REVISÃO REVIEW

 

Depressão no período gestacional e baixo peso ao nascer: uma revisão sistemática da literatura

 

Depression during pregnancy and low birth weight: a systematic literature review

 

 

Daniele Marano Rocha AraujoI; Marina Machado VilarimII, III; Adriane Reis SabrozaI; Antonio Egidio NardiIII, IV

IEscola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil
IIEscola de Ciências da Saúde, Universidade do Grande Rio José de Souza Herdy, Duque de Caxias, Brasil
IIIInstituto de Psiquiatria, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil
IVInstituto Nacional de Ciência e Tecnologia - Translacional em Medicina, Rio de Janeiro, Brasil

Correspondência

 

 


RESUMO

Realizou-se uma revisão sistemática enfocando o efeito da depressão no período gestacional sobre o maior risco do baixo peso ao nascer. A revisão consistiu na busca de artigos publicados nas bases de dados PubMed, SciELO e ISIWEB utilizando-se as palavras-chave: "depression", "pregnancy", "low birth weight" e "birth weight". Foram localizados noventa e nove estudos, no entanto após a leitura dos resumos foram selecionados dez artigos. Segundo o critério de Downs & Black, utilizado para aferir a qualidade dos estudos selecionados, apenas um foi considerado de excelente qualidade, pois alcançou a pontuação máxima de 20 pontos. A depressão na gestação foi associada ao baixo peso ao nascer em sete estudos. Contradições nos achados devem-se às diferenças nas escalas utilizadas para mensurar a depressão, tamanho amostral e controle insuficiente de importantes fatores limitantes de avaliação dos resultados. Por estes motivos, são necessários estudos cuidadosamente desenhados para esclarecer a associação entre depressão durante o período gestacional e baixo peso ao nascer.

Depressão; Gestação; Recém-Nascido de Baixo Peso; Revisão


ABSTRACT

A systematic review was conducted, focusing on the relationship between depression during pregnancy and increased risk of low birth weight. The review covered articles published in PubMed, SciELO, and ISIWEB using the key words "depression", "pregnancy", "birth weight" and "low birth weight". Ninety-nine studies were located, but after reading the abstracts only 10 articles were selected. According to criteria proposed by Downs & Black (1998) to assess the quality of the selected studies, only one was considered excellent, since it reached the maximum score of 20. Depression during pregnancy was associated with low birth weight in seven studies. Contradictions in the findings are due to differences in the scales used to evaluate depression, sample size, and insufficient control of important limiting factors for evaluating the results. Carefully designed studies are thus needed to elucidate the association between intra-gestational depression and low birth weight.

Depression; Pregnancy; Low Birth Weight Infant; Review


 

 

Introdução

A gravidez é um momento de profunda complexidade na vida de uma mulher. É considerado um momento privilegiado, no qual a mulher, símbolo da fecundidade, reafirma a importância do seu papel social 1. Este período é caracterizado por diversas transformações biológicas, psicológicas e sociais, que afetam a saúde mental e física da gestante, e também exerce influência sobre a saúde do bebê 2,3,4,5.

Não é de admirar que um processo que impõe tantas exigências, como é o caso da gravidez, esteja associado à presença de transtornos mentais. Os estudos epidemiológicos são quase consensuais que atributos psicossociais, tais como ansiedade e depressão podem resultar no risco aumentado para desfechos negativos 6.

A prevalência da depressão durante o período gestacional é de aproximadamente 7% a 15% 6,7. Mais recentemente, alguns estudos vêm apontando este transtorno como possível fator de risco para o baixo peso ao nascer 7,8.

Diversos estudos já demonstraram a associação de alguns transtornos psicológicos, tais como a ansiedade/estresse durante a gestação no desencadeamento do baixo peso ao nascer, após o controle de variáveis confundidoras, como o estado sócio-econômico, ganho de peso durante a gestação e comportamentos de risco durante este período, tais como hábito de fumar e ingestão de bebidas alcoólicas 9. Já em relação à depressão, especificamente, poucos são os estudos que avaliaram o impacto desse transtorno em relação aos resultados obstétricos 10.

Uma das razões do interesse em se estudar a associação entre depressão e baixo peso ao nascer decorre da relevante prevalência de ambas, como também devido às conseqüências negativas que tais variáveis acarretam tanto para a gestante quanto para o concepto. O baixo peso ao nascer está associado ao maior risco de morbidade e mortalidade perinatal e neonatal 11, problemas emocionais, cognitivos e comportamentais, diminuição da performance escolar, depressão na adolescência, entre outros agravos 12,13.

Já a depressão pode acarretar para a mulher diversos sintomas, tais como humor triste, cansaço, anedonia com diminuição de interesses e atividades, de forma contínua por no mínimo duas semanas consecutivas. Encontram-se ainda alterações no apetite, sono (insônia ou hipersonia), peso (diminuição ou aumento), dores e mal-estar físico, sentimento de irritabilidade, culpa excessiva, pensamentos de morte ou ideação suicida e déficit cognitivo 14,15.

A associação entre depressão e baixo peso ao nascer pode ser elucidada por dois mecanismos: este transtorno pode ocasionar alterações hormonais e bioquímicas que levam ao aumento da produção de catecolaminas. Estas mudanças podem acarretar a restrição do crescimento intra-uterino devido à redução do fluxo sangüíneo útero-placentário ou irritabilidade uterina 7,16. O segundo ponto explicativo para esta associação é que a depressão pode ser mediadora de determinados comportamentos de risco, tais como o consumo de álcool e tabaco 16,17, inadequado pré-natal, diminuição do apetite e consumo alimentar, considerados limitantes para o ganho de peso adequado do bebê 16,18.

Dessa forma, esta revisão tem como objetivo examinar estudos que investigaram o efeito da depressão durante a gestação e o maior risco do baixo peso ao nascer.

 

Métodos

O método adotado foi de revisão sistemática da literatura, consistindo na busca retrospectiva de artigos científicos, nesse caso, sobre a associação entre a depressão e o desfecho baixo peso ao nascer. Para tal, foram utilizadas as seguintes bases de dados bibliográficos: PubMed, SciELO e ISIWEB. Os estudos selecionados foram publicados durante o período de 1996 a 2007.

Na estratégia de busca foram utilizadas as seguintes palavras-chave: "depression" para definir a exposição, "low birth weight", "birth weight" para o desfecho e "pregnancy". Outra estratégia foi a busca manual em listas de referências dos artigos identificados e selecionados pela busca eletrônica.

A busca bibliográfica, segundo a estratégia estabelecida, resultou em 99 artigos. No entanto, apenas dez foram selecionados para compor o atual artigo. Os demais foram excluídos pelos seguintes motivos: por serem revisões de literatura, estudos repetidos nas diferentes bases de dados ou por não estarem disponibilizados na íntegra. Cabe ressaltar que na base SciELO não foi encontrado nenhum artigo relevante utilizando os unitermos citados acima.

Os critérios utilizados na seleção de artigos para a revisão foram o tipo de desenho do estudo (coorte, caso-controle ou transversal) e o idioma (português, inglês ou espanhol).

Os artigos selecionados foram comparados em relação aos seguintes eixos: ano de publicação, país de origem, tamanho da amostra, idade média das participantes, tipo de desenho, taxa de perdas de seguimento, período em que a exposição foi aferida, fatores de confusão controlados na análise, principais resultados observados, estimadores utilizados na análise estatística e escalas empregadas para mensurar a depressão.

Os artigos selecionados foram avaliados e pontuados conforme os critérios metodológicos propostos por Downs & Black 19, aplicáveis ao delineamento dos artigos para avaliação da qualidade dos mesmos. Tais critérios avaliam a qualidade da informação, a validade interna (vieses e confundimentos), o poder do estudo e também a validade externa. Composto, originalmente, por 31 itens, o presente artigo utilizou a versão composta por 27 itens, sendo excluídos também os itens relacionados a estudos experimentais. Deste modo, ao final, foram avaliados 19 itens, pontuando, no máximo, vinte pontos.

Os artigos foram avaliados quanto aos seguintes aspectos: (1) hipóteses ou objetivos; (2) principais desfechos; (3) características dos participantes incluídos; (4) Distribuição das principais variáveis de confusão em cada grupo de sujeitos a ser comparado; (5) principais resultados; (6) informação sobre estimativas da variabilidade aleatória nos dados para os principais desfechos; (7) informação sobre características das perdas; (8) informação sobre valores de probabilidade para os principais desfechos; (9) representatividade dos indivíduos convidados a participar do estudo; (10) representatividade dos indivíduos incluídos no estudo; (11) caso os resultados não tenham sido baseados em hipóteses estabelecidas a priori, se isto foi deixado claro; (12) se, em estudos de coorte, a análise ajustou para diferentes durações de acompanhamento, ou, se em estudos de casos e controles o tempo entre a intervenção e o desfecho foi o mesmo para casos e controles; (13) adequação dos testes estatísticos utilizados para medir os principais desfechos; (14) se as medidas utilizadas para os principais desfechos foram acuradas; (15) se os participantes em diferentes grupos foram recrutados na mesma população; (16) se os participantes nos diferentes grupos foram recrutados no mesmo período de tempo; (17) se a análise incluiu ajuste adequado para as principais variáveis de confusão; (18) se foram consideradas as perdas de participantes durante o acompanhamento; e (19) Se o estudo tinha poder suficiente para detectar um efeito importante, com um nível de significância de 5%.

 

Resultados

Atendendo aos objetivos traçados antes de se iniciar a busca bibliográfica, foram selecionados dez artigos para compor a presente revisão. Dos dez estudos, quatro foram realizados nos Estados Unidos, um na Noruega, um no Canadá, um na Dinamarca, um na Índia, um na Inglaterra e um no Reino Unido. Em relação à faixa etária, quatro estudos incluíram gestantes adolescentes, dois estudos informaram apenas a idade média, dois estudos informaram a idade mínima e máxima e dois estudos não informaram a idade das gestantes avaliadas. Quanto ao idioma, todos os artigos foram escritos em língua inglesa (Tabela 1).

 

 

Dos dez estudos selecionados, dois utilizaram o desenho transversal, dois de caso-controle e seis de coorte. Informações sobre as perdas de seguimento foram obtidas em sete dos dez estudos. As perdas variaram entre 1,73% no estudo de Pagnini & Reichaman 20 a 22,5% no estudo de Neegers et al. 21 (Tabela 2).

No que diz respeito aos principais resultados e estimadores adotados, sete artigos encontraram associação entre depressão durante o período gestacional e baixo peso ao nascer (Tabela 3).

Em relação às escalas utilizadas para mensurar a depressão, apenas três estudos utilizaram instrumentos exclusivos para a avaliação de depressão. Nos demais, verificou-se a utilização de escalas que contemplaram além da depressão diversos aspectos psicossociais, tais como: ansiedade, hostilidade, violência entre parceiros (Tabela 4).

De acordo com o critério proposto por Downs & Black 19, o escore médio atribuído aos artigos selecionados foi de 17,5 pontos, sendo 20 pontos o valor máximo atingido e 15, o mínimo. Por este escore, destacou-se um artigo com 20 pontos 21, um com 18 pontos 22 e dois com 17 pontos 7,23.

 

Discussão

Apesar de os fatores que afetam o binômio materno-fetal terem suas origens no período pré-concepcional, a literatura científica atual sugere que a depressão pré-natal possa estar sendo negligenciada. A depressão durante a gravidez pode ser considerada questão importante para o campo da saúde pública devido aos sérios agravos que este transtorno pode acarretar, tais como: baixo peso ao nascer, prematuridade, além de afetar o desenvolvimento infantil 24.

A comparação dos resultados dos estudos que investigaram a associação entre a depressão durante a gestação e o baixo peso ao nascer ficou bastante dificultada devido às diferentes metodologias empregadas no que diz respeito ao tipo de desenho do estudo, período de avaliação da depressão, escalas utilizadas para avaliar o transtorno, perdas de seguimento e controle de variáveis de confundimento.

Os estudos selecionados apresentaram diferentes momentos nos quais a exposição (depressão) foi mensurada, o que pode justificar, em parte, as diferenças nos resultados encontrados. A literatura científica indica que a fase de maior prevalência de transtornos mentais na mulher ocorre principalmente no primeiro e no terceiro trimestre de gestação e nos primeiros 30 dias de puerpério. Vale ressaltar que a intensidade das alterações psíquicas depende de fatores orgânicos, familiares, conjugais, sociais, culturais e da personalidade da gestante 24.

Pelo fato de alguns estudos não terem quantificado as perdas de seguimento, as estimativas de associação podem estar comprometidas 25. Observou-se uma perda superior a 20% no estudo conduzido por Neggers et al. 21. Vale ressaltar que este estudo, apesar da perda citada, alcançou a maior pontuação no critério Downs & Black, empregado para aferir a qualidade dos estudos selecionados. Segundo Sacket 26, o viés introduzido através da perda de seguimento pode acarretar sérios problemas na validade dos resultados encontrados devido à possibilidade de ocorrer perda seletiva da amostra estudada. No entanto, este problema é acentuado quando a perda gira em torno de 30% a 40% 26.

A depressão está associada a inúmeros fatores de risco tais como antecedentes psiquiá-tricos, dificuldades financeiras, baixa escolaridade, gestação na adolescência, falta de suporte social, eventos estressores e história de violência doméstica. Já para o baixo peso ao nascer, estudos epidemiológicos demonstram que existem inúmeros fatores responsáveis pelo desencadeamento desse processo: condições sócio-econômicas precárias, peso da mãe antes e durante a gestação, etnia/raça, estatura, idade, escolaridade materna, nascimentos múltiplos, paridade, história obstétrica anterior, cuidados pré-natais, morbidade materna durante a gravidez, comportamentos de risco como o consumo de bebidas alcoólicas, a ingestão de café e o hábito de fumar 25. Cabe destacar que os estudos não contemplaram os principais fatores de confundimento para o desfecho baixo peso ao nascer.

Entre os estudos selecionados, verificou-se o uso de diversos tipos de escalas para mensurar a depressão na gestação. Tais instrumentos são empregados para quantiûcar a presença e a gravidade dos sintomas de depressão através de critérios objetivos preestabelecidos. No entanto, não há como evitar uma parcela de subjetividade na atribuição dos escores, já que estamos tratando de sintomas particulares. Sendo assim, devemos considerar as medidas sempre como uma estimativa aproximada 26.

Ainda que a maioria das escalas de avaliação seja utilizada há mais de vinte anos e que elas tenham passado por estudos de validação e confiabilidade, é preciso lembrar que a avaliação das categorias de sintomas que compõem a síndrome depressiva varia de uma escala para outra. Algumas valorizam mais os sintomas cognitivos, outras, o humor, dependendo de seu referencial teórico utilizado 27.

O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) 28 demonstraram que o baixo peso ao nascer é quatro vezes maior em países em desenvolvimento em relação aos países industrializados. Raham 29 relata que a depressão no terceiro trimestre gestacional ocorre em mais de 25% das mulheres do sul da Ásia.

Outro estudo conduzido por Rahamn et al. 23 demonstrou que a depressão durante o terceiro trimestre de gravidez está associada ao maior risco de baixo peso ao nascer na população de baixa renda, e que esta associação é independente dos efeitos do estado nutricional materno representado pelo índice de massa corporal (IMC). Este mesmo grupo demonstrou, através de um estudo longitudinal com estas mesmas crianças, que a depressão, independente da questão do baixo peso ao nascer, está associada ao retardo de crescimento intra-uterino.

O estudo de Rosen et al. 30 teve como objetivo avaliar a questão da violência como variável explicativa para o baixo peso ao nascer. Este demonstrou que as mulheres que sofreram violência tinham duas vezes mais chance de terem filhos com baixo peso ao nascer e que esta variável estava fortemente associada à depressão. No entanto, vale destacar que os dados do peso do bebê foram auto-relatados após cinco anos de nascimento.

O estudo conduzido por Pagnini & Reichman 20 enfocou a questão dos principais fatores de risco associados ao atendimento pré-natal, já que o não comparecimento ou o acompanhamento tardio a tais consultas está intimamente associado ao baixo peso ao nascer e à mortalidade infantil. O uso de bebidas alcoólicas, tabaco e drogas pesadas, tais como a cocaína, acarretaram a procura atrasada das gestantes pelos cuidados de pré-natal. Em contrapartida, de acordo com este estudo, a entrada no pré-natal se tornou mais precoce quando se tratou de gestantes que apresentaram sintomas depressivos ou aquelas que já tinham sofrido algum tipo de violência. No entanto, tal achado não corroborou o estudo de Carvalho et al. 31, o qual demonstrou que os quadros depressivos não tratados durante a gravidez tendem a diminuir a freqüência nas consultas pré-natais.

Considerando a realidade de saúde pública nacional, o conhecimento de tais fatores é de extrema importância, já que o cuidado pré-natal pode ser o único contato que uma mulher em idade reprodutiva possa ter com os serviços de saúde, tornando-se crucial para intervenções direcionadas à promoção da saúde da mulher como um todo 32.

Outro fator que dificultou a comparação entre os estudos diz respeito à idade das mulheres que compuseram a amostra. Dos dez estudos selecionados, quatro 20,23,33,34 incluíram gestantes adolescentes. A depressão é um transtorno mental freqüente na adolescência, sendo a gravidez um importante fator de risco para o seu desenvolvimento nesta fase da vida. A freqüência desse transtorno tende a ser mais alta entre as grávidas adolescentes do que em gestantes adultas e está associada a significativos riscos obstétricos e psicossociais, tanto para a mãe quanto para o bebê 24. Também, vale ressaltar, que as gestantes adolescentes tendem a negligenciar o serviço pré-natal em relação às adultas, favorecendo assim, resultados obstétricos negativos, tais como o baixo peso ao nascer 20.

Os estudos de Zimmer-Gembeck & Helfand 33 e Neggers et al. 21 foram compostos predominantemente por mulheres de baixa renda. Nos demais estudos não houve homogeneidade quanto às características sócio-econômicas. A desvantagem sócio-econômica é considerada um fator etiológico indireto para o baixo peso ao nascer, pois ele pode mediar exposições psicológicas, comportamentais e ambientais envolvidas na redução do crescimento fetal 25.

Dos dez estudos selecionados, sete demonstraram associação entre a depressão e o baixo peso ao nascer. No entanto, três 8,22,35 não obtiveram o mesmo resultado. O estudo conduzido por Evans et al. 8 apesar de ter sido composto por uma amostra de mais de 10 mil gestantes, não conseguiu demonstrar que a depressão é um fator de risco independente para o baixo peso ao nascer por duas hipóteses: a utilização de questionários autopreenchidos e perda de informações das variáveis confundidoras de 25% das gestantes. O estudo de Cooper et al. 22, apesar também de não ter demonstrado associação entre as variáveis, observou que o estresse durante a gestação está associado ao baixo peso ao nascer. Berle et al. 35 avaliaram 1.465 mulheres em uma clinica obstétrica na Suécia e não encontraram associação entre tais variáveis. Vale ressaltar que a prevalência do baixo peso ao nascer é reduzida no país e por este motivo, o próprio estudo colocou como limitação o reduzido poder de teste estatístico para detectar possíveis associações entre depressão e baixo peso ao nascer.

Nos países desenvolvidos, a detecção e tratamento da depressão no período gestacional têm sofrido um significante avanço. Os estudos têm demonstrado que nestes países existe uma atenção mais adequada às mães que têm diagnóstico de depressão como também o suporte social é mais adequado. Já nos países em desenvolvimento, esta questão ainda é considerada um sério problema de saúde pública, necessitando urgentemente de mudanças nas políticas públicas 23.

O impacto da depressão na gestação sobre os resultados obstétricos é menos claro que os demais transtornos mentais 10. Sendo assim, é de fundamental importância que a depressão, como potencial fator determinante para o baixo peso ao nascer, continue sendo investigada cuidadosamente na clínica e pela literatura, a fim de que o diagnóstico e tratamento desse transtorno possam ter uma ação preventiva na saúde da gestante e do recém-nascido.

Dessa forma, a realização de estudos cuidadosamente desenhados, com recrutamento de gestantes com características similares e com a utilização de escalas validadas, poderá contribuir para a produção de novas evidências acerca da relação entre depressão e baixo peso ao nascer.

 

Colaboradores

D. M. R. Araujo participou de todas as etapas do estudo, desde o planejamento, levantamento bibliográfico, pontuação pelo escore Downs & Black, análise dos resultados e elaboração final do artigo. M. M. Vilarim participou do levantamento bibliográfico, análise dos resultados e revisão do artigo. A. R. Sabroza participou da elaboração do artigo. A. E. Nardi participou do planejamento, orientação e revisão do artigo.

 

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Correspondência:
D. M. R. Araujo
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca
Fundação Oswaldo Cruz
Rua Leopoldo Bulhões 1480
Rio de Janeiro, RJ, 21041-210, Brasil
danielemarano@yahoo.com.br

Recebido em 13/Ago/2009
Versão final reapresentada em 24/Nov/2009
Aprovado em 10/Dez/2009

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br