Distanciamento social em contextos urbanos na pandemia de Covid-19: desafios para o campo da saúde mental

Social distancing in urban contexts in the COVID-19 pandemic: challenges for the field of mental health

Maria Lúcia Magalhães Bosi Erinaldo Domingos Alves Sobre os autores

Resumo

Neste artigo, analisamos o distanciamento social, principal ação preventiva na pandemia de Covid-19, como fenômeno que ultrapassa sua demarcação como medida sanitária, revelando-se como experiência humana desdobrada em sofrimentos psíquicos diversos, desafiando sob muitas formas o campo da saúde mental. Situamos essa problemática no cenário brasileiro, periférico no capitalismo globalizado, contextualizado na hipermodernidade, no qual sobressai o modo de vida urbano, marcado por desigualdades e produtor de vulnerabilidades que se evidenciam no combate à pandemia, expressandose em sofrimentos e transtornos que desafiam o campo da saúde mental coletiva. Apontamos reflexões e subsídios para a ampliação desse campo, sob uma perspectiva crítica e complexa, concernentes à produção de conhecimentos e do cuidado, focalizando a urbanidade como dimensão analítica central na compreensão do distanciamento. Ilustramos com alguns desafios e também possibilidades de reinvenção em saúde mental, no contexto da pandemia de Covid-19, focalizando tanto ações voltadas à esfera coletiva, em escala macro, na rede pública de saúde, como nos encontros constitutivos do processo de cuidado, buscando subsidiar uma clínica ampliada nesse contexto.

Palavras-Chave:
Saúde mental; Saúde pública; Pandemia Covid-19; Sistemas de saúde; Urbanidade

Abstract

In this article, we examine social distancing, the main preventive action in the Covid-19 pandemic, as a phenomenon that goes beyond its demarcation as a health measure, revealing itself as a human experience unfolded in various psychological sufferings, challenging the field of Mental Health in many ways. The analysis places this subject in the Brazilian scenario, peripheral in globalized capitalism, contextualized in hypermodernity, in which the urban way of life, stands out, marked by inequalities and vulnerabilities that are evident in the fight against the pandemic, expressing itself in suffering and disorders that challenge the field collective mental health. We point out reflections and subsidies for the expansion of this field, from a critical and complex perspective, concerning the production of knowledge and care practices, focusing on urbanity as a central analytical dimension in the understanding of social distancing. We illustrate with some challenges and possibilities of reinventing mental health, in the context of the Covid-19 pandemic, focusing both on actions aimed at the collective sphere, on a macro scale, in the public health network, as well as in the constitutive meetings of the care process, seeking subsidize an expanded clinic in this context.

Keywords:
Mental health; Public health; Covid-19 pandemic; Health systems; Urbanity

Introdução

Antes de iniciarmos a análise em tela, cabe uma ressalva: é preciso reconhecer que a pandemia de Covid-19 é um processo ainda em curso, desdobrando-se e surpreendendo-nos com novos elementos a cada dia. Analisá-lo neste momento, apesar de já termos ultrapassado a marca das 620.000 mortes e 22,3 milhões11Atualizamos os dados de prevalência e mortalidade por COVID, mas registramos que o artigo foi construído quando tínhamos 300.000 mortes e 12 milhões de casos no Brasil, portanto, em um momento em que a ressalva feita no parágrafo se fazia ainda mais pertinente. No momento desta revisão, a cifra alcança cerca de 700.000 mortes no país. de casos no Brasil, dificulta um maior amadurecimento sobre sua natureza, sua complexidade e seus contornos como fenômeno, bem como a amplitude dos seus desfechos nos planos biopsíquico e sócio-histórico. É um desafio falar sobre aquilo que ainda está se delineando e cujos limites temporais são difíceis de prever. Mais ainda quando estamos imersos no fenômeno, porque exige um exercício muito refinado de reflexividade. Karel Kosik, na obra “Dialética do Concreto”, sintetiza esse esforço, ao dizer: “É sabido como é cansativo elaborar cientificamente os acontecimentos contemporâneos, enquanto a análise dos acontecimentos passados é relativamente mais fácil porque a própria realidade já se incumbiu de fazer uma certa eliminação e crítica” (2002, p. 28; grifo do autor).

Cientes dos riscos de uma análise ante esses limites, decidimo-nos a fazê-la, concebendo-a como aproximações, ou melhor, o “possível de hoje”. São, portanto, anotações, subsídios, direcionadas a reflexões mais densas no campo da saúde mental coletiva que o tempo permitirá. Escolhemos um itinerário que procura situar a pandemia de Covid-19 e o distanciamento social para além de medida sanitária, recuperando elementos históricos e alguns nexos com a sociedade contemporânea, na qual o modo de vida urbano predomina, conferindo destaque ao sofrimento psíquico no urbano, como um dos seus desdobramentos, de modo a apontar subsídios para o campo da saúde mental, concebido como espaço específico de produção de saber e de um amplo espectro de práticas de cuidado.

Pandemia de Covid-19 e distanciamento social: contextualização histórica

No Brasil, março de dois mil e vinte transformou inúmeras estruturas operantes em inércia coletiva. Ao redor do globo terrestre, um vírus com forte capacidade de contágio e rápida propagação antagonizou o cenário mundial e colonizou grande parte dos países ocidentais e orientais, gerando a pandemia de Covid-19. Esta é uma doença causada pelo coronavírus Sars-CoV-2, denominado como o “novo coronavírus”, que acarreta um quadro clínico que varia de infecções assintomáticas a quadros respiratórios graves, levando à alta letalidade, sobretudo em grupos vulneráveis (OPAS, 2020aORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE. Folha informativa - Covid-19 (doença causada pelo novo coronavírus). 26 maio 2020. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875.
https://www.paho.org/bra/index.php?optio...
). Em 11 de março de 2020, a OMS a reconhece como uma pandemia, resultando na mobilização de uma ampla rede de instituições e outras estruturas, nos diferentes países/continentes, voltadas à prevenção do contágio e consequente propagação veloz do vírus (OPAS, 2020bORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE. Histórico da pandemia de covid-19 - OPAS/OMS. [2020]. Disponível em: https://www.paho.org/pt/covid19/historico-da-pandemia-covid-19. Acesso em: 10 dez. 2021.
https://www.paho.org/pt/covid19/historic...
).

O Brasil se viu assim inserido em um cenário global ameaçador que, de forma um tanto esquemática, poderia ser representado por uma dinâmica entre três grandes grupos no que tange à adoção de ações e estratégias no contexto nacional. De um lado, (1) a rede de serviços de saúde [setor saúde] tentando sustentar a todo custo o bem-estar social; de outra parte, despontavam como forte eixo de tentativa de enfrentamento da problemática (2) iniciativas políticas, espaço que se transforma, desde então, num “campo de guerra” entre distintas posições envolvendo governadores, prefeitos, ministros e a própria presidência da República, concernentes às medidas sanitárias, dentre elas, a manutenção (ou não) do distanciamento. Iniciativas essas que se expressam em propostas e decretos que, mesmo contrariando o nível central, acabam paralisando o país, reverberando efeitos nas múltiplas esferas da vida social. Simultaneamente, a (3) ciência entra em cena como forte aliada no aniquilamento da propagação do Sars-CoV-2, envolvendo os cientistas numa incessante corrida em busca de uma vacina e no debate acerca de medicamentos voltados à prevenção e à cura da doença provocada pelo vírus, além de muitos deles se engajarem na “militância” em prol do distanciamento e demais medidas preventivas, não obstante a posição não consensual no interior da comunidade científica.

No que concerne às disputas internas, se considerado o conjunto da federação, a política em nível municipal e estadual vem se alinhando à saúde pública e à ciência em favor da superação da calamidade que se instalou em toda a sociedade, tentando, com isso, contemplar todos os segmentos populacionais. A esse respeito, é possível observar que essa dinâmica, protagonizada em vários estados e municípios, vem encontrando resistência da presidência da República e de seus aliados, causando perplexidade inclusive em nível internacional (THE LANCET, 2020THE LANCET. COVID-19 in Brazil: “So what?”, v. 395, ed. 10235, p. 1461, 09 maio 2020. Disponível em: https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(20)31095-3/fulltext.). Somando-se a isso, é preciso citar os movimentos que surgiram a favor e contra tentativas de contenção e ataque ao vírus e, consequentemente, do momento pandêmico. Um dos mais recentes exemplos é o “ativismo antivacina”, uma “reemergência”, conforme análise de Camargo Júnior (2020CAMARGO JUNIOR, K. R. Lá vamos nós outra vez: a reemergência do ativismo antivacina na Internet. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 36, supl. 2, e00037620, 2020.).

Nesse contexto, à falta, quando da eclosão, de um tratamento ou vacina eficaz, que somente mais tarde começaria a surgir como possibilidade, no aludido “campo de guerra”, emerge como medida sanitária e estratégia central, em nível global e desde o começo da pandemia, o distanciamento social que, em certos momentos, se radicaliza face o recrudescimento da pandemia (AQUINO, ., 2020AQUINO, E. M. et al. Medidas de distanciamento social no controle da pandemia de covid-19: potenciais impactos e desafios no brasil. Ciência & Saúde Coletiva, v. 25, p. 2423-2446, 5 jun. 2020. https://doi.org/10.1590/1413-81232020256.1.10502020.; NATIVIDADE ., 2020NATIVIDADE, M. dos S. et al. Distanciamento social e condições de vida na pandemia COVID-19 em Salvador-Bahia, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, v. 25, p. 3385-3392, 28 ago. 2020. https://doi.org/10.1590/1413-81232020259.22142020.). Esse distanciamento consiste na reclusão voluntária ou compulsória da população em seus lares com o propósito de evitar o contato social e limitar a circulação, acompanhada pela interrupção de serviços e fechamentos do comércio não essencial (GIAMATTEY ., 2021GIAMATTEY, M. E. P. et al. Rituais fúnebres na pandemia de COVID-19 e luto: possíveis reverberações. Escola Anna Nery, v. 26, 29 set. 2021. DOI 10.1590/2177-9465-EAN-2021-0208. Disponível em: http://www.scielo.br/j/ean/a/zGDv9BZ6Lc44fxJFBBz8ktC/?lang=pt. Acesso em: 10 dez. 2021.; WILDER-SMITH; FREEDMAN, 2020WILDER-SMITH, A.; FREEDMAN, D. O. Isolation, quarantine, social distancing and community containment: pivotal role for old-style public health measures in the novel coronavirus (2019-nCoV) outbreak. Journal of Travel Medicine, v. 27, n. 2, p. taaa020, 13 mar. 2020. https://doi.org/10.1093/jtm/taaa020.).

Sob o slogan “Fique em casa”, a vida entra em suspensão, de forma inédita, no Brasil e no mundo. Tal dispositivo pode animar um debate polêmico acerca das contradições entre proteção contra doenças e o direito de liberdade do indivíduo que, a nosso ver, não pode ser solucionado mediante abstrações, como certas análises buscam fazer, desconsiderando a ambiguidade inerente à questão. É imperioso acessar as experiências das pessoas, visando a recuperar os significados construídos socialmente, cabendo também um confronto com a segurança coletiva. Questão que resiste a análises lineares e superficiais, mas que fica anotada para futuras reflexões.

O cenário nacional emerge assim como espaço de intensa efervescência, no qual, ainda que não com a mesma ênfase se comparado à discussão econômica, epidemiológica e macro política, ganha grande destaque o tema do sofrimento psíquico e dos transtornos mentais no distanciamento social, interpelando diretamente o campo da saúde mental, visibilizando-o (CAMOZZATO, ., 2020CAMOZZATO, A. et al. Saúde mental e atenção psicossocial na pandemia COVID-19: psicofármacos na Covid 19. 2020.; DUARTE ., 2020DUARTE, M. de Q. et al. COVID-19 e os impactos na saúde mental: uma amostra do Rio Grande do Sul, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, v. 25, p. 3401-3411, 28 ago. 2020. https://doi.org/10.1590/1413-81232020259.16472020.). Uma rápida consulta mediante a ferramenta Google com a expressão “Saúde mental na Covid” aponta mais de 40 milhões de resultados, enquanto o Google Acadêmico alcança a marca de 10.000 artigos publicados. No primeiro espaço, recuperam-se artigos em jornais, revistas, informes, entrevistas, boletins, e um sem-número de matérias e imagens, evidenciando a saúde mental como campo de destaque e desdobramento da experiência de estar isolado.

Vários estudos concernentes ao sofrimento psíquico vem sendo desenvolvidos desde que a pandemia foi adquirindo tônus e se revelando em distintas camadas do campo da saúde mental: pesquisa que enfatiza a importância de se ter uma Atenção Básica à Saúde (APS) sólida suficiente para auxiliar no enfrentamento de problemas relacionados ao sofrimento psíquico decorrente da pandemia (MATTOS; PEREIRA; GOMES, 2021MATTOS, M. P.; PEREIRA, B. M.; GOMES, D. R. Um ensaio sobre a cegueira: saúde mental na atenção básica e as disputas diante da pandemia da covid-19. Saúde e Sociedade, v. 31, p. e200783, 17 dez. 2021. https://doi.org/10.1590/s0104-12902021200783.); estudo que desvela narrativas de mulheres que, além de lidar com afazeres domésticos, ainda precisam atuar na linha de frente como profissional de saúde, suportando todo o desgaste emocional já esperado em meio a uma pandemia (CANAVÊZ; FARIAS; LUCZINSKI, 2021CANAVÊZ, F.; FARIAS, C. P.; LUCZINSKI, G. F. A pandemia de Covid-19 narrada por mulheres: o que dizem as profissionais de saúde? Saúde em Debate, v. 45, p. 112-123, 22 nov. 2021. https://doi.org/10.1590/0103-11042021E109.); estudos que apontam as incontáveis disfunções emocionais, tais como ansiedade, depressão e estresse, em grupos diversos (MAIA; DIAS, 2020MAIA, B. R.; DIAS, P. C. Ansiedade, depressão e estresse em estudantes universitários: o impacto da COVID-19. Estudos de Psicologia (Campinas), v. 37, 18 maio 2020. DOI 10.1590/1982-0275202037e200067. Disponível em: http://www.scielo.br/j/estpsi/a/k9KTBz398jqfvDLby3QjTHJ/?format=html. Acesso em: 7 jan. 2022.; PEREIRA; SANTOS; MANENTI, 2020PEREIRA, H. P.; SANTOS, F. V.; MANENTI, M. A. Saúde mental de docentes em tempos de pandemia: os impactos das atividades remotas. Boletim de Conjuntura (BOCA), v. 3, n. 9, p. 26-32, 19 ago. 2020. https://doi.org/10.5281/zenodo.3986851.), dentre muitas outras problemáticas no campo da saúde mental.

Ainda focalizando o cenário alusivo ao tema, podemos identificar três momentos vitais dessa díade sofrimento psíquico e distanciamento social: (1) vida pré-distanciamento social; (2) vida em distanciamento social; e, como conjectura, (3) vida pós-distanciamento, na medida em que a vida não foi apenas enclausurada, mas, de certo modo, se tornou o próprio enclausuramento.

Na vida pré-distanciamento, os campos político, de saúde e científico recebiam um reconhecimento diferente daquele observado no momento atual. Para a maioria dos representantes mais emblemáticos do país, a saúde não merecia adquirir status de reconhecimento. A sigla SUS (Sistema Único de Saúde) não figurava nos discursos oficiais do Estado Brasileiro e nem nas vestimentas usadas em entrevistas, como prioridade ou mesmo dispositivo importante, sendo um setor seguidamente negligenciado no orçamento voltado a políticas públicas (FERNANDES; PEREIRA, 2020FERNANDES, G. A. de A. L.; PEREIRA, B. L. S. Os desafios do financiamento do enfrentamento à COVID-19 no SUS dentro do pacto federativo. Revista de Administração Pública, v. 54, p. 595-613, 28 ago. 2020. https://doi.org/10.1590/0034-761220200290.).

A política oficial na saúde, por sua vez, era visualizada pela percepção dos próprios políticos, majoritariamente, como uma política correta, apesar das iniquidades e negligência, enquanto alguns segmentos da sociedade percebiam e denunciavam irregularidades do sistema, sem que isso gerasse reinvindicações mais efetivas (SCHAEFER ., 2020SCHAEFER, B. M. et al. Ações governamentais contra o novo coronavírus: evidências dos estados brasileiros. Revista de Administração Pública, v. 54, p. 1429-1445, 2 nov. 2020. https://doi.org/10.1590/0034-761220200503.). Contudo, o constituir política, na vida pré-distanciamento, deveria ser efetivado como um bem-comum, “direito de todos e dever do estado” como previsto na Constituição, concepção essa que foi finalmente confrontada, exigindo um subsequente pôr em prática após o assolamento global da Covid-19. No distanciamento social, momento em que ainda nos encontramos enquanto redigimos essas reflexões, a saúde e a ciência sentem a implantação de outro status de reconhecimento (ainda que não consensual, mas hegemônico) no plano político e social: o de guardiões imprescindíveis na luta contra o colapso nacional provocado pela Covid-19.

Muitas vezes desacreditado como setor imprescindível, a saúde, mais precisamente o SUS, e a ciência, majoritariamente produzida em Universidades e Instituições Públicas, também representada em Associações e pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e mesmo Laboratórios da indústria farmacêutica, são instadas a se responsabilizarem pela assistência e busca de alternativas terapêuticas, ganhando notável visibilidade e realçando o seu importante papel frente à fatalidade (CARVALHEIRO, 2020CARVALHEIRO, J. D. R. Os coletivos da Covid-19. Estudos Avançados, v. 34, p. 7-24, 10 jul. 2020. https://doi.org/10.1590/s0103-4014.2020.3499.002.). No campo da saúde mental, atores da “linha de frente”, incluindo os trabalhadores em saúde mental, notadamente psiquiatras e psicólogos, tem um lugar destacado e ocupam um espaço expressivo nas mídias sociais, face o desafio de buscar estabilidade emocional num contexto inédito e ameaçador. São incontáveis as lives e impressionante o número de visualizações daquelas que acessamos em YouTube e Instagram, que cabe assinalar como ilustração da visibilidade que o campo recebe.

Desse modo, com a vida em colapso, o setor saúde (mental) pode ser – talvez pela primeira vez – reconhecido em território nacional, em escala bem maior do que de costume e convocado a propor soluções enérgicas para o cenário de colapso, e a ciência convidada a exercer seu papel [pós] moderno de representação da “verdade” (LUZ, 1988LUZ, M. T. Natural, racional, social: razão médica e racionalidade científica moderna. Rio de Janeiro: Campus, 1988.).

Quanto ao terceiro momento indicado na periodização, o pós-distanciamento social, são muitas e diversas as discussões e tentativas divinatórias sobretudo em relação a um “novo normal”, termo que começa a circular na sociedade e que nos indagamos sobre o que significa, uma vez que “normal” já é per si um conceito problemático. Contudo, não nos alongaremos sobre os devires, uma vez que nosso recorte é o período de distanciamento social, ou seja, o “aqui e agora”. Mas vale observar que já emergem reflexões acerca das opções feitas até o presente pelo modelo da globalização, tornando o enfrentamento da Covid-19 um desafio de proporções monumentais. Noutras palavras, convoca-nos à reflexão sobre a viabilidade de adesão a medidas sanitárias, quando estas disputam com a sobrevivência para aqueles que vivem nos “andares de baixo”

E eis a nossa distopia particular e nosso microcosmo do caos. A pandemia entra pela “porta da frente” [...] desembarca nos aeroportos [...] nos portos com navios de passageiros e de carga, se dissemina a partir dos “andares de cima”, mas não poupa, por isso, os “andares de baixo”. (RAMOS, 2020RAMOS, T. T. Pandemia é pandemia em qualquer lugar – vivendo a crise da Covid-19 de fora dos grandes centros. Espaço e Economia. Revista Brasileira de Geografia Econômica, v. 18, 2020., p. 5).

Num outro plano de análise do cenário nacional, a contenção populacional em seus lares desperta outras chagas sociais, as quais convocam a tríade: sociedade-distanciamento social-capitalismo.

Ao nos referirmos ao distanciamento social como medida de saúde pública, conforme já aludido, impõe-se resgatar sua natureza como experiência humana historicamente situada, o que permite inserir o sofrimento psíquico nas reflexões, ou seja, o campo da saúde mental. Com isso, rompe-se com o discurso biomédico de prevenção do risco, inserindo-se a intersubjetividade, haja vista que é de pessoas confinadas que falamos. Sendo assim, sob um modo de produção capitalista, seria melhor falarmos de distanciamentos, no plural, dada a dificuldade para considerar qualquer medida sanitária como experiência homogênea, face as desigualdades e vulnerabilidades observadas no nosso país.

Embora já tenhamos feito a ressalva que não nos ocuparemos, por ora, das consequências geradas pela pandemia da Covid-19, o que aqui mencionamos e já se evidencia no distanciamento, nos faz hipotetizar a emergência em larga escala, em uma sociedade pós-pandemia de Covid-19, de modalidades de sofrimento psíquico inusitadas advindas de experiências chocantes, imprinting de várias naturezas, como aqueles ocasionados pela impossibilidade inédita de ritualizar as despedidas, ausência de velórios e despedidas feitas pela internet, sobrecarga de muitos segmentos, notadamente trabalhadores da “linha de frente”, coveiros e muitos outros, que antecipam novas demandas de cuidado, em especial, na esfera da saúde mental.

Com isso, evidencia-se a necessidade de um preparo para reinventar a atuação em saúde mental em novos contextos. Tal cenário exige ampliação nas bases da saúde mental, tanto como campo científico, como na sua práxis profissional, abrangendo âmbitos onde reinam a desassistência e, provavelmente, reinarão os impactos mais avassaladores. Os mesmos cenários que se impõem como barreiras estruturais para medidas objetivas de proteção e prevenção; mas não somente neles, pois o sofrimento psíquico parece se generalizar e atinge as diversas classes, ainda que com especificidades.

O sistema capitalista como modo de produção, tendo como um dos seus componentes um mercado de trabalho específico, vem desvelando camadas, grosso modo, não tão visíveis das suas iniquidades. Tudo isso se expressa em sentimentos de medo, ansiedade, angústia, insegurança, desdobrando-se em sintomas de maior ou menor intensidade. Para Mbembe (2003MBEMBE, A. Necropolítica. 3 ed. São Paulo: n-1 edições, 2018.), a biopolítica – discutida a princípio por Foucault em termos de violências, entre elas a simbólica, praticada pelo Estado sobre o povo – demarca a soberania do colonizador sobre os indivíduos, de maneira a ditar quem deve viver e quem deve morrer.

Nesse contexto, desponta como protagonista primordial a sociedade enclausurada, reclusa, afastada do convívio social, manifestando crises de várias naturezas, dentre elas as que se apresentam em nível psíquico, por estar afastada do tecido coletivo, desafiando campos diversos, dentre eles, como já apontado, a saúde mental, a recriarem suas práticas. O distanciamento social, face as contradições geradas pelo capitalismo, é um determinante da manifestação de problemas biopsicossociais nos indivíduos em confinamento, inclusive aqueles que vivem na complexa vida urbana, no espaço das grandes metrópoles onde a pandemia é mais voraz, e o distanciamento, uma empreitada mais complexa.

A cidade não se limita a delineamentos geográficos; se revela, antes, como um condensado de vivências, símbolos, experiências; espaço que tanto pode libertar como realizar práticas de controle sobre os corpos de quem nela habita. Além disso, a pandemia de Covid-19 é um fenômeno eminentemente metropolitano, ainda que já espalhado para cidades de portes médios e mesmo áreas não urbanas. Nesse sentido, “a cidade é um locus excepcional” para se pensar o distanciamento social, seus impasses e desdobramentos em várias esferas da vida (RAMOS, 2020RAMOS, T. T. Pandemia é pandemia em qualquer lugar – vivendo a crise da Covid-19 de fora dos grandes centros. Espaço e Economia. Revista Brasileira de Geografia Econômica, v. 18, 2020.), em especial, na esfera psíquica. É uma categoria fundamental para a compreensão dos fenômenos no campo da saúde mental coletiva.

Urbanidade, subjetividade e distanciamento social na Covid-19

George Simmel, ao construir seu texto seminal intitulado “As grandes cidades e a vida do espírito”,22Este texto de Simmel também é citado como “A Metrópole e a vida Mental”, a exemplo do título que consta no capítulo 1 da coletânea “O Fenômeno Urbano”, organizada por Otávio Guilherme Velho (2ª edição, 1973). datado de 1903, talvez não imaginasse quão atual suas reflexões seriam para o estudo da urbanidade na interface com a “vida mental”. Nele, Simmel destaca ser a intensificação da vida nervosa o “fundamento psicológico sobre o qual se eleva o tipo das individualidades da cidade grande”, já ressaltando a pressão do urbano sobre a vida psíquica e emocional de quem nela vive, mesmo sem, talvez, poder imaginar o que seriam as metrópoles e o fenômeno urbano no futuro. Em um momento em que, mais da metade da população mundial vive nas cidades, faz-se necessário considerar “uma problemática especificamente urbana na agenda das considerações teóricas” (SOJA, 1993SOJA, E. W. Geografias pós-modernas: a reafirmação do espaço na teoria social. 2 ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993., p. 118). Nesse escopo, sujeito e estrutura se misturam produzindo experiências tecidas na materialidade da vida urbana, na qual a Covid-19 se revela como fenômeno de grandes proporções. Costa, Dimenstein e Leite (2019COSTA, M. G.; DIMENSTEIN, M.; LEITE, J. F. Feminismos e agroecologia: lutas contemporâneas na cidade. In: BOSI, M. L.; PRADO, S. D.; AMPARO-SANTOS, L. Cidades, Corpo e Alimentação: aproximações interdisciplinares. Salvador: Edufba, 2019., p. 54) postulam ser “impossível pensar a subjetividade humana contemporânea separada da experiência urbana”, uma vez que esse “estilo de vida” - o urbano - se espraia e invade o mundo globalizado.

As cidades são espaços nos quais se desdobra a urbanidade (experiência urbana), relações dos sujeitos historicamente situados, englobando experiências construídas no cotidiano, evidenciando que “o processo de produção do espaço social é ao mesmo tempo objetivo e subjetivo” (SÁNCHEZ, 2001SÁNCHEZ, F. A reinvenção das cidades na virada de século: agentes, estratégias e escalas de ação política. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, n. 16, p. 31-49, 2001., p. 33). A apropriação capitalista dos espaços, os processos de gentrificação, a fabricação de periferias necessárias à acumulação, via venda da força de trabalho com consequente marginalização de vasta camada da população, como se observa no Brasil, ao que se soma o desinvestimento na saúde e educação, compõem um cenário adverso à superação da pandemia de Covid-19.

Essa pandemia, como se sabe, apesar de não mais se restringir às grandes metrópoles, nelas começou e delas ora se dissemina para outros espaços; daí nossa ênfase na urbanidade. Certamente, sem desmerecer o contexto e especificidades das cidades do interior, ou mesmo as de médio porte, é nas metrópoles, conforme amplamente noticiado, que seus impactos são mais evidentes e preocupantes. No que tange ao distanciamento social, no contexto urbano pós-moderno, se impõe considerar a

[...] impossibilidade de se viver exclusivamente do trabalho, de forma independente de outras relações de produção e trabalho [...]. Consequentemente, interromper fluxos, encontros, contatos, relações, é interromper o que define o trabalho nas cidades. E isso tem consequências...com potencial para grandes estragos. E que não seriam tão graves, se não fosse em um sistema tão injusto e excludente (RAMOS, 2020RAMOS, T. T. Pandemia é pandemia em qualquer lugar – vivendo a crise da Covid-19 de fora dos grandes centros. Espaço e Economia. Revista Brasileira de Geografia Econômica, v. 18, 2020., p. 3).

Assim, o distanciamento social não se restringe a “medida sanitária”, simples de ser cumprida, bastando “obediência” e “compreensão” da população (mesmo que isso possa se aplicar a uma pequena parte desta), conforme se lê em vários discursos, sobretudo das agências de saúde quando abstraem as condições materiais em prol de prescrições inacessíveis à maioria da população de muitos países e regiões, como é o caso brasileiro. O distanciamento é, como dissemos, experiência, e como tal, inscrita no mundo da vida, na materialidade, da qual não se dissocia. Desse modo, soam quase absurdas certas recomendações atinentes à adesão às principais medidas, onde sobressaem discursos sócio-centrados que desconsideram as desigualdades, iniquidades e exclusão. Desse modo, a “segregação e a precariedade dos espaços [urbanos] segregados serão um marco para a compreensão dos impactos da pandemia da Covid-19 na periferia do capitalismo” (RAMOS, 2020RAMOS, T. T. Pandemia é pandemia em qualquer lugar – vivendo a crise da Covid-19 de fora dos grandes centros. Espaço e Economia. Revista Brasileira de Geografia Econômica, v. 18, 2020.). Noutras palavras, é preciso entender esse fenômeno como elemento sociológico estrutural – resistente, portanto, a ações que passam ao largo disso.

Difícil culpabilizar a população brasileira, em sua maioria, pelos índices de distanciamento que não alcançam o que a OMS preconiza – em termos ideais –, pois as recomendações emanam de Agências Internacionais e não distinguem centro e periferia no capitalismo globalizado e tampouco, centro e periferia dos conglomerados urbanos contemporâneos. Para certas camadas cumprirem o distanciamento, e aqui me refiro às elites, é preciso que outras se arrisquem face a escolha entre se protegerem e passar fome. Além disso, mesmo para quem pode escapar a esse risco, o isolamento é um desafio para os que vivem em barracos de um cômodo, nas favelas e periferias urbanas.

Entretanto, ao nos referirmos às desigualdades de classe como aspecto estrutural, é preciso cautela para evitar certos atalhos. Concordando com Ramos (2020), cabe a ressalva importante de que, não obstante as desigualdades que se apresentam no espaço urbano, não pretendemos aqui reforçar a posição de que o distanciamento social é um privilégio de classe inacessível a todos. Concordamos com a autora quando afirma preferir:

[...] defender que se trata de um direito roubado de muitos trabalhadores e trabalhadoras, já que o privilégio coloca o direito numa posição de exceção. Proteger-se, estar seguro em casa, não se expor ao contato social em situação de pouca segurança e muito risco não deveria ser tratado como privilégio, mas um direito assegurado a todos e todas (p. 9; grifo nosso).

Voltando nosso olhar sobre o urbano, é preciso ainda reconhecer que, nas grandes cidades, sobretudo fora das periferias, já vivemos, de certo modo, distanciados. Os projetos urbanísticos dos grandes condomínios isolam entre si os habitantes das cidades, dividindo-os por classes, distanciando-os entre si:

Pode-se, então, refletir sobre os muros, reais e simbólicos, erguidos nas cidades contemporâneas e que não param de se multiplicar ao nosso redor, encerrando não apenas bairros de uma cidade, favelas em bairros de camadas médias [...] Tais empreendimentos imobiliários não nos dão qualquer evidência de que aumentem assim as relações comunitárias, as trocas entre vizinhos. Ao contrário, apenas banalizam o isolamento, revelando uma fragilidade afetiva de seus moradores sempre à espera de uma chamada telefônica, de uma mensagem de e-mail, de um chamado distante [...] (SCOCUGLIA, 2011SCOCUGLIA, J. B. Cultura e urbanidade: da metrópole de Simmel à cidade fragmentada e desterritorializada. Cad. Metrop., n. 13, v. 26, p. 395-417, 2011., p. 400).

Contudo, consoante Kosik (2002), essa escala de isolamento integra a nossa cotidianidade hipermoderna, ou seja, não equivale ao distanciamento radical e abrupto eliciado pela pandemia de Covid-19. Pode-se minimizar os efeitos do distanciamento via conexão digital para aqueles que dispõem de recursos tecnológicos capazes de costurar em parte a ruptura imposta pela pandemia. Mas isso não parece recompor a intensidade da vida presencial.

Ao nos referirmos à diversidade de experiências com o distanciamento, na perspectiva dialética adotada, contemplando ambiguidades e contradições, também localizamos, de forma exploratória, no vasto material alusivo à vida distanciada, narrativas que indicam a apropriação positiva dessa medida como produção de vida, aspecto ao qual apenas um artigo, na revisão realizada, fazia menção. Sousa et al. (2020), em um estudo on-line, localiza pontualmente, relatos referentes a isso: “o meu autocuidado só aumentou, pois tenho realizado meditação, acessado arte, feito ações mais proativas no que se refere à minha saúde mental. Aproveitado para estudar, fazer leituras e cursos para melhorar o meu preparo profissional” (p. 6). Outro participante, ainda, elucidou que “tem sido uma experiência de aprendizado e, dessa forma, eu me sinto mais tranquilo e também me desperta para a melhoria dessa situação” (p. 7). Nesses relatos, ao lado de quadros de ansiedade, depressão ou constante medo do vírus e outros sentimentos transversais à população em seu conjunto, figura certa “positividade” do momento, vinculada à diminuição do impacto da urbanidade em suas vidas.

Entretanto, no vasto material não sistematizado até aqui na literatura, mas circulante nas redes sociais, lives, blogs, matérias, indo ao encontro do assinalado nos depoimentos do estudo acima, é possível inferir que esse “ganho” inusitado, paradoxal, se inscreve em narrativas de pessoas com estabilidade em suas carreiras, suporte material, não submetidas a qualquer prejuízo financeiro e cujo cenário futuro é de retorno ao seu trabalho ou atividades anteriores. Assim, o distanciamento em sua diversidade objetiva e subjetiva expressa o espectro da desigualdade social e suas iniquidades, sendo até um elemento terapêutico, em certos casos, e de produção de vida no plano subjetivo.

No entanto, esse não é o caso da maioria da população brasileira. Para esta, a precariedade de recursos e das moradias, somadas à tensão que significa ganhar seu sustento suportando vulnerabilidades de várias naturezas, trabalhar sob condições precárias e improvisadas, leva a que o distanciamento seja mais violento e com desfechos mais intensos. Organizações voltadas ao enfrentamento da violência doméstica vêm observando e denunciando um aumento expressivo de atos violentos devido à coexistência forçada, do estresse econômico e de temores sobre o coronavírus (PIZZINGA, 2021PIZZINGA, V. H. Vulnerabilidade e atividades essenciais no contexto da COVID-19: reflexões sobre a categoria de trabalhadoras domésticas. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, v. 46, 12 mar. 2021. DOI 10.1590/2317-6369000025020. Disponível em: http://www.scielo.br/j/rbso/a/8GBS7nSVTGR3NyGcnMSsC6v/?lang=pt. Acesso em: 10 dez. 2021.; SANTOS ., 2020SANTOS, K. O. B. et al. Trabalho, saúde e vulnerabilidade na pandemia de COVID-19. Cadernos de Saúde Pública, v. 36, 16 dez. 2020. DOI 10.1590/0102-311X00178320. Disponível em: http://www.scielo.br/j/csp/a/W7bdfWDGNnt6jHCcCChF6Tg/?lang=pt. Acesso em: 10 dez. 2021.). Ainda que a literatura relativa aos impactos do distanciamento social sobre a violência doméstica e familiar no decorrer da pandemia de Covid-19 seja ainda relativamente escassa, já dispomos de um amplo acervo de notícias divulgadas na mídia, relatórios de organizações internacionais e mesmo algumas publicações que começam a figurar na literatura científica (SILVA, 2020), apontando para o aumento desse tipo de violência, com destaque para o feminicídio e abuso sexual, não poupando países do capitalismo central.

Da mesma forma, o desemprego ocasionado pela Covid-19 é um elemento de sofrimento, evidentemente vinculado às situações de violência, pois responde pelo aumento do consumo de bebidas alcoólicas, drogadição, tentativas de suicídio e mesmo agravamento de quadros como depressão e agressividade (GHIRALDELLI, 2021GHIRALDELLI, R. Trabalho, reformas ultraliberais, desigualdades e pandemia no Brasil: os sentidos da crise. Trabalho, Educação e Saúde, v. 19, 2021. DOI 10.1590/1981-7746-sol00326. Disponível em: http://www.scielo.br/j/tes/a/W8rSX37Twg9k7KTCCKdFDkp/?lang=pt. Acesso em: 10 dez. 2021.; SOUZA, 2020SOUZA, D. de O. As dimensões da precarização do trabalho em face da pandemia de Covid-19. Trabalho, Educação e Saúde, v. 19, 19 out. 2020. DOI 10.1590/1981-7746-sol00311. Disponível em: http://www.scielo.br/j/tes/a/7rJ6TkW8Cs88QkbNwHfdkxb/?lang=pt. Acesso em: 10 dez. 2021.). Também os transtornos do comportamento alimentar e distúrbios do espectro obsessivo-compulsivo são elencados dentre os que vêm aumentando e merecem análises específicas, como muitos outros que convocam a saúde mental, tanto na produção de conhecimento como no plano do cuidado (COSTA; HENRIQUES; ESMERALDO, 2021COSTA, L.; HENRIQUES, E.; ESMERALDO, T. Alteração da alimentação e atividade física em contenção social: experiência da região autónoma da madeira. Acta Portuguesa de Nutrição, n. 24, p. 6-10, mar. 2021. https://doi.org/10.21011/apn.2021.2402.).

Sofrimento psíquico e distanciamento social na Covid-19: e o campo da saúde mental?

Nos tópicos anteriores, procuramos situar brevemente a pandemia de Covid-19 no contexto da pós-modernidade, num país de posição periférica na sociedade capitalista globalizada, conferindo destaque ao urbano, entendido como espaço de desdobramento de experiências múltiplas que englobam tanto a vida material, a reprodução dos agentes, como a produção subjetiva ancorada nessa materialidade, sendo categoria analítica central para a compreensão do distanciamento na Covid-19, em sua complexidade. Construímos, assim, a moldura no interior da qual situaremos agora um aspecto central na problemática-título deste artigo, podendo tomá-la como fenômeno situado e não como idealidade. Neste ponto, aplicaremos um Zoom, de modo a, no interior da produção subjetiva neste contexto inédito, focalizarmos uma dimensão específica em que toda a análise realizada até aqui desemboca: o sofrimento psíquico no distanciamento social na Covid-19 e alguns desafios, bem como potencialidades para a saúde mental coletiva.

Trata-se de um objeto cujos limites são de difícil delimitação, haja vista a multiplicidade de manifestações desse fenômeno no plano psíquico (ou psicológico), que numa perspectiva complexa, portanto, hologramática, (MORIN, 2002MORIN, E. A religação dos saberes: O desafio do século XXI (3ª ed.). Rio de Janeiro: Bertrand do Brasil, 2002.; 2004MORIN, E. A cabeça bem feita. 9 ed. Rio de Janeiro: Bertrand do Brasil, 2004.) se vincula a muitos outros planos. A complexidade é ainda maior quando consideramos, como logo de início assinalamos, que o fenômeno Covid-19 ainda está se configurando, sendo difícil aquilatar sua amplitude, seus impactos sobre a vida psíquica e, consequentemente, as incontáveis possibilidades e indagações que ainda se imporão sobre a ciência e a práxis na saúde mental. Face os limites de espaço, devem, portanto, ser consideradas ilustrações no aqui e agora, fragmentos de um universo bem mais extenso e que se desdobra, incessantemente, no contexto da pandemia que ora vivenciamos.

Refletindo sobre um recorte nesse vasto território de reflexão, elegemos, neste tópico, um itinerário em que se examinará, dado os limites de espaço, apenas alguns dentre os vários impactos do distanciamento social no urbano, em suas interfaces com a saúde mental, procurando apontar as já mencionadas ambiguidade e diversidade dessa experiência humana. Mesclando-se à problematização, mais do que respostas – que seriam precoces, neste momento – optamos por interrogar esse campo na direção de compartilhar inquietações e oxigenar um debate, mais do que nunca, necessário. Ao nos referirmos a “campo”, fazemo-lo na concepção formulada por Bourdieu (2003BOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R. Pierre Bourdieu. São Paulo: Ática, 2003.), concernente ao campo científico, mas também ao domínio profissional, da ação ou produção do cuidado, porque a pandemia desafia o campo da saúde mental nessas duas dimensões: reflexão/produção teórica e ação.

Cabe, logo de início, assinalar que o distanciamento social no espaço urbano implica uma interrupção, uma ruptura com o familiar, exigindo a reinvenção da cotidianidade. Karel Kosik, referindo-se à cotidianidade e sua presença como “organizadora” da nossa existência, argumenta:

Quando é que a vida de todo dia se torna problemática e qual o sentido que se desvenda ao problematizar-se? A vida cotidiana é antes de tudo organização, dia a dia, da vida individual dos homens; a repetição de suas ações vitais é fixada na repetição de cada dia, na distribuição de tempo em cada dia. A vida de cada dia é [...] ritmo em que se escoa a história individual de cada um. (2002, p.79)

Desse modo, prossegue Kosik: “As coisas, os homens, os movimentos, as ações, os objetos circundantes, o mundo[...] simplesmente são [...]. A cotidianidade se manifesta como a noite da desatenção [...] como mundo da familiaridade” (2002, p. 80; grifo do autor). Esse cotidiano tem suas interrupções, suas exceções, como os feriados, as festas nacionais, tudo isso significando quebras, mas pertencendo a um movimento regular e reiterado a cada dia, na rotina da produção da vida, portanto no interior do que é familiar. Tal cotidiano, por mais violento e ameaçador que possa se configurar nas cidades, estabiliza a vida coletiva fornecendo, paradoxalmente, uma imagem de segurança e certa previsibilidade necessária ao aparelho psíquico.

Contudo, seguindo ainda com Kosik: “A vida de cada dia se torna problemática [...] quando sofre uma interrupção [...quando] ocorre a destruição da cotidianidade quando milhões de pessoas são arrancadas a este ritmo” (2002, p. 81; grifo nosso). Tal circunstância impõe que se crie uma nova cotidianidade, conforme se observa na pandemia da Covid-19. Porque a “vida de cada dia” depende da cotidianidade – presente até nas condições mais radicais e desafiadoras - “também os campos de concentração têm sua própria cotidianidade, e até mesmo um condenado à morte” (KOSIK, 2002KOSIK, K. Dialética do concreto. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002., p. 81). Esses elementos nos ajudam a identificar um começo de problemática: o impacto causado pela interrupção abrupta do cotidiano devido à emergência da pandemia. E a reinvenção de novas cotidianidades, com desfechos profundos e ambíguos na produção subjetiva, expressando-se em igualmente ambíguas e diversas experiências no que concerne ao plano psíquico, exigindo-lhe rápidas adaptações. Neste ponto, começam nossas indagações.

Muito do que chega como demanda nos vários dispositivos onde se desenvolve o cuidado em saúde mental no período de não-pandemia, são sofrimentos que se inscrevem no universo do trabalho e ante as ameaças de viver no urbano, no ritmo veloz pós-moderno, violento, com suas nefastas “consequências humanas” (BAUMAN, 1999BAUMAN, Z. Globalização: as consequências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999.), reverberando na vida familiar e afetiva. Desse modo, seria uma hipótese plausível que minimizar a intensidade cotidiana da vida dos indivíduos – referimo-nos àqueles que podem viver o distanciamento – significaria proporcionar menos sofrimento causado pela correria capitalista, pela performance exigida pela “sociedade do desempenho” (HAN, 2018HAN, B-C. Psicopolítica. O neoliberalismo e as novas técnicas de poder. Belo Horizonte: Âyiné, 2018.), dando-lhes “tempo para viver”, “tempo para se recolher”, se proteger da “pressão sobre o aparelho psíquico” ressaltada por Simmel. Todavia, é possível contrapor elementos a tal análise questionando: se a compressão do espaço-tempo (HARVEY, 2014HARVEY, D. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 25 ed. Rio de Janeiro: Edições Loyola, 2014.; SIMMEL, 2005SIMMEL, G. As grandes cidades e a vida do espírito. São Paulo: Maná, 2005.) é um fenômeno que gera mal-estar, a sua descompressão, isto é, a saída da rotina exaustiva, mas, ainda assim, ritmo, poderia ser geradora de mais angústia? Julgamos que ambos os questionamentos se mostram pertinentes e não têm respostas fáceis; no entanto, hipotetizamos: na medida em que a sociedade acomodou a lógica de tal sistema a uma cotidianidade, como analisada por Kosik, sair dela, de maneira repentina, causaria uma desorganização subjetiva e coletiva, acarretando angústias que põem em risco a integridade psíquica dos sujeitos, sobretudo no espaço urbano. Esta questão não será aqui aprofundada, mas as circunstâncias singulares atuais representam uma oportunidade de explorá-la como fenômeno psíquico singular e potencialmente elucidativo de outras experiências análogas nesse plano, como investimento teórico no campo da saúde mental.

Para se ir além na compreensão desse fenômeno social que colocamos em evidência, é imprescindível que se entenda alguns outros elementos. Se a ruptura brusca no cotidiano urbano causada pela pandemia de Covid-19 é uma experiência comum a todos nós, causando-nos desorganização subjetiva, interessa-nos indagar se e como a reinvenção do cotidiano, per si, se revela como sofrimento nas esferas individual e coletiva. Para tanto, na ausência de uma vasta literatura cientifica, mas já dispondo de uma produção na saúde coletiva33Neste ponto, vale mencionar que as revistas nucleares do campo Saúde Coletiva, notadamente Physis - Saúde coletiva e Interface, Ciência & Saúde Coletiva, dedicaram espaço expressivo ao tema ao longo de 2020, possibilitando o enriquecimento da literatura em Saúde Coletiva, nas configurações epistemológicas complementares à Epidemiologia. Algumas revistas da Psicologia também publicaram números temáticos alusivos à pandemia Covid 19, conferindo destaque à saúde mental. e campos afins com que podemos dialogar, ancorando, também, a problematização em uma coleção ampla de matérias publicadas nas redes sociais, lives, debates on-line, depoimentos, somados a narrativas produzidas por trabalhadores em saúde mental, partiremos de um plano macrossocial para finalizarmos com dilemas e potencialidades nos espaços cotidianos de produção do cuidado nos diversos dispositivos.

Foram muitos (e seguem se multiplicando), como já apontado, os eventos virtuais e documentos sobre o tema “Saúde Mental na Covid-19”; a maioria, voltada ao manejo da ansiedade com procedimentos que até podem ser eficazes, mas sofrem dos mesmos males do discurso biomédico, ao desconsiderarem os contextos sociais urbanos nos quais os conselhos/recomendações não podem ganhar vida. Nesse escopo, sobressaem como temas o “como lidar com o medo e a ansiedade”; “saúde mental em tempos de covid”; “como lidar com o stress em tempos de Covid-19”; “minimize sua tensão e a dos seus familiares” e incontáveis outros. Temas decerto oportunos, haja vista os medos diversos e a ansiedade não raro vinculada a perdas: da vida; de familiares; do emprego arduamente conquistado numa sociedade com índice de desemprego alarmante e acentuado pela pandemia. A ruptura na cotidianidade e a imprevisibilidade concernente a quando se alcançará uma segurança e retorno às atividades geram uma sensação de perda de referências, desenraizamento e desamparo. Assim, a ameaça de ficar sem sustento e a descontinuidade do cotidiano associada geram angústia com seus desfechos avassaladores: insônias, palpitações, sintomas somáticos de toda ordem, amplamente apontados em incontáveis matérias, sobretudo lives, produzidas com a participação expressiva de psicólogos/as e outros trabalhadores na saúde mental.

No momento, ainda não é possível dispor de dados consistentes ou estatísticas que dimensionem com rigor o aumento desses quadros – um retrato epidemiológico brasileiro da saúde mental na Covid-19 – mas já se pode antecipá-lo mediante o que se lê nos informes sob a ótica das teorias psicossociais, além de artigos assinalando o aumento dos agravos em grupos específicos (DUARTE ., 2020DUARTE, M. de Q. et al. COVID-19 e os impactos na saúde mental: uma amostra do Rio Grande do Sul, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, v. 25, p. 3401-3411, 28 ago. 2020. https://doi.org/10.1590/1413-81232020259.16472020.; SILVA ., 2020SILVA, A. F. et al. Elementos precipitadores/intensificadores da violência conjugal em tempo da Covid-19. Ciênc. saúde coletiva, v. 25, n. 9, p. 3475-3480. Epub 28-ago-2020.).

O Mental Health Atlas 2017 (WHO, 2018WORLD HEALTH ORGANIZATION. Mental Health Atlas 2017. Geneva: World Health Organization, 2018. Disponível em: https://www.who.int/mental_health/evidence/atlas/mental_health_atlas_2017/en/. Acesso em: 24 jan. 2021.
https://www.who.int/mental_health/eviden...
) aponta que nos últimos anos tem havido um reconhecimento crescente do importante papel que a saúde mental desempenha na consecução das metas de desenvolvimento global, ilustrado pela inclusão desta nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Em 2019, lança o documento WHO Special Initiative for Mental Health (2019-2023WORLD HEALTH ORGANIZATION. Special Initiative for Mental Health (2019-2023): Universal Health Coverage for Mental Health. Geneva: World Health Organization, 2019. Disponível em: https://www.who.int/health-topics/mental-health#tab=tab_1.
https://www.who.int/health-topics/mental...
): Universal Health Coverage for Mental Health, evidenciando a importância do tema em nível global. No Brasil, desde 2011, o SUS passou a operar sob a lógica de Redes de Atenção à Saúde, e pelos dados impressionantes mencionados nesses documentos e nos sistemas de informação, a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) foi escolhida como uma das redes prioritárias (BRASIL, 2012BRASIL. Ministério da Saúde. Diretrizes para o cuidado das pessoas com doenças crônicas nas Redes de Atenção à Saúde e nas linhas de cuidado prioritárias. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2012.).

Não surpreende, portanto, que a pressão atual expanda exponencialmente essas estimativas. O campo da saúde mental deve ficar atento não somente para acompanhar e documentar esse esperado agravamento, como também para registrar eventuais novos sintomas e quadros consequentes à pandemia de Covid-19. Ou seja, construir coletivamente mediante suas Associações, instituições/grupos de pesquisa e coletivos, “sistemas de vigilância” que registrem e confiram relevo a essa dimensão, a nosso ver, apesar da reverberação, ainda negligenciada nos protocolos voltados ao cuidado nesta pandemia. Trata-se de reforçar o campo da saúde mental, conferindo-lhe visibilidade em sua dimensão coletiva, avançando o projeto da desinstitucionalização e reforma psiquiátrica tão vulnerável neste momento, com flagrantes lacunas no que tange aos espaços de assistência (MOREIRA; BOSI, 2019MOREIRA, D. de J.; BOSI, M. L. M. Qualidade do cuidado na Rede de Atenção Psicossocial: experiências de usuários no Nordeste do Brasil. Physis, Rio de Janeiro, v. 29, n. 2, e290205, 2019.).

Nesse sentido, cabe a esse campo um protagonismo no sentido de denunciar a pandemia de sofrimento psíquico, caracterizando-a. Tal situação – “pandêmica” na experiência do profissional cuja narrativa mencionamos – corrobora-se na proliferação de dispositivos de cuidado organizados por coletivos e organizações não governamentais que, ainda de forma insuficiente, suprem o desmonte da Rede de Atenção Psicossocial, nos anos recentes. Após avanços expressivos, como já aludido, assistimos a vários retrocessos que precisam ser revertidos. Contudo, a construção de redes de atenção para os usuários com sofrimento psíquico não é tarefa simples; implica uma complexa trama tecida entre diferentes serviços e estratégias de saúde. A qualidade do cuidado para a constituição dessa modalidade de rede é fundamental para a ampliação e qualificação do acesso e do atendimento a essa população.

É preciso, ainda, qualificar profissionais para atuar no âmbito da Saúde Mental em sua dimensão coletiva, para uma atuação nos dispositivos da Atenção Básica e naqueles substitutivos criados no processo da Reforma Psiquiátrica Brasileira. Essa é uma potencialidade ainda não totalmente explorada, tanto no que concerne à produção de conhecimentos, como de tecnologias de cuidado para atuar na alta complexidade desse espaço.

Contrabalançando essas lacunas, cabe registrar que várias iniciativas de atenção psicológica vêm ganhando visibilidade ou sendo criadas nesta pandemia, constituindo novos espaços não somente de práticas de cuidado, mas de possibilidades de expansão e de reflexão sobre o campo saúde mental nas duas dimensões antes mencionadas. São espaços de “escuta solidária”, “apoio emocional”; “suporte psicológico”, “SOS Psicologia”, “TelePsi Covid-19”, e até mesmo no Portal do Servidor do Governo Federal se localizam dispositivos, apenas para ilustrar entre vários, alguns coletivos e canais, voltados a oferecer suporte, mediante teleconsultas. Ainda que não inseridos no sistema de saúde oficial, vem sendo avaliadas como iniciativas importantes no que concerne ao seu lugar no suporte emocional, sobretudo num momento de privação do ir e vir, da escassez de abraços e manifestações de afeto que sustentavam nossa cotidianidade anterior à ruptura e à instauração dessa nova forma de viver o dia a dia.

Urge que essas experiências durante a Covid-19 sejam sistematizadas, documentadas, avaliadas e também problematizadas à luz dos conhecimentos no campo da saúde mental coletiva, visando à sua reapropriação na conformação de novos dispositivos fundamentados em análises rigorosas que possibilitem atingir um cuidado de qualidade e o ideário da reforma, envolvendo universalização e integralidade do cuidado.

Acreditamos que o distanciamento social, conforme afirmado logo no início deste texto, nos desafia como experiência complexa, exigindo recriações, reinvenções, desafiando de muitas formas o campo da saúde mental. Procuramos apontar reflexões e subsídios para a ampliação desse campo, examinando alguns desafios que se colocam tanto no plano teórico, como nas ações voltadas à esfera coletiva visando à construção de encontros na perspectiva de uma clínica ampliada, interrogando a integralidade e humanização do cuidado em saúde mental. Consideramos este um momento possibilitador de reinvenções na saúde mental, na diversidade dos territórios urbanos, como campo de produção de saberes e conhecimentos e como campo que demanda a construção de tecnologias de cuidado inovadoras.

  • 1
    Atualizamos os dados de prevalência e mortalidade por COVID, mas registramos que o artigo foi construído quando tínhamos 300.000 mortes e 12 milhões de casos no Brasil, portanto, em um momento em que a ressalva feita no parágrafo se fazia ainda mais pertinente. No momento desta revisão, a cifra alcança cerca de 700.000 mortes no país.
  • 2
    Este texto de Simmel também é citado como “A Metrópole e a vida Mental”, a exemplo do título que consta no capítulo 1 da coletânea “O Fenômeno Urbano”, organizada por Otávio Guilherme Velho (2ª edição, 1973).
  • 3
    Neste ponto, vale mencionar que as revistas nucleares do campo Saúde Coletiva, notadamente Physis - Saúde coletiva e Interface, Ciência & Saúde Coletiva, dedicaram espaço expressivo ao tema ao longo de 2020, possibilitando o enriquecimento da literatura em Saúde Coletiva, nas configurações epistemológicas complementares à Epidemiologia. Algumas revistas da Psicologia também publicaram números temáticos alusivos à pandemia Covid 19, conferindo destaque à saúde mental.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Abr 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    30 Mar 2021
  • Aceito
    14 Fev 2022
  • Revisado
    10 Jan 2022
PHYSIS - Revista de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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