Tecnologia mHealth na prevenção e no controle de obesidade na perspectiva do letramento em saúde: Lisa Obesidade

Leyla Márcia Ramos Oliveira Clarice Maria Araújo Chagas Vergara Helena Alves de Carvalho Sampaio José Eurico de Vasconcelos FilhoSobre os autores

RESUMO

O estudo objetivou descrever a tecnologia mHealth, utilizada para auxiliar na prevenção e no controle da obesidade em adultos à luz do letramento em saúde. A tecnologia foi desenvolvida pelo método do design participativo por uma equipe interdisciplinar que envolveu enfermeira, nutricionista, um designer e um analista de sistemas. Os autores desenvolveram um design de baixa e alta fidelidade, baseado no design interativo centrado no usuário, à luz do letramento em saúde. O estudo proporcionou desenvolver conhecimento do uso do letramento para desenvolvimento de tecnologia móvel, visando a uma maior acessibilidade dos indivíduos à prevenção e ao controle da obesidade. Foi considerada a percepção de equipe interdisciplinar sobre as questões relacionadas à saúde, o desenvolvimento e a aplicação da tecnologia mHealth para o enfrentamento do problema. Obteve-se tecnologia denominada Lisa Obesidade, com objetivo de empoderamento do usuário. Espera-se ser uma ferramenta para auxiliar profissionais da saúde a realizar ações promotoras de saúde.

PALAVRAS-CHAVE
Aplicativos móveis; Obesidade; Promoção da saúde

Introdução

O Brasil tem cerca de 18 milhões de pessoas consideradas obesas, segundo a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. Somando o total de indivíduos acima do peso, o montante chega a 70 milhões, o dobro de três décadas atrás. A obesidade é caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal no indivíduo. Suas causas podem estar relacionadas ao patrimônio genético do indivíduo, a maus hábitos alimentares, disfunções endócrinas, sedentarismo. É fator de risco para uma série de doenças, como hipertensão arterial sistêmica, doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2, entre outras11 Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica. Diretrizes brasileiras de obesidade; 2016 [internet]. 4. ed. São Paulo: ABESO; 2016 [acesso em 2018 fev 2]. Disponível em: http://www.abeso.org.br/pdf?diretrizes_brasileiras_obesidade_2009_2010_1.pdf.
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,22 Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. Obesidade [internet]. Rio de Janeiro: SBEM; 2008 [acesso em 2018 jan 18]. Disponível em: https://www.endocrino.org.br/obesidade/.
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A obesidade é, hoje, reconhecida como uma pandemia e, já há algumas décadas, tem sido apontada como prioridade na agenda das políticas públicas nos âmbitos nacional e internacional. Alguns progressos pontuais podem ser observados. No entanto, nenhum país conseguiu controlar essa epidemia. Estão correlacionados a esse fato o lobby do setor privado comercial; a falta de prioridade de política específica dos governos para implementar medidas efetivas diante do não entendimento da população da real dimensão dos problemas correlacionados a essa patologia, que tem como consequência a insuficiente pressão da sociedade civil para a ação política; e a escassa avaliação empírica de medidas implementadas33 Reis V. Prevenção e Controle da Obesidade [internet]. Rio de Janeiro: Abrasco; 2017 [acesso em 2017 dez 14]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/noticias/saude-da-populacao/prevencao-e-controle-da-obesidade-na-cadernos.
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As mHealths podem ser definidas como a utilização de informações e de tecnologias de comunicação para oferta e melhoria de serviços de saúde. A saúde móvel cria condições para a avaliação contínua de parâmetros de saúde, configura um novo cenário de incentivo a comportamentos saudáveis e auxilia a autogestão de condições crônicas, entre outras vertentes de aplicação44 Rocha TA, Fachini LA, Thumé E, et al. Saúde Móvel: novas perspectivas para a oferta de serviços em saúde. Epidemiol. Serv. Saúde [internet]. 2016 jan-mar [acesso 2018 jan 2]; 25(1):159-170 Disponível em: https://scielosp.org/scielo.php?pid=S2237-96222016000100159&script=sci_arttext.
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O alcance dessa tecnologia, apesar de facilitado pelo maior acesso da população, precisa não só ser acessível, mas agregar o fator do real entendimento do conteúdo vinculado para sensibilizar o seu uso. Nessa perspectiva, o letramento em saúde é uma ferramenta que permite aos usuários dessas tecnologias entenderem e interagirem com os conteúdos que devem ser validados e, se possível, retroalimentados.

Letramento em saúde pode ser definido como o grau segundo o qual os indivíduos têm capacidade para obter, processar, entender informações básicas e serviços necessários para a tomada de decisões adequadas em saúde55 Passamai MPB, Sampaio HAC, Dias AMI, et al. Functional health literacy: reflections and concepts on its impact on the interaction among users, professionals and the health system. Interface [internet]. 2012 abr-jun [acesso em 2017 out 14]; 16(41):301-314 Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/icse/v16n41/en_aop2812.pdf.
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. Pela crença dos autores nessa concepção, houve a proposta de desenvolvimento, de forma interdisciplinar, de uma ferramenta tecnológica mHealth designada Lisa Obesidade, cujo objetivo é descrever uma tecnologia para auxiliar na prevenção e no controle da obesidade em adultos à luz do letramento em saúde. A perspectiva é de que ela possa contribuir para auxiliar na redução dos índices de obesidade que têm trazido tanto sofrimento à população devido a comorbidades a ela associadas.

Procedimentos metodológicos

No processo de concepção da tecnologia mHealth Lisa Obesidade, adotou-se a metodologia do processo de design de interação participativo centrado no usuário66 Preece J, Rogers Y, Sharp H. Design de interação: além de interação homem-computador. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2013., cujo principal objetivo é a concepção e a construção de produtos interativos que melhorem e aumentem o leque de possibilidades de comunicação, interação e trabalho entre as pessoas. Essa metodologia destaca-se por considerar as necessidades e a participação contínua dos usuários (pesquisadores) em todas as fases de concepção e desenvolvimento do projeto. O objetivo desse processo é tornar a interação do usuário com a ferramenta o mais simples e eficiente possível.

Essa tecnologia foi elaborada por um profissional de design, com orientação de uma enfermeira mestranda em saúde coletiva, professores doutores em nutrição e um professor doutor em ciências da computação.

O processo de design de interação contempla quatro etapas: A primeira etapa prevê a identificação das necessidades do(s) cliente(s) e/ou usuário(s) e, com base nelas, o estabelecimento dos requisitos do sistema. A etapa seguinte é o design de possíveis ‘soluções’ para as necessidades identificadas com base nos requisitos. Seleciona-se uma proposta de design, inicia-se a etapa de construção de um protótipo funcional, uma versão interativa. Com o protótipo funcional pronto, realiza-se a última etapa de avaliação. É possível que durante a execução de uma atividade, identifique-se ser necessário retomar uma etapa anterior para correção ou melhora, por isso, é interativo. A quarta e última etapa contempla a compilação e a análise dos resultados obtidos.

Neste estudo, para cumprir a primeira etapa, ocorreram reuniões de brainstorming, onde foram identificados os requisitos técnicos/funções que o sistema deveria contemplar, visando a mitigar a problemática apresentada.

A seguir, são apresentados os principais requisitos identificados:

  1. Identificação do perfil clínico – cadastro clínico do usuário. Permite que o usuário preencha características de saúde a fim de ser associado ao tipo de perfil clínico. Através deste item, é possível saber se o usuário tem comorbidades, como diabetes ou hipertensão arterial sistêmica.

  2. Cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC), permitindo ao usuário que, ao colocar o seu peso (Kg) e sua altura (m), conheça sua classificação, segundo a tabela de classificação de peso11 Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica. Diretrizes brasileiras de obesidade; 2016 [internet]. 4. ed. São Paulo: ABESO; 2016 [acesso em 2018 fev 2]. Disponível em: http://www.abeso.org.br/pdf?diretrizes_brasileiras_obesidade_2009_2010_1.pdf.
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    . O resultado do cálculo do IMC permite a visualização, através de sinalizações de cores (verde, amarelo e vermelho). O usuário saberá se está em risco para obesidade ou se está obeso, bem como sua classificação, e, a partir daí, receberá informações para possíveis condutas.

  3. Informações sobre obesidade à luz do letramento em saúde, baseado no Guia77 Eichner J, Dullabh P. Accessible Health Information Technology (Health IT) for Populations. With Limited Literacy: a guide for developers and purchasers of health IT. Rockville: Agency for Healthcare Research and Quality; 2007. e na metodologia do processo de design de interação participativo centrado no usuário66 Preece J, Rogers Y, Sharp H. Design de interação: além de interação homem-computador. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2013..

  4. Controle e alerta de alimentos perigosos a determinadas patologias através da foto do seu prato com a participação de profissionais de saúde.

  5. Centros mais próximos de tratamento da obesidade – o usuário receberá possíveis localizações de centros para tratamento de obesidade.

Após esse levantamento prévio, foram estabelecidos os requisitos funcionais da ferramenta e elaborado um documento de requisitos:

  1. Acessar o sistema: local de inclusão do usuário (login e logoff);

  2. Registrar dados cadastrais: uma opção na tela inicial para inserção dos dados dos usuários: senha, e-mail, idade, sexo e nível de escolaridade;

  3. Realizar cálculo do IMC por meio da fórmula: ao inserir seu peso e altura, o usuário será ‘classificado’ ou terá a informação do seu risco para obesidade. De acordo com a classificação: Baixo peso (< 18,5), peso normal (18,5 – 24,9), sobrepeso ( &ge; 25), pré-obeso (25,0 a 29,9), obeso I (30,0 a 34,9), obeso II (35,0 a 39,9), obeso III ( &ge; 40). Desse modo, ele pode estabelecer sua meta de perda de peso e acompanhar seu progresso;

  4. Avaliação da refeição: o usuário tira a foto e posta no aplicativo, e seu prato será avaliado por uma rede de colaboradores (usuários, nutricionista e alunos de nutrição);

  5. Notícias e eventos: ferramenta para visualização dos principais eventos sobre promoção da saúde que estejam ocorrendo.

A segunda etapa consta dos processos de design e redesign. Esta etapa foi o momento de definir como seria o produto. No caso dos artefatos tecnológicos, o design contempla os protótipos das interfaces (telas) do sistema aplicativo. Esses protótipos contemplam os requisitos identificados que foram atendidos nas telas por meio dos elementos de interface e do layout.

Um protótipo é uma representação da interface com a qual o usuário pode interagir e oferecer informações para propor mudanças e melhorias. É um modelo semifuncional do produto final88 Pearrow M. Web site usability handbook. Massachusetts: Charles River Media; 2000.. Usar uma versão parcialmente finalizada do site/aplicativo é uma maneira comum de realizar testes de usabilidade já nas fases iniciais do ciclo de vida do projeto99 Santos RLG. Usabilidade de interfaces para sistemas de recuperação de informação na web: estudo de caso de bibliotecas on-line de universidades federais brasileiras [tese]. Rio de Janeiro: Universidade Católica do Rio de Janeiro; 2006, 347 p..

São considerados os seguintes níveis de prototipagem: baixa fidelidade, média fidelidade e alta fidelidade. Cada um desses três níveis de fidelidade de protótipo apresenta benefícios singulares importantes de serem incluídos no processo de projeto (design) de interface99 Santos RLG. Usabilidade de interfaces para sistemas de recuperação de informação na web: estudo de caso de bibliotecas on-line de universidades federais brasileiras [tese]. Rio de Janeiro: Universidade Católica do Rio de Janeiro; 2006, 347 p..

Na fase de design, adota-se a concepção dos protótipos de baixa fidelidade. Um protótipo de baixa fidelidade possui baixo grau de detalhamento. Somente apresenta visualmente a funcionalidade, não possui recursos de interação99 Santos RLG. Usabilidade de interfaces para sistemas de recuperação de informação na web: estudo de caso de bibliotecas on-line de universidades federais brasileiras [tese]. Rio de Janeiro: Universidade Católica do Rio de Janeiro; 2006, 347 p.. O objetivo foi oferecer uma visão geral do layout de tela e dos elementos de interface, permitindo uma discussão mais clara sobre a proposta.

Nesta fase, deu-se o início à criação do design da ferramenta, com a participação dos membros da equipe nas discussões, tendo como base os passos de criação de material segundo o letramento em saúde, com o intuito de aproximar as funcionalidades do sistema, a linguagem e o entendimento do usuário. Também se discutiu nessa fase quais motivações levam um profissional de nutrição a entrar no aplicativo.

O processo de design dos protótipos de baixa fidelidade produzido pelo designer utilizou a ferramenta Photoshop.

O protótipo de alta fidelidade foi construído na versão interativa, contemplando as características presentes no protótipo de baixa fidelidade, tipografia, iconografia e paleta de cores.

As discussões entre os membros da equipe continuaram durante todo o processo, gerando adaptações e mudanças, como a alteração do nome da tecnologia, a interatividade e os formatos que despertassem maior interesse do usuário.

Na elaboração das telas de alta fidelidade, utilizou-se, também, a ferramenta Photoshop.

O estudo descrito no artigo foi finalizado nessa etapa, na qual obteve-se a elaboração do design interativo.

Resultados e discussão

No contexto da engenharia de software, a prototipação é um processo que capacita o desenvolvedor a criar um modelo do produto final que será posteriormente desenvolvido1010 Pressman RS. Engenharia de software. São Paulo: McGraw Hill Brasil; 2011..

Os modelos de prototipação podem ser de baixa e alta fidelidade. O protótipo de alta é muito semelhante à versão final, pois é um programa que executa parte ou todas as características que serão melhoradas no produto final66 Preece J, Rogers Y, Sharp H. Design de interação: além de interação homem-computador. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2013.,1010 Pressman RS. Engenharia de software. São Paulo: McGraw Hill Brasil; 2011..

Revisões sistemáticas têm mostrado que as abordagens tradicionais para o excesso de peso, em especial, os tratamentos clínico e farmacológico, têm obtido pouco êxito no controle da doença e que existe consenso quanto à necessidade de adotarem-se modelos ecológicos nas ações de saúde pública para prevenção e controle do excesso de peso e da obesidade. Tais modelos reconhecem a existência de múltiplos fatores associados ao ganho de peso. Além disso, o apoio das tecnologias atualmente disponíveis pode ser outro ponto importante na condução das estratégias para o enfrentamento dos aumentos da prevalência da doença. O desenvolvimento de uma tecnologia para prevenção e tratamento da obesidade, à luz do letramento em saúde, com o objetivo de auxiliar usuários e profissionais como um instrumento de promoção da saúde, concretizou-se com o design Lisa Obesidade, o qual se dispõe a ser uma ferramenta de aprendizagem e de interação com o usuário, além de disponibilizar interfaces que possibilitam hábitos saudáveis1111 Sarno F, Canella DS, Bandoni DF. Mobile health e excesso de peso: uma revisão sistemática. Rev Panam Salud Pública [internet]. 2014 [acesso em 2017 out 14]; 35(5/6):424-431. Disponível em: https://scielosp.org/pdf/rpsp/v35n5-6/18.pdf.
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E essa abordagem é reforçada quando se destaca a importância da preocupação com o usuário no desenvolvimento de uma interface, a qual só se mostra eficaz quando o usuário é capaz de realizar a ação por meio da ferramenta. A partir desse pensamento, surgiram processos de design que colocavam o usuário como figura central e partiam de suas características para definir o resultado final do artefato criado. Esse conjunto de métodos é englobado no conceito do design centrado no usuário, cuja principal característica está no envolvimento efetivo dos usuários finais no processo de design e na maneira como eles influenciam na forma do projeto1212 Fabrício MA, Bonetti MH, Grassi NB, et al. Tutoriais gamificados e o design centrado no usuário. Revista Geminis [internet]. 2015 [acesso em 2017 out 14]; 6(1);62-78. Disponível em: http://www.revistageminis.ufscar.br/index.php/geminis/article/viewFile/218/189.
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A pesquisa favoreceu aprofundar o conhecimento do contexto apresentado, considerando a percepção da equipe interdisciplinar (nutrição, enfermagem, designer e tecnologia) sobre as questões relacionadas à saúde, o desenvolvimento e a aplicação da tecnologia mHealth para o enfrentamento do problema.

No primeiro momento, foram realizados a concepção e o desenvolvimento de 23 telas no protótipo de baixa fidelidade (figura 1). Nessa etapa, propiciou-se a avaliação prévia, pela equipe interdisciplinar, das telas e interfaces, havendo uma especial preocupação com a sua estrutura, o seu conteúdo e a sua compreensão.

Figura 1
Telas de perfil do usuário do protótipo de baixa fidelidade

No segundo momento, foi elaborado o protótipo de alta fidelidade, com desenvolvimento de 14 telas que, após discussões entre a equipe interdisciplinar (figuras 2 a 5), permitiram a percepção das necessidades de ajustes relacionadas à interatividade e às imagens. Assim, posteriormente, foram elaboradas 34 telas de alta fidelidade, o que proporcionou telas mais limpas, com conteúdo mais acessível, sendo algumas transformadas em duas.

Figura 2
Telas de metas e gráfico de peso, avaliação de prato, cálculo do IMC e informações gerais do protótipo de baixa fidelidade

Figura 3
Telas de perfil do usuário do protótipo de alta fidelidade

Figura 4
Telas de metas e gráfico de peso, avaliação de prato, cálculo do IMC e informações gerais do protótipo de alta fidelidade

Figura 5
Telas de informações gerais e personalizadas do protótipo de alta fidelidade

A tecnologia desenvolvida para prevenção da obesidade permite um melhor controle por parte dos profissionais dos cuidados prestados pelos usuários. O cuidado por meio da equipe multidisciplinar deve ser repensado, porque muito do que cada profissional pode oferecer, ou efetivamente oferece aos pacientes, perde-se em ações estanques e dissociadas do cuidado construído pelo grupo. Por outro lado, tal realidade não parece ser um fenômeno relacionado unicamente ao Brasil, onde a experiência aqui relatada se desenvolve. O material desenvolvido pela Advisory Board Company1313 Advisory Board Company. A nova realidade reformulando o atendimento intensivo a pacientes complexos e multimórbidos. [internet]. Washington: Internacional Clinical Operations Board; c2018 [acesso em 2017 dez 14]. Disponível em: https://www.advisory.com/international.
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demonstra que tem sido uma preocupação de diferentes países o esforço em encorajar as partes interessadas a trabalharem juntas, em uma abordagem centrada na pessoa, para tratar pacientes de forma eficaz no cenário adequado. A expressão maior de tal esforço resulta na compreensão de que uma nova definição de trabalho deve ser pensada em favor da transformação do cuidado.

O vínculo entre o profissional de saúde e o usuário é fundamental para o controle e a prevenção da obesidade. O trabalho em grupo permite melhor estímulo à adesão e gera melhor qualidade de vida para os pacientes. A Organização Mundial de Saúde (OMS) define a adesão ao tratamento de enfermidades crônicas como um fenômeno multidimensional determinado pela conjugação de cinco conjuntos de fatores, denominados dimensões: sistema de saúde, doença, tratamento, paciente e fatores relacionados ao cuidador. Essa classificação deixa claro ser enganosa a crença de que os pacientes são os únicos responsáveis pelo tratamento1414 World Health Organization. Adherence to long-term therapies: evidence for action [internet]. Genebra: WHO; 2003 [acesso em 2018 jan 18]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/42682/1/9241545992.pdf.
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A metodologia proposta para o desenvolvimento da tecnologia se mostrou bastante eficiente, tanto nas fases iniciais quanto na atividade de elaboração dos requisitos para a compreensão das necessidades dos usuários. A importância da participação de uma equipe interdisciplinar durante todo o processo se deve ao fato de proporcionar uma melhor definição das etapas, dos parâmetros e das avaliações de alternativas que melhor atendessem ao objetivo deste estudo, bem como do produto gerado. O uso dos protótipos de baixa e alta fidelidade, ao longo de todo o processo de design, contribuiu para identificar e selecionar as formas mais precisas, as melhores alternativas que permitam melhor interação e aprendizado do usuário.

Acredita-se que os princípios que embasaram a metodologia centrada em protótipos tornaram o processo de design mais interativo, ampliando o uso de protótipos para todas as fases do processo de design; criando um número maior de ciclos interativos; adequando o protótipo em cada fase e considerando as características das fases, área de design, finalidades, propósitos e nível de fidelidade a cada ciclo.

A visão dos protótipos foi ampliada para algo além de uma ferramenta de apresentação do projeto, entendendo que elas podem contribuir tanto para a compreensão do problema e do que deve ser projetado nas fases iniciais de design como para o levantamento de parâmetros com usuários, realização de avaliações com as alternativas e aprovação do produto final.

Acredita-se que esses princípios podem contribuir para tornar o processo de design e os produtos desenvolvidos a partir dele mais eficientes. Nesse momento, foi importante a associação do design centrado no usuário e a aplicação dos princípios do letramento em saúde. Para as informações e o conteúdo abordados, tentou-se a utilização de linguagem clara e de fácil entendimento. As telas com informações/imagens foram contextualizadas e acessíveis. No desenvolvimento de tecnologias à saúde, não se pode dissociar o design centrado no usuário do letramento em saúde.

Com o número expressivo de usuários de aplicativos móveis, a equipe de saúde deve aproveitar esse interesse e fazer dessa ferramenta uma aliada nas orientações de prevenção e tratamento da obesidade, bem como na manutenção de hábitos de vida saudáveis. A seleção de aplicativos de maneira criteriosa pode promover uma maior aproximação do profissional e melhorar a compreensão do usuário sobre seu estado de saúde, além de aguçar o seu interesse em cuidar da própria saúde.

Tecnologias móveis já fazem parte de nossas vidas cotidianas e, pelos motivos expostos, têm o potencial de impactar a promoção de saúde de forma positiva, especialmente na prevenção e no tratamento do excesso de peso e da obesidade, que são atualmente grandes desafios para a saúde pública no mundo1111 Sarno F, Canella DS, Bandoni DF. Mobile health e excesso de peso: uma revisão sistemática. Rev Panam Salud Pública [internet]. 2014 [acesso em 2017 out 14]; 35(5/6):424-431. Disponível em: https://scielosp.org/pdf/rpsp/v35n5-6/18.pdf.
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Considerações finais

Após todas as etapas percorridas e discussões constantes da equipe interdisciplinar de desenvolvimento do design Lisa Obesidade, obteve-se um recurso tecnológico do qual se espera que possa oferecer aos usuários a adoção de medidas amplas de cuidado com a saúde, favorecendo o seu empoderamento e configurando-se como uma ferramenta a mais para auxiliar profissionais da saúde a realizar ações promotoras de saúde.

A tecnologia desenvolvida neste estudo está disponível para a etapa de avaliação de juízes e do público.

Diante do exposto, fica patente que a ferramenta ora desenvolvida faz parte de uma estratégia para empoderamento dos usuários, que não dispensa o acompanhamento periódico com os profissionais de saúde.

  • Suporte financeiro: não houve

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    03 Jun 2018
  • Aceito
    13 Ago 2018
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde RJ - Brazil
E-mail: revista@saudeemdebate.org.br