Uso de substâncias psicoativas ilícitas por estudantes de pedagogia de uma universidade pública

Use of illicit drugs by students of a public university of pedagogy

Marcos Vinícius Ferreira dos Santos Rafaely Rebuli Procopio Flávia Batista Portugal Marluce Miguel de Siqueira Sobre os autores

RESUMO

Esta pesquisa objetivou traçar o perfil do uso de drogas ilícitas entre acadêmicos do curso de graduação em Pedagogia do Centro de Educação da Universidade Federal do Espírito Santo. Realizou-se um estudo quantitativo, exploratório, descritivo e transversal. A população estudada foi constituída de alunos matriculados no referido curso no segundo semestre de 2010. O questionário utilizado foi o proposto pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas. Encontrou-se um maior uso de drogas na vida de tranqulizantes e ansiolíticos (15%) e anfetamínicos (7,8%). Os estudantes do sexo masculino usam mais maconha do que as mulheres, assim como os estudantes que relataram não ter religião. O presente estudo detectou que a maconha, os inalantes e solventes, os tranqulizantes e os anfetamínicos, são as principais drogas de escolha pelos universitários.

PALAVRAS-CHAVE
Estudantes; Drogas ilícitas; Prevenção secundária

ABSTRACT

This study aimed to profile the use of illicit drugs by students of undergraduate education in the Center of Education of the Federal University of Espírito Santo. We conducted a quantitative, exploratory, descriptive and transversal study. The study population consisted of students enrolled in that course in the second half of 2010. The questionnaire used was the one proposed by the National Secretariat about Drug Policy. Was found a higherdrug use in the lives of tranquilizers and anxiolytics (15%) and amphetamines (7.8%). The male students use more marijuana than women, as well as students who reported having no religion. This study found that marijuana, inhalants and solvents, tranquilizers and amphetamines, were the main drugs of choice for students of graduation.

KEYWORDS
Students; Street drugs; Secondary prevention

Introdução

O uso de substâncias psicoativas (SPAs) tem sido objeto de mobilização organizada das nações em todo mundo. Seus efeitos negativos são responsáveis por afetarem a estabilidade das estruturas dos Estados e sociedades, ameaçando valores políticos, econômicos, humanos e culturais dos mesmos. As SPAs afetam homens e mulheres independentemente de grupos étnicos, sociais, faixa etária e instrução, tendo ou não qualificação (CARLINI et al., 2005CARLINI, E.A. et al. II Levantamento Domiciliar sobre o uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil: estudo envolvendo as 108 maiores cidades do país: 2005. São Paulo: CEBRID: UNIFESP, 2005.).

Segundo o Relatório Mundial sobre Drogas (UNODC, 2010UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME (UNODC). World Drug Report, 2010.), o uso de SPAs ilícitas no âmbito mundial em 2008 foi entre 16 a 38 milhões. Os consumidores de cannabis sativa incluem o maior número de usuários de drogas ilícitas (129 – 190 milhões de pessoas). Em segundo lugar as anfetaminas aparecem sendo as SPAs mais consumidas, seguidas pela cocaína e opiáceos.

De acordo com o II Levantamento Domiciliar sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil (CARLINI et al., 2005CARLINI, E.A. et al. II Levantamento Domiciliar sobre o uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil: estudo envolvendo as 108 maiores cidades do país: 2005. São Paulo: CEBRID: UNIFESP, 2005.), foi observado que o uso na vida para qualquer droga no Brasil (exceto álcool e tabaco) foi de 22,8% e que os entrevistados na faixa etária de 12 – 17 anos, já fizeram uso das mais variadas drogas. O uso na vida de maconha aparece em primeiro lugar com 8,8%, seguido de solventes 6,1%, benzodiazepínicos 5,6%, orexígenos 4,1%, estimulantes 3,2%, cocaína 2,9%, xaropes 1,9%, opiáceos 1,3% e alucinógenos 1,1%. Quando analisada a região Sudeste pode-se observar que o uso na vida de qualquer droga, com exceção de álcool e tabaco, foi de 24,5%. As drogas ilícitas mais consumidas, segundo relato de uso na vida, foram, respectivamente, maconha 10,3%, solventes 5,9%, benzodiazepínicos 6,6%, estimulantes 3,8% e cocaína 3,7%.

As diferenças entre os grupos populacionais c seus contextos culturais costumam determinar padrões específicos de uso de drogas (SMART; OGBORNE, 2000SMART, R.G.;OGBORNE, A.C. Drug use and drinking among students in 36 countries. Addictive Behaviors, v. 1, n. 3, p. 455-460, 2000.). De tal modo, o uso de SPAs entre estudantes universitários é preocupante, uma vez que estes comportamentos podem trazer futuramente conseqüências sociais que perdurem por suas vidas profissionais (PINTON; BOSKOVITZ; CABRERA, 2005PINTON, F.A.; BOSKOVITZ, E.R; CABRERA, E.M.S. Uso de drogas entre os estudantes de medicina de São José do Rio Preto, SP, no ano de 2002. Arquivos de Ciências da Saúde, v. 12, n. 2, p. 91-96, 2005.).

No I Levantamento Nacional sobre o uso de álcool, tabaco e outras drogas entre universitários das 27 capitais brasileiras (SENAD, 2010BRASIL Presidência da República. Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas. I Levantamento Nacional sobre o Uso de Álcool e Outras Drogas entre Universitários das 27 Capitais Brasileiras. Brasília: Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, 2010.), mostrou que 48,7% dos universitários já fizeram uso de alguma SPAs ilícitas pelo menos uma vez na vida. As SPAs com maior freqüência de uso na vida foram: maconha (26,1%), inalantes (20,4%), anfetamínicos (13,8%), tranqüilizantes (12,4%), cocaína (7,7%), alucinógenos (7,6%) e ecstasy (7,5%).

Em um estudo realizado na Universidade Federal do Amazonas (LUCAS et al., 2006LUCAS, A.C.S. et al. Uso de psicotrópicos entre universitários da área da saúde da Universidade Federal do Amazonas, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, v. 22, n. 3, p. 663-671, 2006.) observa-se que as duas SPAs psicotrópicas ilícitas mais usadas na vida entre os universitários da área de saúde foram os solventes (11,9%) e a cannabis sativa (9,4%), seguidas, então, dos anfetamínicos (9,2%), cocaína (2,1%) e alucinógenos (1,2%). Também se encontrou uma prevalência de uso 30% para solventes e 17% para a maconha, em uma pesquisa realizada com estudantes de medicina de nove faculdades paulistas (KERR-CORRÊA 1999KERR-CORRÊA, F. Uso de álcool e drogas por estudantes de medicina da Unesp. Revista Brasileira de Psiquiatria, v. 21, n. 2, p. 95-100,1999.)

Como observado em outras universidades, a Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) também foi cenário de pesquisa semelhante. Em estudos realizados com universitários dos cursos de Medicina, Odontologia, Enfermagem e Farmácia desta universidade, pode-se observar que, cm relação ao consumo de drogas ilícitas na vida pelos estudantes de medicina e odontologia, aparecem em primeiro lugar os solventes com 15,5% para os estudantes de medicina e 25,9% para os de odontologia, seguido da cannabis sativa, 9,5% para os estudantes de medicina e 13,2% para os de odontologia, e os alucinógenos com 1,8% para os estudantes de medicina e 4% para os de odontologia (PEREIRA 2008PEREIRA, D.S. et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de medicina. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, v. 57, n. 3, p. 188-195,2008.; TEIXEIRA 2010TEIXEIRA, R.F. et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de Odontologia da Universidade Federal do Espírito Santo. Ciência e Saúde Coletiva, v. 15, n. 3, p.655-662, 2010.). Nos universitários de Enfermagem, apareceu em primeiro lugar como uso na vida os ansiolíticos com 13,4%, seguido dos anfetamínicos 11,7%, solventes 11,2% e maconha 6,7% (MARDEGAN, 2007MARDEGAN, P.S. et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de enfermagem. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, v. 56, n. 4, p. 260-266, 2007.). Já nos acadêmicos de Farmácia o uso de inalantes apareceu em primeiro lugar com 18,2%, seguido dos ansiolíticos 9,5% e maconha 8,8% (PORTUGAL et al. 2008PORTUGAL F.B. et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de farmácia. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, v. 57, n. 2, p. 127-132, 2008.).

Tal como cm universitários da área da saúde, estudos com acadêmicos de pedagogia se faz necessário, uma vez que estes serão futuros profissionais da educação e serão, desta forma, responsáveis pela formação de novos profissionais. Também deve-se ressaltar que, o profissional inserido na área da educação, se torna um modelo em seu ambiente de trabalho frente as pessoas que estão a sua volta e, principalmente, àquelas que serão educadas por estes profissionais.

Portanto, traçar o perfil dos usuários de substâncias psicoativas ilícitas entre os universitários do curso de pedagogia é de grande importância, já que tais estudos fornecem subsídios para a implantação de programas de prevenção ao uso indevido de substâncias psicoativas dirigido a esses universitários.

Metodologia

Trata-se de um estudo exploratório, descritivo, transversal e quantitativo, realizada no Centro de Educação (CE) da UFES, no período de 2010/2. A população estudada foi constituída dos 485 alunos que estavam devidamente matriculados no curso de Pedagogia, período de 2010/2. A amostra foi calculada no software Epi Info 6.04, com intervalo de confiança de 95%, erro de 5% e prevalência 50%, resultando uma amostra de 215 universitários.

Inicialmente, enviou-se uma carta à diretora do CE e aos chefes de departamento de Linguagens, Cultura e Educação e de Teorias de Ensino e Práticas Educacionais, solicitando a colaboração dos professores na concessão de 30 minutos de suas respectivas aulas para a aplicação dos questionários. Realizou-se um estudo piloto, a fim de calibrar os aplicadores. A aplicação do questionário foi realizada em sala de aula, por bolsistas de iniciação cientifica devidamente treinados, com anuência prévia dos professores, após breve explicação dos objetivos do trabalho pelos pesquisadores. Todos que aceitaram participar da pesquisa assinaram o termo de consentimento livre c esclarecido, de acordo com Resolução Nº. 196/1996 do Conselho Nacional de Saúde (CNS). O questionário utilizado foi o proposto pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD) para o I Levantamento Nacional sobre o Uso de Álcool c Outras Drogas entre Universitários das 27 Capitais Brasileiras (SENAD, 2010BRASIL Presidência da República. Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas. I Levantamento Nacional sobre o Uso de Álcool e Outras Drogas entre Universitários das 27 Capitais Brasileiras. Brasília: Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, 2010.). Utilizou-se um questionário fechado, de auto-preenchimento e sem identificação pessoal do aluno, contendo breve explicação sobre a pesquisa, dados sócio-demográficos, dados do consumo de substâncias psicoativas, e relacionamento familiar e social do entrevistado, analisados de acordo com a classificação da Organização Mundial de Saúde (SMART, 1980SMART, R.G. et al. A methodoiogy for students drug-use surveys. Geneva: World Healh Organization, 1980.):

  • Uso na vida: quando a pessoa fez uso de qualquer droga psicotrópica pelo menos uma vez na vida;

  • Uso no ano: Uso no ano: quando a pessoa utilizou droga psicotrópica pelo menos uma vez nos doze meses que antecederam a pesquisa;

  • Uso no mês: quando a pessoa utilizou droga psicotrópica pelo menos uma vez nos trinta dias que antecederam a pesquisa;

Os dados foram analisados pelo programa Statistical Package for the Social Science - SPSS 16, sendo realizada inicialmente uma análise univariada e posteriormente uma análise bivariada, a fim de verificar a associação entre o uso de SPAs e as variáveis independentes.

O presente estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da UFES, de acordo com os dispositivos da Resolução Nº 196/96 do CNS sobre Pesquisa com Seres Humanos (CNS, 1996). O mesmo integra o projeto intitulado “Uso de Substâncias Psicoativas entre Universitários da Educação de uma Universidade Pública (Prot. Nº. 119/2009)”.

Resultados e discussão

Foram pesquisados 294 estudantes, o que corresponde a 60,6% de todos os alunos matriculados no período. Conforme mostrado na Tabela 1, a maioria dos estudantes é do sexo feminino (94,2%). Além disso, há um predomínio de estudantes entre 19 c 24 anos (59,5%). Segundo a religião, a maioria citou ser Evangélico/Protestante (43%), Católicos (40,1%) e os que não possuem religião (11,5%). Quanto a classe socioeconômica, constatou-se que a maioria pertence às classes B (51,4%) e C (40,5%).

Tabela 1
Características sócio-demográficas dos estudantes de pedagogia da UFES. Vitória, 2010

O uso na vida de substâncias ilícitas encontrada no presente estudo foi de 53,9%. Em um estudo com universitários da Federal de Goiás (CANUTO; FERREIRA; GUIMARAES, 2006CANUTO M.H.A.; FERREIRA, RA; GUIMARÃES, E.M.B. Uso e abuso de drogas ilícitas por jovens do 1º ano da Universidade Federal de Goiás. Revista Paulista de Pediatria, v. 24, n. 2, p. 135-142, 2006.), encontrou-se que o uso na vida de Inalantes (23%) e Maconha (14,6%) foi superior ao uso de Ansiolíticos (7,7%) e Anfetamínicos (6,4%). Os dados encontrados por Canuto, Ferreira e Guimarães (2006)CANUTO M.H.A.; FERREIRA, RA; GUIMARÃES, E.M.B. Uso e abuso de drogas ilícitas por jovens do 1º ano da Universidade Federal de Goiás. Revista Paulista de Pediatria, v. 24, n. 2, p. 135-142, 2006. aproximam-se dos encontrados no I Levantamento Nacional sobre o uso de SPAs por Universitários (SENAD, 2010), porém contrapõe-se a este estudo, onde Inalantes e Maconha, embora estejam entre as principais SPAs utilizadas, apresentaram menor prevalência entre as substâncias citadas. Podemos relacionar esse menor uso de maconha e inalantes ao fato do curso de pedagogia conter em sua maioria estudantes do sexo feminino (94,2%), o que leva a uma preferência pelo consumo de Ansiolíticos e Anfetamínicos, como observado em um estudo com estudantes de Enfermagem (MARDEGAN 2007MARDEGAN, P.S. et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de enfermagem. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, v. 56, n. 4, p. 260-266, 2007.), onde a maioria dos estudantes também era do sexo feminino (82,7%). Neste estudo os Ansiolíticos (13,4%) e Anfetamínincos (11,7%) foram as primeiras substâncias psicoativas ilícitas de escolha mais utilizadas pelos estudantes.

Gontijo (2003)GONTIJO, C.R.B. A relação Pedagogia - profissão de mulher: desafio atual para a prática e a formação de educadoras. In: II CONGRESSO DE PESQUISA E ENSINO EM HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO EM MINAS GERAIS, 2003, Uberlândia. Anais do II Congresso de Pesquisa e Ensino em História da Educação em Minas Gerais, 2003. relaciona o fato do curso de pedagogia haver em sua maioria mulheres, ao processo de demanda sócio-econômica, surgimento do capitalismo e à procura da mulher por mais representatividade em atividades sócio-culturais. Porém, essa inserção no mercado de trabalho é feita através de profissões que segundo a autora seria uma espécie de extensão do lar, onde se torna possível a conciliação entre a vida pública e privada da mulher.

Quanto à faixa etária, este estudo corrobora com outros, como o de Kerr-Correa et al. (1999)KERR-CORRÊA, F. Uso de álcool e drogas por estudantes de medicina da Unesp. Revista Brasileira de Psiquiatria, v. 21, n. 2, p. 95-100,1999. que encontraram em seu estudo um predomínio de faixas etárias jovens, principalmente mulheres, tendo uma variação da média de idade dos alunos estudados nas nove universidades pesquisadas entre 21,2 a 22,3 anos. Lemos c outros autores (2007)LEMOS, K.M. et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de Medicina de Salvador (BA). Revista de Psiquiatria Clínica, v. 34, n .3, p. 118-124, 2007. cm seu estudo, com os estudantes de medicina de Salvador, também encontraram uma média de idade parecida: 21,9 anos. Alguns estudos realizados na UFES (MARDEGAN 2007MARDEGAN, P.S. et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de enfermagem. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, v. 56, n. 4, p. 260-266, 2007.; PEREIRA 2008PEREIRA, D.S. et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de medicina. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, v. 57, n. 3, p. 188-195,2008.; PORTUGAL 2008PORTUGAL F.B. et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de farmácia. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, v. 57, n. 2, p. 127-132, 2008.; TEIXEIRA 2010TEIXEIRA, R.F. et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de Odontologia da Universidade Federal do Espírito Santo. Ciência e Saúde Coletiva, v. 15, n. 3, p.655-662, 2010.) também corroboram com os resultados desta pesquisa, já que a maioria dos estudantes pertence à faixa etária de 18 a 24 anos e a classe sócio-econômica B. O fato de a maioria dos estudantes que ingressam no curso de pedagogia pertencer à classe socioeconômica mais baixa, pode ser atribuído, segundo Gontijo (2003)GONTIJO, C.R.B. A relação Pedagogia - profissão de mulher: desafio atual para a prática e a formação de educadoras. In: II CONGRESSO DE PESQUISA E ENSINO EM HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO EM MINAS GERAIS, 2003, Uberlândia. Anais do II Congresso de Pesquisa e Ensino em História da Educação em Minas Gerais, 2003., às condições econômicas; ao déficit de estudos, já que vieram de escolas públicas; a dificuldade de conciliar trabalho e estudo; e por acharem que a pedagogia seria uma das poucas oportunidades de ingressarem na universidade, uma vez que consideravam a entrada nesse curso relativamente fácil. Em relação à religião, o I Levantamento Nacional com universitários contrapõe-se a este estudo, já que 60% dos estudantes disseram ser católicos, e apenas 16% disseram ser protestantes (SENAD, 2010).

A Tabela 2 mostra o uso na vida, no ano e nos últimos 30 dias, de substâncias psicoativas ilícitas por estudantes de pedagogia da UFES. Em relação ao uso na vida, as principais SPAs utilizadas pelos universitários foram: Tranqüilizantes e Ansiolíticos (15%), Anfetamínicos (7,8%), Maconha (7,5%) e Inalantes e Solventes (5,4%). Com relação ao uso no ano, as SPAs mais freqüentes foram: Tranqüilizantes e Ansiolíticos (8,8%), Anfetamínicos (4,1%), Analgésicos e Opiáccos (3,4%), e Maconha (1,7%). As mais usadas nos últimos 30 dias foram: Tranqüilizantes e Ansiolíticos (6,8%), Analgésicos e Opiáceos (3,0%) e por último Anfetamínicos (2,7%).

Tabela 2
Prevalência de uso de substâncias psicoativas por estudantes de pedagogia da UFES. Vitória, 2010

Obscrvou-sc neste estudo resultados estatisticamente significantes quanto ao uso na vida de maconha e inalantes por parte dos estudantes do sexo masculino, corroborando com o estudo de Lemos e outros autores (2007)LEMOS, K.M. et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de Medicina de Salvador (BA). Revista de Psiquiatria Clínica, v. 34, n .3, p. 118-124, 2007., em que o uso de maconha pelos homens (27,1%) foi maior do que nas mulheres (12,2%), apresentando significância estatística em relação ao uso de p<0,01. No I Levantamento nacional com universitários3 também se encontrou que a maconha (34,5%) e os inalantes (25,5%) são as drogas mais consumidas pelos homens. Com base nesses resultados é possível entender que a maconha e os inalantes são SPAs de fácil aceitação por parte dos estudantes do sexo masculino.

Na Tabela 3 pode-se observar o uso na vida de SPAs ilícitas em relação ao Sexo, Idade e Religião. Na associação uso na vida e sexo, encontrou-se uma significância estatística referente ao uso de maconha e inalantes de (p = 0,000) para ambos, onde os estudantes do sexo masculino possuem 27,3% (RP = 6,492; IC = 2,967-4,206) e 25% (RP = 6,492; IC = 2,967-4,206) mais chances de consumir maconha e inalantes, respectivamente, do que os estudantes do sexo feminino. Com relação ao uso na vida e idade, ouve um maior uso de SPAs em duas faixas, de 19 a 24 anos e 25 a 34 anos, variando de acordo com a substância usada. Embora não se tenha encontrado nenhuma significância estatística nessa associação, pode-se observar que houve uma maior prevalência no consumo de maconha (59,1%), inalantes (50%) c tranqüilizantes (59,1%) na faixa etária dos estudantes de até 24 anos. Quanto ao uso de anfetamínicos (43,5%), observou-se um mesmo consumo entre os estudantes de até 24 anos c os de 25 a 34 anos. Na associação de uso na vida e religião, encontrou-se uma significância estatística para o uso de inalantes e solventes e maconha de (p = 0,016) e (p = 0,035) respectivamente, uma vez que, os indivíduos que relataram não ter religião, apresentaram 33,3% (RP = 6,176; IC = 1,467-26,001) mais chances de usarem inalantes e de 23,8% (RP = 4,632; IC = 1,160-18,497) mais chances de usarem maconha do que os evangélicos. Em relação ao uso de tranqüilizantes e anfetamínicos em associação com as três variáveis sócio-demográficas, não foi encontrado nenhuma significância estatística no uso das mesmas.

Tabela 3
Prevalência de uso na vida de substâncias psicoativas em relação ao sexo, idade e religião por estudantes de pedagogia da UFES. Vitória, 2010

Em relação ao uso na vida de SPAs e religião, segundo Dalgalarrondo, Soldera, Filho e Silva (2004)DALGALARRONDO, P. et al. Religião e uso de drogas por adolescentes. Revista Brasileira de Psiquiatria., v. 26, n. 2, p. 82-90, 2004., os protestantes históricos e os pentecostais apresentam relativamente menor uso das SPAs do que os católicos e os espíritas, aproximando-se, também, do estudo de Silva et al. (2006)SILVA, L.V.E.R. et al. Fatores associados ao consumo de álcool e drogas entre estudantes universitários. Revista de Saúde Pública, v. 40, n. 2, p. 280-288, 2006., que encontrou um maior uso de SPAs ilícitas pelos espíritas (27,2%), seguido dos católicos (24,9%), outras religiões (21,2%) e, por fim, dos protestantes (18%). Corroborando com este estudo, onde se observou um menor uso de substâncias psicoativas ilícitas pelos protestantes em relação aos católicos e aos que relataram não ter religião. Este estudo (SILVA et al., 2006SILVA, L.V.E.R. et al. Fatores associados ao consumo de álcool e drogas entre estudantes universitários. Revista de Saúde Pública, v. 40, n. 2, p. 280-288, 2006.), também mostra que o fato de ter alguma religião influenciou o consumo de SPAs ilícitas com significância estatística de (p < 0,001), onde 37,7% dos que disseram não ter religião usaram SPAs contra 24,6% dos que disseram ter religião e fizeram uso.

É importante ressaltar que valores e atitudes morais e religiosas são mais importantes do que uma possível prática religiosa, como ir com freqüência a cultos e missas. Embora não tenham sido analisados esses fatores neste estudo, sabe-se que eles são de extrema importância para melhor observar a influência não apenas da religião dita, mas da religiosidade praticada (SILVA 2006SILVA, L.V.E.R. et al. Fatores associados ao consumo de álcool e drogas entre estudantes universitários. Revista de Saúde Pública, v. 40, n. 2, p. 280-288, 2006.; WAGNER; ANDRADE, 2008WAGNER, G.A.; ANDRADE, A.G. Uso de álcool, tabaco e outras drogas entre estudantes universitários brasileiros. Revista de Psiquiatria Clínica., v. 35, n. 1, p. 48-54, 2008.).

Considerações finais

O presente estudo mostrou que, dentre o consumo de substâncias psicoativas ilícitas, a maconha, os inalantes e solventes, os tranqüilizantes e os anfetamínicos, são as principais SPAs de escolha pelos universitários, corroborando com vários outros estudos encontrados na literatura. Observou-se que a maconha e os inalantes, embora não tenham sido as SPAs de uso mais prevalente, são as que possuem maior uso e aceitação por parte dos estudantes do sexo masculino. Quanto ao uso de tranquilizantes e anfetamínicos, observou-se que estas foram as primeiras SPAs de escolha mais usadas por parte dos estudantes. Vários estudos na literatura também mostram a preferencia das mulheres pelo uso de medicamentos. Outro ponto importante observado, é que o uso de SPAs por estudantes que relatam pertencer a alguma religião foi menor do que os que relataram não ter religião, Isso mostra que a religião ainda é um fator de proteção para o uso de SPAs.

Diante disso, este estudo pretendeu conhecer o uso das SPAs pelos estudantes de pedagogia, já que estes são os universitários que mais tarde estarão no mercado de trabalho atuando como educadores. É importante ressaltar, que o uso de SPAs está cada vez maior. Dessa forma, é necessário se ter educadores capacitados e preparados para trabalharem a temática nas salas de aula.

Sendo assim, espera-se mostrar com este estudo a necessidade de uma maior abordagem sobre o uso de substâncias psicoativas entre os universitários, sendo necessário fazer a inclusão do tema no currículo do curso, bem como criar programas para prevenção que atendam de forma especifica esta população, uma vez que, quando se tornarem profissionais, passarão a ser vistos como modelos no ambiente de trabalho que estarão inseridos frente às pessoas que estão a sua volta e, principalmente, àquelas que serão educadas pelos mesmos.

Agradecimentos

Agradecemos à equipe CEPAD-UFES, nas pessoas dos membros anteriores e atuais, que forneceram apoio técnico-administrativo para execução deste trabalho. Também agradecemos aos universitários que se dispuseram em participar de nosso estudo e ao Enfermeiro Denis Soprani Pereira pela colaboração na versão final.

  • Suporte financeiro: não houve

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    Dez 2013

Histórico

  • Recebido
    01 Abr 2013
  • Aceito
    01 Jun 2013
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