‘A gente não quer só comida’: integralidade na atuação interprofissional no cuidado da obesidade infantil

‘We don’t want only food’: integrality in the interprofessional performance in the care of childhood obesity

Claudia Carneiro da Cunha Sobre o autor

RESUMO

O artigo traz uma análise socioantropológica de uma prática de assistência de caráter interprofissional, da psicologia com a nutrição, voltada ao atendimento de crianças e adolescentes obesos e seus familiares, quase sempre mães, acompanhados em um ambulatório público da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). A educação em saúde e a integralidade do cuidado são conceitos ‘postos em prática’, articulando-os ao brincar como instrumento terapêutico e à arte como campo de vivências e expressão de singularidades. O corpo e a corporeidade são abordados nas suas dimensões biopolíticas, mas também sensíveis e simbólicas, na busca por compreender a obesidade infantil e suas nuances. Nas análises, a saúde deixa de ser medida a partir de seu caráter normativo, tomando-se o processo saúde-doença em sua complexidade.

PALAVRAS-CHAVES
Obesidade pediátrica; Integralidade em saúde; Assistência centrada no paciente

ABSTRACT

The article presents a socioanthropological analysis of an interprofessional care practice, of psychology and nutrition, aimed at obese children and adolescents and their families, almost always mothers, assisted in a public outpatient clinic of the Rio de Janeiro State University (UERJ). Health education and integrality of care are concepts ‘put into practice’, articulating play as a therapeutic tool and art as a field for experiences and expression of singularities. The body and corporeality are approached in their biopolitical dimensions, but also in their sensitive and symbolic ones, in the search to understand childhood obesity and its nuances. In the analyses, health is no longer measured from its normative character, taking the healthdisease process in its complexity.

KEYWORDS
Pediatric obesity; Integrality in health; Patient-centered care

Introdução

A obesidade é considerada uma doença multifatorial caracterizada pelo acúmulo excessivo de tecido adiposo no corpo. Mendes e colaboradoras11 Mendes JOH, Bastos RC, Moraes PM. Características psicológicas e relações familiares na obesidade infantil: uma revisão sistemática. Rev. SBPH. 2019 [acesso em 2022 set 29]; 22(2):228-247. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-08582019000300013&lng=pt.
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, em artigo de revisão da literatura, mostram que há indicativos de correlações entre ansiedade, depressão, questões familiares e obesidade infantil. As autoras consideram que determinados contextos familiares, escolares e sociais podem promover uma combinação facilitadora para o surgimento da obesidade infantil.

Embora existam poucos estudos no campo da saúde sobre o tema da atuação interprofissional no cuidado da obesidade infantil, o trabalho de Bortagarai et al.22 Bortagarai FM, Peruzzolo DL, Ambrós TM. A interconsulta como dispositivo interdisciplinar em um grupo de intervenção precoce. Disturb Comum. 2015 [acesso em 2022 set 28]; 27(2):392-400. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/20851/16998.
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– que investigou o uso do dispositivo de interconsulta como estratégia interdisciplinar em um grupo de profissionais que atuam em um programa de intervenção precoce – demonstrou que esse dispositivo beneficiou a ampliação de conhecimentos, permitiu um maior amparo e menor solidão na reflexão sobre os casos, contribuiu para melhor resolução das demandas e ofertou mais recursos para auxiliar a família na compreensão sobre a situação geral da criança.

A experiência de implantação de um programa de abordagem interdisciplinar no tratamento da obesidade infantil com atividades em grupos, individuais e oficinas temáticas relevou uma melhora nos exames bioquímicos, das medidas antropométricas, na autoaceitação, na diminuição do sedentarismo, no sono, no convívio social, nos níveis de ansiedade, agressividade, compulsão alimentar e nas relações familiares. Portanto, programas de intervenção com esse perfil devem compor políticas públicas33 Rabelo RPC. Implantação de um Programa Interdisciplinar para o controle da obesidade infantil na Secretaria de Saúde do Distrito Federal. Comun Ciênc Saúde. 2018 [acesso em 2022 set 28]; 29(1):65-69. Disponível em: https://revistaccs.escs.edu.br/index.php/comunicacaoemcienciasdasaude/article/view/152.
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A colaboração interprofissional emergiu da necessidade de fortalecer os sistemas de saúde com base nos princípios da Atenção Primária à Saúde e se tornou um dos desafios mais urgentes para os formuladores de políticas, profissionais de saúde, gestores e comunidades em todo o mundo. A ideia-chave é assegurar soluções inovadoras e transformadoras do sistema, que garantam a disponibilidade, a variedade e a distribuição adequada da força de trabalho de saúde44 Organização Mundial de Saúde. Redes de Profissões de Saúde Enfermagem e Obstetrícia Recursos Humanos para a Saúde. Marco para Ação em Educação Interprofissional e Prática Colaborativa. Genebra: OMS; 2010..

A prática colaborativa na atenção à saúde ocorre quando profissionais de saúde de diferentes áreas prestam serviços com base no princípio da integralidade, envolvendo usuários e suas famílias, cuidadores e comunidades para atenção à saúde da mais alta qualidade e em todos os níveis da rede de serviços. Essa prática pode reduzir: o número de complicações de usuários e a duração da internação; a tensão e o conflito entre os prestadores de assistência; o número de internações; a rotatividade de profissionais; as taxas de erros médicos e de mortalidade44 Organização Mundial de Saúde. Redes de Profissões de Saúde Enfermagem e Obstetrícia Recursos Humanos para a Saúde. Marco para Ação em Educação Interprofissional e Prática Colaborativa. Genebra: OMS; 2010..

O presente trabalho descreve o percurso de construção do trabalho coletivo e integrado entre os saberes da psicologia e da nutrição no cuidado da obesidade infantil na assistência ambulatorial, seguindo a perspectiva socioantropológica e o método etnográfico. Esse método reúne um conjunto de concepções e de procedimentos utilizados tradicionalmente pela antropologia, para fins de conhecimento científico da realidade social. Uma abordagem qualitativa aos problemas de saúde identifica-se de várias formas com o método etnográfico, pois possibilita ao investigador compreender as práticas culturais dentro de um contexto social mais amplo, estabelecendo as relações entre fenômenos específicos e uma determinada visão de mundo55 Victora CG, Knauth DR, Hassen MNA. Pesquisa qualitativa em saúde: uma introdução ao tema. Porto Alegre: Tomo Editorial; 2000..

Nesse sentido, a análise aqui empreendida segue os processos vividos, os momentos de tensionamento, de composição interdisciplinar e até mesmo de borramento entre as fronteiras disciplinares. Dessa forma, a estruturação do trabalho acompanha o curso do desenvolvimento do próprio projeto, percorrendo a fase-piloto e a definição posterior de seus alicerces teóricos e metodológicos. A mudança na trajetória das ações é vista como parte de uma construção coletiva e de reflexão conjunta. Vale ressaltar que as noções de integralidade66 Ayres JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saúde soc. 2004 [acesso em 2022 abr 19]; 13(3):16-29. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/nvGMcCJJmpSSRjsGLhH8fmh/abstract/?lang=pt.
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e educação em saúde77 Valla VV, Stotz EN. Participação popular, Educação e Saúde: Teoria e prática. Rio de Janeiro: RelumeDumará; 1993. que estruturam o Sistema Único de Saúde (SUS), sobretudo, na atenção básica, comparecerão ao longo do trabalho como referenciais analíticos, assim como prática assistencial.

Métodos: modos de fazer e conceber o trabalho

O presente artigo baseia-se em uma prática de assistência de caráter interprofissional, da psicologia com a nutrição, voltada ao atendimento de crianças e adolescentes obesos e seus familiares, quase sempre mães, acompanhados em um ambulatório público da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). O trabalho foi criado e desenvolvido sob o estímulo do Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde do Ministério da Saúde, realizado de maio de 2016 a abril de 2018 (PET-Saúde/GraduaSUS), e de 2019 a 2021 (PET-Interprofissionalidade), destinado a potencializar a integração ensino-serviço-comunidade no âmbito do SUS.

O projeto aqui descrito nasceu a partir de várias confluências: o encontro de profissionais, estagiários e residentes de diferentes áreas e em diversos níveis de formação; o compromisso profissional com uma clientela atendida em um serviço público de saúde de cunho formativo; a busca pela criação e pela manutenção de espaços de oxigenação no atendimento à saúde infantojuvenil, prevenindo o engessamento de práticas; e a afetividade capaz de dar liga a uma atuação interdisciplinar e interprofissional desenhada a muitas mãos.

Em agosto de 2017, nasceu o projeto-piloto ‘1, 2, feijão com arroz: tecendo práticas da nutrição e psicologia na alimentação infanto-juvenil’. Os questionamentos iniciais, à época da sua construção, eram variados: o que é o trabalho da psicologia integrado ao da nutrição? Como é um trabalho na atenção secundária voltado a esse tema e de caráter interdisciplinar? O que há de específico na dinâmica do serviço e do trabalho voltado à obesidade infantil?

Da parte da psicologia, o brincar como instrumento terapêutico88 Santa Roza E. Quando brincar é dizer. Rio de Janeiro: Relume Dumará;1993. emergiu como um ‘solo seguro’ para o início da conversa com a equipe da nutrição. Já tínhamos certeza, a partir de experiências prévias e dos marcos teóricos utilizados, de que o brincar é promotor de saúde, uma vez que está diretamente vinculado à constituição do aparelho psíquico, ao surgimento e à manutenção dos processos de simbolização88 Santa Roza E. Quando brincar é dizer. Rio de Janeiro: Relume Dumará;1993..

Iniciamos, a partir daí, inúmeros debates acerca do formato do trabalho. Definimos que o objetivo geral do projeto seria promover uma prática interdisciplinar entre a psicologia e a nutrição, com vistas a qualificar o cuidado em saúde da obesidade de crianças e adolescentes.

Um chão comum entre as duas áreas foi o princípio da integralidade do SUS66 Ayres JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saúde soc. 2004 [acesso em 2022 abr 19]; 13(3):16-29. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/nvGMcCJJmpSSRjsGLhH8fmh/abstract/?lang=pt.
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, ao considerar o usuário como um indivíduo cultural e socialmente situado, respeitando sua visão de mundo no processo saúde-doença; posto que, diante dos desafios de ordem psicossocial, colocados pela obesidade infantil, manifestamos uma preocupação em não reproduzir no projeto uma lógica normativa e verticalizada, ainda comum na educação em saúde77 Valla VV, Stotz EN. Participação popular, Educação e Saúde: Teoria e prática. Rio de Janeiro: RelumeDumará; 1993., incluindo a educação alimentar e nutricional.

Debatemos acerca das novas configurações de família na contemporaneidade99 Barros MML. Família e Gerações. Rio de Janeiro: FGV Editora; 2006. e dos seus reflexos na educação das crianças. Além disso, levantamos questões sobre ‘um modo de funcionar da família’, quando, por exemplo, o adulto oferece comida para a criança por ‘pena’ ou ‘culpa’, visando a um ‘reparo’ de ordem emocional ou transgeracional. Refletimos também sobre o lugar das tecnologias e dos meios de comunicação, dos jogos, dos vídeos e das redes sociais no entretenimento das crianças e dos jovens na atualidade, relacionando-os com o retraimento do brincar na rua e nos espaços públicos, em razão da violência urbana.

Por fim, abordamos a questão de a comida/ alimentação expressar a cultura de determinado grupo social. Sabíamos que as práticas alimentares não dizem respeito somente ao ato de comer. O plantio, a compra, o modo de preparo, o que se come, como se come, com que frequência, em qual horário, como é absorvido, tudo isso reflete práticas sociais e culturais1010 Rotenberg S, Vargas S. Práticas alimentares e o cuidado da saúde: da alimentação da criança à alimentação da família. Rev. Bras. Saúde Matern. Infant. 2004 [acesso em 2019 mar 15]; 4(1):85-94. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbsmi/a/N6QJK6M9SVbYCXqGyTBfbYg/?lang=pt&format=pdf.
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Realizamos as ações do projeto-piloto de setembro a dezembro de 2017, estruturando o trabalho a partir de dois grupos de atendimento psicológico e nutricional – um de responsáveis e outro de crianças e adolescentes. Os encontros dos grupos aconteceram quinzenalmente (com alguns encontros conjuntos de responsáveis e filhos), alternados com atividades da equipe para planejamento e estudo. Planejamos um total de seis encontros, com uma intencionalidade a cada encontro. Para tanto, inspiramo-nos na metodologia do Instituto de Arte Tear, já que a arte amplia as sensibilidades, os campos simbólicos e imaginários, desenvolvendo os processos cognitivos e a capacidade crítica.

Nesse sentido, os encontros foram estruturados em quatro módulos lúdicos e arte-educativos, contemplando quatro eixos temáticos: 1) relações familiares e o lugar da criança na família; 2) corpo sensível e imagem corporal; 3) os sentidos do olfato, do paladar e da alimentação; 4) dinâmicas familiares e rotinas alimentares.

Para a abordagem do primeiro eixo, resolvemos lançar mão da ferramenta familiograma, instrumento fundamental para o profissional de saúde que trabalha com famílias, uma vez que permite descrever e ver como uma família funciona e interage1111 Gonçalves DA, Ballester D, Chiaverini DH, et al. Guia prático de matriciamento em saúde mental. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2011.. Nossos objetivos eram de obter uma representação gráfica com informações sobre a família, de maneira que tivéssemos uma ideia da composição, dos tipos de arranjos e vínculos, além de pistas sobre as influências da configuração familiar na obesidade infantil – isso porque observávamos que, em muitas famílias, havia várias figuras de autoridade, mas nenhuma ou poucas que assumissem a condução do tratamento da criança ou do adolescente. Para tal, apostamos na proposta da colagem, com figuras de pessoas e bichos recortadas de revistas, além de tinta guache e canetinha para a composição de desenhos em papel A3. Essa proposta foi feita com as crianças e as mães/ responsáveis, separadamente. Com isso, encontramos uma grande variedade de composições familiares, entre as próprias díades, mãe-filho, e entre o grupo.

No segundo eixo, corpo sensível e imagem corporal, visávamos proporcionar para as crianças e os adolescentes uma experiência de ‘renascimento sensível’, dando espaço para um conjunto de sensações mobilizadoras de marcas corporais inconscientes, a fim de acessar emoções e sentimentos em uma rememoração do corpo pelo corpo. Afinal, com as interrogações levantadas por Resende1212 Resende C. O que pode um corpo? O método Angel Vianna de conscientização do movimento como um instrumento terapêutico. Physis. 2008 [acesso em 2019 mar 15]; 18(3):563-574. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/fPHMqrBntmTMtPx5rFyvLFQ/abstract/?lang=pt.
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a partir do método Angel Vianna: ‘o que pode um corpo?’, a autora nos mostra que a conscientização do movimento “pode, via o corpo, contribuir para a integração do psicossoma, ampliando a saúde do indivíduo enquanto capacidade normativa e criativa”1212 Resende C. O que pode um corpo? O método Angel Vianna de conscientização do movimento como um instrumento terapêutico. Physis. 2008 [acesso em 2019 mar 15]; 18(3):563-574. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/fPHMqrBntmTMtPx5rFyvLFQ/abstract/?lang=pt.
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Destaca-se ainda que o processo lúdico se caracteriza como um momento de “acordar o corpo”, pois permite a saída de um “estado de tensão” para um de “atenção com o corpo”, uma “presença corporal”1212 Resende C. O que pode um corpo? O método Angel Vianna de conscientização do movimento como um instrumento terapêutico. Physis. 2008 [acesso em 2019 mar 15]; 18(3):563-574. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/fPHMqrBntmTMtPx5rFyvLFQ/abstract/?lang=pt.
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(567). Além disso, Resende1212 Resende C. O que pode um corpo? O método Angel Vianna de conscientização do movimento como um instrumento terapêutico. Physis. 2008 [acesso em 2019 mar 15]; 18(3):563-574. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/fPHMqrBntmTMtPx5rFyvLFQ/abstract/?lang=pt.
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apresenta a possibilidade da busca de acesso ao corpo singular e único a partir dos ossos, suas referências anatômicas em conexão com o movimento de cada um.

Quando começamos a despertar e abrir espaços no corpo, a busca por novas possibilidades de movimento vai-se transformando numa necessidade diária para conquistar um corpo mais livre e capaz de se integrar com as suas sensações. Aguçar a capacidade proprioceptiva é poder ir ao encontro da nossa singularidade, (re)conhecendo os limites, capacidades, memórias e vivências do corpo, respeitando-os1212 Resende C. O que pode um corpo? O método Angel Vianna de conscientização do movimento como um instrumento terapêutico. Physis. 2008 [acesso em 2019 mar 15]; 18(3):563-574. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/fPHMqrBntmTMtPx5rFyvLFQ/abstract/?lang=pt.
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De posse dessa perspectiva sobre o corpo e a corporeidade, nossa hipótese de trabalho, no campo psicológico, era a de que a interrupção do cuidado ou a sua descontinuidade nos primeiros anos de vida geram efeitos específicos no psicossoma. Assim, nosso questionamento inicial era: como essas marcas e rupturas na continuidade da experiência do cuidado na mais tenra idade podem estar relacionadas com a obesidade?

Seguindo a abordagem da Psicanálise do Sensível de Ivanise Fontes1313 Fontes I. A descoberta de si mesmo na visão da Psicanálise do sensível. São Paulo: Ideias & Letras; 2017., algumas pistas surgiram. Consideramos a possibilidade de que, em face de vivências de descontinuidade no cuidado na relação mãe-cuidador/a-bebê, o sujeito desamparado busca conforto psíquico no ato de comer, na produção de um corpo farto, redondo e aconchegante, na busca por um preenchimento, um ‘autoamparo’, com a gordura operando como uma espécie de ‘prótese psíquica’, conforme postula a autora1313 Fontes I. A descoberta de si mesmo na visão da Psicanálise do sensível. São Paulo: Ideias & Letras; 2017..

Essas perspectivas teórico-metodológicas se conjugaram com a pesquisa etnográfica, orientada pelo aporte socioantropológico, com uso sistemático de diários de campo, realizados no período de 2017 a 2019.

Após a etapa-piloto, o projeto no mesmo formato de grupo foi realizado de janeiro a junho de 2018. A partir de julho de 2018 até o início da pandemia da Covid-19, quando o grupo foi interrompido, desenhamos um novo formato de trabalho. Atrelamos o dia do grupo às consultas ambulatoriais de nutrição, visando à adesão das crianças e seus responsáveis aos grupos. Optamos pelo brincar livre com as crianças, roda de conversa com as mães e alguns momentos de atividades conjuntas voltadas à educação alimentar e nutricional.

A pesquisa de tipo etnográfica busca a compreensão e o sentido dos fenômenos sociais do ponto de vista êmico, ou seja, procura o significado das práticas pesquisadas para os praticantes. Ademais, o papel do pesquisador é o de interpretar esses fenômenos, e não simplesmente constatar a sua existência55 Victora CG, Knauth DR, Hassen MNA. Pesquisa qualitativa em saúde: uma introdução ao tema. Porto Alegre: Tomo Editorial; 2000..

Esta abordagem implica uma relação social entre o pesquisador e os pesquisados, considerando que a presença do observador é parte do evento observado. Portanto, a qualidade dos dados depende, em grande parte, da maneira como essa interação social se estabelece, em uma relação de proximidade, confiança, baseada em princípios éticos55 Victora CG, Knauth DR, Hassen MNA. Pesquisa qualitativa em saúde: uma introdução ao tema. Porto Alegre: Tomo Editorial; 2000..

A observação participante é um elemento-chave nesse tipo de pesquisa, já que se considera que muitos elementos não podem ser apreendidos por meio da fala ou da escrita. O ambiente, os comportamentos individuais e grupais, a linguagem não verbal, a sequência e a temporalidade em que ocorrem os eventos são fundamentais não apenas como dados em si, mas como subsídios para a interpretação posterior deles55 Victora CG, Knauth DR, Hassen MNA. Pesquisa qualitativa em saúde: uma introdução ao tema. Porto Alegre: Tomo Editorial; 2000.. Dessa maneira, o investigador busca captar o ‘excedente de sentido’1414 Oliveira RC. O trabalho do Antropólogo: olhar, ouvir, escrever. Rev. antropol. 1996 [acesso em 2022 set 27]; 39(1):13-37. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/ra/article/view/111579.
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, atento às afetações do campo1515 Siqueira P, Favret-Saada J. “Ser afetado”, de Jeanne Favret-Saada. Cad. Campo (São Paulo 1991). 2005 [acesso em 2022 set 27]; 13(13):155-61. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/cadernosdecampo/article/view/50263.
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Resultados do processo de trabalho

A partir dos horizontes teóricos e metodológicos acima descritos, propusemos em uma das atividades que as crianças e os adolescentes vivessem um ‘renascimento’, a partir da entrada e da saída de uma caixa de papelão de grandes dimensões, que as englobasse, proporcionando-as contorno e proteção. Do lado de fora, eu, estagiárias e demais crianças do grupo ficávamos aguardando o ‘tempo’ de nascimento de cada um(a), interagindo a partir de singelos toques na caixa, simulando os sons e os movimentos do mundo externo, capazes de afetar a ‘vida intrauterina’.

A criança, assim que resolvia ‘nascer’ da caixa-útero, era imediatamente acolhida por mim e pelo nutricionista em uma manta macia de microfibra estendida no chão, em que, de bruços, recebia o toque e o acolhimento corporal com outra manta suave.

O acolhimento corporal, criado pela pesquisadora Núbia Barbosa, da Escola de Dança Angel Vianna, consiste no contorno do corpo com a manta dobrada, criando, entre a mão e o tecido macio, invólucros das partes da pessoa. O toque terapêutico da mão, mediado pela manta macia, traz uma intencionalidade de acessar, no corpo, marcas expressas nas cadeias musculares, dimensões inconscientes de experiências emocionais dos primórdios da vida e impressões corporais mais recentes.

Para Didier Anzieu1616 Anzieu D. O Eu-pele. São Paulo: Casa do Psicólogo; 1988., autor do clássico ‘O Eu-pele’, a pele é a base orgânica que auxilia a fundamentação de funções específicas para futuras organizações do Eu. O sentido mais intimamente associado à pele, o tato, é o primeiro a desenvolver-se no embrião humano. Entre outros aspectos, ele nos ensina a diferença entre o eu e o outro, a diferença entre um fora e um dentro de nós1717 Ferreira FR, Callado LM. O afeto do toque: os benefícios fisiológicos desencadeados nos recém nascidos. Rev Med SaudeBrasilia. 2013 [acesso em 2022 abr 19]; 2(2):112‐119. Disponível em: https://portalrevistas.ucb.br/index.php/rmsbr/article/view/4015/2677.
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. Segundo Winnicott1818 Winnicott DW. O brincar & a realidade. Rio de Janeiro: Imago; 1975., o holding seria o próprio contato físico, no sentido de o bebê se sentir amparado e seguro.

Segundo Fontes et al.1919 Fontes I, Roxo M, Soares MCS, et al. Virando gente: a história do nascimento psíquico. São Paulo: Ideias & Letras; 2014., para que o fio de continuidade da existência seja assegurado, vários processos estão envolvidos, tanto no próprio corpo do bebê quanto através do corpo de quem o cuida, no caso, inicialmente, a mãe. A palavra-chave é continência, um contorno-corpo que se dá entre a mãe e o bebê. A experiência de envelopamento se reflete no sentir que existe um ‘em volta de si’. É na busca dessa gradativa experiência de continência que o filho poderá confiar corporal e psiquicamente em sua sobrevivência. Segundo as autoras, um envelope corpóreo-psíquico dará ao bebê a certeza de não sucumbir às angústias muito primitivas.

Essa experiência de ‘envelopamento’ foi vivida por todas as crianças e os adolescentes; em seguida, oferecemos a cada um deles um pedaço de argila para que pudessem criar formas sobre o sentido/vivido no ‘nascimento’ da ‘caixa-útero’. Nota-se que não se tratava de criar uma representação artística literal do nascer, mas de ofertar um material de arte que as permitisse moldar, modular, ancorar sensações e sentimentos, possibilitando algum grau de elaboração e conforto no que se refere a uma experiência bastante forte e significativa.

Os efeitos dessa experiência, enquanto prática terapêutica, fizeram-se sentir em um encontro posterior, quando propusemos uma ‘roda de cheiros’, em uma vivência sensorial e olfativa voltada às crianças, aos adolescentes e às mães. Colocamos no interior de copos plásticos pequenos, separadamente, os mais variados cheiros relativos à experiência cotidiana: café, achocolatado, chiclete, essência de laranja, cravo, canela, cebola, alho etc., e fizemos uma roda para que os copos, tampados com um papel alumínio com pequenos furos, fossem cheirados por todos. Após a experiência olfativa individual, o cheiro/aroma era adivinhado e revelado pelo grupo.

Em seguida, convidamos os participantes para rememorar cheiros e gostos relacionados com a família e com a vida familiar. Foram muitas as memórias trazidas à tona. O cheiro de bolo saindo do forno na casa da avó, a receita passada por gerações, o cheiro de alho no feijão fresquinho, as reuniões de família, a mesa farta de comida, entre outras.

Posteriormente, dividimos os responsáveis/mães das crianças e dos adolescentes, formando grupos e colocando-os em salas separadas. Os responsáveis/mães foram para uma roda de conversa a fim de falar sobre o vivido, já as crianças e os adolescentes foram convidados a criar um enredo e um esquete com as memórias provocadas pelos diferentes cheiros. Explicamos que a dinâmica da atividade seria inspirada no Teatro Fórum, do Centro do Teatro do Oprimido (CTO). Essa metodologia estimula a criação de cenas com situações de opressão, que podem ser descritas como situações de discordância e impasse, envolvendo desigualdades de poder entre dois ou mais indivíduos. Tais situações são vistas como passíveis de mudança, a partir de posicionamentos diferenciados dos atores em cena e da ‘plateia’, que é convidada a atuar no lugar de determinados personagens da trama, especificamente, daqueles que são oprimidos. Em seguida, ofertamos objetos, adereços, roupas e perucas para que eles pudessem criar os cenários e as personagens.

É interessante notar que, sem qualquer direcionamento, os conflitos das três cenas criadas giraram em torno da alimentação. Outro aspecto curioso foi o fato de a caixa de papelão, usada no encontro anterior como caixa-útero, ter sido transformada em fogão nos três esquetes. Nesse processo, uma cena foi bastante emblemática. Na dramatização, um pai autoritário chega em casa alterado de bebida e, aos berros, dirige-se à mulher dizendo: cadê meu almoço, mulé? Já falei que quero comer! O homem se desloca para a cozinha e agride a mulher com empurrões e gritos na frente do filho pequeno. Quando o pai agride a mãe, o filho tenta se meter na briga, em defesa da mãe, porém, leva um safanão do pai, passando a ser alvo das agressões físicas e verbais do progenitor. Observa-se que, na cena, tal qual montada originalmente a partir do enredo criado pelo grupo, o filho teria de ficar passivo diante das agressões do pai, contudo, na repetição da cena, ocorre uma mudança.

Na cena seguinte, o filho pega a caixa de papelão, que até então figurava como um ‘fogão’ no cenário da cozinha, transformando-a, novamente, na ‘caixa-útero’. Posteriormente, deita a caixa, entra nela e pede para que a personagem da mãe fique de joelhos com a caixa encostada na sua barriga para que o ‘gestasse’. O pai irrompe a sala aos berros com a mulher, o filho sai subitamente da ‘caixa-útero’ e, corporalmente, enfrenta o pai, saindo da passividade que originalmente configurava o seu papel na cena, impedindo o desenrolar de mais violência no cenário doméstico. Fim de cena e da atividade do dia.

Essas cenas e seus enredos trazem uma questão recorrente nos grupos: a raiva e a agressividade (não ditas e não expressas), bem como a linguagem da violência em conflitos familiares, com destaque para aquelas que envolvem a alimentação. Tais temáticas se relacionam com o tema dos limites/regras, autoridade e cuidado familiar com relação às diferentes figuras de cuidado, comumente uma mãe/mulher/tia/avó que tenta manter os cuidados com a alimentação, sendo ela, geralmente, a que acompanha o filho/criança nas consultas de nutrição, e uma figura masculina, pai/avó/tio, que habitualmente burla as regras e oferece alimentos em tese proibidos, pelo valor calórico ou pela qualidade de ultraprocessado.

Observamos que, na medida em que havíamos cumprido o objetivo inicial de integrar a psicologia e a nutrição, a etapa seguinte veio acompanhada por uma demanda, por parte da chefia da nutrição, de renovados objetivos e ‘resultados mais concretos’. Algumas questões que atravessavam essa etapa eram: como provar que a criança ‘melhorou’, para além de impressões mais subjetivas afeitas ao âmbito emocional e ao trato interpessoal? O que explica a falta de adesão ao grupo, a despeito das dificuldades objetivas de deslocamento da clientela? Estamos atuando a serviço de que corpos? O ‘corpo saudável’/ magro, dentro de determinada norma social?

A partir de todas essas considerações e limites das práticas em saúde, muitas delas felizmente não resolvidas e alvo de calorosas discussões na equipe, o projeto, em sua última fase, apostou em alguns resultados anteriores e em premissas de atuação que ‘deram certo’. Uma delas foi a manutenção do brincar no momento de ‘integração’, com a proposta de atividades iniciais conjuntas com crianças e mães, antes de separá-las em grupo distintos. Acessar e despertar o corpo da díade (mãe-filho) com brincadeiras, brinquedos cantados e cirandas/danças circulares foi uma ‘regra’ a ser mantida, já que criava outra disponibilidade corporal para o trabalho, além de uma quebra de gelo nas relações.

Apesar de termos de lidar com esses constrangimentos advindos da lógica hegemônica do campo da saúde, do ponto de vista teórico-metodológico, o projeto manteve suas premissas. Inclusive, a abordagem do corpo foi ainda mais intensificada ao longo do tempo. Criamos uma convivência possível entre essas diferentes forças, não sem tensões. A manutenção de uma visada sensível e poética nunca ficou subsumida a uma educação em saúde ‘bancária’55 Victora CG, Knauth DR, Hassen MNA. Pesquisa qualitativa em saúde: uma introdução ao tema. Porto Alegre: Tomo Editorial; 2000., pretensamente racional e desafetada. Esse era, inclusive, o diferencial do projeto. Entendemos, coletivamente, que há de se aprender a fazer ‘com’: a psicologia com a nutrição, e vice-versa, o qualitativo com o quantitativo, a razão com a emoção, e as especialidades com o saber leigo, tão legítimo quanto o primeiro.

Discussão do trabalho e as cenas em debate

A partir das cenas protagonizadas e descritas nos resultados, torna-se importante sublinhar que o mais significativo foi dar espaço para a expressividade e para a criatividade diante dos efeitos do conflito no corpo e na vida. A partir do acolhimento corporal, percebemos que a criança, ao ser ‘olhada’ por outros olhos e ‘abraçada’ por outros afetos que acolham a sua diferença, pôde, então, criar um olhar de si por meio das sensações corporais, o que foi fundamental.Sabemos em Winnicott2020 Winnicott DW. Desenvolvimento emocional primitivo. In: Winnicott DW. Da pediatria à psicanálise: obras escolhidas. Rio de Janeiro: Imago; 2000. p. 218-232. que é a partir do somático que há uma integração gradual na direção de um self organizado. Assim, “abrir os espaços do corpo e reorganizá-lo no movimento é organizar o indivíduo como um todo”1212 Resende C. O que pode um corpo? O método Angel Vianna de conscientização do movimento como um instrumento terapêutico. Physis. 2008 [acesso em 2019 mar 15]; 18(3):563-574. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/fPHMqrBntmTMtPx5rFyvLFQ/abstract/?lang=pt.
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A questão principal é dar passagem aos afetos, e, mais que isso, ‘performar’ esse afeto relacionalmente. Compreendendo que:

[...] é pelas experimentações sensíveis, através dos movimentos e da captação dos ritmos particulares, que seriam recuperados os vividos dos estágios primários da existência, possibilitando um corpo mais poroso às afetações do mundo2121 Borges HMOC. Sobre o movimento: o corpo e a clínica. [tese]. Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro; 2009.(29).

Nota-se que a exclusão do indivíduo gordo está diretamente relacionada com o lugar que o corpo passou a ocupar desde a modernidade. Conforme salienta Hélia Borges, “o corpo se tornou o lugar privilegiado das intervenções efetivadas pelo biopoder visando à otimização da vida”2121 Borges HMOC. Sobre o movimento: o corpo e a clínica. [tese]. Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro; 2009.(36).

A autora2121 Borges HMOC. Sobre o movimento: o corpo e a clínica. [tese]. Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro; 2009. faz referência direta às obras de Foucault (1985, 1999), que mostrou como, na época clássica, o corpo, individual e coletivo, passou a ser alvo de uma gestão minuciosa, estatal, por intermédio de tecnologias de poder, a disciplina e a biopolítica, com o intuito de implementação de práticas regulatórias de manutenção da vida e preservação da espécie. A dimensão utilitária da criação social de corpos hábeis (dóceis) para o front de guerra, o trabalho nas fábricas e o rendimento escolar refletem esse momento histórico, econômico e social, produzindo modelos normativos que, até hoje, produzem corporeidades e subjetividades, incluindo e excluindo, a depender de suas ‘qualidades’, corpos individuais e coletivos.

A partir do trabalho descrito, ainda podemos refletir: o que seria a melhora da criança? Emagrecer? Comunicar-se melhor nas consultas e expressar seus desejos, dificuldades e insatisfações? Engajar-se ativamente no tratamento nutricional? Além dos ‘riscos’ orgânicos, presentes ou possíveis com o tempo de convívio com o sobrepeso ou a obesidade, qual é ‘o problema’ de ser ‘gordo/a’ na infância e adolescência? Quais são os demais ‘riscos’ dessa condição de habitar um corpo infantil e dissidente? Essas questões valem do mesmo modo para meninos e meninas? Com o gênero, a cor/ raça joga um papel importante na construção dessa perspectiva interseccional do corpo?

Desprovidos de respostas a todas essas questões, o fantasma da normatividade em saúde nos rondava ao mesmo tempo que lutávamos pela não banalização de um problema de saúde pública: a obesidade infantil. Afinal, não estamos em um serviço de saúde voltado à prevenção e ao cuidado do sobrepeso e da obesidade?

O emagrecimento e a ‘melhora’ psicossocial dele advindo são um horizonte a ser perseguido, um aspecto impossível de ser desconsiderado no projeto. A ideia de poder e ter que ‘provar resultados’ com o projeto apareceu como uma ‘necessidade’, sobretudo, porque temos como meta a criação de um centro de referência voltado à obesidade infantil na universidade. Desse modo, como afirmar que o projeto modifica o quadro da obesidade infantil das crianças e dos adolescentes? Em que medida se dá essa modificação? O emagrecimento deve ser visto como o fim último do trabalho?

Tínhamos mais perguntas do que respostas. No entanto, é importante dizer que estar em um serviço de saúde traz como premissa uma ‘melhora de saúde’, e que ‘saúde’, comumente, ainda que não exclusivamente, ainda é percebida como ausência de doença, descrita e referida a partir de marcadores biomédicos e laboratoriais.

Algumas pistas para considerações finais

Durante o trabalho dos grupos, observamos nas crianças e nos adolescentes uma espécie de ‘alienação’ de si mesmas com relação à imagem corporal e à propriocepção, do corpo presente e vivo. As ações do projeto, portanto, foram pensadas como propulsoras dessa consciência corporal, começando-se pela pele, pelo invólucro sensível e estruturante do corpo no mundo. Mantas macias que acolhem a globalidade do ser, luvas táteis que acariciam suas partes, almofadas que afagam os membros em amparo e contorno, na busca por envelopar esses corpos desconectados, desconexos de suas pertenças no mundo.

Trabalhamos, em muitos momentos, com a díade mãe-criança, entendendo o funcionamento complexo dessa ligação psicossomática que, em alguns casos, parece impedir que as crianças se delineiem na sua singularidade (psíquica e somática).

Daniel Stern2222 Stern D. Diário de um bebê. O que seu filho vê, sente e vivencia. Porto Alegre: Artes Médicas; 1991. aponta a importância de os pais/cuidadores inventarem uma vida interior para o seu bebê. Para o autor, essas ‘fantasias’ criadas a partir do passado e do presente dos próprios pais refletem aspirações, temores e desejos profundos. Entretanto, em algum momento da vida da criança, os pais precisarão reconhecer a singularidade do/a filho/a, suas características únicas, rompendo com essas projeções iniciais.

No campo em estudo, observamos que dimensões transgeracionais, psicológicas/ traumáticas e sociais parecem jogar um papel fundamental na dificuldade que algumas mães apresentam em conferir espaços de singularização para os/as filhos/as.

Winnicott2323 Winnicott DW. O Mundo em Pequenas Doses. In: Winnicott DW. A Criança e o seu Mundo. Rio de Janeiro: Zahar; 1965. p. 76-82., em seu texto ‘O Mundo em Pequenas Doses’, destaca o lugar da mãe no processo de constituição das fronteiras corporais e da integração psicossomática do/a filho/a, da entrada da criança no mundo objetivo, intersubjetivo e interior.

[...] façamos então a pergunta: por que a pessoa normal e sadia tem, simultaneamente, a sensação da realidade do mundo e da realidade do que é imaginativo e pessoal? O que aconteceu para que você e eu ficássemos assim? É uma grande vantagem ser assim, pois desta maneira podemos usar a nossa imaginação para tornar o mundo mais emocionante e usar o mundo real para exercer a nossa capacidade imaginativa. Será que crescemos assim mesmo? Bem, o que quero dizer é que não crescemos assim se, no princípio, cada um de nós não tiver uma mãe capaz de nos apresentar ao mundo em pequenas doses2323 Winnicott DW. O Mundo em Pequenas Doses. In: Winnicott DW. A Criança e o seu Mundo. Rio de Janeiro: Zahar; 1965. p. 76-82.(77).

Nesse sentido, o brincar é a base para o estabelecimento da relação mãe-filho, sendo instrumento fundamental para: uma práxis corporal adequada; a formação da consciência corporal; o desenvolvimento sensório-motor; a construção espacial; a construção da consciência de si e da consciência social2424 Maturana HR, Verden-Zöller G. Amor y juego: Fundamentos olvidados de lo humano. Santiago: Instituto de Terapia Cognitiva; 1993..

O brincar como linguagem preferencial da criança, um elemento de conexão cultural presente em todos os grupos sociais, aparece como um meio de criação de vínculos, como reflete a própria etimologia do termo originário do latim: vinculum. No serviço de saúde, o brincar ajuda no reposicionamento de relações hierarquizadas, afinal, todos brincam juntos, profissionais de saúde, estagiários/as, crianças e mães.

Winnicott1818 Winnicott DW. O brincar & a realidade. Rio de Janeiro: Imago; 1975. afirma que o lugar do brincar é a área intermediária da experiência – entre o mundo interno e o externo –, um espaço no qual se dão todas as vivências criativas. Ao longo de sua vida, o indivíduo vai transitando por esse espaço, que o autor denominou de ‘espaço potencial’.

Na área das ciências humanas, diversas publicações sobre o fenômeno lúdico descrevem as funções terapêuticas do brincar, visto que ele possibilita: a expressão de sentimentos, preferências, receios e hábitos; a mediação entre o mundo familiar e situações novas ou ameaçadoras; e a elaboração de experiências desconhecidas ou desagradáveis2525 Mitre RMA, Gomes R. A promoção do brincar no contexto da hospitalização infantil como ação de saúde. Ciênc. Saúde Colet. 2004 [acesso em 2019 mar 11]; 9(1):147-154. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/CWNCmqSjFFzL4CfgTWQcFnK/?lang=pt.
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O riso solto, o corpo livre e a descontração assumem o lugar no espaço do serviço de saúde em contraposição à rigidez das práticas de saúde normativas. O brincar e o movimento permitem falar de comida, alimentação e nutrição em diálogo com ‘outros’ saberes, especializados e leigos. A normatividade do campo da saúde é relativizada, e as noções de ‘saúde’ e ‘doença’ passam a ser contextualizadas por sujeitos históricos, sociais e culturais.

Essa perspectiva vai ao encontro da noção de integralidade que alicerça e embasa o SUS, além de constituir um solo comum aos profissionais envolvidos no projeto.

A integralidade da atenção envolve a compreensão da noção de ampliação da clínica, o conhecimento sobre a realidade, o trabalho em equipe multiprofissional e transdisciplinar e a ação intersetorial. Completa a integralidade do atendimento, a noção de humanização, recuperando para a produção do conhecimento e configuração da formação, a reconciliação entre o conhecimento científico e as humanidades, entre ciência da saúde e arte da alteridade2626 Ceccim R, Feuerwerker L. O Quadrilátero da Formação para a Área da Saúde: Ensino, Gestão, Atenção e Controle Social. Physis. 2004 [acesso em 2019 mar 11]; 14(1):41-65. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/GtNSGFwY4hzh9G9cGgDjqMp/?format=pdf&lang=pt.
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Considerando que o conceito de integralidade abarca desde os aspectos organizacionais, da atenção à saúde em uma rede hierarquizada e complementar, até os elementos humanitários, na compreensão de um indivíduo composto por dimensões subjetivas, culturais, sociais e históricas, o cuidado é pensado de modo particular; diferenciado da assistência médico-curativa, centrada na doença e nas práticas que as legitimam. Assim, falar de cuidado é considerar os ‘projetos de felicidade’ envolvidos no ato de tratar2727 Ayres JR. Organização das Ações de Atenção em Saúde: modelos e práticas. Saúde soc. 2009 [acesso em 2022 abr 19]; 18(2):11-23. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/QZX9gH7KmdDvBpfDBSdRVFP/abstract/?lang=pt.
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Ao tomarmos os projetos de felicidade como horizonte normativo, temos, como visto, de renovar nossas técnicas de cuidado, ampliando inclusive os saberes que ativamente buscaremos utilizar no cotidiano de nosso trabalho em saúde. [...] Mas vamos especialmente precisar usar a sabedoria prática, ou seja, precisaremos fundir horizontes entre nossos saberes técnicos e os saberes que as pessoas de quem cuidamos acumularam sobre si próprias e seus projetos de felicidade, com a abertura necessária para que, do diálogo entre esses saberes, surjam boas escolhas sobre o quê e como fazer nas diversas situações de cuidado2727 Ayres JR. Organização das Ações de Atenção em Saúde: modelos e práticas. Saúde soc. 2009 [acesso em 2022 abr 19]; 18(2):11-23. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/QZX9gH7KmdDvBpfDBSdRVFP/abstract/?lang=pt.
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Essa compreensão de cuidado alicerçou outro princípio norteador do projeto, o de educação (popular) em saúde. Seguindo a ideologia de Paulo Feire, essa é pautada no diálogo e na troca de saberes entre educador e educando, em que o saber popular é valorizado e o cerne do debate está nos temas vivenciados pela comunidade que levem a mobilização social para uma vida melhor77 Valla VV, Stotz EN. Participação popular, Educação e Saúde: Teoria e prática. Rio de Janeiro: RelumeDumará; 1993..

No caso do projeto aqui descrito, todos esses saberes antes explicitados apareceram conjugados, em uma atuação interdisciplinar. A educação pela sensível aposta no estímulo sensorial (dos sentidos) para ‘tocar’ a memória da experiência de cada um2828 Bondía JL. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Rev. Bras. Educ. 2002 [acesso em 2019 mar 23]; 1(19):20-28, Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbedu/a/Ycc5QDzZKcYVspCNspZVDxC/?format=pdf&lang=pt.
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A arte, com a intencionalidade de abrir espaço para uma vivência cinestésica e tátil, por exemplo, pode ser terapêutica, pois permite a simbolização, o acesso aos conteúdos inconscientes, sem necessariamente traduzi-los em palavras ou material inteligível racionalmente. Tais aspectos podem e devem ser perpassados pela afetividade, pela alegria do encontro, com o outro e no grupo, pelo contato com um espaço que não é o euclidiano e um tempo que não é o cronológico.

Nessa perspectiva, qual é a importância de ampliar os sentidos? Entendidos aqui na sua dupla acepção: de aparelho sensorial, conectivo com o mundo; e de significação cultural/ social do ser no mundo. Qual é a importância de perceber, para além do que se entende como ato cognitivo/racional? Qual a relevância de uma ativação plurissensorial, da pele, espaço-existência em que se inscrevem e modulam experiências primordiais, dos primeiros anos de vida, e dos anos que se seguem até o fim da existência? Esse giro do olhar nos é oferecido por Hubert Godard2929 Godard H. Olhar Cego: entrevista com Hubert Godard, por Suely Rolnik. In: Rolnik S. Lygia Clark: da obra ao acontecimento. Nós somos o molde. A você cabe o sopro. São Paulo: Pinacoteca do Estado de São Paulo; 2006. p. 73-79. em seu ensaio ‘Olhar Cego’. O autor nos fala da importância de sair do âmbito do ‘olhar neurótico’ e dar lugar às outras perspectivas de nós mesmos, do outro e do mundo.

Percebemos que reconhecer o corpo/pele em que se habita, saber possuir um esqueleto ósseo e um fibroso que estrutura um corpo intercambiável, pois aberto para o mundo2525 Mitre RMA, Gomes R. A promoção do brincar no contexto da hospitalização infantil como ação de saúde. Ciênc. Saúde Colet. 2004 [acesso em 2019 mar 11]; 9(1):147-154. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/CWNCmqSjFFzL4CfgTWQcFnK/?lang=pt.
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, que pode ser cada vez mais receptivo, ágil, permeável e flexivo, é um caminho profícuo para a lida com corpos dissidentes. Seguindo Georges Canguilhem3030 Canguilhem G. O normal e o patológico. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2006., e o seu célebre conceito de ‘normatividade’, a saúde deixa de ser medida a partir de normas externas preestabelecidas para ser referida à capacidade do indivíduo de instaurar novas normas ante as demandas do meio. É sempre o indivíduo que deve ser tomado como referência.

  • Suporte financeiro: não houve

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    Dez 2022

Histórico

  • Recebido
    21 Abr 2022
  • Aceito
    17 Out 2022
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