Fatores condicionantes para o acesso às equipes da Estratégia Saúde da Família no Brasil

Factors affecting access to the Family Health Stategy teams in Brazil

Márcia Guimarães de Mello Alves Elisete Casotti Luisa Gonçalves Dutra de Oliveira Mônica Tereza Christa Machado Patty Fidelis de Almeida Marcos Paulo Fonseca Corvino Juliana Marin Regina Fernandes Flauzino Luiz Albérico Araújo Montenegro Sobre os autores

Resumos

O artigo analisa o acesso às equipes certificadas pelo Programa Nacional de Melhoria de Acesso e da Qualidade da Atenção Básica, tendo por categoria central o acesso potencial e duas dimensões: acolhimento e disponibilidade. A partir de questões selecionadas dos instrumentos da Avaliação Externa do Programa, geraram-se escores e três estratos. Os resultados confirmam que os fatores favoráveis ao acesso potencial foram: localização na região Sudeste, em capitais e municípios de maior porte e com maior número de equipes por unidade. Apesar dos progressos, os resultados indicam a necessidade de políticas e ações voltadas à qualificação da atenção prestada, especialmente nos municípios de pequeno porte.

Avaliação de serviços de saúde; Acesso aos serviços de saúde; Atenção Primária à Saúde; Saúde da Família


The article aims to analyze access to teams certified by National Program for Access and Quality Improvement in Primary Care. The category studied was the potential access with two dimensions: embracement and availability. Data obtained from selected issues of instruments of External Evaluation of the program were sources of information and generate scores and three strata. The results show that favorable factors to the potential access were located in the Southeast, in capitals, bigger towns, and larger number of teams by health unit. Despite progresses, the results address to the need for policies and actions to qualify the care provided, especially in small towns.

Health services evaluation; Health services accessibility; Primary Health Care; Family health


Introdução

O Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) tem, entre as suas diretrizes, a construção de um parâmetro de comparação entre as equipes de saúde da Atenção Básica (AB) e o estímulo ao processo contínuo e progressivo de melhoramento dos padrões e indicadores de acesso e de qualidade que envolva a gestão, o processo de trabalho e os resultados alcançados por essas equipes (BRASIL, 2011ABRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.654, de 19 de Julho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde, o Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) e o Incentivo Financeiro do PMAQ-AB, denominado Componente de Qualidade do Piso de Atenção Básica Variável - PAB Variável. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 20 jul.2011a. Seção I, p. 79.). A AB é considerada como a porta de entrada do sistema de saúde e deve ser acolhedora e resolutiva para o conjunto das necessidades de saúde, além de coordenadora da continuidade do cuidado (PINTO; SOUSA; FLORÊNCIO, 2012PINTO, H. A.; SOUSA, A.; FLORÊNCIO, A. R. O Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica: reflexões sobre o seu desenho e processo de implantação. RECIIS - R. Eletr. de Com. Inf. Inov. Saúde, Rio de Janeiro, v. 6, n. 2, Sup. 2012. Disponível em: <http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/viewArticle/624/1083>. Acesso em: 28 mar. 2014.
http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index...
). Starfield (2002)STARFIELD, B. Atenção primária: equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília, DF: Unesco: Ministério da Saúde, 2002. considera a Atenção Primária à Saúde (APS) como a porta de entrada, oferecendo cuidados focados na pessoa ao longo do tempo e não sobre a doença, provendo atenção a todas as condições e coordenando a assistência em outros níveis de atenção, quando necessário. Para a autora, na APS, o acesso deveria ser universal e não necessariamente relacionado ao problema/necessidade, uma vez que este pode não ter sido ainda identificado e definido. A definição de um serviço de APS como porta de entrada dependeria, segundo a mesma autora, tanto da acessibilidade (estrutura), como, por exemplo, da localização geográfica do serviço, horários e dias de funcionamento, como também da utilização de fato () que a população faz do mesmo.

O artigo 8º do Decreto nº 7508 de 28 de junho de 2011, que regulamentou a Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990, estabelece que o acesso universal, igualitário e ordenado às ações e serviços de saúde se inicia pelas portas de entrada do SUS e se completa na rede regionalizada e hierarquizada, de acordo com a complexidade do serviço (BRASIL, 2011B, P.01______. Casa Civil. Decreto Federal nº 7.508 de 28 de junho de 2011. Regulamenta a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, para dispor sobre a organização do Sistema Único de Saúde - SUS, o planejamento da saúde, a assistência à saúde e a articulação interfederativa, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 29 jun. 2011b. Seção I, p.01.), sendo a AB uma das portas de entrada às ações e aos serviços de saúde nas redes de atenção à saúde.

O componente 'Avaliação Externa' do PMAQ-AB consistiu no levantamento de informações para análise das condições de acesso e de qualidade da atenção em saúde. Foram verificadas a estrutura e as condições de funcionamento das Unidades Básicas de Saúde (UBS), visando à acessibilidade, à ambiência, às condições de trabalho e à disponibilidade de equipamentos, insumos e medicamentos. A organização do processo de trabalho com vistas ao acesso e à qualidade das ações foi abordada sob a perspectiva do profissional e do usuário, considerando a implantação de alguns dispositivos, tais como o acolhimento, a agenda compartilhada, as ferramentas de gestão do cuidado, dentre outros. A unidade de análise foi a EqAB e seu local de trabalho, a UBS (PINTO; SOUSA; FLORÊNCIO, 2012PINTO, H. A.; SOUSA, A.; FLORÊNCIO, A. R. O Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica: reflexões sobre o seu desenho e processo de implantação. RECIIS - R. Eletr. de Com. Inf. Inov. Saúde, Rio de Janeiro, v. 6, n. 2, Sup. 2012. Disponível em: <http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/viewArticle/624/1083>. Acesso em: 28 mar. 2014.
http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index...
).

A complexidade do conceito de acesso encontra-se na diversidade de definições apresentadas por variados autores. Donabedian (1973)DONABEDIAN, A. Aspects of medical care administration. Cambridge: Harvard University Press, 1973. utilizou o termo "acessibilidade" definindo-o como as características dos recursos em saúde que facilitam ou obstruem sua utilização pelos potenciais usuários. O conceito de acessibilidade ampliou a noção de acesso para além da disponibilidade de recursos em um dado local e hora, e, em certa medida, incorpora a dimensão acolhimento (MASCARENHAS, 2003MASCARENHAS, M. T. M. Avaliando a implementação da Atenção Básica no município de Niterói, RJ: Estudos de caso em Unidade Básica de Saúde e Módulo do Programa Médico de Família. 2003. 176 p. Tese (Doutorado em Saúde Pública). - Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2003.). Donabedian (1973)DONABEDIAN, A. Aspects of medical care administration. Cambridge: Harvard University Press, 1973. classificou os fatores que influenciam a acessibilidade do usuário aos serviços de saúde em dois grupos: sócio-organizacionais e geográficos que, embora distintos, apresentam correlações importantes. Os elementos sócio-organizacionais englobam todas as características dos recursos de saúde não relacionados aos elementos espaciais tais como: atributos do profissional de saúde (sexo, cor, especialização, tipo de remuneração) e estratégias formais e informais de admissão de pacientes que podem se utilizar de mecanismos de exclusão pela cor, status econômico ou diagnóstico. O segundo grupo de fatores que pode dificultar ou facilitar a acessibilidade, de acordo com esse mesmo autor, refere-se aos elementos geográficos, incorporando a ideia de que o espaço pode criar resistências à movimentação do usuário. A distância até o serviço de saúde, o tempo de deslocamento e o tempo gasto na busca pelos cuidados são algumas das medidas desses elementos. Estudos sobre itinerários terapêuticos têm trabalhado com esses elementos, destacadamente o acesso/acessibilidade, ainda que com diferentes abordagens teórico-metodológicas (CABRAL , 2011CABRAL, A. L. L. V. et al. Itinerários terapêuticos: o estado da arte da produção científica no Brasil. Ciênc. Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 11. 2011, p. 4433-4442.).

Por meio de revisão da literatura, Hulka e Wheat (1985)HULKA, B. S.; WHEAT, J. R. Patterns of utilization: the patient perspective. Medical care, Philadelphia, v.3, n. 5, p. 438-460, 1985. evidenciaram os fatores que determinam a utilização dos serviços de saúde. Uma das categorias identificadas foi o 'status de saúde' ou necessidade de saúde. As evidências sugerem que a utilização dos serviços de saúde está diretamente relacionada à percepção da necessidade, sendo este o principal fator na determinação do uso. Os fatores capacitantes, segundo esses autores, envolvem os recursos que podem facilitar ou dificultar a utilização dos serviços de saúde. Abrangem recursos familiares, tais como renda e cobertura por planos de saúde e outros vinculados à oferta de serviços como: disponibilidade de profissionais, exames, tempo de espera pelo serviço, etc.

Em publicações mais antigas, Andersen (1968)ANDERSEN, R. A behavioral model of families' use of health services. Chicago: University of Chicago, 1968. (Research Series, 25)., bem como Aday e Andersen (1974ADAY, L. A.; ANDERSEN, R. A framework for the study of access to medical care. Health services research, New York, v. 9, n. 3, p. 208-220, 1974.), já estabeleciam três condições, relacionadas às características da população, que determinavam a utilização de serviços de saúde: os componentes 'predisponentes', os 'capacitantes' e a 'necessidade'. Andersen e Newman (2005)ANDERSEN, R.; NEWMAN, J. F. Societal and individual determinants of medical care utilization in the United States. Milbank Quarterly, New York, v. 83, n. 4.p. 1-28, 2005.referem-se a esses componentes como determinantes individuais da utilização dos serviços de saúde. Dois desses determinantes vão ao encontro das definições apresentadas por Hulka e Wheat (1985)HULKA, B. S.; WHEAT, J. R. Patterns of utilization: the patient perspective. Medical care, Philadelphia, v.3, n. 5, p. 438-460, 1985., ou seja, (i) a utilização dos serviços de saúde, que está relacionada à percepção dos indivíduos sobre sua condição, sintomas e incapacidades; e (ii) os componentes ou fatores capacitantes, que envolvem a disponibilidade de recursos nos serviços de saúde e a capacidade por parte dos indivíduos de acessá-los. São estes - utilização dos serviços e fatores capacitantes - os que se adequam ao trabalho aqui apresentado. Já os fatores predisponentes (ANDERSEN; NEWMAN, 2005ANDERSEN, R.; NEWMAN, J. F. Societal and individual determinants of medical care utilization in the United States. Milbank Quarterly, New York, v. 83, n. 4.p. 1-28, 2005.), incorporam características demográficas da população que antecedem o surgimento do problema de saúde e predispõem os indivíduos a utilizarem serviços de saúde como, por exemplo, idade, gênero, classe social e cor. Para esses autores (2005), o acesso se refere à entrada do usuário no serviço de saúde e à continuidade da atenção, envolvendo a disponibilidade dos serviços de saúde onde e quando o usuário necessitar, com clara definição da porta de entrada.

Outros autores (TRAVASSOS; MARTINS, 2004TRAVASSOS, C.; MARTINS, M. Uma revisão sobre os conceitos de acesso e utilização de serviços de saúde. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 20, n. 2, p. 190-198, 2004.; PAVÃO; COELI, 2008PAVÃO, A. L. B.; COELI, C. M. Modelos teóricos do uso de serviços de saúde: conceitos e revisão. Cad. Saude Coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 3, p. 471-482, 2008.) destacaram também a importância da utilização dos serviços de saúde, delimitando o acesso em dois tipos: acesso potencial e acesso realizado. O primeiro, objeto de estudo deste artigo, caracteriza-se pela presença de fatores capacitantes do uso de serviços, ou seja, os meios disponíveis para obtenção dos cuidados de saúde, enquanto o segundo representa a utilização de fato desses serviços.

Penchansky e Thomas (1981PENCHANSKY, R.; THOMAS, J. W. The concept of access: definition and relationship to consumer satisfaction. Medical care, Philadelphia, v. 19, n. 2, p. 127-140, 1981.) propuseram cinco dimensões para análise do acesso potencial aos serviços de saúde: disponibilidade, acessibilidade geográfica, acomodação, capacidade de pagamento pelos serviços e aceitabilidade. A primeira dimensão, disponibilidade de serviços de APS, expressa a relação entre volume, tipo de serviços e recursos existentes em APS e as necessidades dos usuários. A acessibilidade geográfica aos serviços relaciona a distância e a distribuição geográfica dos serviços à localização dos pacientes. A dimensão da acomodação/acolhimento expressa a relação entre a organização dos recursos e a adaptação/acomodação dos usuários: sistemas de agendamento de serviços, visitas domiciliares, etc. A capacidade de compra refere-se aos custos dos serviços e à possibilidade de copagamento por parte da clientela, que varia em função das modalidades de pagamento, existência de planos privados, dentre outros. A quinta dimensão representada pela aceitabilidade dos serviços caracteriza-se pela satisfação dos usuários com sua organização.

Posteriormente, Kringos (2010)KRINGOS, D. S. et al. The breadth of primary care: a systematic literature review of its core dimensions. BMC Health Services Research, Londres, v. 10, n. 1, p. 65-78, 2010. acrescentaram duas outras dimensões do acesso: a utilização dos serviços de APS, que indica o real consumo desses serviços, e a equidade no acesso, referente à adequação entre a provisão de serviços e as necessidades de saúde.

Neste artigo, 'acesso' é compreendido como "possibilidade de utilizar serviços de saúde quando necessário" (TRAVASSOS; OLIVEIRA; VIACAVA, 2006TRAVASSOS, C.; OLIVEIRA, E. X. G.; VIACAVA, F. Desigualdades geográficas e sociais no acesso aos serviços de saúde no Brasil: 1998 e 2003. Ciênc Saúde Coletiva, v. 11, n. 4. 2006, p. 975-986., P. 976). As dimensões selecionadas para abordar o tema foram 'disponibilidade' e 'acolhimento', correlacionando-as com os fatores condicionantes do acesso, com base no banco de dados e o que mais se aproximava do modelo de análise construído.

De acordo com Assis e Jesus (2012)ASSIS, M. M. A.; JESUS, W. L. A. Acesso aos serviços de saúde: abordagens, conceitos, políticas e modelo de análise. Ciênc Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 17, n. 11, p. 2865-2875, 2012., a disponibilidade corresponde ao alcance do usuário aos serviços de que necessita, incluindo-se a localização da unidade de saúde, a disponibilidade de horários e os dias em que a unidade atende, bem como a possibilidade de atendimento a consultas não agendadas, dentre outros. O acolhimento, segundo esses autores, compreende as ações comunicacionais, atos de receber e ouvir a população que procura os serviços de saúde, dando respostas adequadas a cada demanda em todo o percurso da busca: desde a recepção e o atendimento individual ou coletivo até o encaminhamento externo, o retorno, a remarcação e a alta. Como tecnologia leve (MERHY, 2002MERHY, E. E. Um ensaio sobre o médico e suas valises tecnológicas: contribuições para compreender as reestruturações produtivas do setor saúde. Interface(Botucatu), Botucatu, v. 4, n. 6, p. 109-116, 2000.), o acolhimento direciona estratégias de atendimento que resultem em ações de saúde mais ágeis e resolutivas, envolvendo trabalhadores, gestores e usuários (COELHO; JORGE; ARAÚJO, 2009COELHO, M. O. JORGE, M. S. B.; ARAÚJO, M. E. O acesso por meio do acolhimento na Atenção Básica à Saúde. Rev Baiana de Saúde Pública, Salvador, v.33, n.3, p. 440-452, 2009.). Propõe uma reorganização do processo de trabalho com garantia do direito de acesso aos serviços e humanização das relações estabelecidas.

Para o Ministério da Saúde, o

acolhimento é uma prática presente em todas as relações de cuidado, nos encontros reais entre trabalhadores de saúde e usuários, nos atos de receber e escutar as pessoas, podendo acontecer de formas variadas" (BRASIL, 2011C______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Acolhimento à demanda espontânea.Cadernos de Atenção Básica n. 28, Volume I. Brasília: Ministério da Saúde, 2011c. p. 19., P. 19) e, por isso, destaca que qualquer análise precisa considerar o que acontece em cada espaço. Identifica que a ampliação/facilitação do acesso; a postura, atitude e tecnologia de cuidado; e a (re)organização do processo de trabalho em equipe são dimensões constitutivas do acolhimento. (BRASIL, 2011C______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Acolhimento à demanda espontânea.Cadernos de Atenção Básica n. 28, Volume I. Brasília: Ministério da Saúde, 2011c. p. 19., P. 19).

Assim, o objetivo deste estudo foi o de analisar o acesso às equipes da Atenção Básica certificadas pelo Programa em todo o território brasileiro, tomando como base as dimensões 'Disponibilidade' e 'Acolhimento', na perspectiva estrutural e organizacional, a partir das variáveis existentes no instrumento de coleta de dados, identificando posteriormente os fatores condicionantes que interferem na qualidade do acesso.

Metodologia

Trata-se de estudo descritivo, de abordagem quantitativa, baseado nos dados secundários pertencentes ao componente da 'Avaliação Externa' disponíveis no banco do PMAQ-AB (FAUSTO; SOUZA JUNIOR, 2013FAUSTO, M. C. R.; SOUZA JUNIOR, P. R.B. Nota metodológica sobre a avaliação das equipes de Atenção Básica e censo das unidades básicas de saúde no âmbito do Programa Nacional para Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica. Mimeo. 2013.). Para este estudo, foram considerados os dados de questões dos 'Módulos I - Observação na Unidade de Saúde' e 'II - Entrevista com Profissional da Equipe de Atenção Básica e Verificação de Documentos na Unidade de Saúde'. O universo analisado é representativo apenas para as equipes que aderiram voluntariamente ao Programa e suas respectivas unidades de saúde. No total, foram entrevistadas 17.202 equipes (16.566 de Saúde da Família e 636 de Atenção Básica parametrizadas) em 3.944 municípios brasileiros, correspondentes a 51% das equipes implantadas no país no ano de 2012, atuando em 14.111 unidades básicas de saúde (UBS) (FAUSTO; SOUZA JUNIOR, 2013FAUSTO, M. C. R.; SOUZA JUNIOR, P. R.B. Nota metodológica sobre a avaliação das equipes de Atenção Básica e censo das unidades básicas de saúde no âmbito do Programa Nacional para Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica. Mimeo. 2013.).

Para a análise, identificaram-se, dentre as questões disponíveis nos instrumentos citados, aquelas consideradas pelos autores como coerentes com as dimensões de 'acesso' escolhidas - 'disponibilidade' e 'acolhimento'. Em seguida, definiram-se parâmetros com base nas atividades previstas para desenvolvimento no âmbito da Atenção Básica, afim de pontuar cada questão.

Cada pergunta (aqui denominada 'item') originou uma variável dicotômica (sim/não) com base nas suas opções de resposta e nos critérios estabelecidos como 'ótimos' no tocante ao desempenho. A cada item atendido, segundo os critérios, foi atribuído 1 (um) ponto. O escore total de cada dimensão correspondeu à soma dos valores atribuídos às questões. Assim, a dimensão 'acolhimento' com 15 questões variou entre 0 a 15 pontos; a dimensão 'disponibilidade'com 39 questões variou de 0 a 39 pontos e o escore de 'acesso', construído a partir da soma destas duas dimensões, com 54 questões no total, variou de 0 a 54 pontos.

A classificação do acesso em 'baixo', 'médio' e 'alto', foi definida de acordo com os tercis de distribuição dos pontos das questões somadas. Os pontos de corte para a dimensão 'acolhimento' foram 0 a 8 (baixo), 9 a 11 (médio) e 12 a 15 (alto) e para a dimensão 'disponibilidade' foram 0 a 24 (baixo), 25 a 29 (alto) e 30 a 39 (alto). Já para 'acesso', os valores limites foram 0 a 33 (baixo), 34 a 39 (médio) e 40 a 54 (alto). Na figura 1, resume-se o modelo de construção das dimensões e de análise.

Figura 1
Modelo de construção das dimensões e das categorias de análise

Fonte: Elaboração própria

Para análise da distribuição das equipes, segundo os estratos de acesso gerados, foram selecionados os fatores listados abaixo e construídas tabelas de contingências:

  1. Regiões do Brasil: Norte (categoria de referência), Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste;

  2. Ser capital ou não (categoria de referência);

  3. Porte populacional: até 20 mil habitantes (categoria de referência); de 20.001 até 200.000 habitantes e acima de 200.000 habitantes;

  4. Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M 2010): muito baixo e baixo = 0 a 0,599 (categoria de referência); médio = 0,600 a 0,699; alto = 0,700 a 0,799; muito alto = igual ou maior que 0,800 (PNUD, 2013);

  5. Estratos para certificação do PMAQ-AB: adotada a classificação proposta pelo Departamento de Atenção Básica (DAB). A definição dos seis estratos foi feita com base em índice que varia de zero a dez e porte populacional. O índice é composto por cinco indicadores: 1. Produto Interno Bruto (PIB) per Capita; 2. Percentual da população com plano de saúde; 3. Percentual da população com Bolsa Família; 4. Percentual da população em extrema pobreza; e 5. Densidade demográfica. Os indicadores são ponderados com peso 2 (Produto Interno Bruto per Capita) ou 1 (todos os demais).

  6. Os estratos são: 1 = pontuação menor que 4,82 e população de até 10 mil habitantes; 2 = pontuação menor que 4,82 e população de até 20 mil habitantes; 3 = pontuação menor que 4,82 e população de até 50 mil habitantes; 4 = pontuação entre 4,82 e 5,4 e população de até 100 mil habitantes; e pontuação menor que 4,82 e população entre 50 e 100 mil habitantes; 5 = pontuação entre 5,4 e 5,85 e população de até 500 mil habitantes; e pontuação menor que 5,4 e população entre 100 e 500 mil habitantes; 6 = população acima de 500 mil habitantes ou com pontuação igual ou superior a 5,85 (BRASIL, 2014ABRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.654, de 19 de Julho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde, o Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) e o Incentivo Financeiro do PMAQ-AB, denominado Componente de Qualidade do Piso de Atenção Básica Variável - PAB Variável. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 20 jul.2011a. Seção I, p. 79.). A categoria de referência foi o estrato 1;

  7. Número de equipes por unidade: 1 equipe (categoria de referência); 2 a 3 equipes; 4 ou mais equipes;

  8. Tempo de trabalho na equipe do profissional respondente: menos de 1 ano (categoria de referência), 1 ano, 2 anos, 3 a 5 anos, 6 ou mais anos.

Um modelo de regressão logística multinomial foi usado para avaliar a associação multivariada dos fatores condicionantes em relação aos estratos de acesso. A regressão logística multinomial é um método de classificação que generaliza uma regressão logística para problemas multiclasse, ou seja, com mais de dois possíveis resultados discretos. Esse modelo é usado para prever as probabilidades dos diferentes resultados possíveis de uma variável dependente categórica distribuída (no nosso caso, 'acesso', 'disponibilidade' e 'acolhimento') a partir de um conjunto de variáveis independentes, por meio da razão de chances (GREENE, 1993GREENE, W. H. Econometric analysis. 5. ed. New Jersey: Prentice Hall, 1993.). A razão de chances avalia quão fortemente a presença ou ausência de uma dada propriedade de uma variável está associada com a presença ou ausência de outra propriedade da mesma variável, numa dada população (GREENE, 1993GREENE, W. H. Econometric analysis. 5. ed. New Jersey: Prentice Hall, 1993.). A categoria 'baixo acesso' foi considerada como referência para a variável dependente. O programa utilizado para todas as análises foi o SPSS® 20.0 e Excel® 2010.

Resultados e Discussão

No quadro 1, é possível observar que, no tocante à dimensão 'acolhimento', tem sido mais frequente a realização de visitas domiciliares (99,6%), de escuta e avaliação dos usuários que chegam à unidade de saúde espontaneamente (97,2%), e a reserva de vagas para atendimento no mesmo dia para usuário com necessidade (92,2%).

Quadro 1
Percentual de equipes da Saúde da Família (n = 17.202) que atenderam aos critérios propostos para as variáveis que compõem a dimensão 'acolhimento' - Brasil, 2012

Entretanto, ainda que seja esperado o estabelecimento de mecanismos que assegurem a acessibilidade e o acolhimento nas unidades de saúde (BRASIL, 2012______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. Brasília: Ministério da Saúde, 2012.), menos da metade das equipes entrevistadas referem ter condições consideradas adequadas para realizar tal 'acolhimento', tais como: disponibilidade de sala específica (36,6%); existência de protocolos para acolhimento (38%), capacitação dos profissionais para essa atividade (46,3%). Também chama a atenção que apenas 21,1% das equipes informaram desencadear ações a partir do acolhimento. Dessas ações, a menos frequente foi a marcação na agenda do enfermeiro (0,5%), menor inclusive do que a opção relacionada com a marcação na agenda de outros profissionais (0,9%), contrariando a atribuição prevista, de realização de consulta de enfermagem, na Política Nacional de Atenção Básica (BRASIL, 2012______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. Brasília: Ministério da Saúde, 2012.). Observa-se, por fim, que apenas 30,2% das equipes garantem acesso a pessoas portadoras de deficiência e 42,9% aos residentes fora da área de abrangência de sua equipe.

Quanto à dimensão 'disponibilidade', conforme se observa no quadro 2, a maior parte das equipes informou que suas unidades funcionam na hora do almoço (99,5%) e oferecem pelo menos dois turnos de atendimento (94,9%), predominantemente pela manhã e à tarde (94,8%). Outra ação frequentemente relatada pelas equipes foi o exame citopatológico realizado por 97,2% das equipes.

Quadro 2
Percentual de equipes da Saúde da Família (n = 17.202) que atenderam aos critérios propostos para as variáveis que compõem a dimensão 'disponibilidade' - Brasil, 2012

Dentre as ações menos disponíveis está a realização de testes diagnósticos de gravidez, HIV e sífilis na unidade (1,6%). Ao analisar a opção 'sempre disponíveis', para o conjunto das equipes, observa-se que a disponibilidade dos testes foi de 14,7% para detecção do HIV, 5,3% para gravidez e 2,8% para sífilis.

Em seguida, a segunda menor proporção (6,1%) está relacionada com a abordagem de diferentes temas nas ações educativas e de promoção da saúde. As três temáticas mais ofertadas pelas equipes foram: prevenção e tratamento de diabetes (89,5%); de hipertensão arterial sistêmica (HAS) (89,4%) e gestação/puerpério (87,4%). O desenvolvimento dos temas tuberculose e hanseníase foi relatado por 54,2% e 51,1% das equipes, respectivamente. Poucas equipes relataram abordar a prevenção e tratamento ao uso, abuso e dependência decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas (24,5%), bem como de ansiolíticos e benzodiazepínicos (16,1%).

Outro item com reduzida pontuação pelas equipes refere-se a ter 'sempre disponível' o conjunto de imunobiológicos listados no PMAQ-AB (7,9%). Na análise isolada por imunobiológico, verifica-se que a maioria está 'sempre disponível' para sete de cada dez equipes entrevistadas, com exceção da BCG-ID (57,8%), Febre amarela (50%), esta, recomendada na região Norte, endêmica da doença, e, por fim, a pneumocócica 23 valente (22,9%). A justificativa para a oferta restrita a algumas unidades básicas e de referência, no caso da BCG-ID, pode ser a exigência de treinamento profissional específico e a ideia de minimização da perda de doses seguindo a recomendação de não estar disponível em todas as unidades do território nacional. No caso da Pneumocócica 23, sua menor frequência deve-se ao fato de não estar recomendada pelo calendário de vacinação do Programa Nacional de Imunização, como é o caso da Pneumocócica 10 valente.

No tocante à realização de procedimentos/pequenas cirurgias na unidade, com vistas a medir a resolutividade da Atenção Básica, observa-se que, proporcionalmente, o procedimento mais executado e comprovado pelas equipes é a aplicação das vacinas do calendário de imunização (79,1%). Os procedimentos menos realizados são a lavagem de ouvido, drenagem de abcesso, sutura de ferimentos e extração de unha (55,5%, 53,5%, 48,8%, 39,5%, respectivamente).

Distribuição dos grupos de fatores condicionantes em cada estrato, por dimensões e categoria

Entretanto, nossa principal questão foi saber como se deu o desempenho, quanto ao acesso e suas dimensões 'acolhimento' e 'disponibilidade', das equipes de saúde de família que aderiram ao programa. Optamos, então, por estratificá-las, com base nos tercis de distribuição, em 'baixo', 'médio' e 'alto', para a categoria 'acesso' e suas dimensões, 'acolhimento' e 'disponibilidade'.

Podemos observar na tabela 1que a distribuição das equipes não ocorre de forma homogênea entre os estratos, especialmente nas dimensões 'acolhimento' e 'disponibilidade'. Para entender que fatores poderiam ter influenciado o 'acolhimento', a 'disponibilidade' e o 'acesso' às equipes, elegemos como prováveis variáveis explicativas: (i) 'características espaciais' - a distribuição por macroregiões; o fato de ser capital do estado ou não; (ii) uma 'característica demográfica' - o tamanho da população, segundo a classificação utilizada pelo DAB; (iii) 'aspectos socioeconômicos' - IDH-M e estratos propostos pelo PMAQ-AB; e, por fim, (iv) 'características da própria equipe' - número de equipes por unidade de saúde e tempo de serviço do profissional respondente.

Tabela 1
Equipes de Saúde da Família por estratos de acolhimento, disponibilidade e acesso, segundo fatores condicionantes - Brasil, 2012

Em relação à dimensão 'acolhimento', as equipes concentram-se no estrato médio (41,1%) e na dimensão 'disponibilidade', no estrato mais baixo. Nesta última, ressalta-se a discrepância entre as distribuições do estrato mais alto (16,7%) e do mais baixo (44,1%).

A maior possibilidade de acesso concentra-se na região Sudeste (46,4%), influenciada pelo 'acolhimento' (42,5%) e 'disponibilidade' (34%), maiores nesta região em relação às demais. Do ponto de vista geográfico, outro fator que influenciou positivamente o acesso às equipes é estar na capital: 61,0% das equipes foram alocadas no estrato de maior acesso, sendo 52% em relação ao 'acolhimento' e 49,2% em relação à 'disponibilidade'. Por outro lado, estar na região Norte (50%) e não estar em uma capital (37,1%) teve influência negativa no acesso.

Em relação ao tamanho da população, observou-se uma relação direta com o desempenho das equipes: as maiores proporções de equipes no mais alto estrato de 'acolhimento' (46,7%), 'disponibilidade' (43%) e 'acesso' (54,5%) estavam em locais com maior população; inversamente, as maiores proporções de equipes no menor estrato do acesso (44,9%) e suas dimensões, localizaram-se nas cidades com menos de 20 mil habitantes.

Em relação aos aspectos sócioeconômicos, os municípios que apresentavam IDH-M muito baixo e baixo apresentavam maiores proporções de menor acesso (52,1%), 'disponibilidade' (46,7%) e 'acolhimento' (52,4%). Os municípios com IDH-M muito altos apresentavam maior proporção de 'acesso' (70,7%) e 'acolhimento' (64,1%), com menor 'disponibilidade'. Apresentaram mais alta 'disponibilidade', os municípios com IDH-M alto (25,9%).

Em relação aos estratos propostos pelo Programa que relaciona os cinco indicadores ponderados - Produto Interno Bruto (PIB) - per capita; percentual da população com plano de saúde; percentual da população com Bolsa Família; percentual da população em extrema pobreza e densidade demográfica) e a população, observa-se que os mais altos escores de 'acesso' são encontrados nos municípios que estão no maior estrato (maior índice e maior população) (59,8%). Nesse estrato também se encontra maior 'acolhimento' (51,9%), mas com disponibilidade 'média' (45,5%). Os municípios no estrato 1, de piores condições, encontram-se no estrato de menor 'acesso' (52,1%), 'acolhimento' (52,4%) e 'disponibilidade' (46,7%).

Em relação às características da equipe, as unidades básicas de saúde que abrigam quatro equipes ou mais de Saúde da Família têm melhor desempenho na categoria acesso (71,8%) e na dimensão 'acolhimento'(60,3%), refletido pelo maior percentual de equipes classificadas no estrato 'alto', mas com desempenho médio no tocante à 'disponibilidade'(44%). O tempo de permanência dos profissionais nas equipes não influenciou seu desempenho quanto ao acesso, com pouca diferença entre os estratos de análise.

Relação entre fatores condicionantes e estratos

Para analisar os fatores condicionantes da distribuição dos escores nos estratos elaborados, tomaram-se como referências as situações mais desfavoráveis, conforme se observa na tabela 2.

Tabela 2
Modelo de regressão multinomial para o escore de acesso potencial da população às equipes de Saúde da Família - BRASIL, 2012 *

Comparado ao grupo com menor acesso (região Norte), a chance de estar no estrato 'médio' foi 2,3 vezes maior (1,91 - 2,73) na região Sudeste, 78% maior (1,46 -2,16) no Sul e 39% maior (1,18 -1,63) na região Nordeste. No tocante aos demais fatores, essa chance foi 34% maior (1,12-1,60) nos municípios com porte entre 20.001 e 200.000 habitantes e 29% maior nos municípios com mais de 200.000 habitantes. Em relação ao desenvolvimento humano do município, a chance aumentou diretamente com os estratos considerados, sendo quase três vezes maior (2,13 - 4,06) nos municípios com IDH-M muito alto. Apenas os municípios classificados no estrato máximo do PMAQ-AB tiveram chance 77% maior (1,31 - 2,38) de estar no estrato médio de acesso. Não foi encontrada associação entre estar no estrato médio de acesso e os demais estratos do PMAQ-AB, com o número de equipes ou com o tempo de serviço do profissional respondente na equipe.

Ainda comparada ao grupo de menor 'acesso', a chance de estar no estrato 'mais alto' de 'acesso' foi 2,8 vezes maior (2,30 - 3,43) para os municípios da região Sudeste e 1,77 vezes maior (1,42 - 2,20) para os da região Sul. No tocante ao outro aspecto geográfico analisado, a chance de estar no estrato de maior acesso foi 1,35 vezes maior (1,06 - 1,69) nas capitais. Em relação aos aspectos socioeconômicos, essa chance estava diretamente relacionada ao grau de desenvolvimento humano, sendo de quase sete vezes (4,89 - 9,43) a chance de estar nos municípios com IDH-M muito alto em relação aos de menor IDH-M. Apenas os municípios classificados no estrato 6 do PMAQ-AB tiveram chance 2,3 vezes maior (1,68 - 3,21) de estar classificado no estrato de maior acesso. Por outro lado, essa chance foi só de 0,77 (0,65 - 0,91) nos municípios do estrato 2, quando comparados com aqueles do estrato 1. Quanto maior o número de equipes, maior a chance de estar situado no estrato de maior acesso: municípios com 4 ou mais equipes tiveram chance 2,9 vezes maior (2,29 - 3,69) de estar neste estrato, quando comparados a municípios com apenas uma equipe. Não foi encontrada diferença em relação às diferentes categorias de tempo de serviço do profissional respondente na equipe. Entretanto, as equipes com 2 anos ou 6 anos ou mais de trabalho tiveram chance 1,3 vezes maior de estarem no estrato de maior acesso, em relação àquelas com menos de 1 ano de trabalho. Quando se comparam os grupos de menor e de maior acesso, não se encontra associação em relação ao porte populacional, demais estratos do PMAQ-AB e estar há um ano na equipe.

Conclusões

A implantação da Estratégia Saúde da Família no país experimentou expansão de cobertura bastante expressiva a partir dos anos 2000, com ritmos diferentes entre as regiões e porte populacional dos municípios, sendo a cobertura atual estimada em 57% da população brasileira pelo Departamento de Atenção Básica do Ministério da Saúde em junho de 2014 (BRASIL, 2014B). Esse diagnóstico desencadeou um conjunto de ações, sobretudo por parte do gestor federal, reconhecendo que municípios de maior porte exigem maior disponibilidade de recursos de ordem organizacional, político-institucional e financeiro.

Em anos mais recentes, tem-se observado a preocupação com aumento de cobertura aliada a estratégias para garantia de qualidade e fortalecimento das equipes de Atenção Básica em seus atributos essenciais, dentre os quais se destaca a dimensão do acesso. Nessa perspectiva, se inseriu o Programa Nacional de Melhoria de Acesso e da Qualidade da Atenção Básica.

Ao se concentrar no 'acesso' potencial, objeto desta análise, pode-se concluir que o desempenho de equipes localizadas na região Sudeste, em capitais, municípios de maior porte e com maior número de equipes por UBS apresentaram desempenho mais favorável para a obtenção dos cuidados. A afirmativa refere-se tanto à 'disponibilidade' ou abrangência, atributos fundamentais para a qualificação de uma atenção primária integral em saúde, como para o acolhimento, dimensão reconhecidamente importante para a conformação dos serviços de Atenção Básica como fonte regular de cuidados e criação de vínculo. Os resultados convergem para a necessidade de políticas e ações voltadas à qualificação da atenção prestada nos municípios de pequeno porte. Em síntese, condições favoráveis implicam melhor possibilidade de utilização dos serviços, contribuindo para a consolidação de uma porta de entrada acolhedora e resolutiva pela Atenção Primária em Saúde. Esta é uma aposta a ser feita e que poderá ser monitorada com o segundo ciclo do PMAQ-AB.

  • ADAY, L. A.; ANDERSEN, R. A framework for the study of access to medical care. Health services research, New York, v. 9, n. 3, p. 208-220, 1974.
  • ANDERSEN, R. A behavioral model of families' use of health services Chicago: University of Chicago, 1968. (Research Series, 25).
  • ANDERSEN, R.; NEWMAN, J. F. Societal and individual determinants of medical care utilization in the United States. Milbank Quarterly, New York, v. 83, n. 4.p. 1-28, 2005.
  • ASSIS, M. M. A.; JESUS, W. L. A. Acesso aos serviços de saúde: abordagens, conceitos, políticas e modelo de análise. Ciênc Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 17, n. 11, p. 2865-2875, 2012.
  • BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.654, de 19 de Julho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde, o Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) e o Incentivo Financeiro do PMAQ-AB, denominado Componente de Qualidade do Piso de Atenção Básica Variável - PAB Variável. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 20 jul.2011a. Seção I, p. 79.
  • ______. Casa Civil. Decreto Federal nº 7.508 de 28 de junho de 2011. Regulamenta a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, para dispor sobre a organização do Sistema Único de Saúde - SUS, o planejamento da saúde, a assistência à saúde e a articulação interfederativa, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 29 jun. 2011b. Seção I, p.01.
  • ______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica Brasília: Ministério da Saúde, 2012.
  • ______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Acolhimento à demanda espontânea.Cadernos de Atenção Básica n. 28, Volume I. Brasília: Ministério da Saúde, 2011c. p. 19.
  • ______. Ministério da Saúde. Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) - Estratos para Certificação Disponível em: <http://dab.saude.gov.br/sistemas/pmaq/estratos_para_certificacao.php>. Acesso em: 31 mar 2014a.
    » http://dab.saude.gov.br/sistemas/pmaq/estratos_para_certificacao.php
  • CABRAL, A. L. L. V. et al. Itinerários terapêuticos: o estado da arte da produção científica no Brasil. Ciênc. Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 11. 2011, p. 4433-4442.
  • COELHO, M. O. JORGE, M. S. B.; ARAÚJO, M. E. O acesso por meio do acolhimento na Atenção Básica à Saúde. Rev Baiana de Saúde Pública, Salvador, v.33, n.3, p. 440-452, 2009.
  • DONABEDIAN, A. Aspects of medical care administration Cambridge: Harvard University Press, 1973.
  • FAUSTO, M. C. R.; SOUZA JUNIOR, P. R.B. Nota metodológica sobre a avaliação das equipes de Atenção Básica e censo das unidades básicas de saúde no âmbito do Programa Nacional para Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica. Mimeo. 2013.
  • GREENE, W. H. Econometric analysis 5. ed. New Jersey: Prentice Hall, 1993.
  • HULKA, B. S.; WHEAT, J. R. Patterns of utilization: the patient perspective. Medical care, Philadelphia, v.3, n. 5, p. 438-460, 1985.
  • KRINGOS, D. S. et al. The breadth of primary care: a systematic literature review of its core dimensions. BMC Health Services Research, Londres, v. 10, n. 1, p. 65-78, 2010.
  • MASCARENHAS, M. T. M. Avaliando a implementação da Atenção Básica no município de Niterói, RJ: Estudos de caso em Unidade Básica de Saúde e Módulo do Programa Médico de Família. 2003. 176 p. Tese (Doutorado em Saúde Pública). - Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2003.
  • MERHY, E. E. Um ensaio sobre o médico e suas valises tecnológicas: contribuições para compreender as reestruturações produtivas do setor saúde. Interface(Botucatu), Botucatu, v. 4, n. 6, p. 109-116, 2000.
  • PAVÃO, A. L. B.; COELI, C. M. Modelos teóricos do uso de serviços de saúde: conceitos e revisão. Cad. Saude Coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 3, p. 471-482, 2008.
  • PENCHANSKY, R.; THOMAS, J. W. The concept of access: definition and relationship to consumer satisfaction. Medical care, Philadelphia, v. 19, n. 2, p. 127-140, 1981.
  • PINTO, H. A.; SOUSA, A.; FLORÊNCIO, A. R. O Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica: reflexões sobre o seu desenho e processo de implantação. RECIIS - R. Eletr. de Com. Inf. Inov. Saúde, Rio de Janeiro, v. 6, n. 2, Sup. 2012. Disponível em: <http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/viewArticle/624/1083>. Acesso em: 28 mar. 2014.
    » http://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/viewArticle/624/1083
  • PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD). Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil 2013 Disponível em:<http://www.pnud.org.br/IDH/Atlas2013.aspx?indiceAccordion=1&li=li_Atlas2013>. Acesso em 28 mar. 2014.
    » http://www.pnud.org.br/IDH/Atlas2013.aspx?indiceAccordion=1&li=li_Atlas2013
  • STARFIELD, B. Atenção primária: equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília, DF: Unesco: Ministério da Saúde, 2002.
  • TRAVASSOS, C.; OLIVEIRA, E. X. G.; VIACAVA, F. Desigualdades geográficas e sociais no acesso aos serviços de saúde no Brasil: 1998 e 2003. Ciênc Saúde Coletiva, v. 11, n. 4. 2006, p. 975-986.
  • TRAVASSOS, C.; MARTINS, M. Uma revisão sobre os conceitos de acesso e utilização de serviços de saúde. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 20, n. 2, p. 190-198, 2004.

  • Suporte financeiro: não houve

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Out 2014

Histórico

  • Recebido
    Abr 2014
  • Aceito
    Jul 2014
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde RJ - Brazil
E-mail: revista@saudeemdebate.org.br