, encontrando nenhuma relação negativa, o que talvez possa se aproximar dos dados de nosso estudo.

Foi encontrada maior prevalência de chiado nos últimos 12 meses (asma atual) em indivíduos que freqüentam escolas privadas em comparação aos que freqüentam escolas públicas, corroborado por outros estudos 6,17. Este fato pode ser explicado pelos diferentes níveis de acesso à saúde, ou seja, adolescentes economicamente desfavorecidos têm menos acesso ao diagnóstico e tratamento, quando comparados aos adolescentes economicamente mais favorecidos 34.

Neste estudo, história de qualquer familiar com asma foi fator de risco para chiado nos últimos 12 meses (asma atual), e as mesmas informações foram encontradas em Montes Claros por Maia et al. 2. Ter pai asmático teve maior chance para asma, situação que já havia sido relatado por Baldessar 35, embora seja diferente do relado por Solé et al. 8, que encontrou uma chance maior de asma quando a mãe era asmática. Também encontramos que a presença de tabagismo dentro de casa foi fator de risco para chiado nos últimos 12 meses (asma atual), fato confirmado por Mitchell et al. 36, em seu estudo multicêntrico, que constataram que adolescentes com idade entre 13-14 anos apresentaram maior risco de sintomas asmáticos quando tem familiar fumante dentro de casa, sobretudo a mãe.

 

Conclusões

A prevalência de chiado nos últimos 12 meses (asma atual) e a gravidade dos sintomas de asma nos adolescentes escolares de 13 e 14 anos de idade nos municípios de Tubarão e Capivari de Baixo foram comparativamente menores em relação a alguns municípios brasileiros. História de qualquer familiar com asma, pai e mãe com asma, moradia alugada e fumante dentro de casa foram fatores de risco para chiado nos últimos 12 meses (asma atual). Estes dados são importantes para monitoramento e tendência desta doença, favorecendo os programas de prevenção na saúde pública, todavia sugere-se que novos estudos sejam realizados, especialmente em outros municípios de Santa Catarina, para investigar possíveis diferenças regionais.

 

Colaboradores

D. Breda participou de todas as etapas da elaboração do artigo. P. F. Freitas participou no desenho, análise, interpretação dos dados, confecção e revisão final do artigo. E. Pizzichini colaborou na análise, discussão e revisão final do artigo. F. R. Agostinho colaborou na atualização da revisão bibliográfica, no trabalho de campo e na elaboração do artigo. M. M. M. Pizzichini participou no desenho, análise, interpretação dos dados, confecção e revisão final do artigo.

 

Agradecimentos

A todos os pais, alunos e escolas que colaboraram com a pesquisa.

 

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Correspondência:
M. M. M. Pizzichini
Universidade Federal de Santa Catarina.
Campus Universitário Trindade, Florianópolis, SC
88040-970, Brasil.
mpizzich@matrix.com.br

Recebido em 19/Nov/2008
Versão final reapresentada em 09/Ago/2009
Aprovado em 01/Set/2009

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br