A regulação de produtos alimentícios ultraprocessados: o desafio de governar o mercado

La regulación de productos alimenticios ultraprocesados: el desafío de gobernar el mercado

Ana Virgínia de Almeida Figueiredo Elisabetta Recine Sobre os autores

Resumos

A relação entre o consumo de produtos ultraprocessados e o aumento da obesidade e do risco de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) impulsionou organismos internacionais a mobilizarem os governos para regular a redução dos teores de açúcares, gorduras e sódio nesses produtos. O artigo analisa a compreensão de diferentes sujeitos estratégicos sobre os riscos à saúde associados aos produtos ultraprocessados, e a intervenção pública adotada para modificar a sua composição, em atendimento à Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN). Trata-se de uma investigação empírica qualitativa em que foram entrevistados representantes de 12 instituições. Adotou-se o referencial teórico da Hermenêutica da Profundidade em conjunto com a Análise de Discurso. Este estudo se concentrou no tema genérico “Acordo e Regulação” e no enunciado matriz “Regulação Consentida”. Considerando um cenário de circulação global dos produtos ultraprocessados, não disciplinados por normas internacionais, a medida de intervenção pública foi a de instituir Acordos com algumas corporações de alimentos, em contraposição ao regulamento compulsório. Tal medida foi criticada por parte dos sujeitos do Setor Público e da Sociedade Civil, pois a relevância do tema para a saúde pública requer regras claras para redução dos nutrientes-chave e com sanções. Em posição contrária, os sujeitos do Setor Regulado avaliam essa medida como sensata e de compreensão do governo. Embora haja divergências entre os sujeitos, constata-se que os Acordos, em contraposição à regulação, desrespeitam as disposições da PNAN 2012 e representam um retrocesso face às suas características particulares, cujos resultados interferirão lentamente na melhoria nutricional dos produtos ultraprocessados.

Palavras-chave:
Alimentos Industrializados; Controle e Fiscalização de Alimentos e Bebidas; Política Nutricional; Vigilância Sanitária


La relación entre el consumo de productos ultraprocesados y el aumento de la obesidad y del riesgo de enfermedades crónicas no transmisibles (DCNT) impulsó a los organismos internacionales para que se movilizaran los gobiernos, con el fin de regular la reducción de los contenidos de azúcares, grasas y sodio en esos productos. El artículo analiza la comprensión de diferentes temas estratégicos sobre los riesgos para la salud, asociados a los productos ultraprocesados, y la intervención pública adoptada para modificar su composición, en atención a la Política Nacional de Alimentación y Nutrición (PNAN). Se trata de una investigación empírica cualitativa en que fueron entrevistados representantes de 12 instituciones. Se adoptó el marco referencial teórico de la Hermenéutica de la Profundidad, en conjunto con el Análisis de Discurso. Este estudio se concentró en el tema genérico “Acuerdo y Regulación” y en el enunciado matriz “Regulación Consentida”. Considerando un escenario de circulación global de los productos ultraprocesados, no disciplinados por normas internacionales, la medida de intervención pública fue la de instituir acuerdos con algunas corporaciones de alimentos, en contraposición con la regulación obligatoria. Tal medida fue criticada por parte de agentes del Sector Público y de la Sociedad Civil, puesto que la relevancia del tema para la salud pública requiere reglas claras para la reducción de los nutrientes-clave y las sanciones que correspondan. En posición contraria, los sujetos del Sector Regulado evalúan esa medida como sensata y de comprensión del gobierno. A pesar de que haya divergencias entre los agentes, se constata que los Acuerdos, en contraposición con la regulación, no respetan las disposiciones de la PNAN 2012 y representan un retroceso frente a sus características particulares, cuyos resultados interferirán lentamente en la mejora nutricional de los productos ultraprocesados.

Palabras-clave:
Alimentos Industrializados; Control y Fiscalización de Alimentos y Bebidas; Política Nutricional; Vigilancia Sanitaria


Introdução

Riscos emergentes à saúde e à nutrição decorrem, dentre outros elementos, do uso intensivo de processos tecnológicos 11. Beck U. La sociedade del riesgo: hacia una nueva modernidade. Barcelona: Paidós; 2002. associados aos produtos alimentícios ultraprocessados, por conta de sua composição nutricional desbalanceada 22. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Guia alimentar para a população brasileira. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2014.. Tais produtos - constituídos em quase sua totalidade por ingredientes de baixo valor nutricional - se destacam entre os fatores de risco para obesidade e outras doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) 33. Monteiro CA, Moubarac JC, Cannon G, Ng SW, Popkin B. Ultra-processed products are becoming dominant in the global food system. Obes Rev 2013; 14 Suppl 2:21-8.,44. Pan American Health Organization. Ultra-processed food and drink products in Latin America: trends, impact on obesity, policy implications. Washington DC: Pan American Health Organization; 2015.. Essas doenças compõem o cenário epidemiológico da maioria dos países 55. World Health Organization. Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of a WHO Consultation. Geneva: World Health Organization; 2000. (WHO Technical Report Series, 894).,66. World Health Organization. Fiscal policies for diet and prevention of noncommunicable diseases: technical meeting report, 5-6 May 2015. Geneva: World Health Organization ; 2016., inclusive do Brasil, cuja ascensão é persistente desde 1989 77. Coitinho DC, Leão MM, Recine E, Sichieri R. Condições nutricionais da população brasileira: Adultos e idosos. Brasília: Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição; 1991.,88. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de Orçamentos Familiares - 2008-2009. Antropometria e estado nutricional de crianças, adolescentes e adultos no Brasil. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2010.. Dados recentes sobre a saúde dos adultos brasileiros indicam que 39,2% apresentam hipertensão arterial; 15,9%, diabetes; 25,9%, obesidade e 60,3%, excesso de peso 99. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Sau´de 2019: atenc¸a~o prima´ria a` sau´de e informac¸o~es antropome´tricas. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2020.. Situação que reflete o aumento no consumo calórico e de nutrientes de risco relacionados aos produtos alimentícios ultraprocessados - pães industrializados, refrigerantes, salgadinhos, biscoitos, cereais matinais etc. 1010. Martins AP, Levy RB, Claro RM, Moubarac JC, Monteiro CA. Increased contribution of ultra-processed food products in the Brazilian diet (1987-2009). Rev Saúde Publica 2013; 47:656-65. - que já compõem 20% do aporte calórico da alimentação 1111. POF 2017-2018: alimentos frescos e preparações culinárias predominam no padrão alimentar nacional. Agência IBGE Notícias 2020; 3 abr. https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/27298-pof-2017-2018-alimentos-frescos-e-preparacoes-culinarias-predominam-no-padrao-alimentar-nacional.
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O aumento das DCNT levou os organismos internacionais a recomendarem a regulação dos componentes nutricionais dos produtos alimentícios ultraprocessados para reduzir os teores de açúcares, gorduras e de sódio 66. World Health Organization. Fiscal policies for diet and prevention of noncommunicable diseases: technical meeting report, 5-6 May 2015. Geneva: World Health Organization ; 2016.,1212. Food and Agriculture Organization of United Nations. The state of food and agriculture:food systems for better nutrition. Rome: Food and Agriculture Organization of United Nations; 2013., a restrição da publicidade desses produtos para crianças; o uso de advertência nos seus rótulos; a regulamentação da comercialização deles em escolas e o aumento da tributação para limitar seu consumo 44. Pan American Health Organization. Ultra-processed food and drink products in Latin America: trends, impact on obesity, policy implications. Washington DC: Pan American Health Organization; 2015..

O controle no consumo dos produtos alimentícios ultraprocessados é um desafio, tanto pelas estratégias de marketing, como pela omissão de informações sobre suas características nutricionais, que colocam as pessoas à mercê do mercado, muitas vezes sem regras e freios éticos, impondo-lhes a aquisição de produtos que driblam os preceitos da saúde. As práticas corporativas das empresas transnacionais promovem a homogeneização dos padrões de consumo, enfraquecendo a cultura e as práticas alimentares 1313. Contreras JH, Gracia M. Alimentação, sociedade e cultura. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2011.. Além de concentrar poder econômico, essas empresas ainda instituem estratégias de atuação política que resultam em interferências nas decisões nacionais de saúde pública 1414. Mialon M, Gomes FDS. Public health and the ultra-processed food and drink products industry: corporate political activity of major transnationals in Latin America and the Caribbean. Public Health Nutr 2019; 22:1898-908..

Diante do agravamento do panorama epidemiológico de alimentação e nutrição o governo brasileiro deflagrou iniciativas em substituição às práticas regulatórias 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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. Em 2007, o Ministério da Saúde, seguindo recomendações internacionais 55. World Health Organization. Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of a WHO Consultation. Geneva: World Health Organization; 2000. (WHO Technical Report Series, 894)., firmou Acordo de Cooperação com a Associação Brasileira das Indústrias de Alimentação (ABIA) para avaliar a potencialidade do setor em reduzir, gradativamente, os teores de açúcar livre, gorduras trans, gorduras saturadas e sal nos produtos alimentícios ultraprocessados 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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Em 2009, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) avaliou a composição nutricional de 24 produtos alimentícios ultraprocessados, quanto ao teor de sódio, açúcares, gorduras saturadas, e gorduras trans 1616. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Perfil nutricional dos alimentos processados. (Informe Técnico, 42/2010). https://nutritotal.com.br/pro/wp-content/uploads/sites/3/2010/11/195-AlimentosProcessadosANVISA.pdf (acessado em 22/Dez/2010).
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, cujos resultados foram preocupantes. Macarrões instantâneos, biscoitos, salgadinhos de milho, refrigerantes, salsichas etc. apresentaram valores elevados para esses nutrientes. Assim, foram firmados sucessivos acordos com entidades representativas das indústrias para, primeiramente, reduzir o teor de sódio nessas categorias 1717. Ministério da Saúde. Construção da agenda de reformulação de alimentos processados com as indústrias de alimentação. http://nutricao.saude.gov.br/sodio_reformulacao.php (acessado em 24/Jun/2014).
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, apesar de o quadro epidemiológico também apontar urgência para a redução dos demais componentes de risco. Esses Acordos 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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constituem o cerne deste artigo.

Diante desse contexto epidemiológico, a Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) foi atualizada. A diretriz da primeira edição - “garantia da segurança e da qualidade dos produtos e da prestação de serviços na área de alimentos” - focalizada na fiscalização e controle dos riscos sanitários tradicionais - inocuidade 1818. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 2ª Ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2008.(Série B. Textos Básicos de Saúde). - foi substituída, na edição de 2012 1919. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012., pela diretriz - “controle e regulação dos alimentos” - abordando a integralidade dos riscos dos alimentos, incorporando aqueles relativos ao “perfil nutricional” e enfatizando a estratégia de regulação.

Considerando o exposto, este estudo analisou a compreensão de diferentes sujeitos estratégicos sobre os riscos à saúde relativos aos produtos alimentícios ultraprocessados e a intervenção pública decorrente, concentrando-se no tema genérico “Acordo e Regulação” e no enunciado-matriz “Regulação Consentida”. Com base nos discursos manifestos, foram identificados os pontos de convergência e de divergência sobre os riscos e agravos reconhecidos, os argumentos para regulação dos alimentos, os compromissos com a saúde pública e os limites de atuação para a intervenção pública sobre o perfil nutricional dos produtos alimentícios ultraprocessados.

Percurso metodológico

Trata-se de uma investigação empírica qualitativa com fins de compreender a visão sobre a regulação pública dos riscos à saúde relacionados aos produtos alimentícios ultraprocessados explicitada por diferentes sujeitos, partindo-se do pressuposto que, mediante o uso da linguagem, os significados que constituem e constroem a realidade discursiva - riscos dos produtos alimentícios ultraprocessados e regulação - podem ser explorados.

Referencial teórico

Hermenêutica da Profundidade

Para investigar as opiniões dos indivíduos sobre a regulação dos produtos alimentícios ultraprocessados, elegeu-se o método da Hermenêutica da Profundidade 2020. Thompson JB. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. 8ª Ed. Petrópolis: Vozes; 2009. como referencial teórico para lidar com os sentidos mobilizados pelas formas simbólicas - opiniões, ideias, crenças etc. Para Thompson 2020. Thompson JB. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. 8ª Ed. Petrópolis: Vozes; 2009., as formas simbólicas são manifestações significativas e ideológicas expressas pelos sujeitos, inseridas em um contexto sócio-histórico específico, que se realizam tanto no âmbito da vida cotidiana quanto na esfera das instituições, estruturadas na dinâmica discursiva de inter-relação entre sentido e poder. Para desvendar as formas simbólicas, seguiu-se o processo interpretativo proposto pela Hermenêutica da Profundidade, que comporta três dimensões analíticas distintas e complementares: Análise Formal ou Discursiva, Análise Sócio-histórica e Interpretação/Reinterpretação 2020. Thompson JB. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. 8ª Ed. Petrópolis: Vozes; 2009..

A Análise Discursiva examina a constituição das formas simbólicas, suas características estruturais internas, elementos distintivos e suas inter-relações. A análise das entrevistas foi adaptada às propostas de Análise Discursiva estruturadas por Orlandi 2121. Orlandi EP. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 9ª Ed. Campinas: Pontes Editores; 2010. e Minayo 2222. Minayo C. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 9ª Ed. São Paulo: Editora Hucitec; 2006., respeitando-se a flexibilidade admitida pela Hermenêutica da Profundidade 2020. Thompson JB. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. 8ª Ed. Petrópolis: Vozes; 2009., que permite problematizar a determinação dos processos de significação da palavra ou texto e compreender como os sujeitos se inter-relacionam e constroem os discursos, constituídos de sentidos determinados ideologicamente, que explicitam a sua posição em uma dada conjuntura sócio-histórica 2121. Orlandi EP. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 9ª Ed. Campinas: Pontes Editores; 2010.,2222. Minayo C. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 9ª Ed. São Paulo: Editora Hucitec; 2006..

Com o material empírico, seguiu-se à exploração do discurso 2121. Orlandi EP. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 9ª Ed. Campinas: Pontes Editores; 2010., configuração do corpus - identificação das regularidades discursivas que foram agrupadas em quatro temas genéricos; a estruturação do discurso-objeto - que permitiu a formulação de cinco enunciados matriz pelas recorrências de ideias identificadas nos temas genéricos, observando as similaridades ou divergências e os conflitos e contradições nos argumentos utilizados para construir as significações; e a reconstrução analítica do discurso - interpretação dos enunciados matriz à luz dos dispositivos teóricos para reconstruir analiticamente os discursos e explicitar os interesses político-ideológicos dos sujeitos, quanto aos riscos dos alimentos e à regulação. Os discursos articulados ao contexto social - Análise Sócio-histórica - permite esclarecer o objeto em análise em sua complexidade, alcançando a Interpretação/Reinterpretação, segundo o modelo teórico proposto por Thompson 2020. Thompson JB. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. 8ª Ed. Petrópolis: Vozes; 2009..

Esse Artigo se concentra no tema genérico “Acordo e Regulação” e no enunciado matriz “Regulação Consentida”.

Sujeitos

Foram entrevistados 13 sujeitos definidos pelos critérios de aproximação com o objeto do estudo, pelo acompanhamento das discussões em níveis nacional e internacional; experiência acumulada; e posição hierárquica compatível para expressar os interesses da instituição vinculada (Quadro 1).

Quadro 1
Características das instituições pesquisadas e o número de entrevistados, 2014.

Os sujeitos entrevistados pertencem a uma destas quatro categorias: Setor Público (SP), Setor Regulado (SR), Sociedade Civil (SC) e Organização Internacional (OI).

No período de fevereiro a junho de 2013, foram realizadas entrevistas individuais presenciais, em Brasília e São Paulo, com duração média de uma hora, com base em um roteiro semiestruturado previamente testado (Quadro 2). As entrevistas foram gravadas e transcritas pela pesquisadora. A categoria da instituição vinculada ao entrevistado foi identificada por códigos: SP, SR, SC e OI. O código foi seguido de um número para cada entrevistado.

Quadro 2
Sequência de perguntas da entrevista.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade de Brasília (parecer nº 117/2012).

Resultados

A racionalidade adotada para abordar os riscos atribuídos aos produtos alimentícios ultraprocessados e os mecanismos de regulação mostra-se diferenciada quando é expressa por diferentes sujeitos. Cada um, em seus campos de competências, desenvolve estratégias de influências e age para adaptar a ação política aos seus interesses. Com aportes diferenciados de capital simbólico e material 2323. Bourdieu P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2009. e com compromissos sociais nem sempre sintonizados, os sujeitos seguem trajetórias específicas que conduzem a processos distintos de compreensão das políticas públicas.

Ao explorar as realizações discursivas do enunciado matriz “Regulação Consentida” em relação à sua função enunciativa, observa-se que o alcance de um produto saudável não depende apenas de disposições legais, mas envolve uma governança regulatória estabelecida entre as partes interessadas, articulando a interiorização dos valores do mercado e de um produto saudável. Essas realizações discursivas são examinadas quanto à diferenciação das suas significações e às alterações das suas formulações entre um conjunto de entrevistas e outro, com fins de delimitar e interpretar o jogo de concordâncias e de conflitos que atravessam as expectativas de um produto alimentício saudável.

Regulação: voluntária ou compulsória?

Para regular as práticas do mercado no âmbito da saúde é imprescindível que haja possibilidade ou comprovação de riscos à integridade da população. O discurso do sujeito da OI é genérico, porém aborda os elementos necessários para deflagrar um processo de regulação dos produtos alimentícios ultraprocessados: “É clara a relação do consumo de alimentos industrializados com essas doenças [DCNT]. (...) têm algumas pesquisas mostrando (...) que a densidade energética deles normalmente é maior do que os alimentos in natura, (...) o que favorece o aumento do excesso de peso (...) e de doenças relacionadas...”.

Porém, regular é uma iniciativa técnica e política e, portanto, são as convergências e divergências dos discursos dos sujeitos do SP, SR, SC e OI que marcam o ambiente regulatório explorado a seguir. Entre a abordagem da recuperação do poder regulador do Estado e a de uma reforma institucional com o objetivo de reduzir os processos burocráticos e facilitar as atividades econômicas, as reflexões dos sujeitos da SC e do SP são divergentes. Para SC2, a criação das agências reguladoras dinamizou a atividade regulatória do Estado: “...o Estado brasileiro voltou a ter um papel ativo, (...) readquiriu o seu papel regulador. (...) É um sistema capitalista movido fundamentalmente pelo lucro, se não houver regras claras, (...) as consequências para a população são dramáticas”. Para o sujeito SP5, as agências reguladoras não cumprem o seu papel formal: “...eu tenho dúvidas do papel das agências como modelo institucional de braço do Estado (...). Elas terminam sendo mais reféns do mercado do que obedecendo ao Estado”.

Frente à premência de melhorar o perfil nutricional dos produtos alimentícios ultraprocessados, o governo decidiu instituir pactos formais (Acordos) com entidades representativas das indústrias, estabelecendo, conjuntamente, metas flexíveis e de longo prazo 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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. Contudo, o sujeito SR1 afirma: “Nós fizemos um Acordo com o MS [Ministério da Saúde]”. Esse “nós” assume a conotação de impositivo, de unilateralidade, como se a iniciativa do Acordo 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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e a decisão de efetuar o ato recaiu predominantemente sobre o sujeito que fala. De fato, a iniciativa formal desse Acordo 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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partiu do governo, para minimizar os impactos negativos na saúde e por identificar uma provável aceitação por parte das corporações quando comparado à regulação compulsória.

Para outros sujeitos do SR, o Acordo é uma demonstração de sensatez do governo e de entendimento entre as partes, reconhecendo a complexidade envolvida na alteração das fórmulas para aproximá-las a produtos com “perfil saudável”. Para eles, regulamentar para sanar falhas por outros mecanismos que não os acordos voluntários seria uma atitude inconveniente: “...é radicalismo, uma regulamentação (...) não dá a flexibilidade como o Acordo. O Acordo é uma coisa de compreensão (...) falar que os alimentos industrializados têm que ser regulamentados, eu sou contra esses controles” (SR1).

A compreensão do SR sobre as medidas - Acordo e Regulação - é paradoxal. A primeira é vista como símbolo de diálogo, bem comum racional e educativa; enfim, protetora do mercado. Já a regulamentação representa radicalismo, controle, autoritarismo, ineficácia e inflexibilidade. A regulação de alimentos, uma prática regulatória, instituída há mais de seis décadas pelo Ministério da Saúde 2424. Brasil. Decreto-Lei nº 986, de 21 de outubro de 1969. Institui normas básicas sobre alimentos. Diário Oficial da União 1969; 11 nov. e, na atualidade, pelas suas autarquias, com a função de atuar para proteger os interesses coletivos de saúde e de tornar justa a competição entre as empresas; agora se converte em um instrumento de polêmica, como expressou anteriormente o sujeito SR1. Para ele, o mercado de alimentos se apresenta como um espaço soberano e autorregulável, dispensando qualquer tipo de imposição de regras e de sanções por descumprimento a elas.

No âmbito do grupo do SP e da SC, as falas não seguem uma uniformidade quanto aos Acordos. Há três posições: (a) favorável, cabe ao governo contornar as divergências de interesses com as indústrias, “...o governo precisa ser parceiro das nossas indústrias” (SP4); “É uma medida de governança combinada com o segmento industrial” (SP3); (b) condicionado à preservação da supremacia do interesse público e de outras prerrogativas do Estado: “Eu não vejo problemas em firmar Acordos, desde que não tenham contrapartidas que firam o Estado” (SP1) e “Esses Acordos são necessários, mas insuficientes e tímidos no que diz respeito às suas metas” (SC1); e (c) contrária, considerando que o conteúdo negociado é de relevância da saúde pública, factível e legal: “Eu sou favorável que haja a regulamentação, mesmo que se estipule um prazo [...] para construção democrática da regra” (SP5) e “...Ele [governo] tem que ter regras claras e inclusive sanções” (SC2).

Depreendem-se dos discursos acima três cenários. O primeiro aponta ausência de sintonia interna entre os argumentos dos sujeitos do SC que, apesar de pertencerem ao mesmo campo de fala, expressam visões sociopolíticas diferentes sobre o Acordo 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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; efeito similar foi registrado no âmbito dos sujeitos do SP. Outro indica ausência de um entendimento harmônico sobre regulação, que envolve um elenco de medidas de controles legais e compulsórias, técnicas e administrativas, para proteger a população contra os riscos à saúde advindos dos sistemas de produção 2525. Lucchese GA. Globalização e regulação sanitária: os rumos da vigilância sanitária no Brasil. Brasília: Agência Nacional de Vigilância Sanitária; 2008.. Regular (com regulamentação) é o processo empreendido pela ANVISA, que implica amplos estudos, envolvimento das partes interessadas, consulta pública, antes da sua aprovação/conclusão 2626. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Agenda regulatória: ciclo quadrienal 2013-2016. http://www6.ensp.fiocruz.br/visa/files/Agenda_Regulatoria_Quadrienal_final_baixa%20(1).pdf (acessado em 02/Abr/2018).
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. O terceiro cenário mostra o acordo como expressão de compreensão e de flexibilidade entre o governo e o setor industrial, comparando-se implicitamente à regulação.

A construção do consenso entre o governo e as corporações de alimentos formalizada nesses acordos demonstra a receptividade e a predisposição dessas entidades em cooperar. Contudo, o resultado obtido desse consenso pode culminar em concessões equilibradas ou em prejuízos para uma das partes, inclusive para a saúde pública. A opção do governo brasileiro em não regulamentar, dispensando sua prerrogativa em favor do Acordo 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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pode ser entendida como um recuo em prol do mercado, uma vez que poderia ter sido elaborado um regulamento, mediante um processo participativo e dialógico, com prazo legal para vigência negociado, seguindo a práxis da ANVISA. Esta é a impressão do sujeito SC2: “Eu acho que tem essa visão de hoje - parceria público-privada, (...) eu percebo que tem um risco (...) de uma privatização, de conceder um poder, como se o mercado pudesse regular”.

Ressalte-se que o aumento da prevalência de DCNT e sua associação ao consumo de produtos alimentícios ultraprocessados já acumula consequências graves individuais e coletivas com alto custo para sociedade. Somente o Estado é capaz de transformar essa demanda em objeto de interesse público da agenda de saúde como expresso na PNAN 2012 1919. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.. Isto foi explicitado pelo sujeito SP5: “Ninguém pode esperar que o mercado seja compatível espontaneamente com os direitos sociais, em especial da saúde, porque ele é vocacionado para o lucro. Então precisa estar sempre regulado, controlado socialmente e com o Estado...”.

Para a construção do Acordo 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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, inicialmente para a redução do teor de sódio, o governo convocou, apenas, as corporações das indústrias de maior relevância econômica. Os sujeitos da SC e do SP criticam essa restrição: “...a sociedade não foi convocada e nem a academia (...). Quem tomou parte desse Acordo foi o Ministério da Saúde e as indústrias com o apoio da ANVISA...” (SC1). Já o sujeito SP2 destaca: “Fazer política é dialogar, porque democracia se faz a partir disto. Isto não significa alinhamento. Isso significa diálogo, busca de agendas convergentes...”. Desses argumentos expressam um nítido confronto entre o “exercício da democracia” e a “extensão da representação”. Alargar a prática democrática nos espaços públicos requer a participação de todos os interessados nas deliberações que repercutem no corpo coletivo 2727. Bobbio N. Estado, governo e sociedade: para uma teoria geral da política. 12ª Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 2005.. A ausência da sociedade civil organizada nesse diálogo institucional compromete tanto a legitimidade das deliberações, quanto demonstra um retrocesso na gestão participativa.

Os Acordos 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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firmados em 2007 rompem com a tradição institucional brasileira de regulação de alimentos para lidar tanto com problemas de inocuidade como de nutrição. Com a regulação, mediante construção participativa com as partes interessadas, tornou-se possível aprovar, no passado, regras obrigatórias para a adição de iodo no sal 2828. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução - RDC nº 28, de 28 de março de 2000. Dispõe sobre os procedimentos básicos de boas práticas de fabricação em estabelecimentos beneficiadores de sal destinado ao consumo humano e o roteiro de inspeção sanitária em indústrias beneficiadoras de sal. Diário Oficial da União 2000; 30 mar., e de ferro e ácido fólico nas farinhas 2929. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução - RDC nº 344, de 13 de dezembro de 2002. Diário Oficial da União 2002; 18 dez..

Essa mudança de estratégia foi benéfica para as indústrias em duplo sentido, pois permitiu maior flexibilidade para estabelecer o nível de redução do sódio e o prazo para adequação dos seus produtos e evitou punições pelo eventual descumprimento dos Acordos, conforme expressam os sujeitos SC e do SP: “...a atividade do governo (...) é mais no sentido de relaxar do que de apertar a regulação” (SC1). “...como não foi possível aprovar a regra, fez-se um Acordo, pois havia o interesse em não prejudicar a indústria nacional” (SP6).

As corporações transnacionais preservam seus interesses, mantendo um canal ativo de articulação internacional que permite a circulação das críticas, pressões e mobilização no âmbito da Organização Mundial da Saúde (OMS), da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), dos países e das organizações da sociedade civil, com relação aos produtos alimentícios ultraprocessados e assim orientam suas entidades para se anteciparem na defesa de seus interesses. Essas entidades acionam seus membros para repensarem as fórmulas dos produtos, antevendo uma ação incisiva dos governos, como se observa na fala “...as multinacionais trouxeram esta ideia (...) que se estende para o resto do mundo. Então, elas receberam a instrução que, em um determinado momento, teriam que começar a pensar (...), nós começamos muito antes do governo atentar ao problema” (SR1). Aqui, observa-se outra tentativa de protagonismo do SR para questionar a atuação do governo brasileiro.

A influência das instâncias intergovernamentais nos processos nacionais é vista como uma mescla de dependência e impotência, implicando perda parcial de soberania nacional para definir regras, mesmo diante de justificativas consideradas relevantes, conforme o discurso de SP4: “...pactuar uma medida regulatória envolve um acordo internacional, porque se trata do Mercosul [Mercado Comum do Sul] (...) O avanço da agenda regulatória [componentes nutricionais] dependerá de um tensionamento internacional, (...) e de uma concertação, um apoio da sociedade...”. No trecho final desse discurso, observa-se que o governo espera e prevê demandas relevantes por parte da sociedade, na definição dos processos e decisões. Em tese, a sociedade civil poderia impulsionar temas polêmicos como a regulação dos componentes nutricionais dos produtos alimentícios ultraprocessados, levando a decisões para além do que foi firmado nos pactos internacionais ou nos acordos voluntários.

Do lado do mercado, o discurso dos sujeitos do SR evidencia que a relação estabelecida com instâncias supranacionais e intragovernamental é o locus em que expressam suas intenções e exercem influências nas decisões, apesar de relatar uma atuação aparentemente limitada: “...a gente participa na discussão dentro do Brasil e indiretamente (...) como observador no Codex (...), para posicionamento, não voto nem veto (...) E no Mercosul, a gente (...) participa das diferentes comissões por meio da ANVISA” (SR3). Quando conveniente, tais instâncias são reportadas como portadoras de status superior ao do Estado; por exemplo, quando o sujeito SR1 faz menção à elasticidade do prazo para adequação do teor de sódio nas fórmulas dos produtos alimentícios ultraprocessados: “Nas nossas fórmulas, nós chegaremos até 2020 conforme preconiza a OMS...”.

Para manter o mercado de alimentos competitivo, as empresas investem em tecnologias e em mecanismos de controle de qualidade que racionalizam uso de recursos e incrementam lucros. Disso se multiplicam os produtos baseados em matérias primas relativamente baratas, formulações nutricionalmente desequilibradas e altamente rentáveis, que contradizem os argumentos do SR: “quem dita as qualidades do alimento é o próprio alimento ou a terra”. Ciente dessa estratégia mercadológica, o sujeito SR3 revela, de modo sutil e ponderado, as intenções da indústria com os produtos alimentícios ultraprocessados: “...há um aumento muito grande da oferta de produtos com (...) mais açúcar, produtos com excesso de gordura...”.

A competitividade no mercado de alimentos expõe as diferenças de interesses e a existência de um sistema de estratificação entre as empresas. Há uma hierarquia de poder entre as corporações, que sujeitam as indústrias de menor porte e entidades politicamente menos expressivas a quase obrigatoriamente seguirem os procedimentos das indústrias de primeira linha para se manterem no mercado: “Nós somos a grande maioria (...) as 200 primeiras empresas do país em produção. Se nós fizermos o produto baixar [os teores nutricionais], as demais vão ter que acompanhar, senão elas perdem mercado. As nossas empresas saem na frente para dar o exemplo...” (SR1).

Assim SR1 expressa a visão do mercado que se coloca como o salvador da economia e do próprio Estado, expresso pela geração de empregos, contribuição na balança comercial e tributos que garantem o funcionamento da máquina estatal: “...nós produzimos, empregamos, pagamos impostos, exportamos, estamos aí há 150 anos”. Discurso que indica simultaneamente força econômica e política, e que intimida de modo implícito 2323. Bourdieu P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2009. o poder público, compelindo-o a recuar de fazer arranjos políticos que firam os interesses comerciais do setor regulado, para se poupar de possíveis retaliações.

Nesse sentido, o discurso do sujeito SP4 enaltece essa adaptação no agir do poder público perante o mercado: “...não dá mais para fazer aquela vigilância de (...) autuar, apreender, (...) de antigamente (...). Hoje, a vigilância sanitária moderna trabalha com o stakeholders, com parcerias e (...) é um movimento contemporâneo. (...) trazer a indústria à responsabilidade (...) à voluntariedade...”.

Atos administrativos, reconhecidamente legais e necessários em situações de riscos à saúde pública são depreciados e avaliados como ultrapassados e inoportunos no contexto contemporâneo para os orientados pelo lema “mercado tudo pode”. Salienta-se que a posição do sujeito SP4 apresentada anteriormente não é hegemônica, conforme o discurso que segue: “...a ANVISA não pode fugir dessa responsabilidade, (...) tem que normatizar e não pode ficar a reboque do mercado” (SP5). A divergência entre essa manifestação e a anterior indica que inexiste harmonia no entendimento da interação público-privada por parte dos sujeitos do SP e que os Acordos podem estar aquém das responsabilidades do poder público perante o mercado e, portanto, serem insuficientes para tratar das necessidades de saúde da coletividade.

Discussão

A prevenção e o controle das DCNT, particularmente do excesso de peso, demandam ações urgentes e articuladas do poder público, que se confrontam com a lógica das políticas neoliberais das corporações de alimentos amparada de um lado pela rentabilidade máxima e ampla liberdade do mercado e, de outro, pelo enfraquecimento do poder do Estado e resistência às medidas de regulação compulsória dos produtos alimentícios ultraprocessados 3030. Moodie R, Stuckler D, Monteiro C, Sheron N, Neal B, Thamarangsi T, et al. Profits and pandemics: prevention of harmful effects of tobacco, alcohol, and ultra-processed food and drink industries. Lancet 2013; 381:670-9.. Mobilizando-se para influenciar o desenho das políticas públicas em prol dos seus interesses 3131. Mialon M, Swinburn B, Wate J, Tukana I, Sacks G. Analysis of the corporate political activity of major food industry actors in Fiji. Global Health 2016; 12:18. e propugnar medidas não regulatórias com prazos extensivos 3030. Moodie R, Stuckler D, Monteiro C, Sheron N, Neal B, Thamarangsi T, et al. Profits and pandemics: prevention of harmful effects of tobacco, alcohol, and ultra-processed food and drink industries. Lancet 2013; 381:670-9., a conduta dessas corporações terminam por retardar a contenção dessas doenças. Os resultados deste estudo evidenciam a complexidade dos embates, controvérsias e obstáculos que atravessam os discursos dos sujeitos envolvidos com a estratégia para reformulação dos produtos alimentícios ultraprocessados.

Atenta-se que essas corporações massificaram a oferta de produtos alimentícios ultraprocessados por causa de suas vantagens econômicas: matérias primas baratas, custos de produção reduzidos e produtos altamente palatáveis 3232. Monteiro CA. Nutrition and health. The issue is not food, nor nutrients, so much as processing. Public Health Nutr 2009; 12:729-31., sustentada por um aparato publicitário fomentador de vendas 3232. Monteiro CA. Nutrition and health. The issue is not food, nor nutrients, so much as processing. Public Health Nutr 2009; 12:729-31.,3333. Hawkes C. Marketing activities of global soft drink and fast food companies in emerging markets: a review. In: World Health Organization, editor. Globalization, diets and noncommunicable diseases. Geneva: World Health Organization; 2002. p. 23-78., inclusive questionável do ponto de vista ético 3434. Stuckler D, Nestle M. Big food, food systems, and global health. PLoS Med 2012; 9:e1001242.. Porém, apesar de os impactos negativos dos produtos alimentícios ultraprocessados à saúde e à nutrição da população atual e das futuras gerações 3535. Phillips L. Food and globalization. Annual Review of Anthropology 2006; 35:37-57. dispostas a consumi-los, esses produtos são lucrativos para quem os produz, revelando a incompatibilidade entre os propósitos do mercado e os da saúde expressa por SP5.

Lamentavelmente, é sobre o consumidor que recai o ônus desse processo global das corporações de alimentos, pois a introdução de produtos alimentícios ultraprocessados na rotina alimentar não é resultado de escolhas estritamente racionais, mas sim influenciadas pela dinâmica social e estimuladas pelo aparato publicitário que exacerba o consumo desses produtos 3333. Hawkes C. Marketing activities of global soft drink and fast food companies in emerging markets: a review. In: World Health Organization, editor. Globalization, diets and noncommunicable diseases. Geneva: World Health Organization; 2002. p. 23-78.. Para Bourdieu 3636. Bourdieu P. Contrafogos: por um movimento social europeu. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores; 2001., a força motriz do mercado ameaça os bens culturais (incluindo hábitos e práticas alimentares) na sociedade contemporânea neoliberal e as inovações tecnológicas e os empreendimentos econômicos não tornam esses bens multidiversificados e nem promovem a satisfação do consumidor; são mercadorias lucrativas e indiferentes aos laços culturais, aceitáveis para o “público máximo” de todos os países.

Daí, é possível compreender a interface entre a globalização do mercado de alimentos, a transição alimentar e a disseminação internacional dos fatores de riscos para as DCNT 66. World Health Organization. Fiscal policies for diet and prevention of noncommunicable diseases: technical meeting report, 5-6 May 2015. Geneva: World Health Organization ; 2016.,3737. Tullao TS. The impact of economic globalization on noncommunicable diseases: opportunities and threats. In: World Health Organization, editor. Globalization, diets and noncommunicable diseases. Geneva: World Health Organization; 2002. p. 17-24.. Com a intensificação das DCNT e a sua associação aos produtos alimentícios ultraprocessados 55. World Health Organization. Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of a WHO Consultation. Geneva: World Health Organization; 2000. (WHO Technical Report Series, 894).,66. World Health Organization. Fiscal policies for diet and prevention of noncommunicable diseases: technical meeting report, 5-6 May 2015. Geneva: World Health Organization ; 2016.,3232. Monteiro CA. Nutrition and health. The issue is not food, nor nutrients, so much as processing. Public Health Nutr 2009; 12:729-31.,3434. Stuckler D, Nestle M. Big food, food systems, and global health. PLoS Med 2012; 9:e1001242., esse ideário neoliberal de independência plena do mercado se desfaz, e o Estado é convocado e pressionado a intervir em defesa da saúde pública, mesmo se isto implicar conflitos entre os interesses privados e as demandas sociais 3838. Magalhães R. Regulação de alimentos no Brasil. Rev Direito Sanit 2017; 17:113-33. em prol de um produto saudável.

Diante disso, cientistas sociais apontam que a soberania dos estados nacionais se enfraqueceu com a globalização da economia 11. Beck U. La sociedade del riesgo: hacia una nueva modernidade. Barcelona: Paidós; 2002., que assume o papel de interlocução política local e global, posto que é relativizada e submetida a fortes e constantes influências das regras e acordos internacionais do comércio de alimentos, especialmente pelos liderados pela Comissão do Codex Alimentarius (CAC-FAO/OMS), para lidar com os assuntos de qualidade e de padrões de segurança sanitária 3939. Lucchese GA. A internacionalização da regulamentação sanitária. Ciênc Saúde Colet 2003; 8:537-5.. Essa perda de autonomia estatal foi ressaltada pelos SP4 e SR1. Há, ainda, constantes pressões das instâncias públicas para a flexibilização de normas e procedimentos que potencializem o livre mercado 3939. Lucchese GA. A internacionalização da regulamentação sanitária. Ciênc Saúde Colet 2003; 8:537-5., a exemplo da formalização dos Acordos 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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. Entre as práticas adotadas pelas corporações de alimentos para mobilizar a agenda pública em prol dos seus interesses estão a prática de lobbying, ameaça de corte de postos de trabalho, de encerramento das atividades industriais, de ação judicial, etc. 3131. Mialon M, Swinburn B, Wate J, Tukana I, Sacks G. Analysis of the corporate political activity of major food industry actors in Fiji. Global Health 2016; 12:18.. O SR1 clarificou devidamente esse poderio econômico das corporações frente ao aparato estatal.

Assim, com diferentes justificativas, os sujeitos vinculados ao SR e ao SP apontam, respectivamente, que seguem as orientações das organizações multilaterais e que o avanço da agenda regulatória nacional depende das deliberações internacionais, caracterizadas por prolongados debates e morosidade nos resultados. Na ocasião, o sujeito do SR afirma que a OMS concedeu prazo superior para adequação das fórmulas dos produtos alimentícios ultraprocessados em comparação aos definidos nos Acordos.

A regulação sanitária brasileira prevê processos formais, com o envolvimento ativo de diferentes representantes - SR, da SC, universidades e instituições públicas de saúde - e participação aberta de interessados 2626. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Agenda regulatória: ciclo quadrienal 2013-2016. http://www6.ensp.fiocruz.br/visa/files/Agenda_Regulatoria_Quadrienal_final_baixa%20(1).pdf (acessado em 02/Abr/2018).
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. É nesse ambiente que se confrontam as evidências científicas, os posicionamentos político-ideológicos, as expectativas e as linhas estratégicas para proteger a população dos riscos dos alimentos. Sob esses diferentes olhares entremeados de interesses conflitantes, deve-se modular o consenso possível para viabilizar o controle dos riscos dos produtos alimentícios ultraprocessados e o estabelecimento de medidas de intervenção pública efetivas para ajustar as práticas do mercado. Os Acordos 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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, em contraposição, interrompem esses processos, sem permitir um debate plural e transparente, estabelecendo metas restritas e com representação limitada de corporações 4040. Martins APB. Reduc¸a~o de so´dio em alimentos: uma ana´lise dos acordos volunta´rios no Brasil. Sa~o Paulo: Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor; 2014..

Diante da necessidade de regular os produtos alimentícios ultraprocessados, de um lado, e a pressão do mercado internacional - somada à ausência de regras supranacionais e à expressividade econômica das corporações envolvidas - de outro, a instituição de Acordos em substituição à regulação foi a estratégia viabilizada pelo governo brasileiro para amenizar os conflitos com o mercado de alimentos, garantir o empenho dele e vislumbrar um possível avanço. Esses Acordos obtiveram o respaldo do SR e de parte do SP sensível às demandas do mercado. No entanto, em épocas anteriores, com o incremento da função regulatória do Estado mencionada por SC2, ocorreu o embate entre o governo e as corporações de alimentos de menor poder econômico, e a regulação foi aprovada, instituindo-se regras e sanções para garantir a adição de nutrientes específicos no sal 2828. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução - RDC nº 28, de 28 de março de 2000. Dispõe sobre os procedimentos básicos de boas práticas de fabricação em estabelecimentos beneficiadores de sal destinado ao consumo humano e o roteiro de inspeção sanitária em indústrias beneficiadoras de sal. Diário Oficial da União 2000; 30 mar. e nas farinhas 2929. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução - RDC nº 344, de 13 de dezembro de 2002. Diário Oficial da União 2002; 18 dez..

Esses Acordos são modalidades similares às parcerias público-privada no campo da saúde (PPPS) que se pautam na partilha de objetivos e ou de tomada de decisão entre os setores público e privado para alcançar resultados sem relevantes desgastes político-institucionais 4141. Hawkes C. Working paper on public-private partnerships for health. ec.europa.eu/health/ph_determinants/life_style/nutrition/documents/ev20081028_wp_en.pdf (acessado em 23/Jul/2014).
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. Na Europa, inúmeras PPPS foram alavancadas para enfrentar o fenômeno do sobrepeso e obesidade, destinando-se à revisão de hábitos de consumo, assim como à redução de componentes dos produtos alimentícios ultraprocessados 4242. Borch A, Roos G. Public private partnerships fighting obesity in Europe. Anthropology of Food 2012; S7. http://aof.revues.org/7286.
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. A “regulação flexível” dos Acordos presumivelmente suavizam os impactos prejudiciais à saúde pública e, ao mesmo tempo, beneficiam o mercado, assegurando-lhe um tempo dilatado para os ajustes, sem quaisquer consequências pelo descumprimento 4343. Majone G. Do estado positivo ao estado regulador: causas e consequências da mudança no modo de governança. Regulação econômica e democracia: o debate europeu. São Paulo: Editora Singular; 2006.. Entretanto, esse tipo de “flexibilidade” pode resultar em concessão excessiva do Estado às corporações, conforme antes abordado por SC1, SP5 e SP6, e no comprometimento da defesa efetiva dos interesses públicos de saúde - produtos saudáveis e redução das DCNT.

O Ministério da Saúde e a ANVISA enaltecem os Acordos para a redução do sódio como inovadores, legítimos e transparentes 4444. Nilson EAF, Jaime PC, Resende DO. Iniciativas desenvolvidas no Brasil para a redução do teor de sódio em alimentos processados. Rev Panam Salud Pública 2012; 34:287-92.. Entre o enaltecimento dessa prática e o descarte de seus possíveis méritos, ponderações são necessárias: primeiro, o cunho ideológico dessa medida, demonstrado pela dispensa das prerrogativas do Estado em estabelecer regras ao mercado e pela opção por Acordos maleáveis e de longa duração; segundo, enfraquecimento das arenas de controle social, por não envolver as representações da sociedade civil nas discussões travadas na esfera pública.

Assim, os Acordos, ao contrário de significarem avanço no controle de alimentos, de serem atos de compreensão, como apontado pelo sujeito do SR, ou de reconhecimento do setor industrial como parceiro, conforme mencionado pelo sujeito do SP, representam limitações político-institucionais para o exercício da vigilância sanitária, em especial, em três aspectos: (a) criam precedentes para evitar a regulação com a finalidade de reduzir os teores de nutrientes-críticos, ação fundamental para proteger a saúde; (b) geram situações de incoerência institucional, pois não se pode fiscalizar o cumprimento dos Acordos; e (c) negligenciam o papel da sociedade civil no processo de pactuação de medidas sanitárias de interesse público.

Perante a força motriz do mercado, a defesa do bem comum está primordialmente nas mãos da sociedade civil organizada, em especial, daquela que reafirma o caráter regulatório do Estado. Qualidades centrais da “boa governança” de qualquer iniciativa são a representação e a participação na tomada de decisão daqueles afetados pelo exercício do poder 4545. Hawkes C, Buse K. Public health sector and food industry interaction: it's time to clarify the term 'partnership' and be honest about underlying interests. Eur J Public Health 2011; 21:400-1.. A ausência forçada da sociedade civil rompe com as práticas previstas na Constituição Federal de 1988 de criação de espaços públicos de intervenção e de expressão da democracia participativa. A sociedade civil pode atuar como um integrante diferenciado na defesa do interesse público e da primazia dos assuntos de saúde, e, nesse caso, contribuir para a aprovação de metas impactantes para redução de nutrientes de risco nos produtos alimentícios ultraprocessados.

Embora a regulação seja usualmente percebida de modo deturpado, como medida autoritária, ela é oportuna e necessária para prevenir riscos crescentes à saúde e favorecer a implementação da diretriz da PNAN 2012 1919. Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde, Ministério da Saúde. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. na sua potencialidade.

Conclusão

Regular riscos à saúde associados aos produtos alimentícios ultraprocessados para conter as taxas ascendentes de DCNT constitui tarefa desafiadora aos governos, pois implica lidar com o poder expressivo das corporações de alimentos e as limitações dos organismos nacionais e internacionais de saúde, diante de uma sociedade civil ativa. A regulação sanitária, por intermédio do uso de estratégias e práticas participativas, busca administrar o conjunto de influências e de interesses divergentes com os sujeitos-chave, a fim de promover um resultado justo, legítimo e extensivo, orientado primordialmente para garantir produtos saudáveis sem, contudo, negligenciar os interesses do mercado.

Os Acordos 1515. Ministério da Saúde. Trata sobre o Acordo do Ministério da Saúde com a Associação Brasileira de Indústrias de Alimentos para redução dos teores de sódio, gorduras e açúcares dos alimentos. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/acordo_social_reducao_teores_sodio_acucar_gorduras.pdf (acessado em 15/Mar/2012).
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, em contraposição à regulação, desrespeitam as disposições da PNAN 2012 e representam um retrocesso face às suas características particulares - maleabilidade, participação social restrita, abrangência limitada, sem previsão de sanções e penalidades e de longa duração - cujos resultados interferirão lentamente na melhoria nutricional dos produtos alimentícios.

Agradecimentos

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo apoio para a realização do doutorado-sanduíche na Universidad Rovira i Vigili (Tarragona/Espanha). À coorientadora do doutorado, Profa. Dra. Renata Monteiro do Departamento de Nutrição, Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade de Brasília. Este artigo relata parte da tese Riscos Emergentes dos Alimentos: Regulação Conflitos e Tensões. Ao Patrick Dahlet, professor visitante da Universidade Federal de Minas Gerais, pelo suporte nas técnicas de Análise do Discurso.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    14 Jul 2020
  • Revisado
    01 Mar 2021
  • Aceito
    25 Mar 2021
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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