Prevalências e desigualdades no acesso aos medicamentos por usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil em 2013 e 2019

Prevalence rates and inequalities in access to medicines by users of the Brazilian Unified National Health System in 2013 and 2019

Prevalencias y desigualdades en el acceso a los medicamentos por parte de los usuarios del Sistema Único de Salud en Brasil en 2013 y 2019

Alexandra Crispim Boing Fabiola Bof de Andrade Andréa Dâmaso Bertoldi Karen Glazer de Anselmo Peres Adriano Massuda Antonio Fernando Boing Sobre os autores

Resumos

O objetivo do estudo foi analisar e comparar a prevalência, a forma de obtenção e os fatores associados ao acesso a medicamentos entre usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil. Foram analisados os dados das edições 2013 e 2019 da Pesquisa Nacional de Saúde, estudo de abrangência nacional e representativo da população brasileira. Os desfechos foram: (1) a obtenção total, por meio do SUS, dos medicamentos prescritos em atendimentos em saúde realizados no próprio SUS nas duas semanas anteriores à entrevista, e (2) a obtenção total dos medicamentos independentemente da fonte. Características demográficas e socioeconômicas foram incluídas como variáveis independentes. Em 2019, observou-se que 29,7% dos entrevistados obtiveram no SUS todos os medicamentos prescritos, que 81,8% tiveram acesso total aos medicamentos quando consideradas todas as fontes de obtenção e que 56,4% pagaram algum valor pelos medicamentos. A proporção de pessoas que não obtiveram nenhum medicamento no SUS e que efetuaram algum desembolso direto aumentou entre 2013 e 2019. A probabilidade de obter todos os medicamentos no SUS foi maior entre os mais pobres, e de consegui-los, independentemente da fonte, foi maior entre os mais ricos. Dentre as pessoas que não conseguiram acesso a todos os medicamentos, aproximadamente duas em cada três indicaram como principal motivo dificuldades de obtenção encontradas em serviços financiados pelo setor público. Verificou-se ampliação do desembolso direto para compra de medicamentos no Brasil e redução de acesso pelo SUS entre usuários do sistema.

Palavras-chave:
Preparações Farmacêuticas; Acesso aos Serviços de Saúde; Sistema Único de Saúde


The study aimed to analyze and compare the prevalence of access to medicines and associated factors among users of the Brazilian Unified National Health System (SUS). The authors analyzed data from the 2013 and 2019 editions of the Brazilian National Health Survey, a nationwide health study, representative of the Brazilian population. The outcomes were: (1) obtaining from the SUS all the medicines prescribed during care received in the SUS itself in the two weeks prior to the interview (2) and obtaining all the medicines, regardless of the source. Demographic and socioeconomic characteristics were included as independent variables. In 2019, 29.7% of the interviewees obtained all the prescribed medicines from the SUS, 81.8% obtained all the medicines in general (considering all sources), and 56.4% paid some amount for the medicines. The proportion who did obtain any medicine from the SUS and that made some out-of-pocket payment increased from 2013 to 2019. The likelihood of obtaining all the medicines in the SUS was higher among the poorest, and that of obtaining the medicines regardless of source was higher among the wealthiest. Approximately two out of three persons that were unable to access all the medicines reported difficulties obtaining them in services funded by the public sector. There was an increase in out-of-pocket expenditure on medicines in Brazil and a reduction in access through the SUS, among users of the system.

Keywords:
Pharmaceutical Preparations; Health Services Accessibility; Unified Health System


El objetivo de este estudio fue analizar y comparar la prevalencia, la forma de obtención y los factores asociados al acceso a los medicamentos entre los usuarios del Sistema Único de Salud (SUS) en Brasil. Se analizaron los datos de las ediciones 2013 y 2019 de la Encuesta Nacional de Salud, un estudio de cobertura nacional y representativo de la población brasileña. Los resultados fueron: (1) la obtención total, a través del SUS, de los medicamentos prescritos en los servicios de salud realizados en el propio SUS en las dos semanas anteriores a la entrevista, y (2) la obtención total de los medicamentos independientemente de la fuente. Las características demográficas y socioeconómicas se incluyeron como variables independientes. En 2019 se observó que el 29,7% de los entrevistados obtuvo todos los medicamentos prescritos en el SUS, que el 81,8% tuvo acceso total a los medicamentos al considerar todas las fuentes de obtención y que el 56,4% pagó por los medicamentos. La proporción de personas que no obtuvieron ningún medicamento en el SUS y que realizaron algún gasto directo aumentó entre 2013 y 2019. Entre los pobres, la probabilidad de obtener todos los medicamentos del SUS fue mayor, y entre los más ricos también fue mayor esta obtención independientemente de la fuente. Entre las personas que no pudieron acceder a todos los medicamentos, aproximadamente dos de cada tres indicaron como razón principal las dificultades que se encuentran en los servicios financiados con fondos públicos. Hubo un aumento del gasto directo para la compra de medicamentos en Brasil y una reducción del acceso a través del SUS entre los usuarios del sistema.

Palabras-clave:
Preparaciones Farmacéuticas; Accesibilidad a los Servicios de Salud; Sistema Único de Salud


Introdução

O acesso a medicamentos é ponto fundamental para garantir atenção integral em saúde e é considerado meta essencial dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 11. United Nations. Sustainable development goals. New York: United Nations; 2015.. Assim, o fornecimento de medicamentos apropriados, de qualidade, em quantidade suficiente e a preços acessíveis deve ser foco de atenção dos formuladores de políticas públicas e de agências globais de saúde 22. World Health Organization. The world medicines situation 2011: access to essential medicines as part of the right to health. Geneva: World Health Organization; 2011..

Embora o acesso aos medicamentos seja um direito humano fundamental e tenha sido ampliado em décadas recentes, estima-se que, em 2017, cerca de dois bilhões de pessoas ainda não tinham acesso a medicamentos básicos, o que correspondia a cerca de um quarto da população mundial 33. World Health Organization. Ten years in public health: 2007-2017. Geneva: World Health Organization; 2017.,44. World Health Organization. Roadmap for access to medicines, vaccines and health product 2019-2023 - comprehensive support for access to medicines, vaccines and other health products. Geneva: World Health Organization; 2019.. O inadequado acesso a medicamentos viola o direto à vida, piora indicadores de saúde e a qualidade de vida e é responsável pelo empobrecimento de muitas famílias, sofrimentos preveníeis, prolongamento de doença e ocorrência de óbitos evitáveis 33. World Health Organization. Ten years in public health: 2007-2017. Geneva: World Health Organization; 2017..

No Brasil, o acesso à terapêutica - inclusive medicamentosa - é direito constitucional 55. Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União 1988; 5 out. e várias políticas públicas para viabilizá-lo têm sido implementadas. Destacam-se, entre o final da década de 1990 e início dos anos 2000, a Lei dos Medicamentos Genéricos 66. Brasil. Lei nº 9.787, de 10 de fevereiro de 1999. Altera a Lei nº 6.360, de 23 de setembro de 1976, que dispõe sobre a vigilância sanitária, estabelece o medicamento genérico, dispõe sobre a utilização de nomes genéricos em produtos farmacêuticos e dá outras providências. Diário Oficial da União 1999; 11 fev., a Política Nacional de Medicamentos 77. Ministério da Saúde. Portaria nº 3.916, de 30 de outubro de 1998. Altera a Lei nº 6.360, de 23 de setembro de 1976, que dispõe sobre a vigilância sanitária, estabelece o medicamento genérico, dispõe sobre a utilização de nomes genéricos em produtos farmacêuticos e dá outras providências. Diário Oficial da União 1998; 10 nov., a adoção da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME) 88. Ministério da Saúde. Relação nacional de medicamentos. Brasília: Ministério da Saúde; 2000. e a Política Nacional de Assistência Farmacêutica 99. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 338, de 6 de maio de 2004. Aprova a Política Nacional de Assistência Farmacêutica. Diário Oficial da União 2004; 20 mai.. Em seguida, foram criados os programas Farmácia Popular do Brasil, Aqui Tem Farmácia Popular e Saúde Não Tem Preço 1010. Ministério da Saúde. Decreto nº 5.090, de 20 de maio de 2004. Institui o Programa Farmácia Popular do Brasil. Diário Oficial da União 2004; 21 mai.,1111. Ministério da Saúde. Portaria nº 184, de 3 de fevereiro de 2011. Dispõe sobre o Programa Farmácia Popular do Brasil. Diário Oficial da União 2011; 4 fev..

Entretanto, apesar das iniciativas para ampliação do acesso aos medicamentos, ainda persistem dificuldades na área, sobretudo relacionadas ao subfinanciamento do Sistema Único de Saúde (SUS), a falhas de gestão e à desestruturação de programas da área 1212. Vieira FS. Desafios do estado quanto à incorporação de medicamentos no Sistema Único de Saúde. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 2019.. Esses problemas vêm se agravando desde que o país entrou numa grave crise política e econômica em 2014, que foi seguida pela implementação de políticas de austeridade fiscal de longo prazo 1313. Massuda A, Hone T, Leles FA, Castro MC, Atun R. The Brazilian health system at crossroads: progress, crisis and resilience. BMJ Global Health 2018; 3:e000829.,1414. Rossi P, Dweck E, Arantes F. Economia política da austeridade. In: Rossi P, Dweck E, Oliveira ALM, organizadores. Economia para poucos: impactos sociais da austeridade e alternativas para o Brasil. São Paulo: Autonomia Literária; 2018. p. 14-31.,1515. Castro MC, Massuda A, Almeida G, Menezes-Filho NA, Andrade MV, Souza Noronha KV, et al. Brazil's Unified Health System: the first 30 years and prospects for the future. Lancet 2019; 394:345-56..

Estudos indicam que a prevalência de acesso a medicamentos no Brasil varia entre 40% e 95%, dependendo do tipo de método utilizado para mensuração e do período recordatório empregado 1616. Bertoldi AD, Barros AJD, Wagner A, Ross-Degnan D, Hallal PC. A descriptive review of the methodologies used in household surveys on medicine utilization. BMC Health Serv Res 2008; 8:222.,1717. Boing AC, Bertoldi AD, Boing AF, Bastos JL, Peres KG. Acesso a medicamentos no setor público: análise de usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil. Cad Saúde Pública 2013; 29:691-701.,1818. Tavares NUL, Luiza VL, Oliveira MA, Costa KS, Mengue SS, Arrais PSD, et al. Acesso gratuito a medicamentos para tratamento de doenças crônicas no Brasil. Rev Saúde Pública 2016; 50 Suppl 2:7s.,1919. Oliveira MA, Luiza VL, Tavares NUL, Mengue SS, Arrais PSD, Farias MR, et al. Acesso a medicamentos para doenças crônicas no Brasil: uma abordagem multidimensional. Rev Saúde Pública 2016; 50 Suppl 2:6s.. Entretanto poucos estudos de abrangência nacional e de base populacional analisaram o acesso aos medicamentos pelos usuários do SUS, seja no próprio serviço público 1717. Boing AC, Bertoldi AD, Boing AF, Bastos JL, Peres KG. Acesso a medicamentos no setor público: análise de usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil. Cad Saúde Pública 2013; 29:691-701. ou considerando-se qualquer forma de obtenção 1818. Tavares NUL, Luiza VL, Oliveira MA, Costa KS, Mengue SS, Arrais PSD, et al. Acesso gratuito a medicamentos para tratamento de doenças crônicas no Brasil. Rev Saúde Pública 2016; 50 Suppl 2:7s.,1919. Oliveira MA, Luiza VL, Tavares NUL, Mengue SS, Arrais PSD, Farias MR, et al. Acesso a medicamentos para doenças crônicas no Brasil: uma abordagem multidimensional. Rev Saúde Pública 2016; 50 Suppl 2:6s.,2020. Stopa SR, Malta DC, Monteiro CN, Szwarcwald CL, Goldbaum M, Cesar GCL. Use of and access to health services in Brazil, 2013 National Health Survey. Rev Saúde Pública 2017; 51 Suppl 1:3s.,2121. Drummond ED, Simões TC, Andrade FB. Acesso da população brasileira adulta a medicamentos prescritos. Rev Bras Epidemiol 2018; 2:e180007.. Além disso, a maior parte dos estudos tem realizado recortes por doenças e medicamentos específicos ou analisado apenas grupos populacionais específicos 2222. Mengue SS, Tavares NUL, Costa KS, Malta DC, Silva Júnior JB. Fontes de obtenção de medicamentos para tratamento da hipertensão arterial no Brasil: análise da Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Rev Bras Epidemiol 2015; 18:192-203.,2323. Mengue SS, Bertoldi AD, Ramos RL, Farias MR, Oliveira MA, Tavares NUL, et al. Access to and use of high blood pressure medications in Brazil. Rev Saúde Pública 2016; 50 Suppl 2:8s.,2424. Costa K, Francisco PMSB, Malta DC, Barros MBA. Fontes de obtenção de medicamentos para hipertensão e diabetes no Brasil: resultados de inquérito telefônico nas capitais brasileiras e no Distrito Federal, 2011. Cad Saúde Pública 2016; 32:e00090014.,2525. Costa KS, Tavares NUL, Mengue SS, Pereira MA, Malta DC, Silva Júnior JB. Obtenção de medicamentos para hipertensão e diabetes no Programa Farmácia Popular do Brasil: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Epidemiol Serv Saúde 2016; 25:33-44.,2626. Leal LL, Bertoldi AD, Menezes AMB, Borges RB, Mengue SS, Gazzana MB, et al. Indicação, acesso e utilização de medicamentos para doenças respiratórias crônicas no Brasil: resultados da Pesquisa Nacional sobre Acesso, Utilização e Promoção do Uso Racional de Medicamentos no Brasil (PNAUM), 2014. Cad Saúde Pública 2018; 34:e00208217.,2727. Matta SR, Bertoldi AD, Emmerick ICM, Fontanella AT, Costa KS, Luiza VL, et al. Fontes de obtenção de medicamentos por pacientes diagnosticados com doenças crônicas, usuários do Sistema Único de Saúde. Cad Saúde Pública 2018; 34:e00073817.,2828. Viana KP, Brito AS, Rodrigues CS, Luiz RR. Acesso a medicamentos de uso contínuo entre idosos, Brasil. Rev Saúde Pública 2015; 49:14.,2929. Simões TC, Meira KC, Santos J, Câmara DCP. Prevalências de doenças crônicas e acesso aos serviços de saúde no Brasil: evidências de três inquéritos domiciliares. Ciênc Saúde Colet 2021; 6:3991-4006.,3030. Katrein F, Tejada CAO, Restrepo-Méndez MC, Bertoldi AD. Desigualdade no acesso a medicamentos para doenças crônicas em mulheres brasileiras. Cad Saúde Pública 2015; 31:1416-26.. Soma-se a isso a ausência de estudos que tenham monitorado os efeitos da crise econômica e das medidas de austeridade fiscal sobre o acesso aos medicamentos em amostras nacionais desde 2014.

O objetivo deste estudo foi analisar e comparar a prevalência, a forma de obtenção e os fatores associados ao acesso a medicamentos entre usuários do SUS em 2013 e 2019 no Brasil.

Métodos

Foram analisados os dados oriundos das edições 2013 e 2019 da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) conduzidas no Brasil. A PNS é uma pesquisa de abrangência nacional realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e tem como objetivo principal obter informações sobre o uso dos serviços de saúde, as condições de saúde da população brasileira e levantar indicadores sobre a vigilância das doenças crônicas e seus fatores de risco 3131. Coordenação de Trabalho e Rendimento, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Percepção do estado de saúde, estilos de vida e doenças crônicas. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2014.,3232. Coordenação de Trabalho e Rendimento, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde 2019: informações sobre domicílios, acesso e utilização dos serviços de saúde. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2020..

A PNS 2013 e 2019 contemplam em sua amostra a população residente em domicílios particulares do Brasil situados nas zonas urbanas e rurais, exceto aqueles localizados nos setores censitários especiais (quartéis, bases militares, acampamentos, alojamentos, presídios, orfanatos, conventos e hospitais). As duas edições da PNS têm amostras representativas da população brasileira e foram realizadas por meio de amostragem em três estágios. Os setores censitários ou os conjuntos de setores formaram as unidades primárias de amostragem, os domicílios compuseram as unidades de segundo estágio e os moradores, o terceiro estágio. Mais detalhes das amostras podem ser obtidos em publicações oficiais 3131. Coordenação de Trabalho e Rendimento, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Percepção do estado de saúde, estilos de vida e doenças crônicas. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2014.,3232. Coordenação de Trabalho e Rendimento, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde 2019: informações sobre domicílios, acesso e utilização dos serviços de saúde. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2020..

Neste estudo foram analisados os dados apenas dos indivíduos que tiveram medicamentos prescritos em atendimento de saúde realizado no SUS nas duas semanas anteriores à entrevista (na PNS 2013, o número de participantes que atenderam a esses critérios foi de 16.772 e, na PNS 2019, de 24.640).

O acesso aos medicamentos é um conceito amplo e complexo que envolve atores públicos e privados, podendo ocorrer com várias combinações de arranjos e compreender diferentes dimensões 3333. Penchansky R, Thomas JW. The concept of access: definition and relationship to consumer satisfaction. Med Care 1981; 19:127-40.. Para as análises deste estudo, foram utilizadas as dimensões de disponibilidade e da capacidade aquisitiva. Assim, os desfechos analisados foram: (1) a obtenção total, por meio do SUS, dos medicamentos prescritos - considerada positiva quando se respondeu “sim, todos” à pergunta “Algum dos medicamentos foi obtido em serviço público de saúde?” -; e (2) a obtenção total dos medicamentos a partir de qualquer fonte - considerada positiva quando a mesma resposta foi obtida para a pergunta “Conseguiu obter os medicamentos receitados?”.

Aos entrevistados, foi perguntado, ainda, se haviam obtido os medicamentos por meio de plano de saúde ou via programa Farmácia Popular do Brasil (em 2019, a indagação era referente ao programa Aqui Tem Farmácia Popular). Ambas essas perguntas e as duas relacionadas aos desfechos foram feitas de forma independente, e as opções de resposta eram “sim, todos”, “sim, alguns” e “não, nenhum”. Por fim, foi indagado se algum valor havia sido pago pelos medicamentos (“sim” e “não”) e, para aquelas pessoas que reportaram não ter conseguido algum medicamento, foi questionado o principal motivo (as opções de resposta foram: não conseguiu no serviço público; não conseguiu no programa Farmácia Popular do Brasil ou Aqui Tem Farmácia Popular; não tinha farmácia próxima ou tinha dificuldade de deslocamento; não conseguiu encontrar todos os medicamentos na farmácia; não tinha dinheiro parra comprar; não achou necessário; melhorou e desistiu de procurar; e outro). Todas essas perguntas complementares aos desfechos foram analisadas de forma descritiva neste estudo.

As variáveis independentes analisadas foram região de residência (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-oeste), sexo (feminino e masculino), raça/cor autorreferida (branca, preta e parda; amarelos e indígenas foram excluídos da análise pela pequena quantidade de respondentes), escolaridade (sem instrução, Fundamental incompleto, Fundamental completo, e ao menos Ensino Médio completo) e renda domiciliar per capita (categorizada em quintis segundo sua distribuição).

Inicialmente, foram estimadas as prevalências com respectivos intervalos de 95% de confiança (IC95%) da obtenção de medicamentos em cada uma das fontes analisadas (SUS, plano de saúde, programa Farmácia Popular do Brasil ou Aqui Tem Farmácia Popular), do pagamento para sua obtenção e os motivos para o não acesso. As diferenças das prevalências entre cada ano foram testadas por meio do teste de qui-quadrado com a correção de Rao-Scott. Por fim, modelos brutos e ajustados de regressão de Poisson foram calculados para explorar as associações entre os desfechos e as variáveis independentes, obtendo-se razões de prevalências (RP) como medidas de associação junto a seus IC95%. Todas as variáveis independentes foram incluídas nos modelos ajustados, assumindo-se entendimento de que o modelo teórico deve orientar a análise múltipla. Não foi verificada multicolinearidade entre as variáveis independentes. Todas as análises incorporaram, em suas estimativas, a natureza complexa da amostra e os pesos amostrais. As análises foram realizadas no programa Stata 15.1 (http://www.stata.com).

Resultados

No total, foram visitados 81.254 domicílios em 2013 e 108.457 em 2019, obtendo-se taxas de resposta iguais a 91,9% (n = 222.385 pessoas) e a 93,6% (n = 293.725), respectivamente. Em ambas as edições da pesquisa, a maior parte dos respondentes residia na Região Nordeste, era composta por mulheres, de raça/cor parda e com Ensino Fundamental incompleto. Maiores detalhes da amostra estão descritos na Tabela 1.

Tabela 1
Prevalência de pessoas que obtiveram todos os medicamentos no Sistema Único de Saúde (SUS) ou por meio de qualquer fonte entre as que realizaram um atendimento de saúde no SUS nas últimas duas semanas. Brasil, 2013 e 2019.

Em 2013, 15,3% das pessoas procuraram atendimento em saúde nas duas últimas semanas, sendo que 97% destas o receberam. A maior parte das consultas ocorreu no SUS (60,2%) e, dentre estas, em 67,8% houve prescrição de medicamento. Já em 2019, a procura por atendimento foi 3,3 pontos percentuais (p.p.) maior (18,6%), enquanto o acesso foi sensivelmente menor (86,1%). Da mesma forma que, em 2013, o SUS concentrou a maior proporção de consultas (57,2%) e, em quase dois a cada três atendimentos, ocorreu prescrição de medicamento (64,8%).

Entre 2013 e 2019, observou-se que a proporção de pessoas que não conseguiram nenhum dos medicamentos receitados apresentou pouca variação, mas houve aumento do percentual da população que conseguiu todos os medicamentos e redução daquela que conseguiu parte deles (Figura 1). Ao analisar a fonte de obtenção dos medicamentos, verificou-se que a proporção de pessoas que não conseguiu nenhum medicamento no SUS aumentou 7,8p.p., na Farmácia Popular do Brasil, 5,1p.p. e, pelo plano de saúde, 5,8p.p. De forma contrastante, a proporção de pessoas que reportou ter comprado algum ou todos os medicamentos prescritos subiu de 49,4% para 56,4% (Figura 1). Nas cinco dimensões analisadas, verificou-se que as proporções observadas entre os dois anos analisados foram estatisticamente diferentes (p < 0,001).

Figura 1
Obtenção de medicamentos em diferentes fontes entre pessoas que tiveram atendimento em saúde no Sistema Único de Saúde (SUS) nas duas últimas semanas. Brasil, 2013 e 2019.

A prevalência de acesso total aos medicamentos no SUS apresentou pouca oscilação entre 2013 e 2019 (31,6% e 29,7%, respectivamente), sendo, nos dois anos, mais elevada entre residentes do Sudeste e do Sul do país, entre pessoas com Ensino Fundamental incompleto e com menor renda (Tabela 1). Em ambos os anos, foram os dois grupos mais pobres da população que apresentaram, dentre todos os estratos populacionais analisados, as maiores medidas pontuais de prevalência de obtenção total de medicamentos no SUS. Já em relação à obtenção total de medicamentos independentemente da fonte, observou-se que os mais ricos apresentaram maior acesso, além, mais uma vez, dos moradores do Sul e do Sudeste do país.

As Tabelas 2 e 3 apresentam os resultados dos modelos brutos e ajustados da regressão de Poisson, respectivamente. Nos modelos ajustados, houve pouca variação entre 2013 e 2019 das variáveis associadas aos desfechos. Quando analisado o acesso total aos medicamentos pelo SUS nos dois anos, observou-se que a prevalência foi mais elevada no Sul e no Sudeste, mas as medidas pontuais de RP foram mais baixas em 2019, em ambos os casos. Em 2019, as categorias intermediárias de escolaridade apresentaram maior valor de RP. Já em relação à renda, com pouca oscilação, observou-se a existência de gradiente de maior acesso total no SUS conforme diminui a renda, e maior acesso total de acordo com o aumento desta. Comparando-se os grupos extremos, o quintil mais rico apresentou prevalência 35% menor de acesso total a medicamentos no SUS, mas 11% referiu maior prevalência de obtenção de todos os medicamentos, considerando-se todas as fontes. Ainda em relação ao acesso total independentemente da fonte, todas as regiões apresentaram maior prevalência do desfecho em comparação ao Norte e, em 2013, pessoas com ao menos Ensino Médio completo apresentaram prevalência 5% maior do desfecho em comparação àquelas sem instrução, associação esta que não foi observada em 2019. Não houve diferença segundo cor/raça e sexo em nenhum ano para ambos os desfechos.

Tabela 2
Razões de prevalências (RP) brutas de receber acesso total a medicamentos no Sistema Único de Saúde (SUS) e em qualquer local entre pessoas que tiveram consultas no SUS e receberam prescrição de medicamentos nas duas últimas semanas. Brasil, 2013 e 2019.
Tabela 3
Razões de prevalências (RP) ajustadas de receber acesso total a medicamentos no Sistema Único de Saúde (SUS) e em qualquer local entre pessoas que tiveram consultas no SUS e receberam prescrição de medicamentos nas duas últimas semanas. Brasil, 2013 e 2019.

Ao analisar os principais motivos de não obtenção de medicamentos, o mais frequentemente relatado em 2019 foi não ter conseguido no serviço público de saúde (60,8%) (Figura 2). Essa razão somada a não encontrar os insumos no programa Aqui Tem Farmácia Popular - ambas são formas de obtenção que dependem de financiamento público - equivaleu a duas em cada três justificativas (66,9%). Esse valor foi semelhante, em 2013, a quem respondeu não ter obtido o(s) medicamento(s) por não ter encontrado no serviço de saúde ou no programa Farmácia Popular do Brasil.

Figura 2
Principais motivos relatados para não obtenção de todos os medicamentos receitados nas duas últimas semanas em atendimentos no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasil, 2013 e 2019.

Discussão

Este estudo identificou cinco importantes resultados: (1) a proporção de pessoas que não obtiveram nenhum medicamento via SUS, via programa Farmácia Popular do Brasil (ou Aqui Tem Farmácia Popular) ou pelo plano de saúde aumentou entre 2013 e 2019; (2) ao mesmo tempo, houve aumento significativo na proporção de pessoas que pagaram por todos ou algum medicamento prescrito; (3) em 2013 e em 2019, em torno de três em cada dez pessoas conseguiram todos os medicamentos via SUS e, em 2019, pouco mais de oito em cada dez conseguiram todos os medicamentos, considerando-se qualquer fonte de obtenção (aumento em relação a 2013); (4) a probabilidade de obter todos os medicamentos no SUS foi maior entre os mais pobres, e de consegui-los independentemente da fonte foi maior entre os mais ricos; (5) por fim, aproximadamente dois terços das pessoas que não conseguiram acesso a todos os medicamentos citaram como principal motivo problemas relacionados à disponibilidade em serviços financiados pelo setor público.

As estimativas de acesso total observadas neste estudo são inferiores aos relatados em estudos prévios, mas diferenças metodológicas nos estudos da área limitam comparações diretas das prevalências. Ao analisar a população idosa de Florianópolis (Santa Catarina), Aziz et al. 3434. Aziz MM, Calvo MC, Schneider IJC, Xavier AJ, d'Orsi E. Prevalência e fatores associados ao acesso a medicamentos pela população idosa em uma capital do sul do Brasil: um estudo de base populacional. Cad Saúde Pública 2011; 27:1939-50. observaram acesso total de 95,8% e, por meio do SUS, de 50,3%. Outros estudos de abrangência nacional observaram valores semelhantes quando recortaram suas análises apenas para doenças respiratórias crônicas (91,4% de acesso total) 1818. Tavares NUL, Luiza VL, Oliveira MA, Costa KS, Mengue SS, Arrais PSD, et al. Acesso gratuito a medicamentos para tratamento de doenças crônicas no Brasil. Rev Saúde Pública 2016; 50 Suppl 2:7s. ou doenças crônicas em geral (47,5% de acesso por meio gratuito 2626. Leal LL, Bertoldi AD, Menezes AMB, Borges RB, Mengue SS, Gazzana MB, et al. Indicação, acesso e utilização de medicamentos para doenças respiratórias crônicas no Brasil: resultados da Pesquisa Nacional sobre Acesso, Utilização e Promoção do Uso Racional de Medicamentos no Brasil (PNAUM), 2014. Cad Saúde Pública 2018; 34:e00208217. e 94,3% de acesso total 1919. Oliveira MA, Luiza VL, Tavares NUL, Mengue SS, Arrais PSD, Farias MR, et al. Acesso a medicamentos para doenças crônicas no Brasil: uma abordagem multidimensional. Rev Saúde Pública 2016; 50 Suppl 2:6s.). Drummond et al. 2121. Drummond ED, Simões TC, Andrade FB. Acesso da população brasileira adulta a medicamentos prescritos. Rev Bras Epidemiol 2018; 2:e180007., ao analisarem os dados das pessoas que receberam prescrição de medicamento em consulta realizada em qualquer serviço de saúde no Brasil em 2013, identificaram acesso total igual a 83%, sendo que 63,9% dos indivíduos tiveram algum gasto com medicamentos. Já Boing et al. 1717. Boing AC, Bertoldi AD, Boing AF, Bastos JL, Peres KG. Acesso a medicamentos no setor público: análise de usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil. Cad Saúde Pública 2013; 29:691-701., com recorte similar ao deste estudo, identificaram prevalência total de acesso aos medicamentos no SUS de 45,3% (IC95%: 44,2-46,5).

Apesar de haver a garantia legal no Brasil de assistência farmacêutica a todos os cidadãos e da vigência de um sistema único de saúde que é público e integral, observou-se no país o aumento de pessoas que consultaram no SUS, mas não obtiveram os medicamentos por meio do próprio sistema. E essa variação ocorreu de forma paralela ao acréscimo do pagamento por medicamentos pela população usuária do SUS. A proporção de pessoas que têm acesso a medicamentos via SUS diminui, na verdade, pelo menos desde 2008 1717. Boing AC, Bertoldi AD, Boing AF, Bastos JL, Peres KG. Acesso a medicamentos no setor público: análise de usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil. Cad Saúde Pública 2013; 29:691-701.. Esse cenário sugere a existência de limitações nas políticas da área no período, especialmente em relação à desestruturação de serviços e políticas de atenção farmacêutica e ao agravamento do baixo financiamento em saúde 1515. Castro MC, Massuda A, Almeida G, Menezes-Filho NA, Andrade MV, Souza Noronha KV, et al. Brazil's Unified Health System: the first 30 years and prospects for the future. Lancet 2019; 394:345-56.,3535. Vieira FS. Evolução do gasto com medicamentos do Sistema Único de Saúde do período 2010 a 2016. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 2017.,3636. Almeida ATC, Sa EB, Vieira FS, Vieira RS, Benevides RPSE. Avaliação econômica do Programa Farmácia Popular do Brasil. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 2017.,3737. Oliveira LCF, Nascimento MAA, Lima IMSO. O acesso a medicamentos em sistemas universais de saúde - perspectivas e desafios. Saúde Debate 2019; 43(spe5):286-98..

Em relação à estruturação dos serviços, Mendes et al. 3838. Mendes LV, Campos MR, Chaves GC, Silva RM, Freitas PS, Costa KS, et al. Disponibilidade de medicamentos nas unidades básicas de saúde e fatores relacionados: uma abordagem transversal. Saúde Debate 2014; 38:109-23. verificaram, no Brasil, baixa proporção de unidades básicas de saúde com disponibilidade total dos medicamentos-chave em todos os grupos farmacológicos. Além disso, segundo os autores, não há dispensação de medicamentos em todas as unidades de saúde e, em muitas localidades do país, há escassez de pontos de provisão de medicamentos. Já Oliveira et al. 1919. Oliveira MA, Luiza VL, Tavares NUL, Mengue SS, Arrais PSD, Farias MR, et al. Acesso a medicamentos para doenças crônicas no Brasil: uma abordagem multidimensional. Rev Saúde Pública 2016; 50 Suppl 2:6s. verificaram que a disponibilidade de medicamentos para doenças crônicas nas farmácias do SUS corresponde a apenas metade da observada nas farmácias privadas. Esse cenário de desabastecimento no setor público associado ao preço elevado dos medicamentos no setor privado 3939. Perehudoff SK, Alexandrov NV, Hogerzeil HV. The right to health as the basis for universal health coverage: a cross-national analysis of national medicines policies of 71 countries. PLoS One 2019; 14:e0215577. dificulta o acesso da população aos medicamentos.

Como questão fulcral do acesso gratuito aos medicamentos está o financiamento do setor de saúde no Brasil. Além do baixo gasto em saúde per capita no país, a maior parte dele é privado e expressa o contexto histórico de um sistema de saúde cronicamente subfinanciado 4040. Mendes A, Funcia FR. O SUS e seu financiamento. In: Marques RM, Piola SF, Roa AC, organizadores. Sistema de saúde no Brasil: organização e financiamento. Brasília: Ministério da Saúde/Organização Pan-Americana da Saúde; 2016. p. 139-68.. Quando analisados os gastos do SUS com medicamentos na soma das três esferas, observam-se valores, em 2010, de R$ 14,3 bilhões; em 2015, de cerca de R$ 20 bilhões; e retração em 2016 para R$ 18,6 bilhões 3535. Vieira FS. Evolução do gasto com medicamentos do Sistema Único de Saúde do período 2010 a 2016. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 2017.. Na análise do gasto por esfera de governo, entre 2015 e 2016, houve redução de 49% dos gastos do estado, 43% do gasto nos municípios e aumento de 8% do gasto federal 3535. Vieira FS. Evolução do gasto com medicamentos do Sistema Único de Saúde do período 2010 a 2016. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 2017..

Destaca-se que a relação entre aumento do financiamento e aumento do acesso não se dá de forma linear, mas depende do volume do aumento e das políticas de assistência farmacêutica implementadas. Parte desse incremento federal observado pode estar relacionada ao aumento dos gastos em medicamentos que são adquiridos pelas ações judiciais 4141. Vieira FS, Zucchi P. Distorções causadas pelas ações judiciais à política de medicamentos no Brasil. Rev Saúde Pública 2007; 41:214-22.,4242. Chieffi AL, Barata RB. Judicialização da política pública de assistência farmacêutica e eqüidade. Cad Saúde Pública 2009; 25:1839-49., pela incorporação de novos medicamentos no SUS - que costumam ter custo mais alto do que os medicamentos já incorporados 4343. Brandão CMR, Guerra Júnior AA, Cherchiglia ML, Andrade ELG, Almeida AM, Silva GD, et al. Gastos do Ministério da Saúde do Brasil com medicamentos de alto custo: uma análise centrada no paciente. Value Health 2011; 14(5 Suppl 1):71-7. -, pela centralização da compra de medicamentos do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica 4444. Vieira FS. O financiamento da saúde no Brasil e as metas da Agenda 2030: alto risco de insucesso. Rev Saúde Pública 2020; 54:127. e pelas dinâmicas das transições demográficas e epidemiológicas do país.

Em período recente, os gastos com a Farmácia Popular do Brasil - que se mostrou uma opção mais cara do que a dispensação de medicamentos feita no serviço de saúde do SUS 4545. Silva RM, Caetano R. Custos da assistência farmacêutica pública frente ao programa Farmácia Popular. Rev Saúde Pública 2016; 50:74.,4646. Garcia MM, Guerra JAA, Acúrcio FA. Avaliação econômica dos programas Rede Farmácia de Minas do SUS versus Farmácia Popular do Brasil. Ciênc Saúde Colet 2017; 22:221-33. - e a desvalorização cambial do real são fatores a serem ponderados 3535. Vieira FS. Evolução do gasto com medicamentos do Sistema Único de Saúde do período 2010 a 2016. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 2017.. Por fim, o cenário após 2017 é bastante preocupante quanto às possibilidades de ampliação do acesso aos medicamentos no SUS. O limite dos gastos públicos impostos pela Emenda Constitucional nº 95 associado a um conjunto de ações contrárias aos valores do SUS já impacta em redução do orçamento disponível em saúde 4747. Menezes APR, Moretti B, Reis AAC. O futuro do SUS: impactos das reformas neoliberais na saúde pública - austeridade versus universalidade. Saúde Debate 2019; 43:58-70.. Além disso, é preocupante a ampliação dos recursos alocados na saúde por emendas parlamentares, que passaram a compor mais importante papel de financiamento 4444. Vieira FS. O financiamento da saúde no Brasil e as metas da Agenda 2030: alto risco de insucesso. Rev Saúde Pública 2020; 54:127., mas que não seguem necessariamente uma alocação baseada na política vigente e nas melhores evidências científicas.

Para ampliação do acesso a medicamentos por meio do SUS, é preciso, também, maior adesão dos prescritores às listas nacionais e municipais de medicamentos, a utilização de protocolos terapêuticos para reduzir variabilidade clínica, a utilização de sistemas de informação para planejamento e controle do abastecimento dos estoques, a agregação das compras públicas para ganhos de escala e a adoção ampliada de protocolos para o uso racional de medicamentos 4848. Tobar F. Lecciones aprendidas en la provisión de medicamentos para la atención primaria de la salud. Salud Pública Méx 2008; 50:463-9..

Outros achados importantes deste estudo e que merecem destaque são a maior importância do SUS para a população com menor renda e o maior acesso total a medicamentos entre os mais ricos nos dois anos avaliados. Eles reforçam a importância do SUS para a redução as desigualdades em saúde, mas, ao mesmo tempo, a manutenção das desigualdades no período analisado - também identificadas em períodos prévios 3030. Katrein F, Tejada CAO, Restrepo-Méndez MC, Bertoldi AD. Desigualdade no acesso a medicamentos para doenças crônicas em mulheres brasileiras. Cad Saúde Pública 2015; 31:1416-26.,4949. Bertoldi AD, Barros AJD, Hallal PC, Lima RC. Utilização de medicamentos em adultos: prevalência e determinantes individuais. Rev Saúde Pública 2004; 38:228-38. - demostra a urgência na reformulação das políticas de assistência farmacêutica. Parte expressiva da população depende exclusivamente do SUS para obtenção de recursos em saúde 3232. Coordenação de Trabalho e Rendimento, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde 2019: informações sobre domicílios, acesso e utilização dos serviços de saúde. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2020., especialmente a de menor renda. O papel estratégico e central do SUS se tornou ainda mais importante na promoção da equidade após a crise econômica iniciada em 2014. Essas desigualdades refletem em maior desembolso direto para a compra dos medicamentos no orçamento das famílias 5050. Boing AC, Bertoldi AD, Posenato LG, Peres KG. Influência dos gastos em saúde no empobrecimento de domicílios no Brasil. Rev Saúde Pública 2014; 48:797-807., principalmente entre as mais pobres. As maiores medidas pontuais de acesso total a medicamentos, independentemente da fonte de obtenção, entre os mais escolarizados podem estar associadas tanto a melhores condições objetivas de vida propiciadas pelo maior nível educacional quanto aos benefícios promovidos por ele que permitem maior compreensão sobre as doenças, orientações médicas e tratamentos 5151. Monteiro CN, Giani RJ, Barros MBA, Cesar CLG, Goldbaum M. Access to medication in the Public Health System and equity: populational health surveys in São Paulo, Brazil. Rev Bras Epidemiol 2016; 19:26-37..

As diferenças regionais vêm sendo consistentemente relatadas na literatura na mesma direção do que foi observado neste estudo. Inquéritos nacionais realizados entre 1998 e 2013 indicam que, apesar da melhoria no acesso e uso dos serviços de saúde no país, persistem diferenças subnacionais importantes, com piores indicadores médios nas regiões Norte e Nordeste quanto ao uso de serviços de saúde, avaliação do estado de saúde e restrição de atividades rotineiras 5252. Viacava F, Bellido JG. Condições de saúde, acesso a serviços e fontes de pagamento, segundo inquéritos domiciliares. Ciênc Saúde Colet 2016; 21:351-70.. Quando analisaram a estrutura das unidades básicas de saúde para atenção a pessoa com diabetes em 2012 e 2014, Neves et al. 5353. Neves RG, Duro SMS, Muñiz J, Pérez CTR, Facchini LA, Tomasi E. Estrutura das unidades básicas de saúde para atenção às pessoas com diabetes: Ciclos I e II do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade. Cad Saúde Pública 2018; 34:e00072317. observaram piores condições de disponibilidade de materiais, de medicamentos e estrutura física exatamente nos municípios do Norte e do Nordeste do país.

Este estudo tem como limitação o potencial viés de memória envolvido nos dados autorreferidos e referidos por terceiros, em particular no relato de realização de consultas no SUS, na forma de obtenção dos medicamentos e no principal motivo de eventual não obtenção daqueles que foram prescritos. No entanto destaca-se que o período recordatório foi curto, o que acaba minimizando o problema. Além disso, trata-se de medida amplamente utilizada em inquéritos nacionais. Como pontos fortes do estudo, destacam-se sua abrangência nacional, condução metodológica sólida e estável entre os anos considerados e análise ampla dos medicamentos prescritos, não restritos a agravos específicos.

Concluindo, verificou-se ampliação do desembolso direto para compra de medicamentos no Brasil e redução de acesso a medicamentos pelo SUS entre usuários do sistema. Esse cenário associado à manutenção das desigualdades no acesso total independente da fonte é preocupante, principalmente em um contexto de redução de investimento público, crise econômica e aumento de doenças crônicas e multimorbidades que exigem terapias contínuas e múltiplas. A ampliação dos gastos no SUS, a qualificação da gestão e a implementação de políticas equânimes são essenciais para viabilizar acesso adequado da população brasileira aos medicamentos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    06 Maio 2021
  • Revisado
    18 Jan 2022
  • Aceito
    10 Mar 2022
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br