Perfil de resiliência em pacientes com dor crônica

Perfil de resiliencia en pacientes con dolor crónico

Israel Souza Ana Glória Godoi Vasconcelos Wolnei Caumo Abrahão Fontes Baptista Sobre os autores

Resumo:

O objetivo deste estudo foi identificar perfis de resiliência em paciente com dor crônica. Utilizando a Análise de Classes Latentes, em uma amostra de 414 pacientes com dor crônica musculoesquelética, foram identificados três perfis: resiliência primária (40%), composto por indivíduos de até 40 anos, que têm alta escolaridade, buscam os cuidados médicos, não trabalham e não apresentam sintomas de estresse psicológico; resiliência secundária (30%), composto por mulheres com mais de 54 anos, que têm baixo nível de escolaridade, buscam cuidados médicos, não trabalham e apresentam baixa probabilidade de experimentar sintomas de estresse psicológico; resiliência terciária (29%), composto por mulheres com médio nível de escolaridade, idade entre 40 e 54 anos, que trabalham, não buscam cuidados médicos e têm alta probabilidade de experimentar sintomas de estresse psicológico. Os três perfis revelam caminhos distintos de resiliência na dor crônica com relevância para prática clínica, destacando a atuação multidisciplinar nos cuidados ao paciente com dor crônica.

Palavras-chave:
Dor Crônica; Resiliência Psicológica; Qualidade de Vida

Resumen:

El objetivo de este estudio fue identificar perfiles de resiliencia en pacientes con dolor crónico. Utilizando el análisis de clases latentes, en una muestra de 414 pacientes con dolor crónico musculoesquelético, fueron identificados tres perfiles: resiliencia primaria (40%), compuesto por individuos de hasta 40 años, que tienen una alta escolaridad, buscan cuidados médicos, no trabajan y no presentan síntomas de estrés psicológico; resiliencia secundaria (30%), compuesto por mujeres con más de 54 años, que tienen bajo nivel de escolaridad, buscan cuidados médicos, no trabajan y presentan baja probabilidad de experimentar síntomas de estrés psicológico; resiliencia terciaria (29%), compuesto por mujeres con medio nivel de escolaridad, edad entre 40 y 54 años, que trabajan, no buscan cuidados médicos y tienen una alta probabilidad de experimentar síntomas de estrés psicológico. Los tres perfiles revelan caminos distintos de resiliencia en el dolor crónico, con relevancia para la práctica clínica, destacando la actuación multidisciplinaria en los cuidados al paciente con dolor crónico.

Palabras-clave:
Dolor Crónico; Resiliencia Psicológica; Calidad de Vida

Introdução

Dor crônica é aquela que persiste por processos patológicos crônicos, de forma contínua ou recorrente; implica alto impacto social, sendo frequentemente associada com outras doenças crônicas, imputando peso para os sistemas de saúde e para a economia. É um problema de saúde específico, com características claras de sintomas, incapacidade e aspectos de saúde mental, que são em grande parte independentes da doença desencadeante ou trauma 11. Kleijnen Systematic Reviews Ltd. Reflection process on chronic diseases in the EU - the role of chronic pain. York: Societal Impact of Pain/European Federation of IASP; 2012. (Systematic Literature Report)..

A prevalência de dor crônica na população geral varia, dependendo do estudo realizado, de 10,1% a 80% 22. Harstall C, Ospina M. How prevalent is chronic pain? Pain: Clinical Updates 2003; 11:1-4.), (33. Abu-Saad HH. Chronic pain: a review. J Med Liban 2010; 58:21-7.. As diferenças se devem principalmente ao critério utilizado para classificar a dor crônica (< 3 meses, ou > 6 meses), bem como a população de estudo (adultos, idosos, veteranos de guerra).

Mesmo com o avanço na compreensão da dor, sua prevalência continua alta e, por vezes, não é reconhecida, é mal avaliada, subestimada, subtratada, ou inadequadamente tratada 44. Hadjistavropoulos T, Craig KD, Duck S, Cano A, Goubert L, Jackson PL, et al. A biopsychosocial formulation of pain communication. Psychol Bull 2011; 137:910-39.. Tal fato pode estar relacionado à incapacidade de o modelo biomédico lidar com todas as interações psicossociais, sociodemográficas, comportamentais, às vezes até mesmo os processos fisiopatológicos, desencadeantes do comportamento doloroso. Nesse sentido, destaca-se o enfoque biopsicossocial, em que as características biológicas, psicológicas e sociais do sujeito tornam-se um aspecto importante na compreensão da dor crônica. Especificamente, no presente artigo pretende-se investigar as inter-relações entre estas variáveis sob a perspectiva da resiliência.

Resiliência pode ser definida como a capacidade de se adaptar às circunstâncias estressantes, sendo associada à diminuição da percepção do estresse. Níveis mais elevados de resiliência estão associados com maiores níveis de aceitação da dor e adaptação a esta, independente do tempo de sua duração. A resiliência previne o estresse emocional, sendo associada a menores níveis de depressão e ansiedade 55. Ramírez-Maestre C, Esteve R, López AE. The path to capacity: resilience and spinal chronic pain. Spine (Phila Pa 1976) 2012; 37:E251-8..

Uma das grandes dificuldades, no entanto, consiste na operacionalização dos achados científicos na prática clínica. Trivedi et al. 66. Trivedi RB, Bosworth HB, Jackson GL. Resilience in chronic illness. In: Resnick B, Gwyther LP, Roberto KA, editors. Resilience in aging: concepts, research, and outcomes. New York: Springer; 2011. p. 181-97. desenvolveram o conceito de resiliência como um construto em três níveis, que chamaram de resiliência primária, secundária e terciária. O objetivo dessa conceituação seria sua aplicação na prática clínica com pacientes portadores de doenças crônicas, reconhecendo que a resiliência pode mudar ao longo do tempo, o que permitiria monitorá-los com respostas específicas para cada nível.

No presente artigo, tem-se por objetivo a construção de um perfil de resiliência de pacientes com dor crônica, agregando tanto a estratégia da utilização de um instrumento específico 77. Karoly P, Ruehlman LS. Psychological "resilience" and its correlates in chronic pain: findings from a national community sample. Pain 2006; 123:90-7., quanto o conceito de resiliência como um construto em três níveis 66. Trivedi RB, Bosworth HB, Jackson GL. Resilience in chronic illness. In: Resnick B, Gwyther LP, Roberto KA, editors. Resilience in aging: concepts, research, and outcomes. New York: Springer; 2011. p. 181-97.. O intuito é refletir a trajetória de vida e o contexto social do indivíduo para que ao menos uma parte da enorme gama dos processos de interação envolvidos possa ser contemplada. Para tal, foi utilizada a Análise de Classes Latentes (ACL), que reflete uma abordagem orientada para a pessoa 88. Collins LM, Lanza ST. Latent class and latent transition analysis: with applications in the social, behavioral, and health sciences. New York: Wiley; 2010.. O foco da ACL é estudar indivíduos com base nos padrões de características individuais relevantes 99. Bergman LR, Magnusson D. A person-oriented approach in research on developmental psychopathology. Dev Psychopathol 1997; 9:291-319., observando os perfis daqueles que apresentam padrões semelhantes. Identificam-se, dessa maneira, processos mais gerais que são subjacentes aos perfis, os quais são montados com base na probabilidade de pertinência (probabilidade condicional) às classes latentes fornecidas pela modelagem.

Metodologia

Amostra

A presente pesquisa foi realizada em conformidade com a Resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que trata das diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa com seres humanos, e foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição onde a investigação foi conduzida (nº 1005-55, Grupo de Pesquisa e Pós-graduação do Hospital de Clínicas de Porto Alegre). Após obter a autorização de utilização do banco de dados do pesquisador responsável, a pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz (CEP/ENSP/Fiocruz; CAAE: 24131413.0.0000.5240).

A metodologia da coleta de dados está descrita no trabalho de Caumo et al. 1010. Caumo W, Ruehlman LS, Karoly P, Sehn F, Vidor LP, Dall-Ágnol L, et al. Crosscultural adaptation and validation of the profile of chronic pain: screen for a Brazilian population. Pain Med 2013; 14:52-61.. A amostra foi recrutada em uma clínica de atenção terciária em dor crônica (pacientes oriundos das unidades básicas), além de contar com voluntários recrutados por intermédio de anúncios em jornais. O critério de inclusão foi o diagnóstico de dor musculoesquelética por médicos com experiência clínica no tratamento da dor. Esse diagnóstico foi estabelecido utilizando-se o protocolo padrão para cada tipo de dor. Os critérios clínicos para definir pacientes com síndrome de dor miofascial foram dor regional, exame neurológico normal, presença de pontos-gatilho (trigger points - pontos dolorosos que, quando pressionados ou estimulados, causam dor com irradiação no músculo afetado), bandas tensas de tecido muscular (taut bands), pontos dolorosos ou sensíveis (tender points) e dor caracterizada como "maçante", "dolorida", ou "profunda". O diagnóstico da cefaleia tensional crônica foi realizado de acordo com os critérios da International Headache Society, e o diagnóstico da fibromialgia foi feito de acordo com os critérios do American College of Rheumatology.

O critério de exclusão foi a inabilidade para compreender o idioma nativo, analfabetos, ou a impossibilidade de se deslocar até o hospital para as avaliações.

Instrumento e variáveis

Para categorização inicial dos indivíduos de acordo com o nível de resiliência, utilizou-se a versão traduzida e adaptada para o Brasil do instrumento Profile of Chronic Pain: Screen (PCP:S). Em sua versão original, o PCP:S compõe-se de 15 itens, distribuídos em três dimensões 1111. Ruehlman LS, Karoly P, Newton C, Aiken LS. The development and preliminary validation of a brief measure of chronic pain impact for use in the general population. Pain 2005; 113:82-90.: severidade - intensidade ou aversão à dor (quatro itens; pontuação de 0 a 30); interferência - impacto da dor em atividades agradáveis, relacionamentos, responsabilidades, metas pessoais, autocuidado e cognição (seis itens; pontuação de 0 a 36); estresse emocional - sentimentos relacionados à dor, como tristeza, tensão, raiva, prazer, isolamento (cinco itens; pontuação de 0 a 25). A versão traduzida e adaptada para a população brasileira 1010. Caumo W, Ruehlman LS, Karoly P, Sehn F, Vidor LP, Dall-Ágnol L, et al. Crosscultural adaptation and validation of the profile of chronic pain: screen for a Brazilian population. Pain Med 2013; 14:52-61. apresentou a mesma estrutura dimensional do estudo original.

Para a classificação dos indivíduos em grupos de resilientes e não resilientes, utilizou-se, no presente estudo, um procedimento similar ao descrito por Karoly & Ruehlman 77. Karoly P, Ruehlman LS. Psychological "resilience" and its correlates in chronic pain: findings from a national community sample. Pain 2006; 123:90-7.. Desse modo, foram classificados como resilientes indivíduos que obtiveram pontuações mais altas na escala de severidade (pontuação acima da média da amostra na escala) em combinação com baixa pontuação nas escalas de interferência e estresse emocional (pontuação abaixo da média da amostra na escala). Os indivíduos não resilientes foram classificados com base na alta pontuação nas escalas de interferência, severidade e estresse emocional (pontuação acima da média da amostra na escala). Os demais foram classificados como "outros". As adequações foram necessárias em virtude de o tamanho da amostra ser reduzido no presente estudo, quando comparado com o da amostra utilizada por Karoly & Ruehlman 77. Karoly P, Ruehlman LS. Psychological "resilience" and its correlates in chronic pain: findings from a national community sample. Pain 2006; 123:90-7..

Nesta pesquisa, as variáveis que serão utilizadas na construção do perfil via ACL serão os seguintes: idade (até 30 anos; de 31 a 40 anos; de 41 a 59 anos; 60 anos ou mais), sexo (masculino e feminino), escolaridade (baixa: 0 a 5 anos de estudo; média: de 6 a 10 anos de estudo; alta: 11 anos ou mais de estudo), se trabalha a despeito da dor (sim, não), se segue tratamento médico específico para a dor crônica (sim, não), resiliência (resilientes, não resilientes, outros). Adicionalmente, para explorar a validade do modelo, utilizou-se a variável relacionada ao diagnóstico da dor crônica (síndrome de dor miofascial, cefaleia tensional crônica, fibromialgia).

Modelagem estatística

A ACL é um modelo de mistura finita 88. Collins LM, Lanza ST. Latent class and latent transition analysis: with applications in the social, behavioral, and health sciences. New York: Wiley; 2010.), (1212. Muthen B, Shedden K. Finite mixture modeling with mixture outcomes using the EM algorithm. Biometrics 1999; 55:463-9.), (1313. Agresti A. Categorical data analysis. Hoboken: John Wiley Sons; 2002.), (1414. Magidson J, Vermunt JK. Latent class models. In: Kaplan D, editor. The Sage handbook of quantitative methodology for the social sciences. Thousand Oaks: Sage Publications; 2004. p. 175-98.), (1515. Vermunt JK, Magidson J. Latent class analysis. In: Lewis-Beck MS, Bryman A, Liao TF, editors. Encyclopedia of social science research methods. Thousand Oaks: Sage Publications; 2004. p. 549-53., cuja aplicação é adequada quando se postula que a população é constituída por dois ou mais subgrupos latentes subjacentes, definidos pela intersecção das inúmeras características individuais, ou seja, quando se postula que existe uma variável categórica subjacente não observada (construto) que divide a população em classes latentes mutuamente exclusivas e exaustivas 88. Collins LM, Lanza ST. Latent class and latent transition analysis: with applications in the social, behavioral, and health sciences. New York: Wiley; 2010.), (1616. Hagenaars JA, McCutcheon A. Applied latent class analysis. New York: Cambridge University Press; 2002.. A pertinência das categorias às classes é desconhecida, mas pode ser deduzida com base em um conjunto de mensurações (itens, variáveis), em geral categóricos.

A ACL possibilita uma classificação de casos com indicadores categóricos semelhante à análise fatorial com variáveis contínuas. Todavia, no primeiro tipo de análise, há a probabilidade de um grupo de indivíduos com características particulares pertencer a uma classe latente que é exclusivamente dependente dos dados 88. Collins LM, Lanza ST. Latent class and latent transition analysis: with applications in the social, behavioral, and health sciences. New York: Wiley; 2010.), (1616. Hagenaars JA, McCutcheon A. Applied latent class analysis. New York: Cambridge University Press; 2002..

Dois parâmetros são essenciais na compreensão da ACL: a probabilidade de pertencer a uma determinada classe latente (prevalência das classes latentes) e a probabilidade de resposta da categoria dentro de cada classe (probabilidades condicionais), que podem ser usadas para obter a proporção esperada em cada célula da tabela de contingência 88. Collins LM, Lanza ST. Latent class and latent transition analysis: with applications in the social, behavioral, and health sciences. New York: Wiley; 2010.. Se o modelo se ajusta bem aos dados, a proporção esperada das células coincide com a proporção observada 88. Collins LM, Lanza ST. Latent class and latent transition analysis: with applications in the social, behavioral, and health sciences. New York: Wiley; 2010.. As classes latentes formadas podem ser definidas (nomeadas, interpretadas) pela combinação das probabilidades condicionais, que, por sua vez, caracterizam os indivíduos que pertencem à classe latente em questão.

Na modelagem para a escolha do número de classes latentes, levou-se em consideração os seguintes critérios:

Pearson's χ2 goodness of fit e likelihood ratio chi-square (G2): o modelo é considerado adequado quando minimiza os valores de χ2 e G2 sem um número excessivo de parâmetros 1717. Linzer DA, Lewis J. poLCA: an R package for polytomous variable latent class analysis. J Stat Softw 2011; 42:1-29.), (1818. Linzer DA, Lewis J. poLCA: polytomous variable latent class analysis: R package version 1.4. https://github.com/dlinzer/poLCA (acessado em 10/Dez/2014).
https://github.com/dlinzer/poLCA...
; neste caso, obteremos um p > 0,05, isto é, não é necessário incluir mais classes latentes no modelo.

Critério de Informação de Akaike (AIC) e Critério de Informação Bayesiano (BIC): são preferidos os modelos com os menores valores de BIC e/ou AIC 1616. Hagenaars JA, McCutcheon A. Applied latent class analysis. New York: Cambridge University Press; 2002.. O BIC é mais apropriado para modelos de classes latentes, por ser simples e por considerar o tamanho da amostra no seu cálculo 1616. Hagenaars JA, McCutcheon A. Applied latent class analysis. New York: Cambridge University Press; 2002.), (1919. Lin TH, Dayton CM. Model selection information criteria for non-nested latent class models. J Educ Behav Stat 1997; 22:249-64.), (2020. Forster MR. Key concepts in model selection: performance and generalizability. J Math Psychol 2000; 44:205-31.), (2121. Nylund KL, Asparouhov T, Muthén BO. Deciding on the number of classes in latent class analysis and growth mixture modeling: a Monte Carlo simulation study. Struct Equ Modeling 2007; 14:535-69.. Em adição, temos o AIC Consistente (CAIC) e o BIC Ajustado para a Amostra (SSBIC ou adjBIC), que seguem a mesma lógica dos demais índices, sendo o BIC ajustado preferível para amostras pequenas 2121. Nylund KL, Asparouhov T, Muthén BO. Deciding on the number of classes in latent class analysis and growth mixture modeling: a Monte Carlo simulation study. Struct Equ Modeling 2007; 14:535-69..

Entropia: trata-se de uma medida de dispersão (ou concentração) de uma função de massa de probabilidade 1717. Linzer DA, Lewis J. poLCA: an R package for polytomous variable latent class analysis. J Stat Softw 2011; 42:1-29.), (1818. Linzer DA, Lewis J. poLCA: polytomous variable latent class analysis: R package version 1.4. https://github.com/dlinzer/poLCA (acessado em 10/Dez/2014).
https://github.com/dlinzer/poLCA...
. Na prática, a entropia procura avaliar se a separação das classes proposta pela modelagem apresenta uma qualidade aceitável, ou seja, se a classificação dos indivíduos nas classes é satisfatória. No presente estudo, adota-se a medida da entropia relativa 2222. Ramaswamy V, Desarbo W, Reibstein D, Robinson W. An empirical pooling approach for estimating marketing mix elasticities with PIMS data. Marketing Science 1993; 12:103-24., que varia de 0 a 1, sendo 0 a pior situação e 1 a melhor situação. Quanto mais próximo de 1, mais clara é a definição das classes 2323. Celeux G, Soromenho G. An entropy criterion for assessing the number of clusters in a mixture model. J Classif 1996; 13:195-212..

Análise de resíduos: essa análise é fundamental para avaliar o pressuposto da independência local. O método mais comum consiste em comparar a frequência observada das variáveis com a frequência que se espera destas de acordo com a ACL. São observados os resíduos bivariados para cada par de comparação; assim, uma tabela 2X2 apresenta quatro resíduos a serem avaliados. Nesta pesquisa, será utilizado o resíduo normalizado, e resultados superiores a │1,96│ serão considerados significativos, indicando violação do pressuposto de independência local 2424. Vermunt JK, Magidson J. Latent GOLD 4.0 user's guide. Belmont: Statistical Innovations Inc.; 2005.), (2525. Vermunt JK, Magidson J. Technical guide for latent GOLD 4.0: basic and advanced. Belmont: Statistical Innovations Inc.; 2005.. Cabe ressaltar que não existe uma regra de ouro a respeito de quantos resíduos significativos são aceitáveis; entretanto, adicionar mais do que quatro resíduos pode inviabilizar o modelo 2626. Muthén LK, Muthén BO. Technical appendices: standardized residuals in Mplus. 2007. https://www.statmodel.com/download/StandardizedResiduals.pdf (acessado em 20/Dez/2014).
https://www.statmodel.com/download/Stand...
.

Uma vez determinado o melhor modelo de classe latente, buscou-se, ainda, verificar a qualidade do modelo. Dessa forma, compararam-se as classes latentes em função da pontuação obtida nas dimensões do PCP:S, utilizando-se a ANOVA one-way, com teste post-hoc de Bonferroni. Para avaliar a validade externa, realizou-se o teste de log da razão da máxima-verossimilhança (G2, similar ao χ2), comparando-se a distribuição dos indivíduos por diagnóstico da dor crônica com a classificação predita pela modelagem de classe latente.

A modelagem foi realizada utilizando-se o pacote poLCA 1717. Linzer DA, Lewis J. poLCA: an R package for polytomous variable latent class analysis. J Stat Softw 2011; 42:1-29.), (1818. Linzer DA, Lewis J. poLCA: polytomous variable latent class analysis: R package version 1.4. https://github.com/dlinzer/poLCA (acessado em 10/Dez/2014).
https://github.com/dlinzer/poLCA...
para o software R (The R Foundation for Statistical Computing, Viena, Áustria; http://www.r-project.org). O nível de significância adotado foi de 5%.

Resultados

Participaram da pesquisa 414 pacientes recrutados na Clínica de Dor e Cuidados Paliativos no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. Dentre eles, 347 eram mulheres com dor crônica musculoesquelética, com média de 11,03 anos de estudo e desvio padrão (DP) de 5,43 anos e média de idade de 50,23 anos (DP = 17,10).

Do total de pacientes (414), 65,9% recorriam aos cuidados médicos e 69,8% não trabalhavam por causa da dor (Tabela 1). O método para classificação da resiliência resultou num total de 11,6% de indivíduos resilientes, 33,1% não resilientes e 55,3% não foram classificados nem como resilientes nem como não resilientes, recebendo, portanto, a classificação de "outros". Esta categoria, "outros", foi descartada no estudo original de Karoly & Ruehlman 77. Karoly P, Ruehlman LS. Psychological "resilience" and its correlates in chronic pain: findings from a national community sample. Pain 2006; 123:90-7., sendo composta por indivíduos com as seguintes características na escala PCP:S: baixo nível de severidade (média de 18,20), nível intermediário de estresse emocional (média de 11,97) e interferência (média de 16,87). Contudo, em todas as dimensões, é a categoria que apresenta a maior variabilidade dos dados com DP de 5,47, 6,42 e 8,63, respectivamente (Tabela 1).

Tabela 1:
Características sociodemográficas da amostra e média no Profile of Chronic Pain: Screen (PCP:S).

Na amostra total, a média na dimensão severidade foi de 21,60 (erro padrão - EP = 0,28); na dimensão estresse emocional, de 14,76 (EP = 0,35); na dimensão interferência, de 21,05 (EP = 0,48); e na escala total, de 57,41 (EP = 0,97).

Na Tabela 2, são apresentados os índices de ajuste para os modelos de classe latente, indo de uma até cinco classes. De maneira geral, os índices decrescem conforme o aumento do número de classes, porém o valor de BIC e CAIC encontram seu ponto ótimo com o modelo de três classes latentes (BIC = 3.619,69; CAIC = 3.648,69). Embora os demais índices apontem para a adequação do modelo de quatro ou cinco classes latentes, notou-se que a adição de uma quarta ou quinta classe latente o tornaria redundante, com as classes adicionais não acrescentando poder explicativo ao modelo do ponto de vista teórico, refletindo também o valor de p encontrado (p = 0,143). Logo, há indícios de que, a partir da terceira classe latente, não é mais necessário aumentar o número de classes. Diante do exposto, o modelo adotado foi aquele com três classes latentes, cujas prevalências e probabilidades condicionais podem ser observadas na Tabela 3.

Tabela 2:
Índices de ajuste de acordo com o número de classes.

Tabela 3:
Probabilidades condicionais e prevalências das classes.

A nomenclatura das classes foi escolhida conforme a proposta de Trivedi et al. 66. Trivedi RB, Bosworth HB, Jackson GL. Resilience in chronic illness. In: Resnick B, Gwyther LP, Roberto KA, editors. Resilience in aging: concepts, research, and outcomes. New York: Springer; 2011. p. 181-97., sendo relacionada à categoria de resiliência predominante na classe latente. Então, a classe 1 foi denominada resiliência primária e, com uma prevalência de 40%, tem maior probabilidade de ser composta por indivíduos de até 40 anos, com 13 anos ou mais de escolaridade, que buscam os cuidados médicos, não trabalham e foram classificados como "outros" no instrumento PCP:S. Com relação ao sexo, os indivíduos do sexo masculino apresentam maior probabilidade de pertencer a esta classe do que às demais.

A classe 2 foi denominada resiliência secundária e, com uma prevalência de 30%, tem maior probabilidade de ser composta por mulheres acima de 54 anos, com até 8 anos de escolaridade, que buscam os cuidados médicos, não trabalham e foram classificadas como "resilientes" no instrumento PCP:S.

A classe 3 foi denominada resiliência terciária e, com uma prevalência de 29%, tem maior probabilidade de ser composta por mulheres de 41 a 54 anos, com 9 a 12 anos de escolaridade, que não buscam os cuidados médicos, trabalham e foram classificadas como "não resilientes" no instrumento PCP:S.

Os resultados apontam, como demonstrado na Tabela 4, que os perfis de resiliência elaborados com base nas classes latentes conseguem discriminar os indivíduos. Assim, os indivíduos classificados com resiliência primária apresentaram os menores escores em todas as dimensões do PCP:S, seguidos daqueles classificados com resiliência secundária e resiliência terciária, com diferenças significativas no teste post-hoc de Bonferroni (p < 0,05) entre todas as dimensões.

Deve-se enfatizar que a ACL é um modelo de mistura finita, significando que as classes são compostas por combinação de variáveis e que, numa mesma classe, podemos encontrar, por exemplo, homens e mulheres. O que caracteriza uma classe é a categoria apresentar maior probabilidade nesta classe do que nas demais.

Tabela 4:
Comparação das classes latentes conforme o Profile of Chronic Pain: Screen (PCP:S).

A análise de resíduos para avaliar a independência local não indicou nenhum resíduo significativo (maior que 1,96). Portanto, os dados atendem ao pressuposto da independência local.

Na Tabela 5, são apresentados os resultados relativos ao teste de validade externa. A hipótese nula é que a distribuição dos indivíduos nas categorias é independente. A comparação das classes latentes com a classificação do diagnóstico da dor crônica se mostrou significativa (G2 = 16,060 ; p = 0,003): os indivíduos com fibromialgia pertencem predominantemente ao perfil de resiliência terciária (63,2%). Por outro lado, os indivíduos com cefaleia tensional crônica aparecem predominantemente no perfil de resiliência secundária (46%), e aqueles com síndrome da dor miofascial pertencem predominantemente ao perfil de resiliência primária (42,6%), sendo uma evidência da validade externa das classes latentes.

Tabela 5:
Validade externa das classes latentes.

Discussão

Neste artigo, identificamos e caracterizamos um conjunto de variáveis e sua inter-relação com a resiliência em indivíduos com dor crônica, por meio da utilização da ACL. Ademais, avaliamos a validade das classes latentes observando, com um validador externo, o padrão encontrado, e, neste caso, os resultados apontaram para a validade da existência das três classes latentes de resiliência: primária, secundária e terciária.

A resiliência primária reflete os indivíduos com baixa severidade no seu grau de dor, mas também parece refletir padrões diferenciados de resiliência. Essa diferença poderia indicar um efeito tanto hereditário quanto ambiental, e, nesse sentido, os achados são consistentes com o trabalho de Boardman et al. 2727. Boardman JD, Blalock CL, Button TMM. Sex differences in the heritability of resilience. Twin Res Hum Genet 2008; 11:12-27.. Estes autores, ao investigarem a hereditariedade da resiliência psicológica em adultos (gêmeos monozigóticos) maiores de 25 nos Estados Unidos, descobriram que homens e mulheres apresentam, no que diz respeito ao afeto positivo, o mesmo grau de hereditariedade; todavia, quando controlados outros efeitos psicológicos, a hereditariedade da resiliência parece ser maior nos homens. Por outro lado, em comparação com as mulheres, os homens parecem derivar benefícios adicionais do domínio ambiental, que podem permitir outras formas de manifestação da resiliência, independentemente da questão sexual 2727. Boardman JD, Blalock CL, Button TMM. Sex differences in the heritability of resilience. Twin Res Hum Genet 2008; 11:12-27.. As explicações para este domínio ambiental, de acordo com os três autores, estariam baseadas no papel social desenvolvido pelas mulheres (cuidados da casa e família), o que as deixaria menos resistentes a fatores estressantes envolvendo amigos e familiares (divórcio, problemas domésticos e de relacionamento), visto que os eventos estressantes na vida em geral seriam similares para ambos 2727. Boardman JD, Blalock CL, Button TMM. Sex differences in the heritability of resilience. Twin Res Hum Genet 2008; 11:12-27.. Tal aspecto daria suporte, também, à questão da idade, pois a classe de resiliência primária apresenta indivíduos do sexo masculino mais jovens que as mulheres da classe de resiliência secundária, o que poderia justificar o desenvolvimento de caminhos de resiliência distintos nos dois grupos.

A classe de resiliência secundária foi composta predominantemente por mulheres com mais de 54 anos, que apresentam baixo nível de escolaridade, não trabalham, mas que buscam os cuidados médicos. Com uma prevalência de 30%, esta classe apresentou como principal diferenciador da resiliência terciária a escolaridade, idade, a busca de cuidados médicos e o trabalho. Já seu diferencial com relação à resiliência primária foi o sexo, a idade e a escolaridade.

O resultado das classes latentes em função da faixa etária apresenta similaridade com o estudo de Gooding et al. 2828. Gooding PA, Hurst A, Johnson J, Tarrier N. Psychological resilience in young and older adults. Int J Geriatr Psychiatry 2012; 27:262-70., no qual o nível de resiliência global e subdimensões de regulação emocional e resolução de problemas foram maiores nos idosos do que nos jovens. Por sua vez, a resiliência relacionada com o apoio social foi maior nos jovens do que nos idosos.

No presente estudo, não trabalhar foi um fator relacionado com as resiliências primária e secundária, devendo-se ressaltar que os indivíduos com esse perfil também apresentaram faixa etária mais elevada. Nesse caso, não trabalhar poderia ser uma opção de antecipação da aposentadoria, sendo esta muitas vezes um desejo do trabalhador, num sentido de férias definitivas, já que, no Brasil, mesmo com todas as divergências, ainda se salvaguardam os direitos básicos dos aposentados. Esse fato deve ser destacado porque estudos que usam a variável "trabalho", como o de Giuntoli et al. 2929. Giuntoli G, South J, Kinsella K, Karban K. Mental health, resilience and the recession in Bradford. York: Joseph Rowntree Foundation; 2011., avaliaram indivíduos que perderam o emprego, identificando nestes alta prevalencia de depressão ao avaliarem a saúde mental e a resiliência durante a recessão em Bradford, Inglaterra. Estes autores destacam, ainda, que os homens foram mais relutantes em procurar apoio emocional do que as mulheres. Ao mesmo tempo, jovens do sexo masculino relatavam o abuso de álcool e drogas ilegais para lidar com o estresse. Mesmo reconhecendo os quadros de estresse e depressão, muitos participantes se recusavam a recorrer à ajuda médica devido ao estigma da doença mental. Já no estudo conduzido por Wright et al. 3030. Wright LJ, Zautra AJ, Going S. Adaptation to early knee osteoarthritis: the role of risk, resilience, and disease severity on pain and physical functioning. Ann Behav Med 2008; 36:70-80., não foram encontradas diferenças conforme o sexo nas variáveis relacionadas à resiliência.

No estudo de Karoly & Ruehlman 77. Karoly P, Ruehlman LS. Psychological "resilience" and its correlates in chronic pain: findings from a national community sample. Pain 2006; 123:90-7., em que foi utilizado o instrumento PCP:S para classificar os indivíduos com dor crônica em dois grupos (resiliente e não resiliente), o grupo resiliente apresentou maior escolaridade, enquanto o não resiliente foi significativamente mais propenso a receber tratamento para o seu problema de dor em comparação com indivíduos resilientes (78% do grupo não resiliente buscavam tratamento médico, enquanto 60% do grupo resiliente faziam o mesmo). Os resultados apontados pelos autores divergem dos achados do presente artigo, no entanto essa divergência deve ser observada com cautela. Primeiro, no estudo de Karoly & Ruehlman 7, embora os não resilientes busquem mais os cuidados médicos, 60% dos resilientes também tinham o mesmo comportamento. Segundo, com relação ao trabalho, parece que estamos diante de diferenças culturais na forma como o trabalho e a aposentadoria são encarados nos dois países; por isso, cabe ressaltar que, como encontrado em nosso estudo, pessoas com baixa escolaridade são submetidas a trabalhos mais árduos fisicamente do que pessoas mais escolarizadas, sendo justificável a compreensão que estas têm de que a aposentadoria é um "prêmio", "férias" ou uma "segunda vida" 3131. Graeff L. Representações sociais da aposentadoria. Textos Envelhecimento 2002; 4:19-34..

Ainda, a busca por tratamento médico em um centro especializado para o tratamento da dor crônica permite aos indivíduos receber a terapêutica adequada ao seu quadro, o que pode resultar numa melhora da percepção da dor pelo paciente. Desse modo, indivíduos com baixa escolaridade podem desenvolver um sentimento de confiança no médico, condição essencial para o sucesso do tratamento. Deve-se destacar que a percepção do bem-estar, assim como o bem-estar emocional são fatores que contribuem para a manutenção da saúde mental 3232. Matos A, André R, Cherpe R, Rodrigues D, Figueira C, Pinto A. Estudo psicométrico preliminar da Mental Health Continuum - Short Form - for youth numa amostra de adolescentes portugueses. Psychologica 2010; 53:131-56.), (3333. Vosgerau MZS. Indicadores de bem-estar emocional e doenças crônicas: associação da autopercepção da felicidade, amor e bom humor à condição de saúde de adultos e idosos de Matinhos, Paraná [Tese de Doutorado]. Londrina: Universidade Estadual de Londrina; 2012.. Logo, a percepção de que está recebendo tratamento adequado para o seu problema possui aspecto protetor para a saúde do indivíduo.

Na análise de validade externa, indivíduos com fibromialgia foram predominantemente classificados com resiliência terciária. Tal fato parece estar relacionado com a gravidade da doença, caracterizada pela dor difusa em diversos pontos do corpo, presença concomitante de dor miofascial e, embora controverso, maior comorbidade e outros sintomas somáticos, tais como fadiga, distúrbios do sono e do humor 3434. Bennett RM, Goldenberg DL. Fibromyalgia, myofascial pain, tender points and trigger points: splitting or lumping? Arthritis Res Ther 2011; 13:117.. Pode-se inferir deste quadro de gravidade, que é reforçado pelo fato de os indivíduos com fibromialgia terem obtido os escores mais elevados nas dimensões de severidade, interferência e estresse emocional, a dificuldade de buscar o reequilíbrio psicológico e o estado de resiliência.

A resiliência é um construto complexo, não sendo possível estabelecer um traço resiliente universal 3535. Rutter M. Implications of resilience concepts for scientific understanding. Ann N Y Acad Sci 2006; 1094:1-12.), (3636. Luthar SS, Brown PJ. Maximizing resilience through diverse levels of inquiry: prevailing paradigms, possibilities and priorities for the future. Dev Psychopathol 2007; 19:931-55.; ela está sujeita a variações culturais, ambientais e genéticas, gerando múltiplos caminhos, por vezes inesperados 3737. Bonanno GA. Loss, trauma, and human resilience: have we underestimated the human capacity to thrive after extremely aversive events? Am Psychol 2004; 59:20-8.. Entretanto, os achados do presente estudo coadunam-se com a proposta de Trivedi et al. 66. Trivedi RB, Bosworth HB, Jackson GL. Resilience in chronic illness. In: Resnick B, Gwyther LP, Roberto KA, editors. Resilience in aging: concepts, research, and outcomes. New York: Springer; 2011. p. 181-97.) e suas implicações na prática clínica, permitindo o monitoramento dos pacientes. Dessa maneira, indivíduos com perfil de resiliência primária precisariam apenas dos cuidados habituais e monitoramento para garantir o equilíbrio e o bem-estar. Indivíduos com perfil de resiliência secundária podem precisar de apoio e de reforço nos seus recursos de enfrentamento, mas em grande parte podem recuperar o equilíbrio por conta própria, não dispensando o acompanhamento especializado na sua trajetória de recuperação. Os indivíduos que requerem maior atenção são aqueles do perfil de resiliência terciária, visto que estes podem necessitar de intervenção profissional multidisciplinar para evitar uma maior deterioração do bem-estar e o comprometimento de sua saúde.

Conclusões

De maneira geral, a ACL se mostrou útil para a construção de perfil de resiliência; ademais, a utilização de um instrumento específico para resiliência na dor crônica (PCP:S) contribuiu para os achados neste artigo. A complexidade do fenômeno analisado, resiliência, requer um estudo minucioso dos aspectos biopsicossociais; nesse caso, as variáveis sociodemográficas funcionam como um proxy desses aspectos e permitem a construção de uma base sólida para compreensão da resiliência. Já o instrumento específico (PCP:S) permite orientar o processo de identificação de grupos de resiliência.

A relevância clínica dos resultados da presente pesquisa merece destaque, uma vez que os perfis de resiliência refletem necessidades diferenciadas de acompanhamento clínico. Ressalta-se, novamente, que o comprometimento da saúde mental do indivíduo aumenta quando este passa do nível de resiliência primária ao nível secundário e, por fim, ao nível terciário.

No entanto, algumas limitações devem ser ressaltadas. A generalização dos resultados é limitada principalmente por a amostra ser composta de indivíduos oriundos de clínica de cuidados de saúde terciário (serviço especializado). Outra limitação ocorre pela não identificação do tipo de dor (neuropática e nociceptiva), o que poderia trazer luz para a compreensão desse fenômeno. Também se configura como uma limitação a não inclusão de outros quadros álgicos diferentes de fibromialgia, síndrome de dor miofascial e cefaleia tensional crônica; tal acréscimo possivelmente acarretasse uma formação de perfis de classes latentes distintos daqueles do presente estudo.

Por fim, sendo a resiliência um construto fortemente relacionado à história de vida do indivíduo, as conclusões deste artigo devem ser interpretadas com cautela por não serem baseadas em dados longitudinais. Nesse sentido, recomenda-se que estudos posteriores procurem evidenciar a história de vida dos indivíduos, buscando modelos de classes latentes para dados longitudinais.

Referências

  • 1
    Kleijnen Systematic Reviews Ltd. Reflection process on chronic diseases in the EU - the role of chronic pain. York: Societal Impact of Pain/European Federation of IASP; 2012. (Systematic Literature Report).
  • 2
    Harstall C, Ospina M. How prevalent is chronic pain? Pain: Clinical Updates 2003; 11:1-4.
  • 3
    Abu-Saad HH. Chronic pain: a review. J Med Liban 2010; 58:21-7.
  • 4
    Hadjistavropoulos T, Craig KD, Duck S, Cano A, Goubert L, Jackson PL, et al. A biopsychosocial formulation of pain communication. Psychol Bull 2011; 137:910-39.
  • 5
    Ramírez-Maestre C, Esteve R, López AE. The path to capacity: resilience and spinal chronic pain. Spine (Phila Pa 1976) 2012; 37:E251-8.
  • 6
    Trivedi RB, Bosworth HB, Jackson GL. Resilience in chronic illness. In: Resnick B, Gwyther LP, Roberto KA, editors. Resilience in aging: concepts, research, and outcomes. New York: Springer; 2011. p. 181-97.
  • 7
    Karoly P, Ruehlman LS. Psychological "resilience" and its correlates in chronic pain: findings from a national community sample. Pain 2006; 123:90-7.
  • 8
    Collins LM, Lanza ST. Latent class and latent transition analysis: with applications in the social, behavioral, and health sciences. New York: Wiley; 2010.
  • 9
    Bergman LR, Magnusson D. A person-oriented approach in research on developmental psychopathology. Dev Psychopathol 1997; 9:291-319.
  • 10
    Caumo W, Ruehlman LS, Karoly P, Sehn F, Vidor LP, Dall-Ágnol L, et al. Crosscultural adaptation and validation of the profile of chronic pain: screen for a Brazilian population. Pain Med 2013; 14:52-61.
  • 11
    Ruehlman LS, Karoly P, Newton C, Aiken LS. The development and preliminary validation of a brief measure of chronic pain impact for use in the general population. Pain 2005; 113:82-90.
  • 12
    Muthen B, Shedden K. Finite mixture modeling with mixture outcomes using the EM algorithm. Biometrics 1999; 55:463-9.
  • 13
    Agresti A. Categorical data analysis. Hoboken: John Wiley Sons; 2002.
  • 14
    Magidson J, Vermunt JK. Latent class models. In: Kaplan D, editor. The Sage handbook of quantitative methodology for the social sciences. Thousand Oaks: Sage Publications; 2004. p. 175-98.
  • 15
    Vermunt JK, Magidson J. Latent class analysis. In: Lewis-Beck MS, Bryman A, Liao TF, editors. Encyclopedia of social science research methods. Thousand Oaks: Sage Publications; 2004. p. 549-53.
  • 16
    Hagenaars JA, McCutcheon A. Applied latent class analysis. New York: Cambridge University Press; 2002.
  • 17
    Linzer DA, Lewis J. poLCA: an R package for polytomous variable latent class analysis. J Stat Softw 2011; 42:1-29.
  • 18
    Linzer DA, Lewis J. poLCA: polytomous variable latent class analysis: R package version 1.4. https://github.com/dlinzer/poLCA (acessado em 10/Dez/2014).
    » https://github.com/dlinzer/poLCA
  • 19
    Lin TH, Dayton CM. Model selection information criteria for non-nested latent class models. J Educ Behav Stat 1997; 22:249-64.
  • 20
    Forster MR. Key concepts in model selection: performance and generalizability. J Math Psychol 2000; 44:205-31.
  • 21
    Nylund KL, Asparouhov T, Muthén BO. Deciding on the number of classes in latent class analysis and growth mixture modeling: a Monte Carlo simulation study. Struct Equ Modeling 2007; 14:535-69.
  • 22
    Ramaswamy V, Desarbo W, Reibstein D, Robinson W. An empirical pooling approach for estimating marketing mix elasticities with PIMS data. Marketing Science 1993; 12:103-24.
  • 23
    Celeux G, Soromenho G. An entropy criterion for assessing the number of clusters in a mixture model. J Classif 1996; 13:195-212.
  • 24
    Vermunt JK, Magidson J. Latent GOLD 4.0 user's guide. Belmont: Statistical Innovations Inc.; 2005.
  • 25
    Vermunt JK, Magidson J. Technical guide for latent GOLD 4.0: basic and advanced. Belmont: Statistical Innovations Inc.; 2005.
  • 26
    Muthén LK, Muthén BO. Technical appendices: standardized residuals in Mplus. 2007. https://www.statmodel.com/download/StandardizedResiduals.pdf (acessado em 20/Dez/2014).
    » https://www.statmodel.com/download/StandardizedResiduals.pdf
  • 27
    Boardman JD, Blalock CL, Button TMM. Sex differences in the heritability of resilience. Twin Res Hum Genet 2008; 11:12-27.
  • 28
    Gooding PA, Hurst A, Johnson J, Tarrier N. Psychological resilience in young and older adults. Int J Geriatr Psychiatry 2012; 27:262-70.
  • 29
    Giuntoli G, South J, Kinsella K, Karban K. Mental health, resilience and the recession in Bradford. York: Joseph Rowntree Foundation; 2011.
  • 30
    Wright LJ, Zautra AJ, Going S. Adaptation to early knee osteoarthritis: the role of risk, resilience, and disease severity on pain and physical functioning. Ann Behav Med 2008; 36:70-80.
  • 31
    Graeff L. Representações sociais da aposentadoria. Textos Envelhecimento 2002; 4:19-34.
  • 32
    Matos A, André R, Cherpe R, Rodrigues D, Figueira C, Pinto A. Estudo psicométrico preliminar da Mental Health Continuum - Short Form - for youth numa amostra de adolescentes portugueses. Psychologica 2010; 53:131-56.
  • 33
    Vosgerau MZS. Indicadores de bem-estar emocional e doenças crônicas: associação da autopercepção da felicidade, amor e bom humor à condição de saúde de adultos e idosos de Matinhos, Paraná [Tese de Doutorado]. Londrina: Universidade Estadual de Londrina; 2012.
  • 34
    Bennett RM, Goldenberg DL. Fibromyalgia, myofascial pain, tender points and trigger points: splitting or lumping? Arthritis Res Ther 2011; 13:117.
  • 35
    Rutter M. Implications of resilience concepts for scientific understanding. Ann N Y Acad Sci 2006; 1094:1-12.
  • 36
    Luthar SS, Brown PJ. Maximizing resilience through diverse levels of inquiry: prevailing paradigms, possibilities and priorities for the future. Dev Psychopathol 2007; 19:931-55.
  • 37
    Bonanno GA. Loss, trauma, and human resilience: have we underestimated the human capacity to thrive after extremely aversive events? Am Psychol 2004; 59:20-8.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Jan 2017

Histórico

  • Recebido
    07 Set 2015
  • Revisado
    11 Dez 2015
  • Aceito
    26 Jan 2016
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br