Planos de carreira, cargos e salários no âmbito do Sistema Único de Saúde: além dos limites e testando possibilidades

Swheelen de Paula Vieira Celia Regina Pierantoni Carinne Magnago Tania França Rômulo Gonçalves de Miranda Sobre os autores

RESUMO

Este estudo objetivou analisar experiências de planos de carreira, cargos e salários premiadas pelo Ministério da Saúde. Para tanto, foi realizada pesquisa descritiva e qualitativa, em 2013, mediante análise documental e entrevistas com gestores de secretarias de saúde com planos implantados. Dados foram analisados à luz das diretrizes nacionais para a instituição de planos no Sistema Único de Saúde. Os planos estudados, negociados com os trabalhadores e baseados nas diretrizes, consideram a avaliação de desempenho e a qualificação profissional para a progressão na carreira. Conclui-se que os planos necessitam incluir os diversos tipos de vínculos empregatícios e formas de remuneração compatíveis com as carreiras da saúde.

PALAVRAS-CHAVE
Recursos humanos em saúde; Administração de recursos humanos; Salários e benefícios; Avaliação de desempenho profissional

Introdução

O cenário nacional do sistema de saúde brasileiro aponta para uma série de desafios, no que se refere à gestão do trabalho em saúde. Alguns nós críticos já vêm sendo debatidos há anos, como a baixa remuneração, falta de motivação dos profissionais, precariedade/flexibilidade dos vínculos empregatícios e as dificuldades na implementação de estratégias para a redução da rotatividade dos trabalhadores.

Nesse contexto, segundo as diretrizes fixadas para a área de recursos humanos (RH) na Norma Operacional Básica (NOB/RH-SUS), o Plano de Carreira, Cargos e Salários (PCCS) é considerado um instrumento de ordenação do trabalho, devendo ser incorporado em cada nível de gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) (BRASIL, 2005______. Ministério da Saúde. Princípios e diretrizes para a gestão do trabalho no SUS (NOB/RH-SUS). 3. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2005. (Série J. cadernos - MS). Disponível em: <http://conselho.saude.gov.br/biblioteca/livros/nob_rh_2005.pdf>. Acesso em: 3 mar. 2017.
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).

O PCCS pode ser definido como um instrumento de gestão do trabalho, que tem como finalidade valorizar o trabalhador e instaurar o processo de carreira nas instituições. Além disso, é um conjunto de normas que orienta e disciplina a trajetória do trabalhador em sua carreira, bem como a respectiva remuneração, promovendo oportunidades de qualificação profissional (CASTRO, 2012CASTRO, J. L. Saúde e trabalho: direitos do trabalhador da saúde. Revista de Direito Sanitário, São Paulo, v. 12, n. 3, p. 86-101, mar./jun. 2012.; BRASIL, 2006______. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Protocolo nº 006/2006. Aprova as Diretrizes Nacionais para a instituição de Planos de Carreira, Cargos e Salários no âmbito do Sistema Único de Saúde - PCCS - SUS. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2006.).

Nesse sentido, para além da perspectiva de direitos, entende-se que o plano de carreiras é uma potente ferramenta de gestão, principalmente quando agregado a outros subsídios, como a gratificação, a avaliação de desempenho e a progressão por qualificação (SEIDL , 2014SEIDL, H. et al. Gestão do trabalho na Atenção Básica em Saúde: uma análise a partir da perspectiva das equipes participantes do PMAQ-AB. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 38, n. esp. p. 94-108, out. 2014.).

Apesar de pautados desde 1986 pela Comissão da Reforma Sanitária, e, em seguida, pela Lei Federal nº 8.080/90, os planos de carreira no SUS só começaram a ser efetivamente impulsionados após a criação da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES) e reinstalação da Mesa Nacional de Negociação Permanente do SUS (MNNP-SUS), em 2003 (BRASIL, 1986______. Ministério da Saúde. Comissão Nacional da Reforma Sanitária. Bases para o aperfeiçoamento das ações integradas de saúde como estratégia para a reforma sanitária brasileira.Brasília, DF: Ministério da Saúde, 1986., 1990______. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial [da] União, Brasília, DF, 20 set. 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm>. Acesso em: 3 mar. 2017.
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, 2003______. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Mesa Nacional de Negociação Permanente do SUS: democratização nas relações de trabalho no Sistema Único de Saúde SUS. Brasília, DF: Ministério da Saúde , 2003. (Série D. Reuniões e Conferências). Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/livreto_mesa.pdf>. Acesso em: 3 mar. 2017.
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).

Dessa feita, em 2006, foram aprovadas as Diretrizes do Plano de Carreira, Cargos e Salários no âmbito do SUS, para apoiar a construção de planos nos âmbitos regionais, estaduais e municipais, considerando as particularidades dos sistemas locais (BRASIL, 2006______. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Protocolo nº 006/2006. Aprova as Diretrizes Nacionais para a instituição de Planos de Carreira, Cargos e Salários no âmbito do Sistema Único de Saúde - PCCS - SUS. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2006.).

Em 2012, no sentido de valorizar as propostas de planos estabelecidas pelos sistemas locais, mas também impulsionar novas proposituras, o Ministério da Saúde lançou edital para o projeto InovaSUS, com o tema Carreira: Planos de Cargos, Carreiras e Salários (InovaSUS-Carreira), premiando 12 projetos (BRASIL, 2015). Criado em 2011, o InovaSUS foi o primeiro prêmio de inovação relacionada à gestão do trabalho em saúde. A iniciativa tem como objetivo a valorização de experiências na área, com a premiação de projetos que almejem a excelência, aprimorem a qualidade dos serviços, das condições de trabalho e do atendimento aos usuários do SUS, e demonstrem possibilidades de reprodução (BRASIL, 2015______. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Prêmio InovaSUS 2012/2013: valorização de boas práticas e inovação na gestão do trabalho na saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2015. Disponível em: <http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2015/maio/21/livro-inovasus-2012-2013-21052015.pdf>. Acesso em: 3 mar. 2017.
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).

Ante ao exposto, e no sentido de produzir evidências que possam subsidiar a estruturação e/ou atualização de planos de carreira, este estudo objetivou analisar experiências de implantação de PCCS premiadas pelo InovaSUS-Carreira, tendo como referencial as diretrizes nacionais elaboradas e aprovadas pela MNNP-SUS.

Material e métodos

Este estudo é um desdobramento da pesquisa 'Avaliação de políticas e programas nacionais da gestão do trabalho e da educação em saúde no SUS', finalizada em 2014, na qual foram entrevistados 519 gestores de secretarias estaduais e municipais de saúde (aqui denominadas SES e SMS, respectivamente), com o objetivo de identificar o estágio e a capilaridade das políticas de gestão do trabalho (OBSERVARH-IMS/UERJ, 2014OBSERVATÓRIO DE RECURSOS HUMANOS EM SAÚDE (OBSERVARH-IMS/UERJ). Estação de Trabalho Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Avaliação de Políticas e Programas Nacionais da Gestão do Trabalho e da Educação em Saúde no SUS. Rio de Janeiro: ObservaRH-IMS; UERJ, 2014. Disponível em: <http://www.obsnetims.org.br/uploaded/11_5_2015__0_Sumario_Executivo_Avaliacao_de_Politicas_e_Programas_Nacionais.pdf>. Acesso em: 3 mar. 2017.
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).

De posse dos resultados da pesquisa, que indicaram deficiência na política de valorização do trabalhador, com poucos planos de carreira instituídos no âmbito do SUS, optou-se por identificar e analisar experiências exitosas de implantação de PCCS.

Trata-se de estudo descritivo e analítico, de abordagem qualitativa, cujo objeto de análise foram algumas experiências de implantação de PCCS.

Para a determinação das experiências a serem investigadas em profundidade, consideraram-se os resultados da 2ª edição do Prêmio InovaSUS-Carreira, que premiou 12 iniciativas, implantadas ou não, consideradas de excelência. A coleta de dados se deu em duas etapas. Primeiro, foram coletados documentos referentes aos planos das estruturas premiadas (legislação, instrumentos e projetos apresentados no ato da inscrição para o InovaSUS-Carreira) e dados secundários para a caracterização dos cenários. Na segunda etapa, foram selecionadas oito secretarias de saúde, por constituírem-se enquanto estruturas estaduais ou municipais de grande porte (acima de 500 mil habitantes), e por terem implantado o PCCS premiado, a saber: secretarias estaduais de Mato Grosso, da Bahia, do Tocantins e das Alagoas; a Fundação Estatal Saúde da Família (Fesf) da Bahia (Fesf-BA); e as secretarias municipais de Goiânia, Recife e Guarulhos.

Uma vez selecionadas as estruturas, procedeu-se ao contato telefônico com os gestores locais, responsáveis ou participantes do processo de implantação dos PCCS, para agendamento de entrevista in loco. Participaram do estudo 13 gestores.

Para essa fase, foi confeccionado um instrumento de coleta de dados semiestruturado, com base nas diretrizes nacionais para a instituição de PCCS no âmbito do SUS, elaboradas e aprovadas pela MNNP-SUS. O instrumento contemplou 58 questões estruturadas em 6 blocos: identificação do respondente; identificação da estrutura pesquisada; processo e implementação do PCCS; caracterização/estruturação do PCCS; avaliação de desempenho; e questões abertas (opinativas).

As entrevistas, realizadas nos meses de agosto e setembro de 2013, foram gravadas em equipamento de áudio digital e gravador portátil, com posterior transcrição integral do conteúdo.

Os dados provenientes dos documentos foram submetidos a uma análise documental e estatística descritiva, a partir de processamento em banco de dados estruturado no software Excel. As informações provenientes das entrevistas foram tratadas por análise descritiva, confrontadas com as diretrizes nacionais para a instituição de PCCS no âmbito do SUS, documentos selecionados e literatura pertinente ao tema. Posteriormente, os resultados da pesquisa foram apresentados para discussão e validação junto aos atores envolvidos, membros da MNNP-SUS e representantes da SGTES.

De acordo com as normas éticas destinadas a pesquisas envolvendo seres humanos, o estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e aprovado sob o Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) nº 0038.0.259.000-11.

Resultados

Perfil dos entrevistados e caracterização das estruturas

Do total de 8 estruturas pesquisadas, participaram como respondentes 13 gestores, entre os quais 8 mulheres, correspondentes a 61,5% da amostra. Quanto à formação, 12 possuem graduação nas mais diversas áreas: serviço social (n=3), direito (n=2), administração (n=2), medicina, ciências contábeis, enfermagem, tecnologia da informação e psicologia.

A maior parte dos gestores (n=7) possui, como maior titulação, a Especialização em Gestão do Trabalho e Educação na Saúde, desenvolvida em decorrência da capacitação promovida pela adesão ao Programa de Qualificação e Estruturação da Gestão do Trabalho e da Educação no SUS (ProgeSUS); cinco possuem mestrado; e um possui formação de nível técnico. No que compete ao tempo dos gestores nos cargos, observou-se uma média de 3,2 anos.

Todas as estruturas pesquisadas possuem órgãos específicos de recursos humanos, criados há pelo menos cinco anos, e encontram-se no primeiro ou no segundo escalão da secretaria de saúde.

Implantação dos Planos de Carreira, Cargos e Salários

Para a propositura dos PCCS premiados, todas as estruturas estudadas partiram de algum plano já implantado, configurando-o conforme as diretrizes nacionais, resguardadas as adaptações necessárias para cada local. A exceção foi a SMS de Guarulhos, que não apresentava nem mesmo um plano geral para os servidores municipais. Criaram-se comissões específicas com a participação dos trabalhadores, mas a maior parte das estruturas não fez a discussão em mesas de negociação, por não tê-las implantadas.

O tempo entre a apresentação de uma proposta de carreira e a sua implantação foi de, no mínimo, um ano, e de, no máximo, seis anos. Para tanto, estudos de impacto financeiro foram demandados, em alguns casos, mais de uma vez, com fins de adequação e viabilização do plano.

Características estruturais dos PCCS específicos para o setor saúde

Em termos de abrangência, as maiores dificuldades de inclusão se dão para os profissionais administrativos, pois há o entendimento, por parte da gestão superior da secretaria de administração, que esses profissionais são 'sistêmicos', ou seja, são contratados para atuarem em qualquer um dos setores existentes no âmbito do município/estado.

Apenas a SES do Tocantins tem todos os trabalhadores efetivos da saúde - cerca de 11 mil - incluídos no PCCS da saúde, com exceção de alguns servidores administrativos, que optaram por se manter no plano de carreira do quadro geral do estado. A Fesf inclui todos os profissionais contratados por ela, porém não há a inclusão dos agentes de saúde, que são contratados pelos municípios.

Os profissionais de saúde do estado das Alagoas estão distribuídos em nove planos distintos, sendo três deles específicos da saúde: PCCS dos médicos; PCCS dos profissionais de apoio à saúde, ganhador do Prêmio InovaSUS, que inclui todos os efetivos de planejamento, administração, transporte, e infraestrutura do setor; e PCCS dos técnicos, assistentes e auxiliares de saúde, que inclui todos os trabalhadores da saúde de nível superior, médio e elementar, exceto aqueles que estão enquadrados em planos específicos.

As SMS de Recife e de Guarulhos, e a SES da Bahia possuem um plano geral para os efetivos da saúde, que não inclui os administrativos. Esta última ainda possui um plano específico para os médicos. O plano da SES de Mato Grosso inclui apenas parte dos administrativos. A SMS de Goiânia possui dois planos para os trabalhadores da saúde, sendo que o plano premiado, implantado em 2012, inclui todos os efetivos, mas não os administrativos. O implantado em 2004 vigora apenas com os profissionais de saúde que não quiseram migrar para o novo plano, mas não inclui os administrativos e nem os agentes de saúde.

No que tange ao predomínio de profissionais de algum nível de atenção, não se percebem tantas incongruências, haja vista que os estados enquadram maior número de profissionais do nível terciário, enquanto os municípios enquadram predominantemente os da Atenção Primária à Saúde (APS). A surpresa é a Fesf, que emprega hoje um maior número de profissionais do âmbito hospitalar, quando era de se esperar que possuísse um maior percentual de profissionais da APS, já que a proposta inicial para a sua criação era a de viabilizar a expansão e consolidação da Estratégia Saúde da Família (ESF).

Esse cenário é devido, principalmente, à não contratualização entre a Fesf e os municípios que a criaram. Do total de 69 municípios que a implantaram, apenas 16 permanecem com contratos ativos. Assim, a Fesf tem ampliado os serviços para outros níveis de complexidade, que não a primária.

Tratando-se dos modos de progressão na carreira, em sua maioria, os planos consideram o processo de avaliação de desempenho e de qualificação. Segundo alguns respondentes, a não contabilização do tempo de serviço na ocasião da adesão ao plano, em certos casos, foi desfavorável a muitos profissionais, uma vez que muitos, ao serem alocados nas tabelas vencimentais, se encontraram no mesmo patamar que outros tantos profissionais recém-admitidos ou com menor tempo de serviço. A principal motivação para a não contabilização do tempo de serviço deveu-se, em grande medida, ao impacto financeiro que causaria.

Uma das maiores questões no processo de discussão e aprovação das propostas dos planos diz respeito às gratificações e aos adicionais, com destaque para a não incorporação do adicional de insalubridade à aposentadoria. Todas as estruturas pesquisadas oferecem algum adicional, com exceção das Alagoas, onde há, inclusive, um movimento de discussão sobre o direito real de recebimento do adicional de insalubridade. Neste estado, os profissionais recém-admitidos não fazem jus a tal benefício, diferentemente dos servidores já atuantes. Este fato tem gerado disputas judiciais e negociações entre as partes envolvidas.

Esse cenário identificado no estado das Alagoas já é percebido em outras instâncias, talvez porque a própria legislação que a prevê seja frágil em diversos aspectos, permitindo que as empregadoras resolvam os impasses em nível local.

Outros questionamentos acerca da insalubridade referem-se à sua contabilização para fins de cálculo de horas extras, férias e 13º salário. Isto porque o adicional integra a remuneração, mas não é incorporado à aposentadoria, sendo, portanto, cabível recurso do trabalhador, quanto à negação do empregador em considerá-lo para este fim.

Processos de avaliação de desempenho

Todos os planos preveem processo de avaliação de desempenho, contudo, na SES das Alagoas, na SMS de Recife e na Fesf-BA ainda não há legislação que o regulamente. Segundo os respondentes da pesquisa, os modelos de avaliação de desempenho previstos abrangem todos os servidores da estrutura, com a exceção do modelo das Alagoas (restrito aos trabalhadores de apoio à saúde), e foram negociados com os trabalhadores, excluindo-se o Tocantins e a Fesf.

A periodicidade, os requisitos e as formas de avaliação variam entre os locais, mas se destaca que a SES da Bahia, por ainda não ter regulamentado os parâmetros e indicadores, executa um modelo no qual a avaliação individual é baseada apenas na assiduidade do trabalhador.

Os dados da pesquisa apontam para a grande dificuldade de regulamentar e desenvolver um processo de avaliação de desempenho que não seja meramente ilustrativo e burocrático, e cujos resultados sejam analisados para subsidiar melhorias para o serviço e para o desenvolvimento de processos de educação permanente. Não obstante, em alguns locais, a avaliação de desempenho garante adicionais importantes à remuneração do trabalhador, caso da Fesf e da SMS de Recife.

Potencialidades e nós críticos dos PCCS da saúde

No que tange aos planos de carreira em vigência, o quadro 1 apresenta os principais pontos positivos e negativos dos PCCS da saúde, segundo a percepção dos gestores.

Quadro 1
Principais pontos positivos e negativos dos planos de carreiras, cargos e salários da saúde implantados, na opinião dos gestores das estruturas de saúde – Brasil, 2013.

É válido chamar a atenção para a implantação de uma política de saúde do trabalhador nos estados de Mato Grosso e da Bahia. Os gestores exaltaram tal iniciativa, fruto de negociação e luta dos trabalhadores, como um passo importante no combate às más condições de trabalho, às doenças e aos agravos do trabalhador, oriundos de um ambiente insalubre, alta carga de trabalho, escassez de insumos básicos etc.

Ainda como pontos de relevância, destacam-se: movimento de extinção das organizações sociais no estado de Mato Grosso; proposta de unificação dos inúmeros planos existentes no âmbito do estado das Alagoas; avaliação de desempenho informatizada, com instrumentos específicos em interface com a educação permanente, no Tocantins; e dificuldade para contratação de médicos e de auxiliares de enfermagem pela SMS de Guarulhos.

Comparativo entre os PCCS e as diretrizes nacionais da MNNP-SUS

As legislações que implantam e regem os planos estão de acordo com o que preveem as diretrizes, como já apontado pelos próprios gestores. Notam-se, contudo, particularidades, já que as próprias diretrizes propõem-se genéricas para que cada local as adeque à sua realidade.

Um aspecto a ser destacado é a abrangência do plano. As diretrizes indicam que todos os trabalhadores do SUS estejam enquadrados em PCCS. Apesar disso, há disparidades entre os locais, tendo em vista o entendimento, por parte de alguns gestores/governantes, de que alguns cargos são genéricos nos âmbitos da prefeitura e do estado, de modo que os profissionais que ocupam tais cargos podem atuar em qualquer setor, cabendo-lhes, portanto, enquadramento em um plano geral da instância.

Outro ponto a ser discutido é em relação à divisão das classes, a qual as diretrizes nacionais propõem que seja realizada de acordo com o grau de escolaridade, constituindo, por exemplo, uma classe/cargo genérica a todos os profissionais de nível superior. Embora os planos estudados tenham tentado se ater ao máximo ao que preconizam as diretrizes, esse aspecto foi considerado ponto nevrálgico, dada a dificuldade de negociação com a categoria médica, que cria impasses para isto, segundo os respondentes. Sendo assim, apenas o plano do estado de Mato Grosso agrega todos os profissionais de uma mesma escolaridade no mesmo cargo. Nos demais, os profissionais médicos se encontram separados em cargos ou planos de carreira específicos. Há, ainda, o caso das Alagoas, que gerenciam nove planos diferentes para profissionais com atuação no SUS.

A diretriz que pressupõe a avaliação de desempenho como um processo pedagógico e participativo, abrangendo, de forma integrada, todas as atividades dos trabalhadores, quer sejam individuais, coletivas ou institucionais, foi acolhida por todos os planos estudados, embora este processo ainda não esteja em prática em alguns locais. Igualmente, a premissa de ingresso na carreira por concurso público também está prevista nos planos das oito estruturas.

No que se refere à gestão partilhada entre os trabalhadores, prevista nas diretrizes nacionais, apenas a Fesf referiu não corresponder. Quanto à criação de comissões de carreiras paritárias de gestores e trabalhadores, com desdobramento para as mesas de negociação, apenas a SES das Alagoas e a SMS de Recife a atendem; a SES da Bahia inclui-se na mesa geral de negociação do estado.

O desenvolvimento na carreira, por promoção e progressão por mérito, determinado pelas diretrizes, ocorre nas SES de Mato Grosso, SMS de Guarulhos e de Recife, e na SES da Bahia. Nestas duas últimas, também se utiliza o tempo de serviço. Nas Alagoas, no Tocantins e na Fesf, se utilizam o tempo de serviço e a avaliação de desempenho.

Por fim, o programa institucional de qualificação com vistas à valorização e ao desenvolvimento profissional só não está previsto nos planos da SMS de Goiânia e da Fesf-BA.

Satisfação dos trabalhadores em relação ao PCCS

Durante as entrevistas, foi também medida a satisfação dos trabalhadores com o PCCS implantado, na percepção dos gestores, por meio de uma escala do tipo Likert, com quatro graus, como segue: grau 1 - insatisfeitos; grau 2 - pouco satisfeitos; grau 3 - satisfeitos; e grau 4 - muito satisfeitos.

As respostas obtidas apontam que, de modo geral, os profissionais estão satisfeitos (média=3) com os planos implantados. Os respondentes referiram que a maior insatisfação é percebida na categoria médica, sobretudo em razão de eles considerarem os salários baixos.

As principais reivindicações dos trabalhadores são: regulamentação de processos previstos no plano, como a avaliação de desempenho; extinção das organizações sociais; melhores condições de trabalho e infraestrutura; 30 horas para a categoria de enfermagem; e implementação de processos de educação permanente.

No que tange à escassez de profissionais de saúde, grande parte dos gestores afirmou que ela se dá basicamente com relação aos médicos, tanto para atuação na Atenção Básica (AB) quanto em outros níveis da atenção. Em se tratando de outros profissionais, os respondentes relataram a existência de oferta que excede a incorporação deles pelo mercado de trabalho.

No que compete à rotatividade profissional, os gestores não puderam afirmar que ela diminuiu após a implantação dos PCCS, que se constituem como eventos recentes, não havendo, ainda, dados suficientes que subsidiem a avaliação deste indicador.

Discussão

A carreira é um sistema organizativo e compreensivo da trajetória das atividades laborais das pessoas; tem função social e administrativa, que orienta a mobilidade no mercado de trabalho e a função psicossocial de dar sentido e motivação às atividades realizadas pelos trabalhadores. A carreira trabalhista surge, no mundo, no início do século XX, com o objetivo de organizar a trajetória da vida laboral dos funcionários, a ser percorrida por meio de cargos e funções a serem desempenhadas ao longo do tempo (ARONI, 2011ARONI, F. Carreira: visão acadêmica e práticas do mercado de trabalho relatadas pela publicação Guia Você S/A Exame 'As melhores empresas para você trabalhar'. 2011. 130 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011.).

No Brasil, a carreira tradicional ganha ênfase na década de 1970, em um contexto de repressão dos sindicatos pela ditadura militar. Ademais, os investimentos no setor industrial atraíram mão de obra de baixa qualidade, que era treinada apenas para o exercício da função, e a valorização do empregado se dava basicamente no que concernia ao seu tempo de trabalho. A década de 1980 foi marcada por greves empreendidas pelos sindicatos, tendo em vista a estagnação econômica e a consequente redução de postos de trabalho e demissões em massa que assolaram o País (ARONI, 2011ARONI, F. Carreira: visão acadêmica e práticas do mercado de trabalho relatadas pela publicação Guia Você S/A Exame 'As melhores empresas para você trabalhar'. 2011. 130 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011.).

Nas últimas décadas, o mercado de trabalho tem se reconfigurado, sobretudo em virtude das profundas mudanças promovidas pela tecnologização e pela automação, que influenciam as relações de trabalho; e da redução de empregos estáveis e diversificação de vínculos empregatícios, que, por consequência, reorganizam as estruturas e concepções de carreira (BLANCH, 2003; SENNETT, 1998). Passa-se a valorizar as competências e habilidades, e há uma concentração de postos de trabalho com contratação via Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) (CAMPOS, 2006CAMPOS, K. C. L. Construção de uma escala de empregabilidade: competências e habilidades pessoais, escolares e organizacionais. 2006. 172 f. Tese (Doutorado em Psicologia) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.; ARONI, 2011ARONI, F. Carreira: visão acadêmica e práticas do mercado de trabalho relatadas pela publicação Guia Você S/A Exame 'As melhores empresas para você trabalhar'. 2011. 130 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011.).

Não obstante à desvalorização do ideário de carreira pública como sonho de todo trabalhador, ainda vigem as reivindicações de trabalhadores públicos, sobretudo alocados nas áreas consideradas prioritárias dos estados - saúde, educação e segurança -, por carreiras que possibilitem a valorização salarial e do tempo de trabalho, e que garantam benefícios de curto prazo, como adicionais e melhores condições de trabalho.

Em se tratando da saúde, desde a implantação do SUS, em 1990, já se propunha a criação de carreiras para os profissionais do sistema, sendo, inclusive, requisito para o recebimento de recursos oriundos da União a implantação de uma comissão de elaboração de PCCS, por parte dos municípios (BRASIL, 1990______. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial [da] União, Brasília, DF, 20 set. 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm>. Acesso em: 3 mar. 2017.
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).

O relatório final da II Conferência Nacional de Recursos Humanos, realizada em 1993, afirmou que as oportunidades de desenvolvimento profissional eram escassas, os salários degradantes, e que os planos de carreira eram inexistentes. Tal cenário acarretaria a desmotivação dos trabalhadores e o descompromisso ético e social com o sistema de saúde (BRASIL, 1993______. Ministério da Saúde. Coordenação-Geral de Desenvolvimento de Recursos Humanos para o SUS. II Conferência Nacional de Recursos Humanos para a Saúde: Relatório Final. Brasília, DF: Ministério da Saúde , 1993. (Cadernos RH Saúde; v. 1, n. 1).).

Passados mais de 20 anos do documento supramencionado, o cenário relatado já não é o mesmo, mas alguns problemas ainda persistem, tais como: escassez de profissionais qualificados na gestão do trabalho; diversificadas modalidades de contratos trabalhistas; ausência de planos de carreiras adequados, em boa parte das estruturas, ou insatisfação dos trabalhadores com o plano existente; remuneração insuficiente; dificuldade de fixação de profissionais; limitação da expansão de quadro de pessoal imposta pela Lei de Responsabilidade Fiscal; ausência de concursos públicos; deficiência de qualificação dos profissionais; e carência de programas de educação permanente (BRASIL, 2004; PIERANTONI ., 2008PIERANTONI, C. R. et al. Gestão do trabalho e da educação em saúde: recursos humanos em duas décadas do SUS. Physis, Rio de Janeiro, v. 18, n. 4, p. 685-704, 2008.; PIERANTONI; GARCIA, 2011PIERANTONI C. R.; GARCIA, A. C. Human resources for health and decentralization policy in the Brazilian health system. Human Resources for Health, London, v. 9, n. 12, 2011.; MAGNAGO; PIERANTONI, 2014MAGNAGO, C.; PIERANTONI, C. R. A percepção dos gestores dos municípios de Duque de Caxias e Rio de Janeiro quanto à rotatividade de profissionais na Estratégia Saúde da Família. Revista Cereus, Gurupi, v. 6, n. 1, p. 3-18, jan./abr. 2014.; NEY; RODRIGUES, 2012NEY, M. S.; RODRIGUES, P. H. A. Fatores críticos para fixação do médico na Estratégia Saúde da Família. Physis, Rio de Janeiro, v. 22, n. 4, p: 1293-311, 2012.).

Não se pode negar, contudo, que o Ministério da Saúde, por meio da SGTES, vem empregando esforços com o objetivo de melhorar todos os aspectos da gestão do trabalho, e se notam melhorias quando se avalia uma evolução no tempo. Em se tratando de PCCS, por exemplo, pesquisa realizada em 2008 constatou que 47,8% das SES e das SMS não possuíam nenhum modelo instituído; 28,9% tinham plano geral para todos os trabalhadores; e 20,2% tinham PCCS específico para o setor saúde (PIERANTONI; GARCIA, 2011PIERANTONI C. R.; GARCIA, A. C. Human resources for health and decentralization policy in the Brazilian health system. Human Resources for Health, London, v. 9, n. 12, 2011.). Em 2012, o percentual daqueles que apontaram a inexistência de planos diminuiu para 29,1%; PCCS gerais foram apontados por 36,6%; e o percentual de respondentes que indicaram planos específicos para o setor saúde aumentou para 28,7% (OBSERVARH-IMS/UERJ, 2014OBSERVATÓRIO DE RECURSOS HUMANOS EM SAÚDE (OBSERVARH-IMS/UERJ). Estação de Trabalho Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Avaliação de Políticas e Programas Nacionais da Gestão do Trabalho e da Educação em Saúde no SUS. Rio de Janeiro: ObservaRH-IMS; UERJ, 2014. Disponível em: <http://www.obsnetims.org.br/uploaded/11_5_2015__0_Sumario_Executivo_Avaliacao_de_Politicas_e_Programas_Nacionais.pdf>. Acesso em: 3 mar. 2017.
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).

Não obstante, a existência de um plano não significa dizer que todos os processos previstos na legislação são, de fato, cumpridos, caso da avaliação de desempenho, que apresenta dificuldades para sua materialização, de maneira que deixe de ser apenas um ato burocrático. Um estudo realizado por Seidl (2014)SEIDL, H. et al. Gestão do trabalho na Atenção Básica em Saúde: uma análise a partir da perspectiva das equipes participantes do PMAQ-AB. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 38, n. esp. p. 94-108, out. 2014. evidenciou fragilidade na incorporação da avaliação de desempenho nos planos de carreira, especialmente em municípios de menor porte populacional.

O aperfeiçoamento das práticas de gestão do trabalho nos serviços de saúde se constitui como um grande desafio. A avaliação de desempenho é um dos focos de atenção do processo de gestão, e sua finalidade é identificar o nível de capacitação/qualificação profissional, bem como o potencial dos trabalhadores em relação aos objetivos organizacionais.

Enquanto ferramenta de auxílio ao processo de tomada de decisão, a avaliação de desempenho é considerada como um instrumento de levantamento de dados, que possibilita caracterizar as condições que dificultam ou impedem o completo e adequado aproveitamento dos trabalhadores da organização. Porém, ao mesmo tempo em que o tema ganha espaço de discussão no setor público, provoca polêmica entre gestores e trabalhadores, principalmente porque o avaliar ainda suscita, no trabalhador, um imaginário de repreender, punir. Por outro lado, também, os processos de avaliação de desempenho conduzidos por grande parte das organizações ainda trazem, em seu bojo, conotações burocráticas, meramente técnicas e pontuais, que não resultam em melhoria dos processos de práticas (PIERANTONI; GARCIA, 2011PIERANTONI C. R.; GARCIA, A. C. Human resources for health and decentralization policy in the Brazilian health system. Human Resources for Health, London, v. 9, n. 12, 2011.).

Nesse contexto de entendimento de que a avaliação de desempenho se configura como importante instrumento de gestão, as estruturas estudadas por esta pesquisa já apostam nesses processos, de forma a tentar acolher as exigências dos serviços e a dos profissionais de saúde, ainda que elas se encontrem em desenvolvimento.

É preciso ter em mente que a implantação de um PCCS não significa apenas ganhos em termos remuneratórios. Ela pode constituir-se como um instrumento poderoso de melhorias das condições de trabalho, capacitação profissional e, mais do que isso, de reconhecimento do trabalhador.

É sabido, contudo, que a implantação de um plano de carreiras, principalmente no que diz respeito ao setor público, é um processo que exige, geralmente, uma longa negociação entres os atores envolvidos, com destaque para os trabalhadores, que usufruirão dos benefícios advindos, e para os representantes do estado, que devem sugerir e/ou aprovar uma proposta para sobrelevar o impacto financeiro causado por um PCCS aos cofres públicos.

A participação do trabalhador é, antes de tudo, essencial para a concretização do sistema nacional de saúde. Ao estimular esta participação na construção de um sistema público democrático, ratifica-se o compromisso com as proposições do movimento da reforma sanitária e busca-se efetivar o SUS (BRASIL, 2007______. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Saúde, trabalho e democracia: a participação dos trabalhadores de saúde nos conselhos. Brasília, DF: Ministério da Saúde , 2007. (Série D. Reuniões e Conferências); (Série Cadernos Metropolitanos). Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/07_0146_M.pdf>. Acesso em: 3 mar. 2017.
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).

A negociação é um processo fundamental, que exige a pactuação de interesses e prioridades pelos diversos sujeitos envolvidos no contexto do trabalho (SILVA, 2012SILVA, N. D. Sistema nacional de negociação permanente do SUS: um instrumento de gestão do trabalho na saúde. 2012. 141 f. Dissertação (Mestrado em Saúde Pública) - Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2012.; BRAGA, 2002BRAGA, D. G. Conflitos, eficiência e democracia na gestão púbica. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2002.), e, neste sentido, os interesses de cada categoria profissional, embora legítimos, bem como a relação público-privada, que introduz a terceirização de serviços no âmbito do SUS e produz diversas modalidades contratuais de trabalho, também acabam por excluir grande parte dos trabalhadores do escopo das políticas de gestão do trabalho, e obstam, especialmente, a concretização dos projetos de carreira pública no SUS (PAIM, 2013PAIM, J. S. A constituição cidadã e os 25 anos do Sistema Único de Saúde (SUS). Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 29, n. 10, p. 1927-1953, 2013.).

Ademais, o subfinanciamento da saúde, que se constitui como problema crônico, tem se agravado nos últimos anos, implicando em cortes expressivos de gastos no setor, sobremaneira no âmbito da gestão do trabalho, área pouco valorizada em toda a história do SUS. Tal cenário aponta perspectivas negativas, especialmente em decorrência da crise político-econômica pela qual passa o Brasil, que tem sido usada como justificativa para propostas de modificação constitucional passíveis de congelar as despesas federais com a saúde pelas próximas décadas (PAIM, 2013PAIM, J. S. A constituição cidadã e os 25 anos do Sistema Único de Saúde (SUS). Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 29, n. 10, p. 1927-1953, 2013.; VIERIA, 2016).

Conclusões

A análise dos dados coletados, quer seja mediante os documentos referentes aos planos, quer seja via discursos dos gestores entrevistados, apontou diferentes e diversas melhorias no âmbito da gestão, emergidas, sobretudo, após a implantação de um plano de carreira. Apresentaram, ainda, desafios que merecem ser estudados e trabalhados com maior afinco, uma vez que são fundamentais para o desenvolvimento da área da gestão do trabalho e da educação na saúde, para a fixação e valorização profissional e, por consequência, para a consolidação e melhoria dos serviços de saúde oferecidos pelo sistema nacional público.

Entre os principais desafios que se apresentam, se podem citar o necessário planejamento do sistema de saúde e a pactuação de metas; a regulamentação do processo de avaliação de desempenho e articulação com a política de educação permanente, de acordo com as metas pactuadas; a valorização do trabalho em equipe como indicador importante do desempenho profissional; e a inserção de todos os profissionais que trabalham na saúde, inclusive administrativos e agentes de saúde.

Dessarte, o processo de implantação de um plano de carreira não deve ser entendido como uma peça neutra, isto é, passível de ser justificado apenas pela racionalidade administrativa. Ele sempre terá, também, um caráter político, econômico, social e cultural.

Sem dúvidas, longe do esgotamento do tema, são necessárias novas aproximações no sentido de desvelar e mapear as diferentes experiências em voga, no Brasil e em países com sistemas universais de saúde, questionando, especialmente, a função do estado na regulação das profissões e do trabalho em saúde, cujas interfaces recaem sobre a gestão do trabalho.

  • Suporte financeiro: Projeto financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) - processo nº 552745/2011-1

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2017

Histórico

  • Recebido
    Ago 2016
  • Aceito
    Jan 2017
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