Ancestralidade genética indígena como fator de risco para tuberculose? Perspectivas críticas e implicações em políticas públicas na saúde indígena

¿Ancestralidad genética indígena como factor de riesgo para la tuberculosis? Perspectivas críticas e implicaciones en políticas públicas en la salud indígena

Ricardo Ventura Santos Luiz Antônio Bastos Camacho Sergio Tavares de Almeida Rego Luiz Eloy Terena Ana Lucia Pontes Jane Felipe Beltrão Carlos E. A. Coimbra Jr.Sobre os autores

Nos dias atuais, o conceito de vulnerabilidade ocupa um espaço central nos debates sobre a saúde dos povos indígenas em escala global, sendo inclusive amplamente referido nas discussões acerca da disseminação da pandemia de COVID-19 11. Nuorgam A. COVID-19 and indigenous peoples. https://www.un.org/development/desa/indigenouspeoples/covid-19.html (acessado em 09/Ago/2020).
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. Esse conceito se faz presente na Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas no Brasil 22. Fundação Nacional de Saúde. Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas. 2ª Ed. Brasília: Fundação Nacional de Saúde/Ministério da Saúde; 2002., alinhando-se à perspectiva dos determinantes sociais da saúde. Nesse esquema interpretativo, que é tão central para as políticas públicas em muitos países do mundo, e também no Brasil, todo e qualquer agravo que acomete as populações humanas envolvem, em alguma medida, aspectos biológicos, mas os principais determinantes do adoecimento e morte das populações são tidos como se vinculando, primordialmente, a desigualdades étnicas, políticas e socioeconômicas.

Mas no caso da saúde dos povos indígenas, por vezes, são acionados argumentos que se ancoram no que poderíamos chamar a outra “face da moeda” do conceito de vulnerabilidade. É quando a noção se assenta, predominantemente - ou completamente, em argumentos ligados à determinação genética. Queremos aqui tecer alguns comentários sobre um artigo recém-publicado em PLoS One por Leal et al. 33. Leal DFVB, Silva MNS, Fernandes DCRO, Rodrigues JCG, Barros MCC, Pinto PDC, et al. Amerindian genetic ancestry as a risk factor for tuberculosis in an Amazonian population. PLoS One 2020; 15:e0236033. que, nos parece, é particularmente ilustrativo de uma ênfase que, equivocadamente, secundariza a perspectiva dos determinantes sociais no campo da saúde nos povos indígenas. É um estudo específico sobre fatores de risco para tuberculose, mas que pode ser utilizado como exemplo de uma dada maneira de fazer (ou não fazer) ciência, com implicações diretas sobre práticas de cuidado e políticas em saúde.

Leal et al. 33. Leal DFVB, Silva MNS, Fernandes DCRO, Rodrigues JCG, Barros MCC, Pinto PDC, et al. Amerindian genetic ancestry as a risk factor for tuberculosis in an Amazonian population. PLoS One 2020; 15:e0236033. (p. 2) argumentam que “...ascendência genética ameríndia é um importante fator de risco para suscetibilidade à [tuberculose] em uma população altamente miscigenada da região amazônica brasileira...”. A investigação enfocou a caracterização de perfis de ancestralidade genômica, comparando dois grupos: o primeiro constituído por 280 pacientes de tuberculose atendidos em um hospital público em Belém, Pará; o segundo, de 138 funcionários do mesmo hospital, com contato com pacientes de tuberculose nos últimos cinco anos, mas sem adoecer. Surpreendentemente, sem controlar variáveis socioeconômicas, cujas influências sobre o adoecimento para a tuberculose são sobejamente conhecidas, a principal conclusão do estudo é a seguinte: “...descobriu-se que a ascendência ameríndia na faixa de 20% a 60% é o principal fator de risco para o aumento da suscetibilidade à [tuberculose]...” 33. Leal DFVB, Silva MNS, Fernandes DCRO, Rodrigues JCG, Barros MCC, Pinto PDC, et al. Amerindian genetic ancestry as a risk factor for tuberculosis in an Amazonian population. PLoS One 2020; 15:e0236033. (p. 5). O que se esperaria como um aspecto central na metodologia, por certo não menos relevante para fins explicativos que a própria caracterização genética, é indicado como limitação da investigação: “...o estudo não foi capaz de obter dados suficientes relacionados ao fator socioeconômico, tabagismo, consumo de álcool, para realizar uma análise estratificada33. Leal DFVB, Silva MNS, Fernandes DCRO, Rodrigues JCG, Barros MCC, Pinto PDC, et al. Amerindian genetic ancestry as a risk factor for tuberculosis in an Amazonian population. PLoS One 2020; 15:e0236033. (p. 6).

Em nossa avaliação, dentre os aspectos metodológicos que comprometem a validade interna dos resultados apresentados por Leal et al. 33. Leal DFVB, Silva MNS, Fernandes DCRO, Rodrigues JCG, Barros MCC, Pinto PDC, et al. Amerindian genetic ancestry as a risk factor for tuberculosis in an Amazonian population. PLoS One 2020; 15:e0236033., está a estratégia de seleção dos controles, que em princípio deve buscar a representação da população que gerou os casos 44. Kleinbaum DG, Sullivan KM, Barker ND. ActivEpi companion textbook. 2nd Ed. New York: Springer Science/Business Media; 2013.. Em geral, isso é alcançado selecionando-se vizinhos dos casos ou pacientes hospitalizados com outras doenças. Não nos parece que funcionários do hospital no qual o estudo foi conduzido, muito possivelmente bastante diferenciados do ponto de vista socioeconômico, das condições de vida e de exposição a fatores de risco a tuberculose, constituam uma aproximação válida da coorte (hipotética) subjacente que gerou os casos. Além disso, o pré-requisito de ter tido contato com pacientes com tuberculose ativa por 5 anos ou mais, sem sintomas e diagnóstico de tuberculose, pode ter selecionado um grupo de comparação diferenciado em relação às características de interesse para a análise da influência da ancestralidade (genômica). Assim, o grupo controle pode ter sido descaracterizado como referência para comparação com os casos, deixando o estudo vulnerável a viés de seleção.

Outro aspecto relevante é o manejo das covariáveis cuja associação com o risco de se infectar e adoecer com tuberculose é bem conhecida 55. World Health Organization. Addressing the social determinants of TB. http://www.who.int/tb/areas-of-work/treatment/social-determinants/en/ (acessado em 08/Ago/2020).
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, e que não foram consideradas na análise. Os autores apontaram a insuficiência de alguns desses dados como limitação do estudo, conforme já apontado, mas desconsideraram que parte do efeito atribuído aos “ancestrais ameríndios” pode ser justamente explicado pelas diferenças dos casos e controles em relação a fatores socioeconômicos, entre outros. Considerando o conjunto das limitações da análise apresentada e de outras deficiências do artigo 66. Vandenbroucke JP, von Elm E, Altman DG, Gøtzsche PC, Mulrow CD, Pocock SJ, et al. Strengthening the reporting of observational studies in epidemiology (STROBE): explanation and elaboration. PLoS Med 2007; 4:e297., não é possível concluir que a ancestralidade ameríndia implicou em maior susceptibilidade à tuberculose.

Um elemento adicional de contexto que cabe mencionar: no mesmo periódico no qual foi publicado artigo de Leal et al. 33. Leal DFVB, Silva MNS, Fernandes DCRO, Rodrigues JCG, Barros MCC, Pinto PDC, et al. Amerindian genetic ancestry as a risk factor for tuberculosis in an Amazonian population. PLoS One 2020; 15:e0236033., há outros sobre os determinantes da tuberculose que, também baseados no desenho conhecido como caso-controle, tem foco nos determinantes sociais da saúde 77. Shimeles E, Enquselassie F, Aseffa A, Tilahun M, Mekonen A, Wondimagegn G, et al. Risk factors for tuberculosis: a case-control study in Addis Ababa, Ethiopia. PLoS One 2019; 14:e0214235.. Alinhado com o que tem sido evidenciado em inúmeras investigações nas mais diversas partes do mundo, estudo conduzido no Iraque 77. Shimeles E, Enquselassie F, Aseffa A, Tilahun M, Mekonen A, Wondimagegn G, et al. Risk factors for tuberculosis: a case-control study in Addis Ababa, Ethiopia. PLoS One 2019; 14:e0214235., identificou como fatores de risco para tuberculose as seguintes variáveis: idade, características dos domicílios (como número de janelas), histórico de hospitalização, presença de coresidentes que tiveram tuberculose, analfabetismo, baixo rendimento domiciliar, tabagismo e ausência de cicatriz vacinal por BCG. O que é indicado como limitação em Leal et al. 33. Leal DFVB, Silva MNS, Fernandes DCRO, Rodrigues JCG, Barros MCC, Pinto PDC, et al. Amerindian genetic ancestry as a risk factor for tuberculosis in an Amazonian population. PLoS One 2020; 15:e0236033., na pesquisa iraquiana que mencionamos aqui por possuir vários paralelos e ter sido publicado na mesma revista, está no cerne dos elementos apontados como compondo os fatores de risco para adoecimento por tuberculose 77. Shimeles E, Enquselassie F, Aseffa A, Tilahun M, Mekonen A, Wondimagegn G, et al. Risk factors for tuberculosis: a case-control study in Addis Ababa, Ethiopia. PLoS One 2019; 14:e0214235.. Nesse contexto, cabe indicar que há vários estudos sobre epidemiologia da tuberculose em comunidades indígenas no Brasil que apontam para os graves problemas gerados pela baixa qualidade dos serviços de saúde prestados 88. Basta PC, Coimbra Jr. CEA, Welch JR, Alves LCC, Santos RV, Camacho LAB. Tuberculosis among the Xavante Indians of the Brazilian Amazon: an epidemiological and ethnographic assessment. Ann Hum Biol 2010; 37:643-57.,99. Coimbra Jr. CEA, Basta PC. The burden of tuberculosis in Indigenous peoples in Amazonia, Brazil. Trans R Soc Trop Med Hyg 2007; 101:635-6..

De uma perspectiva histórica, a tensa relação entre explicações biologizantes vis-à-vis a ênfase em dimensões socioeconômicas e políticas faz parte dos debates sobre saúde dos povos indígenas no Brasil desde longa data 1010. Coimbra Jr. CEA. O sarampo entre sociedades indígenas brasileiras e algumas considerações sobre a prática da saúde pública entre estas populações. Cad Saúde Pública 1987; 3:22-37.,1111. Santos RV, Coimbra Jr. CA, Radin J. "Why did they die?" Biomedical narratives of epidemics and mortality among Amazonian Indigenous populations in sociohistorical and anthropological contexts. Curr Anthropol 2020; 61:441-70.. Na segunda metade do século XX, aconteceu uma intensa discussão sobre a relação entre a ocorrência de doenças infecciosas e suas relações com características genéticas das populações indígenas. Em um momento quando epidemias de sarampo afetavam inúmeras populações indígenas na região amazônica recém-contactadas no contexto da violenta expansão de frentes econômicas e demográficas, pesquisadores das áreas da saúde e da genética realizaram debates com profundas implicações sociopolíticas e sanitárias. Seria a grande mortalidade observada nas populações indígenas em alguma medida decorrente de suas características biológicas herdadas, em particular características genéticas que confeririam uma resposta imunológica aquém da observada em outras populações humanas?

Na época dessas discussões, que aconteceram inclusive em páginas de importantes periódicos internacionais, o geneticista James Neel, reconhecido especialista em genética de populações indígenas amazônicas, se manifestou de forma crítica quanto a argumentos sobre a maior susceptibilidade, de caráter biológico, dos povos indígenas frente a epidemias de doenças infecciosas 1111. Santos RV, Coimbra Jr. CA, Radin J. "Why did they die?" Biomedical narratives of epidemics and mortality among Amazonian Indigenous populations in sociohistorical and anthropological contexts. Curr Anthropol 2020; 61:441-70.. O ponto principal de Neel se referia à baixa densidade e à inconsistência metodológica das evidências científicas para sustentar tais hipóteses. Na perspectiva de Neel, “...dadas as dificuldades metodológicas envolvidas na realização de qualquer estudo sistemático da questão e a ausência de evidências convincentes na literatura, era melhor assumir que a suscetibilidade genética não foi o principal fator de influência1111. Santos RV, Coimbra Jr. CA, Radin J. "Why did they die?" Biomedical narratives of epidemics and mortality among Amazonian Indigenous populations in sociohistorical and anthropological contexts. Curr Anthropol 2020; 61:441-70. (p. 447).

As pesquisas em genética são objeto de preocupações sobre as implicações éticas que estão a elas associadas em todos o mundo. No Brasil, essas preocupações geraram inclusive uma regulamentação específica, a Resolução CNS 340/2004. A ética em pesquisa é vista por muitos pesquisadores apenas como a necessidade de se respeitar os princípios éticos propostos pelo Relatório Belmont de 1978 e as regras dele derivadas. No caso das pesquisas em genética de populações, todavia, é mister que se considere especialmente as possíveis consequências desses estudos, em particular quando seu desenho metodológico for passível de críticas em relação a sua acurácia. O maior risco na disseminação de informações que não sejam resultantes de uma pesquisa metodologicamente bem orientada está na possibilidade de, no âmbito da sociedade em geral, se estigmatizar populações, como já alertava a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em 1995, através de seu subcomitê em Bioética e Genética de Populações: “As atitudes públicas em relação à genética populacional são frequentemente influenciadas por ideologias sociais, racismo e eugenia e podem levar à estigmatização (como quando grupos populacionais nos quais há uma alta incidência de doenças genéticas são selecionados para investigação científica) e reducionismo genético1212. United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization. Bioethics and human population genetics research. http://www.unesco.org/shs/ibc/en/actes/s3/chap3.html (acessado em 09/Ago/2020).
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Concretamente, no caso dos povos indígenas no Brasil, assim como em outras partes do mundo 1313. Jones DA. Rationalizing epidemics: meanings and uses of American Indian mortality since 1600. Cambridge: Harvard University Press; 2004., argumentos quanto à “reduzida resistência genética” já foram acionados para explicar os mais elevados níveis de adoecimento e morte nas populações indígenas. Isso pode ser exemplificado pelos argumentos de um artigo publicado em 1977 sobre políticas de saúde indígena e cuja autoria envolveu funcionários da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), no qual se lê: “...as experiências verificadas demonstram sua pouca resistência genética a doenças (...) virais, podendo afirmar que uma simples infecção viral - gripe, sarampo, varíola, etc. - pode destruir até 90% do contingente demográfico desses grupos1414. Molina AO, Serra OJT. La asistencia médico sanitária en las poblaciones indígenas. América Indígena 1977; 37:179-83. (p. 180). Em contra-ponto a noções de “fatalismo genético” frente à ocorrência de doenças infecciosas, diversos outros autores argumentaram que a provisão de recursos médicos adequados, por si, se mostravam capazes de reduzir significativamente as taxas de mortalidade 1010. Coimbra Jr. CEA. O sarampo entre sociedades indígenas brasileiras e algumas considerações sobre a prática da saúde pública entre estas populações. Cad Saúde Pública 1987; 3:22-37., colocando assim a questão de uma eventual maior suscetibilidade genética dos indígenas em segundo plano, se é que existente.

No livro The Dialectical Biologist, Levins & Lewontin 1515. Levins R, Lewontin R. The dialectical biologist. Cambridge: Harvard University Press; 1985. (p. 4) escrevem: “Fazer ciência é ser um ator social engajado, gostemos ou não, na atividade política. A negação da interpenetração do científico e do social é em si um ato político, dando suporte às estruturas sociais que se escondem atrás da objetividade científica para perpetuar a dependência, a exploração, o racismo, o elitismo, o colonialismo”. Ainda mais no caso de populações socialmente tão vulnerabilizadas, como são os povos indígenas e outras minorias étnico-raciais 1616. Williams DR. Miles to go before we sleep: racial inequities in health. J Health Soc Behav 2012; 53:279-95., a condução de pesquisas no campo da saúde que não levem em consideração em seus respectivos desenhos metodológicos aspectos amplamente conhecidos como relacionados aos desfechos (seja tuberculose ou qualquer outra morbidade) pode levar a resultados imprecisos. Em se tratando de saúde, atribuir à dimensão genética uma primazia na cadeia explicativa, sem a devida consideração dos determinantes sociais, pode contribuir para justificar o inaceitável.

Há abundantes exemplos de como perspectivas sobre a “fragilidade” ou “fortaleza” dos corpos, em geral de minorias étnico-raciais, podem levar a situações com implicações diretas no cuidado em saúde. Na chave do racismo estrutural, potencialmente internalizado por profissionais de saúde, há uma crescente literatura que evidencia situações, chocantes, como a de pacientes negros que recebem menores doses de anestésicos, inclusive no parto, por serem percebidos como tendo corpos supostamente mais resistentes à dor 1717. Hoffman KM, Trawalter S, Axt JR, Oliver MN. Racial bias in pain assessment and treatment recommendations, and false beliefs about biological differences between blacks and whites. Proc Natl Acad Sci U S A 2016; 113:4296-301.. De forma análoga, considerar que a ancestralidade genética ameríndia por si confere maior risco à tuberculose, na ausência do devido controle de fatores socioeconômicos, pode alimentar, no plano das rotinas diárias dos profissionais de saúde, visões e perspectivas que tiram de foco aspectos reconhecidamente centrais no adoecimento e morte, quais sejam, as condições de marginalização, de moradias precárias, de menor acesso aos serviços de saúde, dentre tantas outras.

O já citado geneticista James Neel comentou em um dos debates ocorridos décadas atrás, por ocasião de discussões sobre aspectos biológicos dos povos indígenas vis-à-vis resposta a epidemias de doenças infecciosas: não atribuir ao genético sem a devida consideração dos determinantes socioambientais é uma “posição que seria ‘muito menos propícia à complacência’ por parte das autoridades de saúde1111. Santos RV, Coimbra Jr. CA, Radin J. "Why did they die?" Biomedical narratives of epidemics and mortality among Amazonian Indigenous populations in sociohistorical and anthropological contexts. Curr Anthropol 2020; 61:441-70. (p. 447). Evitar a “complacência”, como colocado pelo geneticista, pode ser interpretado como um alinhamento ao princípio da precaução, claramente expresso no domínio da regulamentação da ética em pesquisa em vigor no país: “O pesquisador deve estar sempre atento aos riscos que a pesquisa possa acarretar aos participantes em decorrência dos seus procedimentos, devendo para tanto serem adotadas medidas de precaução e proteção, a fim de evitar dano ou atenuar seus efeitos1818. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 510, de 7 de abril de 2016. Diário Oficial da União 2016; 24 mai..

Inquestionavelmente, investigações sobre as bases genético-biológicas das doenças infecciosas em quaisquer populações humanas fazem parte de uma agenda de pesquisa relevante. Contudo, ainda mais se tratando de sociedades com um histórico tão profundo e cruel de subjugação e marginalização, como é o caso de povos indígenas, questões socioeconômicas não podem de modo algum ser relegadas a um segundo plano, ainda mais se subsumidas a “limitações do estudo”. Se há tais “limitações”, estruturalmente tão essenciais, talvez melhor nem publicar os resultados, por toda a sombra de viéses que emanam. Os danos podem ser de não pouca monta.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Out 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    17 Ago 2020
  • Aceito
    24 Ago 2020
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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