O construto multidimensional trabalho precário, o futuro do trabalho e a saúde de trabalhadoras(es)

El constructo multidimensional trabajo precario, el futuro del trabajo y la salud de trabajadoras(es)

Rita de Cássia Pereira Fernandes Sobre o autor

Resumos

Este ensaio objetivou discutir a flexibilização do trabalho, acentuada no curso da pandemia de COVID-19, com ampliação do trabalho precário; e discutir modelos teóricos e desafios metodológicos para o estudo do trabalho precário, suas dimensões e os efeitos à saúde de trabalhadoras(es). A crise sanitária e econômica ampliou a vulnerabilidade social de trabalhadoras(es), já em curso em decorrência das mudanças trazidas pela flexibilização, globalmente, e pela Reforma Trabalhista brasileira. Os retrocessos se concretizam no trabalho precário, construto multidimensional que engloba as características dessa flexibilização, em suas três dimensões: (1) relações de trabalho instáveis, decorrentes de contratação insegura, contrato temporário, trabalho parcial involuntário, terceirização; (2) renda inadequada e instável; e (3) insuficiência de direitos e de proteção, com reduzida representação coletiva de trabalhadoras(es), que implica baixo poder de reação às condições aviltantes de trabalho, falta de seguridade social, e retrocessos no apoio regulatório em segurança laboral. Repercussões do trabalho precário na saúde - acidentes de trabalho, distúrbios musculoesqueléticos e transtornos mentais - são evidenciadas em estudos epidemiológicos, destacando-se as limitações teóricas e metodológicas ainda existentes. Conclui-se, que mantidas as bases atuais da inserção de trabalhadoras(es) sem proteção social e do trabalho, o futuro será de ampliação do trabalho precário. Destarte, evidenciar as relações causais entre trabalho precário e saúde é desafio contemporâneo da agenda de pesquisa e de políticas públicas que se impõe na sociedade, com destaque para serviços de saúde do trabalhador.

Palavras-chave:
Trabalho Precário; Proteção Social em Saúde; Saúde do Trabalhador; Acidentes de Trabalho; Transtornos Mentais


Este ensayo tuvo como objetivo discutir la flexibilización del trabajo, acentuada en el transcurso de la pandemia de la COVID-19, con la expansión del trabajo precario; y discutir modelos teóricos y desafíos metodológicos para el estudio del trabajo precario, sus dimensiones y los efectos sobre la salud de las trabajadoras(es). La crisis sanitaria y económica aumentó la vulnerabilidad social de los trabajadoras(es) ya en marcha, como resultado de los cambios provocados por la flexibilización, a nivel mundial, y por la Reforma Laboral brasileña. Los retrocesos se concretan en el trabajo precario, constructo multidimensional que engloba las características de esa flexibilización, en sus tres dimensiones: (1) relaciones laborales inestables, derivadas de contratación insegura, contrato temporal, trabajo parcial involuntario, tercerización; (2) ingresos inadecuados e inestables; y (3) insuficiencia de derechos y de protección, con reducida representación colectiva de trabajadoras(es), lo que implica un bajo poder de reacción ante condiciones de trabajo degradantes, falta de seguridad social y retrocesos en el apoyo normativo a la seguridad laboral. Las repercusiones del trabajo precario en la salud -accidentes de trabajo, trastornos musculoesqueléticos y trastornos mentales- se evidencian en estudios epidemiológicos, destacando las limitaciones teóricas y metodológicas que aún existen. Se concluye que de mantenerse las bases actuales para la inserción de trabajadoras(es) sin protección social y laboral, el futuro será de expansión del trabajo precario. Por lo tanto, evidenciar las relaciones causales entre trabajo precario y salud es desafío contemporáneo de la agenda de investigación y de políticas públicas que se impone en la sociedad, con destaque para servicios de salud del trabajador.

Palabras-clave:
Riesgos Laborales; Protección Social en Salud; Salud Laboral; Accidentes de Trabajo; Trastornos Mentales


Introdução

Crises sanitárias precedentes, com dimensão pandêmica, implicaram profundas repercussões socioeconômicas com impacto sanitário desigual, causando mais infecção e morte entre os mais pobres. Na pandemia de COVID-19 ampliam-se as desigualdades já existentes, com destaque nos países periféricos e entre parcelas mais pobres de países centrais, notadamente no mundo do trabalho, que no período pós-pandemia será marcado pelo trabalho precário 11. Matilla-Santander N, Ahonen E, Albin M, Baron S, Bolíbar M, Bosmans K, et al. COVID-19 and precarious employment: consequences of the evolving crisis. Int J Health Serv 2021; 51:226-8.,22. United Nations Development Program. Regional Human Development Report 2021. Trapped: high inequality and low growth in latin america and the caribbean. Nova York: United Nations Development Program; 2021.,33. Bambra C, Riordan R, Ford J, Matthews F. The Covid-19 pandemic and health inequalities. J Epidemiol Community Health 2020; 74:964-8..

Nos Estados Unidos, as desigualdades se ampliaram na pandemia e ficaram muito explícitas no mundo do trabalho. Os latinos, afro-americanos e negros apresentaram maiores proporções de desemprego na pandemia em comparação aos brancos. O desemprego em dezembro de 2019 já se configurava distintamente segundo grupos étnicos e, no curso da pandemia, houve o maior pico, em maio de 2020, com aumento de 13 pontos percentuais de desemprego entre latinos e 10 pontos percentuais para os demais grupos étnicos. Ademais, ao final de 2020, observou-se mais lenta recuperação da ocupação, com 9,9% e 9,3% de desemprego, respectivamente entre negros e afro-americanos e entre latinos, comparados a 6% entre brancos e 5,9% entre asiáticos. Negros, afro-americanos e latinos foram também os menos elegíveis ao trabalho remoto na pandemia, haja vista sua predominância nas ocupações consideradas de baixa e média qualificação, com trabalho fisicamente exigente e presencial 44. International Labor Organization. World employment and social outlook: trends 2021. Genebra: International Labor Organization; 2021..

Outro marcador relevante da situação de exclusão e desproteção social e do trabalho, a posição socioeconômica dos imigrantes no mundo inteiro foi emblemática da ampliação das desigualdades na pandemia. Imigrantes são em geral mais vulneráveis às demissões forçadas, contratos temporários, baixas remunerações, comparadas(os) às(aos) não imigrantes de mesma ocupação, idade, gênero e escolaridade. Ademais, são inelegíveis para os benefícios sociais, como é o caso dos afastamentos por doença, e foram marcantemente excluídas(os) da possibilidade de trabalho remoto, no curso da pandemia, quando essa medida se incluiu entre aquelas de biossegurança 55. Fasani F, Mazza J. Vulnerable workforce: migrant workers in the COVID-19 pandemic. Luxemburgo: Publications Office of the European Union; 2020..

Quanto ao impacto da pandemia na América Latina e Caribe, destaca-se a queda na ocupação, com grandes retrocessos na participação feminina no mercado de trabalho e ainda maiores desvantagens no trabalho informal do que no formal. Esses impactos na região não serão facilmente superados e demandarão período longo para recuperação 66. Organización Internacional del Trabajo; Comisión Económica para América Latina y el Caribe. Trabajo decente para los trabajadores de plataformas en América Latina. Santiago: Comisión Económica para América Latina y el Caribe; 2021. (Coyuntura Laboral en América Latina y el Caribe, 24)..

As desigualdades na América Latina e Caribe, que já atingiam sobretudo as mulheres mais pobres antes da pandemia, se ampliaram. Segundo aponta o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) 22. United Nations Development Program. Regional Human Development Report 2021. Trapped: high inequality and low growth in latin america and the caribbean. Nova York: United Nations Development Program; 2021., entre as mulheres, o desemprego já chegava, em 2019, a ser 59% mais alto do que entre os homens do segundo mais baixo quintil de renda e a participação delas no mercado de trabalho era 42% menor do que a participação masculina no quintil mais pobre. Quanto à inserção no mercado informal, homens e mulheres de mais baixa renda na América Latina e Caribe são marcantemente atingidos por esta forma de inserção, que representa cerca de 80% entre as pessoas no quintil mais pobre 22. United Nations Development Program. Regional Human Development Report 2021. Trapped: high inequality and low growth in latin america and the caribbean. Nova York: United Nations Development Program; 2021..

No Brasil, a ampliação das desigualdades no curso da pandemia é evidenciada pela variação da renda individual do trabalho no período que vai do quarto trimestre de 2019 ao segundo trimestre de 2021 e chega a ser de -21,49% entre os 50% mais pobres da população, enquanto entre os 10% mais ricos esta variação foi de -7,17% 77. Neri MC. Desigualdade de impactos trabalhistas na pandemia. Rio de Janeiro: FGV Social; 2021..

Neste ensaio, construído a partir de reflexões e críticas na perspectiva da Epidemiologia em Saúde do Trabalhador, evidencia-se que as desigualdades sociais já existentes no mundo do trabalho se ampliam com a chegada da crise sanitária e econômica, estabelecendo maiores desafios para países periféricos e para grupos mais vulnerabilizados em países centrais.

Na primeira seção do texto, apresentam-se elementos que permitem estimar a lenta e difícil recuperação dos indicadores sociais quanto à inserção no trabalho para os grupos vulnerabilizados, na pós-pandemia. Esses elementos são utilizados para evidenciar o aprofundamento das desigualdades no trabalho em um país periférico, o Brasil, com o crescimento da informalidade e seu impacto nas condições de trabalho e na saúde de trabalhadoras(es).

Na segunda seção, define-se que os retrocessos no mundo do trabalho se concretizam por meio do trabalho precário, construto multidimensional que engloba as características resultantes da flexibilização das relações de trabalho. Modelos teóricos e desafios metodológicos para o estudo do trabalho precário são apresentados na perspectiva de suas repercussões na saúde de trabalhadoras(es).

Na terceira seção, as evidências epidemiológicas acerca do trabalho precário são analisadas. Repercussões como acidentes de trabalho, distúrbios musculoesqueléticos e transtornos mentais são evidenciadas, destacando-se as limitações teóricas e metodológicas ainda existentes. A seção de considerações finais pontua o desafio posto pelo trabalho precário, admitindo-se que, mantidas as bases atuais de ampliação da inserção de trabalhadoras(es) sem proteção social e do trabalho, o futuro será do trabalho precário.

Elementos do mundo do trabalho na pré-pandemia para pensar a pós-pandemia no Brasil

O Banco Mundial traz elementos que apoiam as estimativas de lenta recuperação no mundo do trabalho. O “efeito cicatriz” da crise é o efeito a longo prazo da perda de emprego, que acarreta maior carga persistente sobre trabalhadoras(es) menos qualificadas(os), com menor escolaridade, associando-se a piores condições de (re)ingresso ao mercado de trabalho após a crise, período no qual estima-se a redução desproporcional de acesso à experiência de emprego e o crescimento da informalidade 88. Silva J, Sousa LD, Packard TG, Robertson R. Employment in crisis: the path to better jobs in a post-COVID-19 Latin America. Washington DC: World Bank; 2021..

Essas características já podem ser observadas na trajetória da ocupação no Brasil, que caiu vertiginosamente de março a setembro de 2020 e vem se recuperando desde setembro de 2020 às custas da informalidade, que atinge 41,1% da população ocupada, no terceiro trimestre de 2021, com queda do rendimento médio real. Nota-se que a informalidade continua em crescimento no país, quando se compara o primeiro trimestre de 2022 com o primeiro trimestre de 2021 99. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua - PNAD Contínua. https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/media/com_mediaibge/arquivos/715ee48d00ebe3d2dbc20ce5fc2dc69f.pdf (acessado em 21/Mai/2022).
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/me...
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A situação entre trabalhadoras(es) no curso da pandemia no Brasil reflete e amplia a situação anterior à pandemia, de desigualdades sobre as condições de participação no mercado de trabalho e de iniquidades na exposição laboral aos fatores de adoecimento e morte.

Nessa perspectiva, toma-se como ilustrativa a situação de trabalhadores da limpeza urbana em Salvador (Bahia), que é bastante emblemática deste contexto em que a atividade presencial na prestação de um serviço essencial foi mantida durante toda a pandemia. Para caracterizar minimamente esta categoria no período pré-pandemia, podem-se descrever alguns indicadores que evidenciam sua vulnerabilidade social, a partir de estudos conduzidos com uma população de 624 trabalhadores, todos homens. A curta duração do emprego chama atenção, com uma mediana de 26,5 meses e 35 meses para motoristas e coletores de lixo, respectivamente. Desses trabalhadores, os coletores apresentam a mais baixa escolaridade (≤ Fundamental: 75%). Esses são predominantemente jovens (idade média < 32 anos), pretos (65%) e pardos (30%), ou seja, 95% autodeclarados negros 1010. Lessa RS, Fernandes RCP. Dor nas extremidades inferiores, demandas físicas e psicológicas em trabalhadores da limpeza urbana: estudo transversal. Rev Bras Saúde Ocup 2022; 47:e2..

Evidencia-se o racismo institucional e sistemático que se expressa na exposição da saúde aos riscos laborais predominantemente entre pretos e pardos. Os primeiros são os mais expostos aos trabalhos físicos mais penosos, com uso do corpo no manuseio de carga e desempenho de força, com posturas anômalas e submetidos a mais alta exposição a estressores psicossociais 1111. Siqueira JS, Fernandes RCP. Physical and psychosocial demand at work: inequities related to race/skin color. Ciênc Saúde Colet 2021; 26:4737-48.. Apesar da curta duração do emprego na limpeza urbana, os que permanecem mais tempo em atividade apresentam as mais altas prevalências de dor em múltiplas regiões do corpo (dor multirregional), associada ao manuseio de carga, especialmente 1212. Fernandes RCP, Pataro SMS, Carvalho RB, Burdorf A. The concurrence of musculoskeletal pain and associated work-related factors: a cross sectional study. BMC Public Health 2016; 16:628..

Considerando a predominância de trabalhadores negros e com baixa escolaridade em serviços considerados de baixa ou média qualificação, é fácil constatar que esses foram os mesmos trabalhadores não propensos ao trabalho remoto, mantidos na linha de frente de serviços essenciais como no caso da limpeza urbana, serviço estratégico para manutenção da vida em sociedade no curso da pandemia, embora invisibilizado. Apesar dos impactos negativos do trabalho remoto na saúde de trabalhadoras(es), em função das condições nas quais este se instituiu para muitas outras categorias profissionais, o que se assinala aqui é um indicador de desigualdade no acesso à medida de distanciamento social como procedimento de biossegurança, não alcançada por grupos sociais vulnerabilizados.

As condições do período pós-pandemia no mundo do trabalho no Brasil serão mediadas pelos elementos centrais que caracterizam a chegada da pandemia no país. Em março de 2020, o mundo do trabalho vivenciava profunda crise, caracterizada pela acentuada desregulamentação que tem um dos marcos na Reforma Trabalhista brasileira, instituída pela Lei nº 13.467, de julho de 2017 1313. Brasil. Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e as Leis nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho. Diário Oficial da União 2017; 14 jul.. Embora concretizada legalmente em 2017, a Reforma Trabalhista é antecedida por retrocessos na proteção ao trabalho, dos quais se destaca a lei que permite a terceirização de atividade-fim (Lei nº 13.429/20171414. Brasil. Lei nº 13.429, de 31 de março de 2017. Altera dispositivos da Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, que dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas e dá outras providências; e dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros. Diário Oficial da União 2017; 31 mar.) e que marca a legitimação da desigualdade das condições de saúde e segurança de trabalhadoras(es) terceirizadas(os).

A Reforma Trabalhista brasileira vem no bojo das profundas mudanças no mundo do trabalho, associadas sempre às alterações da dinâmica do modo capitalista de produção. A flexibilização das relações de trabalho se amplia globalmente, em um cenário no qual “as principais prioridades para os empregadores são ganhar flexibilidade salarial, para aliviar as restrições à contratação e demissão, e para relaxar as políticas de proteção ao emprego1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53. (p. 231).

Nesta perspectiva, um primeiro eixo da Reforma Trabalhista, segundo Krein & Colombi 1616. Krein JD, Colombi APF. A Reforma Trabalhista em foco: desconstrução da proteção social em tempos de neoliberalismo autoritário. Educação & Sociedade 2019; 40:e0223441., diz respeito ao aprofundamento da flexibilização dos contratos de trabalho e consequentemente das jornadas e remuneração. São elementos importantes deste eixo a terceirização ilimitada e a ampliação do contrato temporário. Inaugura-se uma nova modalidade de contratação que é o contrato intermitente, considerado como emblemático e que se concretiza como trabalho precário 1616. Krein JD, Colombi APF. A Reforma Trabalhista em foco: desconstrução da proteção social em tempos de neoliberalismo autoritário. Educação & Sociedade 2019; 40:e0223441..

Esses autores 1616. Krein JD, Colombi APF. A Reforma Trabalhista em foco: desconstrução da proteção social em tempos de neoliberalismo autoritário. Educação & Sociedade 2019; 40:e0223441. identificam um segundo eixo da Reforma Trabalhista que é o da fragilização das instituições públicas, da fiscalização do cumprimento das normas nos locais de trabalho, e da organização de trabalhadoras(es). A prevalência dos direitos negociados sobre os legislados pode resultar em rebaixamento do previsto em lei, com sujeição de trabalhadoras(es) às condições impostas, haja vista ser improvável uma efetiva negociação individual entre trabalhador(a) e empregador, uma vez que têm poderes marcantemente desiguais.

As discussões trazidas por Benach et al. 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53. dialogam diretamente com o quadro brasileiro apresentado: formas contratuais flexíveis compartilham características do trabalho precário, em meio ao qual há limitação de práticas seguras de trabalho que são impostas por pressões econômicas. Ademais, as falhas no processo regulatório do trabalho enfraquecem e limitam o acesso aos direitos do trabalho. O trabalho flexível compartilha com o trabalho precário, segundo os autores, a existência de contratos de curta duração, instabilidade do emprego, com proteção limitada diante de incertezas, contexto no qual trabalhadoras(es) detém reduzida margem de controle sobre remuneração e extensão de jornada de trabalho. A redução do poder de trabalhadoras(es) concretiza-se na instituição de negociações individuais em detrimento das coletivas, resultando na incapacidade de reagir a práticas inaceitáveis de trabalho e, portanto, na incapacidade de exercitar o direito do trabalho 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.,1616. Krein JD, Colombi APF. A Reforma Trabalhista em foco: desconstrução da proteção social em tempos de neoliberalismo autoritário. Educação & Sociedade 2019; 40:e0223441..

Os efeitos à saúde de trabalhadoras(es) decorrentes do trabalho precário serão resultantes da ampliação da exposição a condições de trabalho deterioradas 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.. Nesse sentido, adota-se neste ensaio que condições de trabalho deterioradas, entre outros aspectos, dizem respeito: à dimensão física do trabalho, relativa a exigências sobre o corpo, como posturas anômalas e manuseio de carga, exposição ao ruído, temperaturas extremas, agentes químicos, biológicos (como o coronavírus), exposição a maquinário e equipamentos em condição inadequada; à dimensão cognitiva, relativa a demandas de alta concentração, atenção e uso da memória, aliadas à tomada de decisões em condições adversas e de baixo controle; e à dimensão psicossocial ou organizacional, incluindo entre muitos aspectos a redução do contingente de trabalhadoras(es) para responder às exigências do trabalho, com baixo apoio social, em meio à falta de capacitação para o desenvolvimento das tarefas, as jornadas longas sob intensificação do trabalho por unidade de tempo, que não possibilitam pausa para descanso, para recuperação das estruturas corporais e psíquicas. Além disso, compõem a dimensão psicossocial ou organizacional, especialmente, as relações de trabalho, relações entre trabalhadoras(es), gestores imediatos e donos dos negócios, sob as quais o exercício do direito ao trabalho decente se efetiva ou se obstaculiza 66. Organización Internacional del Trabajo; Comisión Económica para América Latina y el Caribe. Trabajo decente para los trabajadores de plataformas en América Latina. Santiago: Comisión Económica para América Latina y el Caribe; 2021. (Coyuntura Laboral en América Latina y el Caribe, 24).,1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53..

O estatuto de emprego e a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) no Brasil se constituíram em importantes instrumentos deste sistema de proteção, historicamente, considerando especialmente a regulação, pelo Direito do Trabalho, de uma relação entre desiguais, sob o paradigma da hipossuficiência de trabalhadoras(es) 1717. Druck G, Dutra R, Silva SC. The labor counter-reform: outsourcing and precarization as a rule. Caderno CRH 2019; 32:289-305.. A delimitação do emprego e de jornadas prevenia trabalhadoras(es) de ultrapassar os limites fisiológicos do corpo e da saúde, no curso do labor diário realizado para auferir renda, limitando jornadas extenuantes, que implicam exposição ocupacional levada ao extremo.

Além do Direito do Trabalho, o sistema de proteção do trabalho inclui a Previdência Social - seguro diante de doenças e acidentes de trabalho, que permite a trabalhadoras(es) incapacitadas(os) o afastamento remunerado, ao qual estão inelegíveis as(os) trabalhadoras(es) precarizadas(es), informais, e que estão à margem desse sistema. Também são parte imprescindível desse sistema os dispositivos coletivos de representação de trabalhadoras(es) - sindicatos laborais - em contraposição à individualização da defesa de seus interesses. Ademais, a Vigilância de Ambientes de Trabalho do Sistema Único de Saúde, a fiscalização do Ministério do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho - com o expediente dos Termos de Ajustamento de Condutas na proteção coletiva -, e as universidades públicas, produtoras de conhecimento, compõem o que se espera de um sistema de proteção do trabalho. Aludir a este sistema de proteção visa assinalar que dele resultam os concertos sociais que podem assegurar ou não boas condições de trabalho e saúde a trabalhadoras(es).

Considerando as bases sociais sob as quais as condições de trabalho se estruturam, as importantes mudanças trazidas no processo de flexibilização, globalmente pelo capitalismo, e pela Reforma Trabalhista brasileira, são entendidas como determinantes do quadro de morbidade e mortalidade de trabalhadoras(es), resultante da exposição ocupacional ao trabalho precário.

Trabalho precário: a multidimensionalidade do construto teórico e metodológico

A ampliação das vulnerabilidades na pandemia e na pós-pandemia se vincula à geração da pobreza e ao trabalho precário, com forte impacto sobre trabalhadoras(es), suas famílias e comunidades. Neste ensaio, trabalho precário é definido de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) 1818. International Labor Organization. From precarious work to decent work: outcome document to the workers' symposium on policies and regulations to combat precarious employment. Genebra: International Labor Organization; 2012. (p. 27): “trabalho realizado na economia formal e informal, caracterizado por vários níveis e graus de características objetivas (situação legal) e subjetivas (sentimento) de incerteza e insegurança. Embora um trabalho precário possa ter muitas faces, é geralmente definido pela incerteza quanto à duração do emprego, existência de vários empregadores, relação de trabalho ambígua ou disfarçada, falta de acesso à proteção social e aos benefícios geralmente associados a emprego, baixa remuneração, com obstáculos substanciais, legais e práticos, para ingressar em um sindicato e negociar coletivamente”.

Considerando esse conceito da OIT, este ensaio assume que o trabalho precário poderá incidir entre ocupações do setor formal e informal. Nesse sentido, setor formal inclui empregadas(os) com carteira, militares, funcionárias(os) públicas(os) estatutárias(os), trabalhadoras domésticas com carteira, empregadores com seis ou mais empregados; setor informal incorpora empregadas(os) e trabalhadoras domésticas sem carteira, trabalhadoras(es) por conta-própria, trabalhadoras(es) na produção para o próprio consumo, trabalhadoras(es) na construção para o próprio uso, não remuneradas(os), empregadores com até cinco empregados 1919. Vasconcelos EAS, Targino I. A informalidade no mercado de trabalho brasileiro: 1993-2013. Revista da ABET 2015; 14:141-61..

Com isso, o conceito de trabalho precário presente na literatura revisada, em especial de língua inglesa, foi incorporado neste ensaio para além da definição de haver ou não vínculo formal de emprego, ou seja, nomeia-se trabalho precário a situação definida pela OIT 1818. International Labor Organization. From precarious work to decent work: outcome document to the workers' symposium on policies and regulations to combat precarious employment. Genebra: International Labor Organization; 2012. e atualizada 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47..

As profundas mudanças introduzidas pelo capitalismo na natureza do emprego e trabalho a partir dos anos 1970 caracterizam o crescimento das relações de trabalho flexíveis, com a emergência de insegurança, instabilidade de trabalho e erosão das condições de trabalho 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.. Portanto, nessas três últimas décadas do século XX e até este momento vem ocorrendo a redução progressiva do emprego em seu formato mais tradicional, que caracterizou o trabalho assalariado taylorista-fordista, dando lugar às reestruturações produtivas do capitalismo, no pós-fordismo - com a acumulação flexível ou toyotismo - e, a partir de 2009, com o alastramento da economia de plataforma, como máxima expressão da flexibilização das relações de trabalho e precarização 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.,1616. Krein JD, Colombi APF. A Reforma Trabalhista em foco: desconstrução da proteção social em tempos de neoliberalismo autoritário. Educação & Sociedade 2019; 40:e0223441..

A reestruturação e o enxugamento das organizações, nos anos 1990 e 2000 - com grandes mudanças nas relações de trabalho, redução dos direitos trabalhistas e da proteção ao emprego - estão bem evidenciados e configuram-se como desafio social, em particular, em países periféricos 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.,2121. Druck G. Trabalho, precarização e resistências: novos e velhos desafios? Caderno CRH 2011; 24(n. spe1):37-57.. Estudos que associam essas mudanças aos efeitos deletérios na saúde vêm sendo realizados em diversas áreas disciplinares e com distintas abordagens metodológicas e serão destacados neste ensaio 2222. Bodin T, Çaglayan C, Garde AH, Gnesi M, Jonsson J, Kiran S, et al. Precarious employment in occupational health: an OMEGA-NET working group position paper. Scand J Work Environ Health 2020; 46:321-9.,2323. Benach J, Vives A, Tarafa G, Delclos C, Muntaner C. What should we know about precarious employment and health in 2025? Framing the agenda for the next decade of research. Int J Epidemiol 2016; 45:232-8.,2424. Fernandes RCP. Precarização do trabalho e os distúrbios musculoesqueléticos. Caderno CRH 2011; 24(n. spe1):155-70..

Na pandemia, a expansão da economia de plataforma, fenômeno econômico e social que representa o grande desafio do futuro do trabalho, assumiu contornos sem precedentes de desregulamentação das relações de trabalho em países periféricos ou semiperiféricos, a exemplo do Brasil, processo já apontado antes da pandemia. A expansão desta modalidade se dá com “alta precarização do trabalho [mediado por plataformas digitais - América Latina e Caribe], caracterizado pela instabilidade do trabalho e dos salários, uma proporção significativa de tempo não remunerado, longas jornadas de trabalho, ausência de proteção sociolaboral e falta de opções de diálogo e representação66. Organización Internacional del Trabajo; Comisión Económica para América Latina y el Caribe. Trabajo decente para los trabajadores de plataformas en América Latina. Santiago: Comisión Económica para América Latina y el Caribe; 2021. (Coyuntura Laboral en América Latina y el Caribe, 24). (p. 5-6).

Estudo multicêntrico, coordenado pela Universidade de Oxford (Reino Unido), com participação do Brasil, evidenciou condições precárias de inserção de trabalhadores na economia de plataforma, na atividade de entrega de mercadoria: “a pontuação anual do Fairwork Brasil fornece evidências de que os trabalhadores por plataformas, como em muitos países do mundo, enfrentam condições de trabalho injustas e sofrem sem proteções2525. Fairwork. Fairwork Brazil Ratings 2021: towards decent work in the platform economy. Porto Alegre/Oxford/Berlim: Fairwork; 2022. (p. 2).

O crescimento de pessoas ocupadas no setor de entrega de mercadorias no Brasil avançou marcantemente na pandemia, refletindo a expansão do comércio de alimentos mediado por aplicativos. Tomando o primeiro trimestre de 2016 como base, observa-se um crescimento de 76,8% até o segundo trimestre de 2017; entretanto, o pico de expansão ocorre durante a pandemia. Ao final de 2020, observa-se evolução de 750%, chegando a 979,8%, no segundo trimestre de 2021 2626. Góes G, Firmino A, Martins FA. A Gig economy no Brasil: uma abordagem inicial para o setor de transporte. Carta de Conjuntura 2021; (53):5.. Apesar de haver diferentes estimativas considerando trabalhadores de entrega de mercadorias por meio de aplicativo ou motociclistas profissionais sem carteira assinada, Lapa 2727. Lapa RS. O trabalho em plataformas digitais durante a pandemia da COVID-19: análise de dados da PNAD-COVID-19/IBGE. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 2021. (Mercado de Trabalho: Conjuntura e Análise, 71)., em estudo que analisa dados da PNAD-COVID19, refere a existência de 678.527 entregadores, por conta própria, em novembro de 2020 no país.

Já em 2016, a proposta de uma agenda de pesquisa voltada para abordagem do trabalho precário foi publicada no International Journal of Epidemiology e visava “estabelecer um programa de pesquisa que ampliasse a compreensão acerca do trabalho precário em sua relação com a saúde, e voltado para avaliação de políticas2323. Benach J, Vives A, Tarafa G, Delclos C, Muntaner C. What should we know about precarious employment and health in 2025? Framing the agenda for the next decade of research. Int J Epidemiol 2016; 45:232-8. (p. 233). No curso da pandemia e no pós-pandemia esta pauta se atualiza e se impõe, dadas as condições atuais de ampliação das vulnerabilidades de trabalhadoras(es). Portanto, abordar o trabalho precário que se conforma não apenas nas novas modalidades de inserção na economia de plataforma, mas também nas formas tradicionais de inserção no mercado, é um desafio atual para os estudiosos do trabalho e da saúde de trabalhadoras(es).

Nesse sentido, desafios teóricos e metodológicos têm mobilizado pesquisadores interessados na abordagem do construto trabalho precário. Embora haja uma produção de conhecimento disponível nas últimas duas décadas sobre efeitos à saúde relacionados ao trabalho precário, ressalta-se o uso ainda restrito do construto, baseado em dimensões isoladas. Ademais, discute-se a diversidade de definições conceituais do trabalho precário, que dificulta a apreensão da sua magnitude em diferentes contextos sociais e países 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.,2222. Bodin T, Çaglayan C, Garde AH, Gnesi M, Jonsson J, Kiran S, et al. Precarious employment in occupational health: an OMEGA-NET working group position paper. Scand J Work Environ Health 2020; 46:321-9.. No entanto, já são promissores os acúmulos teóricos acerca da multidimensionalidade do trabalho precário bem como as proposições para operacionalização metodológica da mensuração do construto e produção de evidências epidemiológicas.

Nesta perspectiva, “modelo conceitual relacionando trabalho precário, saúde e qualidade de vida” é proposto por Benach et al. 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.,2323. Benach J, Vives A, Tarafa G, Delclos C, Muntaner C. What should we know about precarious employment and health in 2025? Framing the agenda for the next decade of research. Int J Epidemiol 2016; 45:232-8., e se estrutura a partir dos níveis macro, meso e micro de determinação da saúde e qualidade de vida. No polo mais distal da determinação do trabalho precário encontram-se os poderes políticos do mercado (corporações, instituições, sindicatos), do governo (partidos políticos) e da sociedade (movimentos sociais, organizações não governamentais e da sociedade civil organizada). Este polo distal atua sobre a conformação do mercado de trabalho (com seu quadro regulatório, legislação em saúde e segurança) e estado de bem-estar (políticas sociais e políticas de saúde, benefícios sociais, proteção ambiental e ao consumidor e condições para a equidade).

A conformação do mercado de trabalho e a existência ou não do estado de bem-estar social determinarão o trabalho estável e pleno ou o trabalho precário e seus correlatos, o trabalho informal e o desemprego. Neste modelo, os autores admitem que o trabalho precário incidirá no estado de saúde e qualidade de vida, cujos determinantes proximais serão, por um lado, as condições de trabalho e, por outro, as condições de vida permeadas pela privação de recursos materiais (renda, moradia). Os autores incluem ainda as redes sociais e familiares na determinação do trabalho pleno ou precário, atribuindo, no entanto, seu menor papel nesta determinação 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.,2323. Benach J, Vives A, Tarafa G, Delclos C, Muntaner C. What should we know about precarious employment and health in 2025? Framing the agenda for the next decade of research. Int J Epidemiol 2016; 45:232-8..

Outra proposta teórica para abordagem do trabalho precário, por Bodin et al. 2222. Bodin T, Çaglayan C, Garde AH, Gnesi M, Jonsson J, Kiran S, et al. Precarious employment in occupational health: an OMEGA-NET working group position paper. Scand J Work Environ Health 2020; 46:321-9., encontra correspondência no modelo proposto por Benach et al. 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.. Os autores apontam a lacuna acerca de uma definição comum sobre trabalho precário e consequentemente acerca das evidências empíricas sobre seu papel na saúde, que admitem como uma questão de alta prioridade na agenda de pesquisa. Para esses autores, a natureza multidimensional do trabalho precário se assenta sobre características desfavoráveis que se acumulam em um mesmo trabalho, tais como níveis de remuneração e benefícios não remuneratórios, direitos e representação no local de trabalho, duração e tipo de contrato de trabalho. Ademais, reafirmam a necessária perspectiva interdisciplinar para lograr uma definição comum sobre o construto 2222. Bodin T, Çaglayan C, Garde AH, Gnesi M, Jonsson J, Kiran S, et al. Precarious employment in occupational health: an OMEGA-NET working group position paper. Scand J Work Environ Health 2020; 46:321-9..

Importante contribuição é a revisão sistemática, por Kreshpaj et al. 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47., que buscou identificar as diferentes definições presentes na literatura sobre trabalho precário e trouxe importante contribuição ao debate, além de se constituir em um desenho de revisão sistemática ainda emergente, pois incorporou estudos quantitativos e estudos qualitativos. Os autores 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47. admitem - e isto é uma abertura não habitual entre epidemiologistas - a necessidade de abordagens interdisciplinares para melhor apreensão do trabalho precário, suas dimensões e subdimensões, como também alertam Bodin et al. 2222. Bodin T, Çaglayan C, Garde AH, Gnesi M, Jonsson J, Kiran S, et al. Precarious employment in occupational health: an OMEGA-NET working group position paper. Scand J Work Environ Health 2020; 46:321-9..

A identificação de três dimensões principais do construto trabalho precário deve orientar a pesquisa, ampliando resultados empíricos sobre trabalho precário e saúde. As dimensões de trabalho precário, segundo Kreshpaj et al. 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47., são: (1) instabilidade e insegurança da relação de trabalho; (2) renda inadequada ou insuficiente; e (3) escassez de direitos e de proteção do trabalho.

Da primeira dimensão, foram identificadas na literatura quatro subdimensões: relação contratual insegura, provisoriedade do contrato, subemprego, múltiplos contratos 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47..

Estudos contrastam aos contratos diretos com os empregadores, os contratos terceirizados, com agências de emprego, ou o trabalho por conta própria. Evidencia-se que contratos por meio de terceiros não se constituem, em geral, em uma livre escolha - ao contrário, são muitas vezes a única escolha possível de trabalho. Ademais, estudos mostram que a terceirização se associa a experiências negativas, com desfechos desfavoráveis na saúde de trabalhadoras(es) 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.,2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47.,2828. Rönnblad T, Grönholm E, Jonsson J, Koranyi I, Orellana C, Kreshpaj B, et al. Precarious employment and mental health: a systematic review and meta-analysis of longitudinal studies. Scand J Work Environ Health 2019; 45:429-43..

A garantia da proteção da saúde e prevenção de agravos relacionados ao trabalho, a vigilância sobre as condições nas quais trabalhadoras(es) desenvolvem suas tarefas, são alguns dos elementos reduzidos ou removidos no curso das contratações por terceiros. Desta forma, trabalhadoras(es) submetidas(os) a condições de risco para a saúde em um determinado local de trabalho, não subordinadas(os) diretamente ao tomador do serviço, encontram-se em desvantagem se comparadas(os) às trabalhadoras(es) não terceirizadas(os) no mesmo local de trabalho. A materialidade da vulnerabilização em saúde e segurança da força de trabalho terceirizada é encontrada em literatura epidemiológica atual, que evidencia a maior ocorrência de acidentes de trabalho entre terceirizados 2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50.,3030. Lima MEA, Oliveira RC. Precarização e acidentes de trabalho: os riscos da terceirização no setor elétrico. Rev Bras Saúde Ocup 2021; 46:e6..

Estudos contrastam o contrato temporário ao contrato permanente ou sem prazo definido. No trabalho temporário, incluem-se contratos sob demanda, intermitentes, sazonais, variando quanto a sua duração; e, neste caso, a percepção de insegurança pode se vincular às incertezas quanto à duração do contrato e à expectativa quanto à sua renovação, ou seja, o conjunto de evidências permite inferir que as experiências negativas e os efeitos à saúde e segurança por consequência, se associam ao caráter imprevisível da renovação de contratos para trabalhadoras(es) em recorrentes contratos temporários na vida laboral 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47..

Embora evidências se acumulem acerca do papel do contrato temporário na saúde de trabalhadoras(es), há lacunas metodológicas ainda não superadas na definição desta exposição. Acidentes de trabalho, sintomas depressivos, estresse psicológico e queixas musculoesqueléticas são agravos que se têm associado ao trabalho temporário ou à imprevisibilidade do vínculo de trabalho 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.,2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47.,2828. Rönnblad T, Grönholm E, Jonsson J, Koranyi I, Orellana C, Kreshpaj B, et al. Precarious employment and mental health: a systematic review and meta-analysis of longitudinal studies. Scand J Work Environ Health 2019; 45:429-43.,2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50.,3030. Lima MEA, Oliveira RC. Precarização e acidentes de trabalho: os riscos da terceirização no setor elétrico. Rev Bras Saúde Ocup 2021; 46:e6..

Ao trabalho por tempo integral contrasta-se o trabalho por tempo parcial, outra subdimensão do trabalho precário. Há relevante discussão acerca de seu papel sobre os efeitos à saúde, que pode ser modificado pelo contexto social e econômico. Em situações favoráveis de inserção laboral, quando o trabalho parcial é voluntário, este pode se associar a experiências positivas. No entanto, experiências negativas decorrem do trabalho parcial involuntário, quando este é a única opção de trabalho encontrada, muitas vezes para evitar o desemprego, com submissão a condições degradadas. Portanto, o efeito do trabalho parcial sobre a saúde pode ser modificado pelos regimes de organização social e do mercado de trabalho, que o determinam como voluntário ou involuntário 2828. Rönnblad T, Grönholm E, Jonsson J, Koranyi I, Orellana C, Kreshpaj B, et al. Precarious employment and mental health: a systematic review and meta-analysis of longitudinal studies. Scand J Work Environ Health 2019; 45:429-43.,2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50.,3131. Kretsos L, Livanos I. The extent and determinants of precarious employment in Europe. Int J Manpow 2016; 37:25-43..

Embora existam muitas diferentes formas de mensuração de “múltiplos contratos”, que dificultam a síntese de evidências, há resultados indicando trabalho precário associado às situações que implicam múltiplos contratos, com aumento de risco para desfechos na saúde, especificamente para ocorrência de acidentes de trabalho 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47.,2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50..

A segunda dimensão do trabalho precário identificada na literatura foi mensurada ou definida de muitas diferentes formas nos estudos, mas constitui-se em dimensão consistente do construto, emergindo como renda instável ou inconsistente 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47.. Esta pode se associar a danos à saúde e condições de vida em meio à pobreza, de populações de trabalhadoras(es) e suas famílias vulnerabilizadas. Importante ressaltar a centralidade desta dimensão, haja vista que é a insuficiência de renda, em situação de instabilidade de vínculo, que demarca a vulnerabilidade social e do trabalho, posto que a existência de trabalho intermitente ou informal em áreas de produção artística ou áreas técnicas de alta especialização, ao conferir alta remuneração, embora instável, se distinguirá da situação dos precarizados, que auferem renda mínima a cada nova jornada diária, destinada à sobrevivência imediata.

A terceira dimensão do trabalho precário se expressa por meio de quatro subdimensões que emergiram da literatura 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47.. A falta de representação coletiva de trabalhadoras(es) é a primeira subdimensão relevante, haja vista a maior vulnerabilidade de trabalhadoras(es) não sindicalizadas(os) a demissões arbitrárias, entre outras desvantagens. A segunda subdimensão é a falta de seguridade social, que implica ausência de benefícios do trabalho ou de governos, concedidos a trabalhadoras(es); a terceira subdimensão é a falta ou insuficiência de apoio regulatório, normatizações e políticas de segurança no trabalho; e uma quarta subdimensão identificada diz respeito ao baixo poder de trabalhadoras(es) para o exercício dos direitos no trabalho, a fim de se contraporem às condições inadequadas e exigirem melhores condições de trabalho 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47.. Ademais, da insuficiência de direitos e proteção é particularmente emblemática a situação de trabalhadoras(es) informais, haja vista sua expressiva sub-representação entre as(os) sindicalizadas(os), conforme apontam Kreshpaj et al. 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47..

Essas são as dimensões e subdimensões do construto multidimensional trabalho precário, a partir das evidências científicas derivadas de estudos quantitativos e qualitativos 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47..

Assim, o avanço teórico define a multidimensionalidade do trabalho precário, mas permanecem desafios metodológicos na produção do conhecimento. A operacionalização do construto por meio de dimensões isoladas ainda predomina nos estudos empíricos, que recorrem à dimensão renda insuficiente, ou às subdimensões contrato temporário ou subemprego, para definição de trabalho precário e investigação dos desfechos em saúde associados a este. Há, no entanto, mais recentemente, experiências de pesquisa investigando o trabalho precário na sua multidimensionalidade.

Há um certo consenso acerca da necessária interdisciplinaridade e da cooperação internacional para o estudo do trabalho precário, haja vista a insubordinação deste construto às abordagens reducionistas a partir de um único campo disciplinar, com o uso de métodos desvinculados do estudo de contextos e cenários socioeconômicos e culturais 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.,2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47.,2222. Bodin T, Çaglayan C, Garde AH, Gnesi M, Jonsson J, Kiran S, et al. Precarious employment in occupational health: an OMEGA-NET working group position paper. Scand J Work Environ Health 2020; 46:321-9.,2323. Benach J, Vives A, Tarafa G, Delclos C, Muntaner C. What should we know about precarious employment and health in 2025? Framing the agenda for the next decade of research. Int J Epidemiol 2016; 45:232-8..

Evidências epidemiológicas: trabalho precário e saúde de trabalhadoras(es)

Os efeitos à saúde da reestruturação produtiva e redução dos postos de trabalho (downsizing), dos últimos anos do século XX e primeiros anos do século XXI, são revisados, a partir de estudos da epidemiologia social, por Benach et al. 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.. Os principais achados de estudos longitudinais evidenciam morbidade crescente entre trabalhadoras(es) que antecipam a insegurança do desemprego comparadas(os) às(aos) que antecipam a aposentadoria integral. Entre aqueles que sobrevivem à redução de postos de trabalho, a morbidade se vincula à manutenção de insegurança, perda de controle sobre o trabalho e sobrecarga decorrente da redução da força de trabalho 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53..

Diversos desfechos em saúde são evidenciados nesses primeiros estudos longitudinais: aumento de episódios de doença, episódios mais longos de afastamento do trabalho, redução da saúde autorrelatada, aumento dos fatores de risco cardiovascular e eventos agudos cardiovasculares, bem como crescimento do uso de serviços de saúde, aumento das queixas musculoesqueléticas, do uso de drogas psicotrópicas, além de aumento da frequência de distúrbios do sono, burnout, suicídio e aposentadoria precoce 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53..

Mais recentemente, resultados epidemiológicos acerca do papel do trabalho precário na saúde têm sido relevantes pois permitem constatar que, embora o estudo de dimensões isoladas do construto trabalho precário predomine na literatura, o conjunto já evidencia que o trabalho precário tem se associado a desfechos físicos e psíquicos na saúde de trabalhadoras(es). Os impactos na ocorrência de acidentes de trabalho, de distúrbios musculoesqueléticos e na saúde mental são os mais documentados.

Trabalho precário e impactos na saúde: acidentes de trabalho, distúrbios musculoesqueléticos e transtornos mentais

No Brasil, desde os anos 1990, com a reestruturação produtiva particularmente no setor industrial, profundas mudanças impactaram a saúde de trabalhadoras(es). Estudos a partir dos anos 2000 na Região Metropolitana de Salvador, com trabalhadoras(es) da indústria de plástico, encontraram alta prevalência de distúrbios musculoesqueléticos, com sofrimento físico expresso pelos quadros de dor, fortemente associados às condições de trabalho. Nesses estudos, em 14 fábricas do ramo plástico, conseguiu-se acesso a essas(es) trabalhadoras(es) do mundo privado, habitualmente inacessíveis aos pesquisadores, mas não o acesso para seguimento populacional nas fábricas.

Esta dificuldade pode estar na origem da escassez de estudos longitudinais em trabalhadoras(es) do mundo privado no país. Assim, a partir de estudos de corte transversal, evidenciou-se entre essas(es) trabalhadoras(es) o trabalho precário, com retirada de benefícios sociais, profunda insegurança no trabalho, contratos de curta duração e baixos salários, com acentuada desvantagem para as mulheres. O acesso ao auxílio-doença não era facilitado e o retorno ao trabalho não era apoiado. O trabalho precário naquele contexto era a única alternativa para auferir renda 2424. Fernandes RCP. Precarização do trabalho e os distúrbios musculoesqueléticos. Caderno CRH 2011; 24(n. spe1):155-70.,3232. Fernandes RCP, Assunção AA, Carvalho FM. Changes in the forms of industrial production and their effects on workers' health. Ciênc Saúde Colet 2010; 15 Suppl 1:1563-74.,3333. Fernandes RCP, Assunção AA, Carvalho FM. Repetitive tasks under time pressure: the musculoskeletal disorders and the industrial work. Ciênc Saúde Colet 2010; 15:931-42.,3434. Fernandes RCP, Assunção AA, Silvany Neto AM, Carvalho FM. Musculoskeletal disorders among workers in plastic manufacturing plants. Rev Bras Epidemiol 2010; 13:11-20..

Esses estudos brasileiros sobre distúrbios musculoesqueléticos evidenciam resultados de um contexto de precarização do trabalho ao final dos anos 1990 e início do século XXI, que se segue à reestruturação produtiva marcante, tão bem descrita por autoras(es) da sociologia do trabalho brasileira, entre essas(es) Druck 2121. Druck G. Trabalho, precarização e resistências: novos e velhos desafios? Caderno CRH 2011; 24(n. spe1):37-57..

Com o crescimento da massa de trabalhadoras(es) fora dos espaços formais de trabalho - a fábrica e o escritório - grande parcela do trabalho se desloca para o espaço da rua: vendedores ambulantes, cobradores de transporte urbano alternativo, motociclistas profissionais e guardas de segurança figuram entre as ocupações neste espaço de trabalho precário. Investigação sobre mortes ocorridas na cidade de Salvador, caracterizadas como acidentes de trabalho, revelou vítimas predominantemente inseridas em trabalho precário: 67% das mortes ocorreram nas ruas e 60% dos casos foram acidentes típicos e não de trajeto, ou seja, a rua é o local de trabalho. Os achados evidenciaram a desproteção social e do trabalho: 61,5% das vítimas fatais eram trabalhadoras(es) sem vínculo formal e regular de trabalho (sem carteira de trabalho assinada), com escolaridade muito baixa, 65% tinham até o Ensino Fundamental, 47% não eram vinculados ao Seguro Social, e 44% iniciaram a vida laborativa antes de completar 15 anos de idade. Viu-se então o trabalho precoce ou infantil, indicador de vulnerabilidade social, com marcante presença na trajetória de vida dos que morreram no curso do trabalho. A idade média no óbito foi de 38 anos. Como uma das dimensões do trabalho precário, a baixa renda foi achado importante: 31,5% recebiam até um salário mínimo da região, e outros 48% recebiam de um a três salários. Ademais, as repercussões desses acidentes sobre as famílias foram indicadas pela alta proporção (78%) de responsáveis principais pelo sustento da família entre os que morreram 3535. Lacerda KM, Fernandes RCP, Nobre LCC. Acidentes de trabalho fatais em Salvador, BA: descrevendo o evento subnotificado e sua relação com a violência urbana. Rev Bras Saúde Ocup 2014; 39:63-74..

Assim, o processo de flexibilização iniciado no século XX, com destaque para os estudos da primeira década e parte da segunda do século XXI, se ampliou de forma acelerada, associado ao trabalho precário contemporâneo. Estudos sobre o trabalho precário e sua associação com os acidentes de trabalho têm sido conduzidos principalmente em países centrais - Estados Unidos e países da Europa ocidental 2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50..

O contrato temporário foi a exposição mais explorada nos estudos sobre acidente de trabalho, (...) implicando insegurança, em populações com baixa experiência de trabalho e sem treinamento de segurança para o início das tarefas2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50. (p. 347). Embora contratos temporários possam predominar entre jovens, com baixa experiência de trabalho, que por si só pode ser condição associada aos acidentes de trabalho, o contrato temporário parece ter efeito independente na ocorrência de acidente de trabalho, conforme assinalam Koranyi et al. 2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50.. Questões metodológicas emergem dos estudos que utilizam contrato temporário, com desafios a serem superados, entre esses o papel confundidor, nem sempre controlado, das jornadas longas, extenuantes, que determinam fadiga física e ou psíquica, e que estão associadas ao trabalho temporário. Além disso, a associação entre contrato temporário e a existência de múltiplos contratos, que é também risco independente para o acidente de trabalho, merece análise mais adequada 2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50..

Associação positiva consistente foi encontrada entre ter múltiplos contratos de trabalho, terceirização e acidentes de trabalho 2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50.,3030. Lima MEA, Oliveira RC. Precarização e acidentes de trabalho: os riscos da terceirização no setor elétrico. Rev Bras Saúde Ocup 2021; 46:e6.. Estudos que investigaram o trabalho parcial na ocorrência de acidente de trabalho permitiram importantes discussões. Há achados empíricos que, em princípio, podem sugerir inconsistência entre os estudos, pois mostram tanto associação positiva quanto negativa entre trabalho parcial e saúde; no entanto, esta é a discussão promissora que se assenta sobre o contexto do trabalho parcial, voluntário ou involuntário 2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50.,3131. Kretsos L, Livanos I. The extent and determinants of precarious employment in Europe. Int J Manpow 2016; 37:25-43..

Estudo sobre o trabalho parcial no setor saúde, no Canadá, em equipes de enfermagem, mostrou papel protetor para acidentes de trabalho - lombalgias agudas. No entanto, neste setor, o trabalho parcial parece menos determinado pela precariedade de mercado de trabalho - parcial involuntário -, e mais por escolha, ou seja, se configurando como trabalho parcial voluntário. Neste caso, o trabalho parcial permitiria maior tempo de recuperação após as tarefas de manuseio de carga habitual desta ocupação - manuseio de pacientes - tarefa crítica para lombalgias agudas, constituindo-se em fator de proteção, pela redução da jornada diária e de exposição laboral 3636. Alamgir H, Yu S, Chavoshi N, Ngan K. Occupational injury among full-time, part-time and casual health care workers. Occup Med (Lond) 2008; 58:348-54..

Quanto à insuficiência de direitos e de proteção e, particularmente, quanto à falta de representação coletiva de trabalhadoras(es), há evidências epidemiológicas relevantes. Há estudos que encontraram sindicalização associada a maior ocorrência de acidente de trabalho 3737. Berdahl TA, McQuillan J. Occupational racial composition and nonfatal work injuries. Soc Probl 2008; 55:549-72., mas é possível se questionar sobre vieses 2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50..

Trabalhadoras(es) inseridas(os) em processos produtivos de maior risco laboral podem ser as(os) que mais se organizam em sindicatos, o que influencia na melhoria das condições de trabalho, com amenização dos riscos em decorrência da ação sindical. No entanto, ainda que haja a ação sindical exitosa, este risco, embora amenizado, se mantém nesses processos. Nesses casos, a associação positiva entre acidente de trabalho e ser sindicalizado pode resultar do papel confundidor, não controlado, do risco laboral do processo produtivo 3333. Fernandes RCP, Assunção AA, Carvalho FM. Repetitive tasks under time pressure: the musculoskeletal disorders and the industrial work. Ciênc Saúde Colet 2010; 15:931-42..

Além disso, trabalhadoras(es) sindicalizadas(os) são em geral mais informadas(os) sobre a necessidade de registrar acidente de trabalho e buscar o exercício de seus direitos, como as licenças médicas remuneradas. Desta forma, estudos baseados em registros de absenteísmo por acidente de trabalho podem dar apoio à hipótese de maior ocorrência de acidente de trabalho em sindicalizadas(os), quando esses achados decorrem de vieses, de informação e ou de seleção e, entre esses últimos, o efeito do trabalhador sadio. Nesses casos, acidentadas(os) graves, afastadas(os) do trabalho, não são capturadas(os) pelos estudos que selecionem apenas trabalhadoras(es) em plena atividade laboral 2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50..

Ademais, em situações de trabalho precário, encontram-se obstáculos para o registro de acidentes, e os resultados de estudos poderão ser inconsistentes, trazendo associação negativa entre acidente de trabalho e trabalho precário, decorrente dessas subnotificações. Isso pode ocorrer, especialmente, com trabalhadoras(es) sem acesso ao afastamento por doença remunerado, sem vínculo formal, haja vista a situação de insegurança quanto ao trabalho que inibe as queixas de saúde e de incapacidade para o trabalho, temendo represálias 2929. Koranyi I, Jonsson J, Rönnblad T, Stockfelt L, Bodin T. Precarious employment and occupational accidents and injuries - a systematic review. Scand J Work Environ Health 2018; 44:341-50..

Os acidentes de trabalho se associam com o trabalho precário, inclusive com resultados de estudos que avaliaram a carreira de trabalho e não apenas a situação de trabalho corrente, em cortes transversais, ou presente apenas no baseline de coortes. Ao se comparar trabalhadoras(es) com carreira de trabalho segura com aquelas(es) inseridas(os) em trabalho precário, essas(es) chegam a apresentar o dobro de acidentes de trabalho graves 3838. Giraudo M, Bena A, Leombruni R, Costa G. Occupational injuries in times of labour market flexibility: the diferente stories of employment-secure and precarious workers. BMC Public Health 2016; 16:150..

Ainda quanto aos impactos do trabalho precário na saúde, os desfechos sobre o sistema musculoesquelético, objeto dos estudos da fase de downsizing já referidos, têm sido descritos também recentemente. Contrato temporário, diário ou trabalho parcial, comparado ao vínculo permanente e em tempo integral, associou-se, entre assalariados na Coreia do Sul, à maior chance de dor musculoesquelética. Ademais, entre trabalhadoras(es) precarizadas(os) predominou a dor multirregional, dor em três a quatro regiões corporais, indicando maior gravidade 3939. Park S, Lee J-H. Precarious employment and increased incidence of musculoskeletal pain among wage workers in Korea: a cross-sectional study. Int J Environ Res Public Health 2021; 18:6299..

Estudos longitudinais recentes trazem de forma consistente os desfechos à saúde mental decorrentes do trabalho precário, ainda que predominem entre esses estudos o uso de dimensões isoladas do construto. É possível admitir que sendo a definição multidimensional de trabalho precário relativamente recente, os estudos epidemiológicos ainda são conduzidos com essa limitação. Ademais, boa parte desta produção se concentra em países centrais, da Europa ocidental -a maioria na Escandinávia - e da América do Norte 2828. Rönnblad T, Grönholm E, Jonsson J, Koranyi I, Orellana C, Kreshpaj B, et al. Precarious employment and mental health: a systematic review and meta-analysis of longitudinal studies. Scand J Work Environ Health 2019; 45:429-43.,4040. Vives A, Benmarhnia T, González F, Benach J. The importance of using a multi-dimensional scale to capture the various impacts of precarious employment on health: results from a national survey of Chilean workers. PLoS One 2020; 15:e0238401.. Neste sentido, os resultados devem ser analisados de forma parcimoniosa, haja vista que qualquer extrapolação deve considerar os regimes de bem-estar social e de mercado de trabalho na expressão dos efeitos do trabalho precário.

Além disso, trabalhadoras(es) em situação de precarização são menos acessíveis à pesquisa e ao seguimento em estudos longitudinais, portanto, menos representadas(os). Esta situação se aplica aos países periféricos ou quase-periféricos, cujas condições do mercado de trabalho, do sistema de proteção social e do trabalho, e do baixo financiamento em pesquisa não podem ser bem representadas pelos contextos estudados em países de alta renda, com abordagem de setores com baixo desemprego 1515. Benach J, Vives A, Amable M, Vanroelen C, Tarafa G, Muntaner C. Precarious employment: understanding an emerging social determinant of health. Annu Rev Public Health 2014; 35:229-53.,2222. Bodin T, Çaglayan C, Garde AH, Gnesi M, Jonsson J, Kiran S, et al. Precarious employment in occupational health: an OMEGA-NET working group position paper. Scand J Work Environ Health 2020; 46:321-9.,2828. Rönnblad T, Grönholm E, Jonsson J, Koranyi I, Orellana C, Kreshpaj B, et al. Precarious employment and mental health: a systematic review and meta-analysis of longitudinal studies. Scand J Work Environ Health 2019; 45:429-43..

Entre esses estudos, há evidências consistentes de que depressão e ansiedade estão associadas ao trabalho precário, mensurado por meio da subdimensão contrato temporário, que tem sido bastante investigada nesse sentido, mas ainda de forma isolada das demais dimensões do trabalho precário e implicando uma diversidade de definições que podem significar diferentes aspectos, dificultando a comparabilidade. Da mesma forma que se discute acerca do trabalho parcial, também o papel do contrato temporário sobre a saúde mental pode depender do seu caráter voluntário ou involuntário, este último associado a experiências negativas e efeitos à saúde 2020. Kreshpaj B, Orellana C, Burström B, Davis L, Hemmingsson T, Johansson G, et al. What is precarious employment? A systematic review of definitions and operationalizations from quantitative and qualitative studies. Scand J Work Environ Health 2020; 46:235-47.,2828. Rönnblad T, Grönholm E, Jonsson J, Koranyi I, Orellana C, Kreshpaj B, et al. Precarious employment and mental health: a systematic review and meta-analysis of longitudinal studies. Scand J Work Environ Health 2019; 45:429-43..

Mas há também achados promissores, em estudos longitudinais, que mensuraram trabalho precário por meio de mais de uma dimensão e mostraram fortes associações positivas com efeitos na saúde mental em geral, nos sintomas depressivos, no estresse psicológico e no uso de drogas psicotrópicas. Resultados de metanálise mostram o dobro de chance de os expostos ao trabalho precário apresentarem esses desfechos 2828. Rönnblad T, Grönholm E, Jonsson J, Koranyi I, Orellana C, Kreshpaj B, et al. Precarious employment and mental health: a systematic review and meta-analysis of longitudinal studies. Scand J Work Environ Health 2019; 45:429-43..

Entre os desenvolvimentos metodológicos, cabe ressaltar uma escala proposta que vem sendo validada para mensuração do trabalho precário na sua multidimensionalidade: a Employment Precariousness Scale (EPRES - Escala de Precariadade do Emprego) permitiu evidenciar, em inquérito nacional com trabalhadores no Chile (2020), o gradiente de impacto sobre a saúde em geral, saúde mental e lesões ocupacionais, segundo exposição a baixo, médio e alto escore de trabalho precário 4040. Vives A, Benmarhnia T, González F, Benach J. The importance of using a multi-dimensional scale to capture the various impacts of precarious employment on health: results from a national survey of Chilean workers. PLoS One 2020; 15:e0238401.. Em 2021, utilizando a EPRES, já validada em sua população, estudo de corte transversal sueco também mostrou gradiente de efeito à saúde geral e à saúde mental determinado pela baixa, moderada e alta exposição ao trabalho precário 4141. Jonsson J, Matilla-Santander N, Kreshpaj B, Johansson G, Kjellberg K, Burström B, et al. Precarious employment and general, mental and physical health in Stockholm, Sweden: a cross-sectional study. Scand J Public Health 2021; 49:228-36..

Estudo de corte transversal com trabalhadores brasileiros de transporte urbano, publicado em 2019 4242. Simões MRL, Souza C, Alcantara MA, Assunção AÁ. Precarious working conditions and health of metropolitan bus drivers and conductors in Minas Gerais, Brazil. Am J Ind Med 2019; 62:996-1006., baseou-se no modelo teórico da multidimensionalidade do trabalho precário e, embora não tenha feito uso da EPRES 4040. Vives A, Benmarhnia T, González F, Benach J. The importance of using a multi-dimensional scale to capture the various impacts of precarious employment on health: results from a national survey of Chilean workers. PLoS One 2020; 15:e0238401., utilizou uma variável proxi que buscou a equivalência com as multidimensões propostas e evidenciou associação positiva entre os mais altos escores de precariedade e ocorrência de transtorno mental comum, depressão, distúrbios do sono, dor musculoesquelética e absenteísmo.

Esses estudos vêm contribuir para estimular o uso do construto multidimensional na pesquisa epidemiológica em saúde de trabalhadoras(es), com resultados promissores e que devem incorporar a escala validada que viabilize a comparação dos resultados de pesquisa.

Considerações finais

A pandemia explicita de forma indubitável as desigualdades existentes no mundo e imprime suas consequências sobre o mundo do trabalho. Experiências prévias com crises sanitárias e econômicas ajudam a dimensionar o impacto, a curto e longo prazos, desta pandemia de COVID-19.

O trabalho precário é categoria central para o estudo da ampliação das desigualdades no pós-pandemia, haja vista que trabalhadores precarizados, no setor formal ou informal, foram um grupo criticamente vulnerabilizado durante a pandemia. Assim, partindo-se das evidências sobre o crescimento do trabalho precário, que antecede a pandemia e se amplia no curso desta crise sanitária e econômica, é possível prever seu crescimento na pós-pandemia, dadas as circunstâncias e tendências atuais.

O construto teórico e metodológico trabalho precário deve ser abordado em sua multidimensionalidade, a fim de contribuir mais efetivamente para a compreensão de seu impacto na saúde e vida de trabalhadoras(es). Os modelos teóricos propostos trazem contribuições essenciais que podem permitir o avanço da produção de conhecimento empírico. Neste sentido, evidências epidemiológicas que buscaram como fonte teórica outras áreas disciplinares, em evidente movimento interdisciplinar, vêm mostrando o papel do trabalho precário na saúde de trabalhadoras(es), ainda que permaneçam desafios metodológicos.

Mantidas as tendências, o futuro será do trabalho precário, com maior exclusão e vulnerabilização social e em saúde para muitos grupos ocupacionais. Impõe-se, portanto, como prioridade, uma atualização da agenda em pesquisa e políticas acerca dos efeitos do trabalho precário na saúde de trabalhadoras(es), com extensão para suas famílias e comunidades, considerando o contexto das mudanças e permanências do mundo do trabalho.

A transformação digital da economia e as circunstâncias das(os) trabalhadoras(es) da economia de plataforma podem resultar em ampliação das vulnerabilidades, haja vista que essa mais nova e ampliada modalidade de inserção para os que vivem do trabalho tem resultado, em verdade, na profunda precarização das relações e condições de trabalho, com evidentes impactos na saúde e vida de trabalhadoras(es).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    30 Mar 2022
  • Revisado
    06 Nov 2022
  • Aceito
    16 Fev 2023
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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