“Um agente prisional de menor”: identidade e percepções do agente socioeducativo sobre a instituição, os adolescentes e a sua ocupação11Projeto matricial financiado pelo Conselho Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Processo nº 23038.007708/2011-2016.

“A juvenile prison officer”: identity and perceptions of the socio-educational agent about the institution, adolescents and their occupation

Reni Aparecida Barsaglini Camila Brito Vaillant Sobre os autores

Resumo

Agentes socioeducativos são profissionais atuantes em instituições que abrigam adolescentes cumprindo medida socioeducativa de internação. Pressupondo que os significados e as práticas do agente são influenciados pela e influenciam a constituição da vida social dos adolescentes e da instituição, este texto analisa as percepções desses profissionais quanto à sua identidade articulada às percepções sobre a instituição de internação e os adolescentes. Valemo-nos da fenomenologia para compreender a fluidez da ação, combinada com a sociologia da vida cotidiana, que toma os planos macro e microssociológico na análise social. Os dados advieram de sete meses de trabalho de campo em uma unidade de internação masculina em Mato Grosso, tendo 11 agentes entrevistados com roteiro semiestruturado, adotando-se a análise temática. Os resultados versam sobre os atrativos da profissão (estabilidade, salário, amizade, aprendizagens); sobre a instituição e a profissão (contradições entre discurso e prática, equiparando-se à prisão) e sobre os adolescentes (permanência da visão histórica do “menor” pobre, abandonado e em perigo ou infrator e perigoso). A constituição da identidade é relacional, indissociada do contexto, e os agentes vivenciam as repercussões das contradições e precariedades. Na porosidade e permeabilidade das interações forjam-se e são forjados pessoas, profissionais, grupos e instituições - indissociados: gentes e coisas.

Palavras-chave:
Agente Socioeducativo; Identidade Profissional; Instituição de Privação de Liberdade

Abstract

Socio-educational agents are professionals who work in institutions that house adolescents fulfilling socio-educational measures of detention. Assuming that the meanings and practices of the agent are influenced by and influence the social life constitution of the adolescents and institution, this text analyzes the perceptions of these professionals regarding their identity articulated to the perceptions about the detention institution and the adolescents. We have used phenomenology to understand the fluidity of action, combined with the sociology of everyday life, that considers macro and micro-sociological planes in the social analysis. The data came from a seven-month field work in a male detention unit in Mato Grosso, Brazil, and from11 agents interviewed with a semi-structured questionnaire, adopting thematic analysis. The results are on the attractiveness of the profession (stability, salary, friendship, learning); on the institution and the profession (contradictions between discourse and practice, equating it to prison) and on adolescents (continuance of the historical view of a poor, abandoned, endangered or harmful and dangerous minor). The constitution of identity is relational, separated from the context, and agents experience the repercussions of contradictions and precariousness. In the porosity and permeability of interactions, individuals, professionals, groups and institutions - indissociated -, people and things forge and are forged.

Keywords:
Socio-Educational Agent; Professional Identity; Institution of Deprivation of Liberty

Introdução

Agentes socioeducativos são profissionais que atuam em unidades de internação destinadas a abrigar adolescentes que cometeram atos infracionais (crimes ou contravenções) graves e aos quais foi aplicada medida socioeducativa de privação de liberdade. No Brasil, atualmente, tais medidas se regem, legal e centralmente, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e pelo Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), os quais preveem a execução de ações que articulem as áreas de educação, assistência social, saúde, cultura, esporte e capacitação profissional.

Em Mato Grosso, o agente socioeducativo é o profissional responsável, entre outras funções, por atender, orientar, assistir, vigiar, realizar a segurança interna, custodiar, escoltar, e revistar pessoas e espaços físicos, e prover segurança para os demais profissionais que atendem os adolescentes (Mato Grosso, 2011aMATO GROSSO. Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos. Instrução Normativa nº 002/2011/SEJUDH, de 23 de novembro de 2011. Dispõe sobre o regime de trabalho em turno (RTT) para os Agentes Penitenciários e Agentes Orientadores da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos. Diário Oficial do Estado de Mato Grosso, Cuiabá, 24 nov. 2011a. p. 16. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2JoEsJA >. Acesso em: 29 out. 2015.
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).

Pressupondo que os significados e as práticas do agente socioeducativo são influenciados e influenciam a constituição da vida social dos adolescentes internos e da instituição, este texto decorre de pesquisa mais ampla (Vaillant, 2017VAILLANT, C. B. A experiência dos Agentes Socioeducativos em Unidade de Internação para adolescentes em conflito com a lei, em Mato Grosso. 2017. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) - Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2017.) e analisa as percepções dos agentes socioeducativos quanto à sua identidade em articulação com as percepções sobre a instituição onde atuam e a população com a qual trabalham. Entende-se que tais percepções se assentam na subjetividade (configurada na esfera individual e coletiva), em meio às interações cotidianas perpassadas por elementos técnicos, políticos, institucionais, sociais e culturais, compondo a experiência (Barsaglini, 2017BARSAGLINI, R. A. Conceito e abordagem da experiência: reflexões teóricas e metodológicas em pesquisas qualitativas em saúde [projeto de pesquisa de pós-doutorado]. Cuiabá: Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Mato Grosso, 2017. ).

A identidade profissional resulta da socialização em dada área e é, simultaneamente, estável e provisória, individual e coletiva, subjetiva e objetiva, biográfica e estrutural, construindo-se processualmente pelas interações e aprendizagens que legitimam o pertencimento a uma dada categoria (Dubar, 2005DUBAR, C. A socialização: construção das identidades sociais e profissionais. São Paulo: Martins Fontes, 2005.). Essa socialização transcorre no mundo da vida e está inscrita na experiência. Como conceito, “experiência” se refere à forma como os sujeitos concretos vivenciam seu mundo no fluxo da vida cotidiana, que somente é apreensível como lembrança, já que para se referir a tal vivência o sujeito suspende esse fluxo para refletir sobre ela e nesse movimento a interpreta, editando-a por aquilo que o tocou ou o afetou (Bondia, 2002BONDIA, J. L. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de Educação, Campinas, n. 19, p. 20-28, 2002.). Lembranças remetem à memória enquanto aquilo que ficou marcado e merece ser lembrado, por ser significativo ao interlocutor, sendo ela seletiva e constituída por acontecimentos vividos por si e por personagens, grupos e coletividades às quais a pessoa se sente pertencente, sempre situados em dado espaço e tempo (Pollak, 1992POLLAK M. Memória e identidade social. Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 5, n. 10, p. 200-212, 1992.).

São as experiências do cotidiano que constituem o mundo da vida (Schutz, 1979SCHUTZ, A. Sobre a fenomenologia e relações sociais. Petrópolis: Vozes , 1979.), de modo que as interpretações se baseiam em um estoque de experiências anterior ao sujeito, às suas experiências e às de terceiros, que juntas funcionam como código de referência para a ação. Não obstante, evitando dicotomias, pensamos na circularidade dos elementos constitutivos imbricados nas ações e nas interpretações que compõem a realidade, ou seja:

nem a sociedade, nem os indivíduos, encarados como entidades separadas, mas as relações entre indivíduos (no sentido amplo e não só as interações face a face), bem como os universos objetivados que elas fabricam e que lhes servem de suportes, enquanto eles são constitutivos, ao mesmo tempo, dos indivíduos e dos fenômenos sociais. (Corcuff, 2001CORCUFF, P. As novas sociologias: construções da realidade social. Bauru: Edusc, 2001., p. 24)

Se tais construções de influências recíprocas se materializam no cotidiano, este envolve a historicidade em três aspectos, sendo ela constituída por: construções passadas/herdadas; atualização dessas construções nas práticas e nas interações da vida cotidiana dos atores; aberturas de campos de possibilidades no futuro (Corcuff, 2001CORCUFF, P. As novas sociologias: construções da realidade social. Bauru: Edusc, 2001.).

Nos aproximamos da fenomenologia, na vertente sociológica de Schutz (1979SCHUTZ, A. Sobre a fenomenologia e relações sociais. Petrópolis: Vozes , 1979.), para compreender a fluidez da ação; essa abordagem mostrou-se fértil, porém limitada pela circunscrição situacional das interações face a face. Nós a complementamos, então, com a contribuição da sociologia da vida cotidiana de Berger e Luckmann (2003BERGER, P; LUCKMANN, T. A construção social da realidade. Petrópolis: Vozes, 2003.), que se apropriam circularmente dos planos macro e microssociológico, defendendo não existirem estados naturais puramente humanos sem o substrato sociocultural, pois as situações ou construções sociais também reverberam em realidades objetivas, reações, atitudes, fatos etc. Para esses autores, as realidades objetivas decorrem das institucionalizações, ou seja, de conhecimentos transmitidos nas interações sociais, sedimentados e retidos nas consciências individuais, transcendendo, portanto, o “aqui e agora” e se somando ao estoque de conhecimentos estabelecidos, de modo que a realidade se torna cada vez mais maciça no curso dessa transmissão (Berger; Luckmann, 2003BERGER, P; LUCKMANN, T. A construção social da realidade. Petrópolis: Vozes, 2003.).

Por essa perspectiva abordamos a percepção da identidade do agente socioeducativo quanto à forma como reconhecem e interpretam o contexto (a instituição e os adolescentes/grupo social) onde exercem seu ofício e constroem a si mesmos.

Aspectos metodológicos

Trata-se de um estudo qualitativo que se vale da abordagem da experiência, empreendendo um modelo metodológico mais aberto diante da complexidade do objeto de investigação.

A pesquisa foi realizada no Centro de Atendimento Socioeducativo de Internação Masculina - Polo Cuiabá (MT), selecionado por ser único na capital e por ter autorizado nosso acesso, sendo doravante denominado unidade de internação. A instituição integra o Complexo Pomeri (Cuiabá, MT), composto por vários órgãos e vinculado administrativamente, desde 2010, à Secretaria de Estado de Justiça e Direito Humanos do Estado de Mato Grosso (SEJUDH/MT), sob gestão da Secretaria Adjunta de Justiça e da Superintendência do Sistema Socioeducativo do Estado de Mato Grosso.

Segundo dados da administração local, na ocasião da pesquisa, a unidade de internação masculina contava com cerca de 40 adolescentes, e havia 81 agentes socioeducativos ativos, sendo 55 do quadro efetivo e 26 em contrato temporário. Sua jornada é de 40 horas semanais, organizada pelo regime de plantão de 24 horas trabalhadas, seguidas de 72 horas de descanso, agrupando-se em quatro equipes (plantões A, B, C, D), com um líder cada uma. Os convites foram feitos individualmente para efetivos e contratados, das quatros equipes, que tivessem no mínimo um ano de atuação, considerando-se a disponibilidade e o interesse em participar formalmente das entrevistas. A interrupção destas ocorreu pelo balanço das informações obtidas, diante da ocorrência de repetição e redundância dos dados - ou seja, a partir da saturação temática (Fontanella; Ricas; Turato, 2008FONTANELLA, B. J. B.; RICAS, J.; TURATO, E. R. Amostragem por saturação em pesquisas qualitativas em saúde: contribuições teóricas. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 24, n. 1, p. 17-27, 2008.) -, perfazendo o total de 11 entrevistados.

Desse total, quatro eram do sexo feminino, e sete do masculino; seis tinham ensino superior, e cinco tinham ensino médio completo (dois cursavam ensino superior); sete eram servidores efetivos, e quatro contratados; oito deles tinham de três a cinco anos de atuação na instituição, e três tinham de seis a nove anos; três dos contratados tinham outro vínculo empregatício.

O trabalho de campo foi realizado de fevereiro a agosto de 2016, com visitas diárias à unidade de internação, visando aproximação do cotidiano em tela - momentos essenciais para a recíproca e gradual familiarização entre agentes e pesquisadora nos quais, por meio de frequentes conversas informais, foi possível deixar-se afetar pela experiência naquele cotidiano para tematizá-lo. Assim, entre os aspectos marcantes e os significados do dia a dia do ser-saber-fazer do agente socioeducativo, a identidade aflorou como tema a ser explorado e, por hora, aprofundado e enfocado neste trabalho. Após esse movimento de olhar e ouvir, ajustou-se o roteiro semiestruturado preliminar que guiou as entrevistas pessoais, somadas à observação da dinâmica institucional e laboral, com registros em diário de campo. Os dados produzidos foram tratados pela análise temática, inspirada em Laurence Bardin e detalhada na pesquisa qualitativa em saúde por Gomes (2011GOMES, R. Análise e interpretação de dados de pesquisa qualitativa. In: MINAYO, M. C. S.; DESLANDES, S. F.; GOMES, R. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 30. ed. Petrópolis: Vozes , 2011.).

A pesquisa restringiu-se à internação masculina, onde havia autorização, e não explorou dados documentais internos (sobre ocorrências ou da gestão central, por exemplo), além de não ter acompanhado um plantão inteiro dos agentes (o que era intenção inicial, mas foi inviabilizado por questões burocráticas) ou um plantão de final de semana, durante as visitas de familiares. Contudo, antes de constituírem limitações, entende-se essas restrições como possibilidades de estudos futuros.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética do Hospital Universitário Júlio Müller, Parecer nº 1.417.33, de 22 de fevereiro de 2016. Para garantir o anonimato dos participantes, usamos a sigla ASE (agente socioeducativo) seguida de numeração aleatória para identificar suas falas.

Apresentação e análise dos dados

Os dados, para o presente texto, foram organizados em três tópicos quanto às percepções dos agentes socioeducativos, quais sejam: os atrativos para entrada e permanência na profissão; a visão sobre o Outro, representado pela instituição (Centro Socioeducativo) e pela população com a qual trabalham (adolescentes); a visão sobre si mesmos.

Os atrativos para inserção e permanência na unidade de internação

O acesso profissional ao quadro de servidores de instituições públicas se dá, prioritariamente, por meio de aprovação em concurso público, regido por edital específico. Assim, buscamos compreender o que motivou os entrevistados a se candidatarem às vagas em questão. Em Mato Grosso, a escolaridade exigida para ingresso no cargo de agente socioeducativo era nível médio completo (Mato Grosso, 2011bMATO GROSSO. Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso. Lei nº 9.688, de 28 de dezembro de 2011b. Reestrutura da Carreira dos Profissionais do Sistema Socioeducativo e dá outras providências. Diário Oficial do Estado de Mato Grosso , Cuiabá, 28 dez. 2011b. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2PXUpJc >. Acesso em: 5 abr. 2015.
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), o que atraía grande contingente de candidatos. Todavia, somada à oportunidade de emprego, tem importante peso a quantidade de vagas ofertadas, sobrepondo-se ao conhecimento das atribuições do cargo, como referem os entrevistados:

Com relação ao [agente] socioeducativo, eu também não sabia o que era. Eu… na verdade, ia fazer pra [agente] prisional e, como tinha mais vagas, fiz pra socioeducativo. E depois que entrei aqui que eu pude ter uma visão do que é socioeducativo. (ASE4)

Não sabia nem o que era fazer concurso, pra começar. Foi meu primeiro concurso, aí eu falei: “vou pelo número de vaga!”. E o número de vaga que tinha aqui, pra cá, era o maior que tinha. Falei: “ah, socioeducativo, deve ser alguma coisa de escola, né?” [risos]. (ASE7)

A exigência de qualificação técnica prévia para investidura em cargo público contribui para se saber de antemão as atividades a serem desempenhadas e, se tal qualificação não existe, pressupõe-se que seja oferecida formação inicial preparatória. Nesse sentido, está previsto e condicionado que o agente socioeducativo estará apto a exercer as suas atividades “após formação específica equivalente a 180 (cento e oitenta) horas, a qual abrange além de técnicas de defesa, uso de armas letais e não-letais, combate a incêndio, primeiros socorros, estudo dos direitos humanos e da legislação referente aos direitos das crianças e adolescentes” (Brasil, 2016BRASIL. Projeto de Lei do Senado nº 256, de 2016. Altera a Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, para conceder o porte de arma as agentes de segurança socioeducativos, e dá outras providências. Senado Federal, Brasília, DF, 2016. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2D6pYOd >. Acesso em: 3 jan. 2018.
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). Contudo, no caso em tela, esse conhecimento que foi protelado por ocasião da candidatura se revelou aos aprovados quando estes adentraram à instituição, como é patente na fala de um dos entrevistados: Agente orientador do sistema socioeducador… […] tinha gente que achava que ia ser professor [risos], teve muita gente que na hora que chegou aqui chorou… (ASE1).

A capacitação oferecida no ingresso foi referida pelos entrevistados, porém com nuances de frustação devido à distância e à inadequabilidade à realidade encontrada; foi referido também que aqueles conhecimentos formais somente ganharam sentidos e significados quando encarnados na vivencia prática cotidiana. Nesse sentido, no segundo trecho abaixo observa-se que nem o edital refletia a dimensão concreta do contexto e das atividades institucionais. Tais descompassos foram identificados, também, em estudos feitos em outras instituições de privação de liberdade, como as prisões (Lourenço, 2010LOURENÇO, A. S. O espaço de vida do agente de segurança penitenciário no cárcere: entre gaiolas, ratoeiras e aquários. 2010. Tese (Doutorado em Psicologia Social) - Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2OUo8GR >. Acesso em: 15 out. 2014.
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; Valejo, 2013VALEJO, M. Prisionalização: um retrato do submundo carcerário. Revista Intertemas, Presidente Prudente, v. 26, n. 26, p. 1677-1281, 2013.), envolvendo um saber essencialmente prático que não está codificado e é intransmissível por métodos formais. Notemos:

O curso de formação foi uma enganação, né? Porque lá fala uma coisa totalmente diferente da realidade do que a gente faz aqui… (ASE1)

Acho que foi o momento que eu percebi, que eu entendi o que era o sistema socioeducativo: a partir do momento que eu entrei do portão pra dentro da unidade [de internação], entendeu? Porque o curso, realmente, que eles falam o que é, como é, ninguém sabe… Se você colocar no concurso, cobrar: “agente orientador vai mexer com menor infrator”, a pessoa vai olhar ali, e não sabe o que que é. Não dá pra entender, não sabe a realidade do cargo, como é o serviço, não tem uma lógica… (ASC6)

Com base em Schutz (1979SCHUTZ, A. Sobre a fenomenologia e relações sociais. Petrópolis: Vozes , 1979.), pode-se dizer que a entrada concreta do agente é o momento em que o cotidiano do Centro Socioeducativo (pré-existente, vivenciado e interpretado por outros) se apresenta à sua experiência e interpretação, mas sem parâmetros delineados pelo estoque de experiências anteriores, causando espanto. Subsumido pelo “acostumar”, o impacto inicial verbalizado remete ao estranhamento e à familiarização diante do extraordinário, ou seja, trazer o estranho para o terreno dos fenômenos conhecidos e familiares, tornando-o compatível e consistente com outros fatos de nossa experiência e seus significados comuns, de modo a facilitar e simplificar as ações na vida cotidiana.

Porque no começo você toma um choque, mas depois você vai entendendo por que que as coisas são assim… (ASE3)

como eu nunca tinha visto aquilo, eu achei meio impactante, assim, eu não gostei. Fiquei até assim… meio sem dormir uns dias, assim. Eu não gostei do que eu vi. Mas depois eu acostumei, hoje em dia eu acho normal. (ASE8)

eu já sabia mais ou menos como seria, mas teve muita gente que não sabia, até chorou, quando viu o lugar, né? Que ia trabalhar, tal… mas é aquela coisa, né? Com o tempo você acaba acostumando, né? (ASE1)

Não obstante, o se “acostumar” às condições inóspitas de trabalho reverbera na saúde, como observaram Tschiedel e Monteiro (2013TSCHIEDEL, R. M.; MONTEIRO, J. K. Prazer e sofrimento no trabalho das agentes de segurança penitenciária. Estudos de Psicologia, Natal, v. 18, n. 3, p. 527-535, 2013.) sobre uma categoria profissional similar, afirmando que deixar de perceber situações que anteriormente causavam sofrimento é um mecanismo defensivo que permite se manter em atividade, mas com custos à saúde psíquica.

Uma vez aprovados, nomeados e empossados, quais pontos positivos atuariam como atrativos para que os agentes socioeducativos permanecessem no cargo? A estabilidade funcional, enquanto elemento que motiva aspirar ao ingresso no setor público, foi apontada em estudos em instituições similares (Lopes, 2014LOPES, V. A. Experiência de profissionais de saúde em unidade prisionais em Cuiabá/MT. 2014. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) - Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2014. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2PUw6Mw >. Acesso em: 26 out. 2018.
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) como atrativo e se confirma entre os entrevistados. O conceito foi projetado para proporcionar a continuidade do bom trabalho público, isentando o servidor de perseguições políticas, ideológicas ou pressões no trabalho (Diniz et al., 2012DINIZ, T. G. S. et al. Estabilidade no emprego e o comportamento do servidor público de municipal. In: SIMPÓSIO DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO E TECNOLOGIA, 9., 2012, Rio de Janeiro. Anais… Rio de Janeiro: SEGeT, 2012. 16 p.), embora suas conotações não sejam absolutas, tendo significados variados entre grupos sociais, espaço e tempo. Tanto é que recentes alterações nas regras de demissão ou dispensa do servidor público efetivo/estável foram trazidas e regulamentadas pelo Projeto de Lei do Senado nº 116, de 2017 (Brasil, 2017BRASIL. Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Relatório sobre o Projeto de Lei do Senado nº 116, de 2017 (Complementar). Regulamenta o art. 41, § 1º, III, da Constituição Federal, para dispor sobre a perda do cargo público por insuficiência de desempenho do servidor público estável. Senado Federal, Brasília, DF, 2017. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2qeJzCI >. Acesso em: 3 jan. 2018.
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).

A estabilidade constituía atrativo, a princípio, não pelo cargo em si, mas pelos benefícios dele advindos. A questão, contudo, não se resume a esse aspecto, ganhando relevo a jornada de 40 horas semanais em regime de escala de plantão de 24 por 72 horas (Mato Grosso, 2011aMATO GROSSO. Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos. Instrução Normativa nº 002/2011/SEJUDH, de 23 de novembro de 2011. Dispõe sobre o regime de trabalho em turno (RTT) para os Agentes Penitenciários e Agentes Orientadores da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos. Diário Oficial do Estado de Mato Grosso, Cuiabá, 24 nov. 2011a. p. 16. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2JoEsJA >. Acesso em: 29 out. 2015.
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).

eu gosto muito do regime de plantão, da escala. Dá pra mim fazer um monte de coisa assim. Dá pra mim aproveitar bem minha folga, né? Eu acostumei trabalhar por escala. (ASE11)

Tem meu salário, o tempo que eu tenho de folga, que eu tô com a minha família, com minha filha. Eu acho, assim, bom essa carga horária nossa. (ASE8)

O último trecho refere como atraente o salário da categoria, cujo valor inicial atual, em Mato Grosso, é de R$ 3.183,16 (em contraste com o valor de R$ 954,00 do salário-mínimo vigente) e que, com progressões em dez níveis e quatro classes, pode chegar a R$ 10.733,26.22MATO GROSSO. Tabelas salariais. Rendimentos MT: transparência pública em gestão de pessoas, 2018. Disponível em: <https://bit.ly/2ATeAmR>. Acesso em: 5 nov. 2018. Tais valores se baseiam na legislação que reestruturou a carreira dos profissionais do Sistema Socioeducativo (Mato Grosso, 2017MATO GROSSO. Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso. Secretaria de Serviços Legislativos. Lei nº 10.499, de 17 de janeiro de 2017. Altera a Lei nº 9.688, de 28 de dezembro de 2011, que reestrutura a carreira dos Profissionais do Sistema Socioeducativo. Diário Oficial do Estado de Mato Grosso , Cuiabá, 19 jan. 2017. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2qbMBsj >. Acesso em: 11 abr. 2017.
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) incluindo o requisito do nível superior de escolaridade para ingresso, sendo a progressão e enquadramento dos que já estão no Sistema matéria tratada pelo respectivo sindicato (SINDPSS-MT, 2017SINDPSS-MT - SINDICATO DE CARREIRA DOS PROFISSIONAIS DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO DO ESTADO DE MATO GROSSO. Informação: mudança de classe. Cuiabá, 27 mar. 2017. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2QrBp6r >. Acesso em: 5 nov. 2018.
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).

Notemos que o trecho a seguir agrega como atrativo a folga de plantão de 24 horas, regulamentada pela Instrução Normativa nº 002/2011/SEJUDH, sobre o regime de trabalho em turno (RTT), lembrando que esta se justifica como compensação para categorias que “necessitam de maior intervalo de descanso para melhor se refazerem psicologicamente das atribuições que lhe competem” (Mato Grosso, 2011aMATO GROSSO. Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos. Instrução Normativa nº 002/2011/SEJUDH, de 23 de novembro de 2011. Dispõe sobre o regime de trabalho em turno (RTT) para os Agentes Penitenciários e Agentes Orientadores da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos. Diário Oficial do Estado de Mato Grosso, Cuiabá, 24 nov. 2011a. p. 16. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2JoEsJA >. Acesso em: 29 out. 2015.
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), e não para se ocupar com outro vínculo empregatício, seja formal ou informal.

Ainda, o trecho traz nuances da aprendizagem prenhe de conhecimentos de aplicação não instrumental imediata, ecoando a noção de aprendizagem informal no trabalho, em que pese a não intencionalidade, mas a espontaneidade/influenciada pelo acaso, integrada às rotinas cotidianas, não estruturada, vivencial e não institucional (Pantoja; Borges-Andrade, 2004PANTOJA, M. J.; BORGES-ANDRADE, J. E. Contribuições teóricas e metodológicas da abordagem multinível para o estudo da aprendizagem e sua transferência nas organizações. Revista de Administração Contemporânea, Curitiba, v. 8, n. 4, p. 115-138, 2004.).

Pra mim é um trabalho bom porque tem a minha folga. Eu, realmente, aprendi muito depois que eu vim pra cá, assim… muito, muito sobre administração pública […] por conta do serviço, pelo salário, que propicia isso, que dá pra mim pagar uma faculdade e pelo tempo também que eu tenho pra mim estudar. Porque se eu estivesse trabalhando é… expediente em uma empresa privada, não ia dar pra mim pagar minha faculdade, manter minha casa, pagar combustível, meus livros e ainda trabalhar. Não ia ter condições de jeito nenhum. Então, aqui o tempinho que a gente tem, é cansativo, mas tem os três dias [as 72 horas de descanso], dá pra gente conciliar, dá pra estudar. (ASE4)

O trabalho impele interações interpessoais, vínculos, emoções: sociabilidades que promovem aprendizagem, tomada aqui na acepção posta por Pantoja e Borges-Andrade (2004PANTOJA, M. J.; BORGES-ANDRADE, J. E. Contribuições teóricas e metodológicas da abordagem multinível para o estudo da aprendizagem e sua transferência nas organizações. Revista de Administração Contemporânea, Curitiba, v. 8, n. 4, p. 115-138, 2004.) como processo de mudanças que ocorre no indivíduo, nas dimensões afetiva, motora e cognitiva, que perduram e resultam das interações. Mesmo com uma visão depreciativa sobre os adolescentes, os agentes extraem do trabalho junto deles fatores positivos quanto a seu próprio desenvolvimento - conforme mostram os conteúdos existenciais nos excertos seguintes:

é um trabalho, tipo assim, pessoal, assim, interpessoal, trabalhar com pessoas, entendeu? Querendo ou não, você sempre tá aprendendo. Que nem, quando eu entrei aqui, a gerente que tava aqui, dona X [nome da gerente] falou pra mim: “Você vai aprender com esses guri”. Aí falei: “Aprender o quê? O que eu vou aprender com bandido? O que vai me ensinar?” Entendeu? Aí depois que eu fui, com o passar do tempo… o que ela quis dizer… pra você ver o que é a vida! Aprender: aprender a ser mais paciente, aprender a ser mais observador, aprender várias outras coisas que você vai ter de aprender; percepção nas coisas… Falei: “Ah, realmente, você aprende”, entendeu? (ASC9)

O ponto positivo é que você acaba assim… se humanizando mais, vendo certas histórias, às vezes até se colocando no lugar da família… (ASE4)

Outra faceta expressamente valorizada da sociabilidade é a amizade que, segundo Silva (2014SILVA, B. G. R. S. Estudo sociológico da amizade duradoura e de sua função social na sociedade contemporânea. Revista Vozes dos Vales, Diamantina, v. 3, n. 6, p. 1-29, 2014.), envolve afinidade, afeto, confiança, lealdade, compartilhamento da vida com o outro em significativa parte do tempo e em ambiente específico, público, impessoal. A amizade é consequência da conexão intersubjetiva de motivos, quando desenvolvida no mesmo espaço e tempo, nas relações face a face, em que experiências são compartilhadas possibilitando uma corrente de consciência (Schutz, 1979SCHUTZ, A. Sobre a fenomenologia e relações sociais. Petrópolis: Vozes , 1979.). No ambiente profissional ela pode fomentar a satisfação dos trabalhadores, promovendo prazer e suplantando possíveis adversidades do cotidiano institucional (ou dando condições para melhor suportá-las). E o trabalho é fonte de prazer ao permitir desenvolver aptidões, inteligência e o sentir-se importante (Morin, 2001MORIN, E. M. Os sentidos do trabalho. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 41, n. 3, p. 8-19, 2001.), quando o sujeito se identifica com as atividades exercidas, trazendo consequências positivas para o trabalhador e a instituição. Estas são as pistas desses pontos positivos:

O que é mais significativo pra mim, não assim… não na unidade [de internação], mas é no plantão, é o círculo de amizade que a gente cria, né? […] eu gosto muito daqui. Embora seja uma… uma cadeia [designação comum para instituição de privação de liberdade], como dizem, mas eu gosto muito do círculo de amizade que você cria. Igual, a gente trabalha 24 horas, aí passa três dias sem vir, quando não pega uma folga e fica uma semana, você parece que sente falta do pessoal. De vir, de rir, de brincar, embora tem essa correria, você vê que a gente senta, um ri do outro, um zoa do outro, eu gosto disso. O que mais eu gosto daqui é isso, esse círculo de amizade que a gente cria no ambiente de trabalho, né? Eu acho o mais importante. (ASE7)

Eu gosto de trabalhar na área de segurança, entendeu? Eu sempre trabalhei na área de segurança, desde os meus 18 anos, entendeu? Fui, servi o exército seis anos, aí saí. Fiz curso de vigilante patrimonial, fiz curso de extensão de transporte de valores, entendeu? Eu, gosto de trabalhar aqui, entendeu? Eu… eu no meu pensamento vou aposentar aqui, se Deus quiser! (ASE2)

Vai fazer cinco anos que eu tô trabalhando na instituição. Aqui eu me sinto satisfeito, eu gosto do meu trabalho. Eu acho que se fosse pra me tirar daqui pra mim trabalhar numa secretaria, num outro lugar, eu não ia acostumar, não ia me adaptar. Acho que eu gosto, eu peguei mesmo vontade, né? (ASE11)

Mas a identidade é relativa a um tipo de contexto social e, assim, voltamo-nos às percepções dos agentes socioeducativos sobre a instituição e os adolescentes.

O olhar para o outro: percepções sobre a unidade de internação e os adolescentes

Para além de um local de trabalho, a unidade de internação formalmente se destina aos adolescentes em conflito com a lei, visando reeducá-los para que possam regressar à sociedade, possibilitando “a inclusão social de modo mais célere possível e, principalmente, o seu pleno desenvolvimento como pessoa” (Brasil, 2006BRASIL. Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. Resolução Nacional nº 119, de 11 de dezembro 2006. Dispõe sobre o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 7 dez. 2006, p. 30-69. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2qd4cQH >. Acesso em: 13 mar. 2015.
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, p. 30). No entanto, as falas dos entrevistados mostram distância entre os fins declarados e a realidade das práticas nessas instituições correcionais, o que nos leva a recorrer a dois autores clássicos para compreendê-las: a Goffman (1974GOFFMAN, E. Manicômios, prisões e conventos. 9. ed. São Paulo: Perspectiva , 1974.), para quem as instituições totais (como a correcional) foram idealizadas para segregar os internados da sociedade mais ampla por um período de tempo, impondo-lhes uma vida fechada e formalmente administrada por uma equipe dirigente; e a Foucault (2009FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Trad. Raquel Ramalhete. 36. ed. Petrópolis: Vozes , 2009), pela atualidade de pensar que, se elas continuam a ser acionadas, é porque sua verdadeira função se encontra encoberta - no caso, em lugar de erradicar a criminalidade, as ilegalidades, as delinquências (e ressocializar adolescentes em conflito com a lei), a instituição correcional serve para administrá-las, organizá-las e diferenciá-las, ou seja, fazer a gestão das transgressões. Contudo, se há controle, também há resistência, pois o caráter totalitário nunca será absoluto, e as relações de poder operam de modo difuso intra e intergrupos na interação cotidiana. Nesse sentido, vejamos:

eu acho que a instituição é só pra manter eles lá, fora, longe da sociedade. Manter eles aqui dentro e longe das pessoas de bem, né? Que trabalha, que luta pra ter as coisas, né? E vem um desse e rouba. Pra mim, eu vejo que eles tem que ficar aqui dentro. Porque a maioria pensa em fazer de novo, então… Pra mim, eu não me importo se aqui tá lotado ou não. Que é melhor [do] que ele estar lá fora. (ASE8)

Eu acho que é um… depósito de lixo. Na minha opinião. É lógico, é um trabalho, eu preciso, mas aqui não… como eu te disse, depósito de lixo a meu ver, com relação é… ao tratamento… Porque na maioria das vezes é… parece um teatro, que tem as pecinhas mais importantezinhas que estão lá em cima, tem as essenciais que somos nós e os adolescentes, né? Tudo assim, pra preencher um joguinho, que… Não sei, pra ver quem pode mais, quem manda mais e quem obedece mais, no caso nós. O que acontece, porque aqui dentro, o adolescente chega … ele vai ter a refeição dele, na hora certa, ele vai comer, ele vai ter o acompanhamento técnico, só que… saiu daqui, acabou. (ASE4)

Mas de onde parte a ideia de depósito de lixo senão do estoque de conhecimento mobilizado no cotidiano que, ao passo em que é acessado, também é (re)produzido? Nesse sentido, Wacquant (2007WACQUANT, L. J. D. Punir os pobres: nova gestão da miséria nos Estados Unidos. Rio de Janeiro: Revan, 2007.) explica que compõem o “lixo social”: jovens nascidos em bairros decadentes, filhos da prostituição, do analfabetismo e do consumo de drogas - estes, acrescentamos, são historicamente clientela seleta dos centros socioeducativos.

[…] pra eles [adolescentes], assim, aqui é só uma passagem, que eles vão voltar. Eles mesmos falam: “vou voltar na rua, vou roubar, vou usar droga de novo” (ASE8): essa fala, em tom de ironia, denota a reincidência que os agentes testemunham, desmotivadora de sua profissão, resultando, mesmo involuntariamente, em descaso/destrato com os adolescentes e perpetuando situações de negligência (Vinuto, 2015VINUTO, J. O processo de rotulação do adolescente encarcerado: o “recuperável”, o “estruturado”, e as condições de trabalho existentes em uma instituição de medida socioeducativa de internação. Grupo de Trabalho 13: Controle Social, Segurança Pública e Direitos Humanos. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2015.). Nesse ponto, nos indagamos se a indiferença denotada pelo descrédito não seria mecanismo defensivo dos agentes, minimizando a sensação de terem parcela de responsabilidade nos resultados negativos da ressocialização…

O fracasso institucional em ressocializar esteve presente na experiência de profissionais de saúde do sistema prisional (Lopes, 2014LOPES, V. A. Experiência de profissionais de saúde em unidade prisionais em Cuiabá/MT. 2014. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) - Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2014. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2PUw6Mw >. Acesso em: 26 out. 2018.
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) e também na dos agentes socioeducativos entrevistados, o que parece justificar a percepção de correspondência entre prisão e centro socioeducativo, assim como a equivalência do comportamento delituoso dos jovens ao dos maiores de 18 anos, embutindo neles a responsabilidade por seus atos ao referir: menores só na idade (ASE4). Bem podemos lembrar que cadeia/prisão e internato socioeducativo consistem em dispositivos de controle social, à maneira foucaultiana, e suas clientelas compartilham da mesma origem social; no entanto, lembramos suas singularidades quanto ao pressuposto da imputabilidade ou não do infrator e às respectivas legislações. No caso do adolescente infrator, pela inimputabilidade, ele não está se sujeito às sanções penais, mas sim às medidas socioeducativas previstas nos termos da legislação especial (Jimenez; Frasseto, 2015JIMENEZ, L.; FRASSETO, F. A. Face da morte: a lei em conflito com o adolescente. Revista Psicologia e Sociedade, Belo Horizonte, v. 27, n. 2, p. 404-414, 2015.). Está embutida aí a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento e o ideário protetivo; porém, tal como opera o sistema de Justiça Juvenil brasileiro, persistem as premissas do “modelo tutelar”, ou seja, institucionalização e apartação social do contingente infanto-juvenil tido como perigoso e indesejável às classes mais favorecidas, marcado pela sistemática violação de seus direitos e dos princípios que orientam o Direito Infanto-Juvenil e o Direito Penal no Estado democrático de Direito (Rodrigues, 2016RODRIGUES, E. C. C. Os 26 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente e os desafios da democracia brasileira. Sistema Penal & Violência, Porto Alegre, v. 8, n. 2, p. 243-256, 2016.). Nas palavras dos agentes:

a pessoa deveria saber que aqui é… é um presídio, não é uma internação pra criança. Não é um semiaberto, não é um lar da criança, não é conselho tutelar. Aqui realmente é um presídio, mas pra menores, que são menores só na idade, né? Porque no tamanho são homens […], porque na verdade o que diferencia aqui do presídio adulto, lotado, é só que aqui tem menos presos e são adolescentes. Porque aqui eles ficam presos junto ali, eles brigam, eles têm os problema deles… (ASE4)

Pra mim isso aqui é, também, uma cadeia, né? (ASE8)

Essa aproximação e esse espelhamento da prisão se estreita (reforça, confirma?) pela recente Lei Estadual nº 10.499/2017, que alterou a nomenclatura dos cargos da carreira dos profissionais do sistema socioeducativo, em que o cargo de agente passa a se designar “Agente de Segurança Socioeducativo” (Mato Grosso, 2017MATO GROSSO. Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso. Secretaria de Serviços Legislativos. Lei nº 10.499, de 17 de janeiro de 2017. Altera a Lei nº 9.688, de 28 de dezembro de 2011, que reestrutura a carreira dos Profissionais do Sistema Socioeducativo. Diário Oficial do Estado de Mato Grosso , Cuiabá, 19 jan. 2017. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2qbMBsj >. Acesso em: 11 abr. 2017.
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, grifo nosso). Como vimos, a experiência cotidiana dos agentes sustenta a adequação dessa alteração.

Instigou-nos, também, compreender as concepções dos agentes sobre aqueles que seriam a razão da existência da instituição e aos quais se dirige seu trabalho: os adolescentes. Assim, uma visão que ganhou relevo foi a de considerá-los vítimas sociais, orientada pelas explicações causais da prática de atos infracionais, que seria involuntária, consequência do meio em que nasceram e da maneira e condições em que foram criados, com pais/famílias ausentes, negligentes ou de quem herdaram a inclinação ou a opção pela infração. Tal ideia conflui com o entendimento da criminalidade juvenil como resultante de abandono material e moral presente na pobreza urbana que vicejou durante o século XX no Brasil (Paula, 2014PAULA, L. Justiça juvenil. In: LIMA, R. S.; RATTON, J. L.; AZEVEDO, R. C. (Org.). Crime, polícia e justiça no Brasil. São Paulo: Contexto, 2014. p. 450-461.), cabendo ao Estado a sua proteção e a da sociedade, já que a família seria falha e estaria na origem da criminalidade. Notemos a permanência dessa lógica no senso comum:

Às vezes o adolescente tá aqui, não é porque ele não presta, ele é bandido. É porque ele foi obrigado a entrar nessa vida, pelo pai… que as vezes o pai… ele já tá seguindo exemplo. Às vezes o pai tá preso, o pai é traficante, o pai é usuário […] eu acho que tudo parte, não é só do meio social onde ele vive, do bairro pobre que ele vive, mas da família. Eu acho que é essencial a família, porque a maioria desses adolescentes, nenhum o pai a mãe vive junto ainda. É menino que cresce na rua, que passa fome, que não é bem tratado, que fica doente, que sara por conta. Então, assim… são vidas que já vem destruídas já desde pequena… (ASE4)

Sem negar a presença da carência, nem todos adolescentes são percebidos como vítimas do acaso do nascimento, figurando a percepção de que parte deles inicia a trajetória de infrações pelo contágio moral (influência de amigos). Inspirada em Sylvie Faizang (apud Campos, 2005CAMPOS, E. A. Contágio, doença e evitação em uma associação de ex-bebedores: o caso dos Alcoólicos Anônimos. Revista de Antropologia, São Paulo, v. 48, n. 1, p. 315-361, 2005.), a acepção do contágio aqui não é biomédica, mas sociocultural: a transmissão de algo (a tendência à infração) pelo compartilhamento do mesmo espaço, do mesmo ar, pela proximidade social e pela vivência comum. Em consequência, se deterioram valores que regulam o exercício de papéis vividos na sociedade, perturbando a ordem social e requerendo correção.

acaba influenciado pela mídia mesmo, né? Por marcas [grifes], pelos colegas. Aí quer ter uma roupa de marca, um calçado, aí vai roubar, porque não tem outra saída, o pai não pode dar, a mãe não pode, porque é de família bem humilde, a maioria deles. A maioria deles nem casa tem, é… vive na rua. Então, assim, aí vai roubar. (ASE4)

Não podemos ignorar o engendramento de necessidades na sociedade capitalista e de seus interesses representados na mídia; mas nota-se, nessa última fala, a explicação combinada com elementos já discutidos - diferente das percepções de que há adolescentes com inclinação intrínseca para a prática infracional por suas características psicológicas e morais (caráter, índole, temperamento), conforme as declarações a seguir. A “ostentação”, no relato, traz implícita a gestão de si na forma de se apresentar ao outro e a decisão racional de ter acesso a bens supérfluos (não básicos) e seus significados. A citada “revolta” pode decorrer de postura crítica diante da situação dada e da impulsividade da ação que marcará, decisivamente, o destino do adolescente.

É claro que tem muitos aqui que passam fome e tudo mais, mas isso às vezes eu penso que isso é questão de caráter da pessoa… Não é porque você passa fome, passa necessidade, você tem que fazer esse tipo de coisa. Ah não! […] os guri fazem isso pra querer ostentar. Não é pra… alimentação. Não é assim: “tá passando fome em casa”. É pra ostentar… (ASE8)

[…] tem adolescente que tem boa índole, tem… a família boa, mas vezes por, por algum… uma revolta, alguma coisa mínima, acaba entrando pra esse mundo. E uma vez que entrou, é difícil pra sair… (ASE4)

Essas percepções decorrem das interações institucionais e interpessoais cotidianas concretas que se afetam e se moldam reciprocamente, ou produzem subjetividades, como diria Goffman (1974GOFFMAN, E. Manicômios, prisões e conventos. 9. ed. São Paulo: Perspectiva , 1974.), compondo a visão que os agentes socioeducativos constroem de si mesmos e do seu ofício, conforme abordado a seguir.

O olhar para si: um agente prisional de menor

O que caracteriza ser um agente socioeducativo? A percepção de incoerências entre a adjetivação “socioeducativo” e as atividades cotidianas reflete imprecisões. Segundo Oliveira et al. (2015OLIVEIRA, C. B. E. et al. Socioeducação: origem, significado e implicações para o atendimento socioeducativo. Revista Psicologia em Estudo, Maringá, v. 20, n. 4, p. 575-585, 2015.), o conceito socioeducativo surgiu no contexto do ECA, mas não foi amplamente discutido e esclarecido. No Sinase, os agentes são denominados socioeducadores, cabendo-lhes desenvolver tarefas pertinentes à preservação da integridade física e psicológica dos adolescentes e funcionários, como também atividades pedagógicas. No entanto, essas definições são contestadas pela prática cotidiana:

Eu não vejo a gente como um agente socioeducativo. Pra mim, a gente é um agente de segurança. Que a gente tem que levar, escoltar, tem que resguardar a segurança deles, evitar que eles se machucam, que eles machucam algum agente nosso. Então, agente socioeducativo… eu não vejo isso, tanto que a aqui tem psicólogos, tem assistentes sociais pra fazer esse tipo de trabalho. Eles são capacitados pra fazer isso. (ASE8)

A expressão “de menor”, na fala a seguir, é acionada na identificação da profissão. Historicamente, a figura do “menor” surgiu como categoria jurídica (menoridade penal) e social que definia a infância e a adolescência pobre, ora como abandonada e em perigo, ora como infratora e perigosa, localizando nessas fases a origem das condutas criminosas (Paula, 2014PAULA, L. Justiça juvenil. In: LIMA, R. S.; RATTON, J. L.; AZEVEDO, R. C. (Org.). Crime, polícia e justiça no Brasil. São Paulo: Contexto, 2014. p. 450-461.). Com isso, mobilizava-se a justiça recuperadora, incidindo nas causas dos desvios de conduta, em tempo de prevenir a formação do criminoso adulto - daí a origem das instituições de correção com ênfase na internação: esta protegeria o sujeito de influências propícias às condutas criminosas engendradas pelo abandono e pela situação de rua das crianças e dos adolescentes pobres e de famílias desestruturadas (Paula, 2014PAULA, L. Justiça juvenil. In: LIMA, R. S.; RATTON, J. L.; AZEVEDO, R. C. (Org.). Crime, polícia e justiça no Brasil. São Paulo: Contexto, 2014. p. 450-461.). Essa noção de justiça recuperadora vige desde o Código de Menores de 1927 e de 1979; se o ECA, em 1990, pôs fim à classificação de crianças e adolescentes pobres como “menores”, manteve e atualizou tal noção na figura jurídica das medidas socioeducativas aplicadas aos adolescentes envolvidos com a criminalidade juvenil, conclui Paula (2014PAULA, L. Justiça juvenil. In: LIMA, R. S.; RATTON, J. L.; AZEVEDO, R. C. (Org.). Crime, polícia e justiça no Brasil. São Paulo: Contexto, 2014. p. 450-461.). O seguinte trecho faz incisiva alusão a essa noção:

A gente é agente socioeducador, né? Só que na verdade a gente é um agente prisional de menor, né? Então agente, igual falava, carcerário, prisional, né? Porque na verdade nossa função aqui é escolta, é levar pra sair, tipo: sair, tem que sair algemado, tem que fazer a segurança dele, entendeu? Pra ele não fugir. É acompanhar, no caso, na assistente social, psicólogo, no médico, que é a mesma função do agente prisional, juizado, entendeu? E levar pra aula, aqui dentro mesmo, se precisar falar com gerente, alguma coisa. É isso. A gente não tem aquela função de conversar com ele, isso aí é papel de assistente social e psicólogo, entendeu? Tipo assim, a não ser que ele venha perguntar: “Oh, agente, tenho técnica, tenho psicólogo, tenho ligação?”. Mas ter uma conversa não tem. Até porque eu acho que como o nosso papel é segurança, a gente acha que, até, não tem que ter, entendeu? […] igual tô te falando, na verdade é um agente prisional só que de menor, num lugar insalubre, sujo, entendeu? (ASE1)

Mas o que vem a ser um “agente prisional de menor”? A fala denota o distanciamento entre a realidade vivenciada dos que coabitam a instituição e os princípios do ECA: o local em nada se assemelha aos “espaços para o desenvolvimento de atividades coletivas, na perspectiva de criar ambientes que possibilitem a prática de uma vivência com características de moradia” (Brasil, 2006BRASIL. Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. Resolução Nacional nº 119, de 11 de dezembro 2006. Dispõe sobre o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 7 dez. 2006, p. 30-69. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2qd4cQH >. Acesso em: 13 mar. 2015.
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, p. 69). O que se vê são estruturas e regras de natureza repressiva que tendem ao disciplinamento e à permanente vigilância, como as prisões, remetendo mais à função controladora dessas instituições sinalizada por Foucault (2009FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Trad. Raquel Ramalhete. 36. ed. Petrópolis: Vozes , 2009). Concordamos que “o internato, assim como as prisões para adultos, não está preparado para cumprir o seu suposto papel de ‘reeducação’, definindo-se muito mais como um lugar de punição”, cabendo ao agente, entre, muros, grades e algemas, viabilizar os atendimentos destinados aos adolescentes de modo disciplinado e seguro, semelhante ao que faz o agente prisional (Freitas, 2011FREITAS, R. B. D. Por que o abismo entre a lei e a realidade? Códigos, relações e valores construídos por adolescentes em conflito com a lei e privação de liberdade. Revista Perspectivas em Políticas Públicas, Belo Horizonte, v. 4, n. 7, p. 79-98, 2011., p. 83). Essa prática foi legitimada ao institucionalizar-se pela lei estadual já citada, incluindo a “segurança” na designação da ocupação de agente (Mato Grosso, 2017MATO GROSSO. Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso. Secretaria de Serviços Legislativos. Lei nº 10.499, de 17 de janeiro de 2017. Altera a Lei nº 9.688, de 28 de dezembro de 2011, que reestrutura a carreira dos Profissionais do Sistema Socioeducativo. Diário Oficial do Estado de Mato Grosso , Cuiabá, 19 jan. 2017. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2qbMBsj >. Acesso em: 11 abr. 2017.
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).

Outra marca da identidade do agente socioeducativo é a conversa, como um deles diz: [Do que] a gente faz, noventa por cento é a segurança, dez é de conversar, entendeu? De verbalizar com eles (ASE2). Durante o trabalho de campo, observamos que as conversas com os adolescentes eram frequentes, mas seus contornos parecem confluir para uma habilidade estratégica e instrumental, entendida como extremamente necessária no cotidiano profissional. Afinal, esses profissionais, como parte da equipe dirigente, representam a instituição e seus objetivos (Goffman, 1974GOFFMAN, E. Manicômios, prisões e conventos. 9. ed. São Paulo: Perspectiva , 1974.), de modo que as conversas são permeadas de elementos morais e oportunizam apresentar a perspectiva racional defendida pelo estabelecimento institucional (Benelli, 2014BENELLI, S. J. A lógica da internação: instituições totais e disciplinares (des)educativas. São Paulo: Editora Unesp, 2014. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2Auv0BU >. Acesso em: 25 jun. 2018.
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).

A gente já tem que conversar. Você tem que dialogar, você tem que orientar, você tem que fazer ele entender que tem as normas, tem as regras, que tem que ser feita as atividades, que é importante pra eles, né? […] Por mais que isso seja da equipe técnica, né? Fazer esse trabalho de acolhimento, de psicólogo, mas eu acho que é um pouco psicólogo, também. Porque passa esse tempo todo com eles conversando, né? Tudo que eles têm, que eles precisa, eles vêm perguntar pra gente. Então a gente tem que estar preparado pra ter essa troca de ideia, tem que ter esse entendimento com eles, né? (ASE11)

Na sequência, percebe-se a dificuldade da atuação socioeducativa frente à ambiguidade institucional, resultante da “lógica paradoxal que rege os espaços de privação de liberdade: a coerção e a socioeducação” (Adami; Bauer, 2013ADAMI, A.; BAUER, M. Perfil e prática do agente de segurança socioeducativa: recomendações para a Subsecretaria de Atendimento às Medidas Socioeducativas de Minas Gerais. 2013. Dissertação (Mestrado em Gestão e Políticas Públicas) - Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 2013. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2AtWjvO >. Acesso em: 12 abr. 2015.
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, p. 68). É que a instituição em questão carreia características de um espaço privativo-punitivo (como tranca e destranca, citadas adiante), aproximando-se do que Paula (2014PAULA, L. Justiça juvenil. In: LIMA, R. S.; RATTON, J. L.; AZEVEDO, R. C. (Org.). Crime, polícia e justiça no Brasil. São Paulo: Contexto, 2014. p. 450-461.) assinalou como técnicas punitivo-pedagógicas, mantendo-se a finalidade de recuperação dos indivíduos e de correção de condutas e alterando-se apenas as técnicas empregadas, conforme o contexto histórico-social e o acúmulo de saberes sobre os adolescentes pobres e suas trajetórias individuais. Notemos:

com alguns eu tento, converso com eles, eu busco conversar sempre com os adolescentes, entendeu? Por exemplo: tem uma intriga, a gente vai conversando, aí tem uns que senta do seu lado e você conversa com ele, dá um conselho pra ele. Muitos não aceitam, alguns aceitam, entendeu? Acho que é só nesse momento que a gente pode tá falando com o adolescente. Na realidade nosso trabalho, como eu disse pra você, o nosso trabalho é só de tranca e destranca. (ASC6)

Os agentes se veem, também, como a categoria de maior contato com os adolescentes ao longo do dia, em contraste com outras jornadas diárias mais curtas e com atuações pontuais, além de se constituírem como elo, sendo mediadores das demandas para outros setores e profissionais que ali atuam. Ocorre que, diante das necessidades sentidas, que se traduzem nas solicitações, o agente precisa habilmente lidar com a negação (e saber como fazê-la) ou com a demora para atendê-las, ocasionando possível irritação nos adolescentes, que podem interpretar e reagir de diferentes formas. Esse maior contato articula poderes e saberes sobre a cultura interna, como já apontava Goffman (1974GOFFMAN, E. Manicômios, prisões e conventos. 9. ed. São Paulo: Perspectiva , 1974.), que são úteis no cotidiano do agente socioeducativo, semelhante ao que ocorre com os agentes penitenciários que, conhecendo as normas, os valores e a lógica operativa, “conseguem manter a ordem, num delicado equilíbrio entre cumprimento de seu dever e omissão quanto a algumas práticas costumeiras dos marginais, com fins a não sofrer represálias” (Valejo, 2013VALEJO, M. Prisionalização: um retrato do submundo carcerário. Revista Intertemas, Presidente Prudente, v. 26, n. 26, p. 1677-1281, 2013., p. 37-38), exercendo o controle necessário. Parece mais uma atuação estratégica e defensiva do profissional que visa à docilidade dos internos e à segurança institucional, mesmo diante de situações adversas.

Aí você tem que ter o jogo de cintura, paciência pra chegar, conversar, explicar a situação, tentar disciplinar. Porque é fácil, às vezes, falar: “ah, o socioeducativo tem o trabalho de socioeducação, de isso, daquilo, tem aula”. Não, mas só que quem tá o tempo todo com eles é nós. É nós que tá na linha de frente. Professor vem aqui, passa um filme e vai embora. A técnica vem, conversa um pouquinho com o adolescente, dá um papelzinho pra ele escrever uma cartinha e vai embora. E nós ficamos aqui. (ASE4)

O papel do agente como protetor figurou nos relatos mostrando variadas conotações: a proteção dos adolescentes, evitando conflitos e confrontos entre desafetos; proteger aqueles que, pela natureza do ato infracional (sexual ou contra familiar), podem ser agredidos; protegê-los durante confronto de adolescentes, dissipando e mediando o conflito. Mas essa proteção também é para si, porque a equipe de plantão responde administrativamente pelas ocorrências e porque, ao intervir, podem ser agredidos acidentalmente (ou não); e a tentativa de apaziguamento pode requerer uso da força se os envolvidos estão em embate, podendo resultar em lesão involuntária (ou não) no interno e render-lhe acusações de ações violentas ou excessivas. Nesse sentido, tanto as armas são citadas no uso para a intimidação quanto as “não letais” seriam utilizadas para a contenção de episódios violentos, sem colocar em risco a vida e a integridade física dos envolvidos. Contudo, seu uso em centros socioeducativos é controverso, e seus defensores se inspiram na regulamentação da Lei nº 13.060/2014 (Brasil, 2014BRASIL. Casa Civil. Lei nº 13.060, de 22 de dezembro de 2014. Disciplina o uso dos instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública, em todo o território nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 2014. Seção 1, p. 3. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2Ob1QLA >. Acesso em: 14 mar. 2015.
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), no âmbito da segurança pública.

A nossa função é proteger, mas a gente não tem uma arma, um spray de pimenta, não tem nada, né? Malemá uma tonfa, né? Uma tonfa contra um aço, não dá… (ASE1)

[…] tem essa também: a gente não usa arma. Nem a segurança a gente faz, porque não tem arma… (ASE8)

O discurso de equiparação das ocupações de agentes prisionais e socioeducativos assente na percepção de riscos similares e é mobilizada para sustentar a reivindicação da regulamentação do porte de arma “mesmo fora de serviço”, reconhecendo-se ser esta uma profissão cujos riscos se estendem para fora da instituição. Atualmente tramita o Projeto de Lei do Senado nº 256/2016 (Brasil, 2016BRASIL. Projeto de Lei do Senado nº 256, de 2016. Altera a Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, para conceder o porte de arma as agentes de segurança socioeducativos, e dá outras providências. Senado Federal, Brasília, DF, 2016. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2D6pYOd >. Acesso em: 3 jan. 2018.
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) para regulamentar o porte de arma para agentes socioeducativos; mas, enquanto isso, agenciamentos particulares se efetivam, como na segunda fala a seguir:

Por isso te falo: agente penitenciário é uma profissão de risco, mas agente orientador é uma profissão de risco. Que você, se um adolescente pegar você, e você ficar trancado dentro da ala, junto com os outros adolescentes… […] Como já teve casos de orientador ser pego de refém e não conseguir entrar aqui dentro do sistema socioeducativo, do portão pra cá. (ASC6)

Como agente, não tem a legislação própria nossa, igual a penitenciária tem, que pode usar arma, entendeu? Eu mesmo consegui tirar o porte, entendeu? É… por outra portaria e eu tenho porte. Graças a Deus, eu já tô mais tranquilo, mas tem outro colega que não tirou porte e não comprou arma, entendeu? Mas, graças a Deus, eu consegui tirar tudo na lei, ando armado, mas ando na lei. É um porte particular, não tem nada a ver com a instituição. (ASE2)

Reitera-se que tais percepções de riscos se constroem por vivências concretas medonhas, como rebeliões, motins, mortes de agentes em tentativa de assalto, frequentemente noticiadas pelos jornais, expressando a preocupação constante de possíveis represálias:

Assim, pode até ter sido com a intenção de assalto [refere a um caso recentemente ocorrido e publicado em jornal local], mas quando eles viram quem eles eram - agentes socioeducativos - atiraram. Tanto é que não levaram nada. (ASE1)

Olha, agente orientador, agente prisional foi morto? É por causa da profissão, é por causa que eles [internos, presos] têm raiva, é por causa que eles são criminosos. (ASC6)

O trabalho nas instituições de privação de liberdade é permeado de situações de risco físico, moral e psíquico, pois requer alto nível de concentração e ritmo acelerado, além de oferecer tensão e imprevisibilidade (Lourenço, 2010LOURENÇO, A. S. O espaço de vida do agente de segurança penitenciário no cárcere: entre gaiolas, ratoeiras e aquários. 2010. Tese (Doutorado em Psicologia Social) - Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2OUo8GR >. Acesso em: 15 out. 2014.
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), como fica evidente no relato a seguir sobre o início da carreira de um agente e sobre quando a unidade, antes de uma grande reforma, abrigava maior número de adolescentes em condições precárias extremas.

Na realidade, já saía do portão pra fora, saía olhando pro céu, falava: “meu Deus, obrigada por mais um dia que eu tô saindo viva”. Porque, realmente, era aquela coisa, a gente entrava, eu entrava já com a minha vida entregue nas mãos de Deus. Falava “hoje eu vou entrar, mas não sei se vou sair”. Era assim, todo mundo entrava assim, né? A gente entrava sabendo que tava entrando, mas não sabia se ia sair, né? Aí no outro dia, quando a gente saia, dava aquele alívio. (ASE7)

A solidariedade profissional também caracteriza a prática do agente socioeducativo enquanto recurso que aplaca temores cotidianos. Para Foucault (2009FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Trad. Raquel Ramalhete. 36. ed. Petrópolis: Vozes , 2009), a disposição de cooperar relaciona-se com a necessidade das instituições disciplinares de repartir tarefas, produzindo corpos dóceis e hábeis, prontos para responder a comandos. Ou seja, os profissionais também estão sujeitos às imposições de ordem e disciplina da unidade: a partir de um gesto ou de um olhar trocado, adestram-se para responder a uma ordem/comando em sincronia com as ações da instituição. Testemunhamos a perspicácia da interpretação de sutilezas do ambiente e o cuidado para que as ações com os adolescentes se realizassem solicitamente - ao menos por dois agentes.

Você vê que um confia no outro, né? Que é aquela coisa: se eu vou, você vai junto, né? Igual ali, você entra na ala e vê que vem mais dois, três com você, você já entra mais seguro, mas se você vê que é só você sozinho, fica meio complicado, né? (ASE7)

Os agentes pressupõem confiança e proteção mútuas, que transcorrem em permanente estado de alerta, sendo comuns em ocupações que envolvem segurança e transcendendo os portões da unidade, de modo que estão sempre vigiando e se acautelando dos lugares frequentados para evitar a chance de encontros inusitados com ex-internos (Barbosa, 2005BARBOSA, A. R. Prender e dar fuga: biopolítica, sistema penitenciário e tráfico de drogas no Rio de Janeiro. 2005. Tese (Doutorado em Antropologia Social) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2AtASLv >. Acesso em: 1º mar. 2017.
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), sendo balizados por esquemas tipificados para interpretar e agir em tais situações cotidianas. É uma profissão, portanto, que afeta a sociabilidade.

eu comecei a não frequentar certos lugares, não andar tal horário, sabe? Então, esse trabalho nosso, ele implica, querendo ou não, ele implica na nossa vida social. Hoje em dia, você vai, você já vê um adolescente na rua, você já fica meio assim, né? (ASE7)

Então, assim, pra gente é muito perigoso, sair pra barzinho. Não saio, porque tenho medo. Shopping de vez em quando, mais em casa mesmo. […] até os contratados, né? Você entrou pra essa área, você perde a sua vida social. Não tem condições, você vai viver uma vida normal sim, mas bem restrita e com bastante medo, sim. Justamente por nós trabalhar nessa área. (ASE4)

Questão do lazer, quem trabalha aqui não pode ir em qualquer lugar, entendeu? Você não pode ir num parque. Eu mesmo não vou, tem que selecionar pra mim sair com a minha família, entendeu? Tem que selecionar pra onde que eu vou, eu não vou num parque, numa praça no Pedra 90 [bairro periférico]. (ASE2)

A percepção de profissão estressante tem como parâmetro sinais e sensações corporais vagas, legitimadas pelo saber biomédico, decorrentes da natureza das atividades e amplificadas pelo longo plantão e pelo trabalho noturno. Estudos sobre a saúde dos profissionais de instituições totais apontaram maiores riscos de adoecimento que os da população em geral (Tschiedel; Monteiro, 2013TSCHIEDEL, R. M.; MONTEIRO, J. K. Prazer e sofrimento no trabalho das agentes de segurança penitenciária. Estudos de Psicologia, Natal, v. 18, n. 3, p. 527-535, 2013.) em consequência da perda de noites de sono, com redução do estado de alerta, irritação, ganho de peso e dores de cabeça (Jesus et al. 2016JESUS, C. S. et al. Reflexo do serviço noturno frente às condições de trabalho, saúde, vida social e familiar do profissional de enfermagem. Revista Inova Saúde, Criciúma, v. 5, n. 2, p. 76-95, 2016.) - que foram sintomas aqui pontuados:

Altera nosso relógio biológico, né? Como você tá no plantão, a gente chegou aqui, a gente não tinha costume com o plantão. A partir do momento que a gente começou a fazer plantão, no começo foi bem difícil. Até começar a acostumar com os horários, porque numa vida normal, num horário normal, a noite toda, oito horas por noite, você vai deitar naquele certo horário, vai dormir e vai levantar no outro dia de manhã. Aqui não. Aqui você tá acordado, você tá comendo. Então, todo mundo engordou. A gente engordou. Engordei 10 kg a mais, com cinco anos. Às vezes cê tem um pouquinho mais de dor de cabeça. Até mesmo pelo estresse, assim, de você tá aqui ligado o tempo todo. (ASE4)

Na minha saúde, um exemplo, assim, dá muita dor de cabeça, dor na nuca. Dor nas costas, que isso aí é o estresse, entendeu? Só que a gente tenta controlar… Mas de vez em quando você sai de plantão, não dá pra você dormir. Dormir de dia é diferente de você dormir à noite. Afetou sim. Muita queda de cabelo, entendeu? Não é porque a gente tá ficando velho que vai cair o cabelo, mas do tempo que eu entrei aqui, deu muita queda de cabelo. Que é o estresse, que eu já procurei o médico, entendeu? Eu já procurei, o médico já falou. Tive um problema aqui na vista, entendeu? Quando eu fui chefe de plantão, tive muito estresse, que estourou um vasinho no fundo do meu olho. E o médico perguntou o que aconteceu, onde eu trabalhava; e ele fez a análise e falou: “oh, estourou um vaso no fundo do seu olho. Nós vai ter que fazer uma cirurgia, entendeu? Vai ter aplicação de um produto pra estancar a hemorragia, se nós não fazer até amanhã é perigoso você perder a vista, e isso aí é causado pelo estresse”. O que o estresse faz? Ele falou: “dá ataque cardíaco, queda de cabelo, dor nas costas”. (ASE 2)

Além de ser gerador de adoecimentos, é um trabalho agravador de patologias já existentes por transcorrer em um contexto que exacerba sensações, emoções e sentimentos.

Aqui é tudo muito intenso. A partir do momento que você entrou daquele portão aqui pra dentro, aqui se tá frio, aqui tá o polo norte. É muito mais frio aqui dentro. Se tá calor, aqui é um inferno de calor. Aqui é tudo muito intenso. […] no outro dia você está sugado, detonado. Não tem, assim, sabe… ânimo pra nada, chega em casa você tinha que tomar um banho quente, que parece, que por mais que você toma banho aqui à noite, no outro dia, parece que você tá sujo do mesmo jeito. Chegar em casa tomar um banho de água quente, lavar a cabeça, os pés, entendeu? […] Fico detonada, não durmo, mas fico sabe… no outro dia que eu vou recuperar. (ASE1)

Nesse depoimento, a sujidade pode ser analisada tomando-se o corpo como sistema simbólico e a assepsia corporal como uma profilaxia, também simbólica, moral. Corrobora para essa metáfora a ideia de que sujeira é contraponto de pureza e se encontra no reino da desordem, da desorganização social (Douglas, 1976DOUGLAS, M. Pureza e perigo. São Paulo: Perspectiva, 1976.), como aquilo que ameaça, polui, deve ser evitado, impedido e que os rituais de despoluição e purificação não alcançam pela materialidade do banho. Sujidade perigosa porque atravessa as fronteiras simbólicas do contágio moral - consequência de se trabalhar onde se deposita lixo, como dito antes, o que, portanto, embute nojo, sendo esta

reação de respeito pelas convenções que classificam e separam, assim como o ato de purificar é um ato de retirar as manchas que borram as linhas de marcação dos limites de cada categoria, porque é necessário haver separação para haver comunicação e haver sentido para a poluição ter sentido. Uma coisa nojenta é sempre uma coisa que cruza indevidamente uma linha demarcatória, estabelecendo-se em um lugar impróprio e deslocando no sistema de ordenação. A reação do nojo é uma reação proteção contra a transgressão da ordem. (Rodrigues, 2006RODRIGUES, J. C. Tabu do corpo. 7. ed. Brasília: Fiocruz, 2006., p. 140)

Finalizamos questionando como se livrar de algo em que se está envolvido na (re)produção de sua existência?

Considerações finais

Ao abordar a identidade do agente socioeducativo nos vimos discorrendo sobre as interações que se travam na vida cotidiana: com pessoas, grupos sociais, instituição (missão, normas, estrutura física), legislações, programas sociais e consigo (cada biografia), extrapolando o plano situacional e sendo também histórico (biografia contextualizada).

A constituição da identidade é relacional e não dissociada da definição do contexto de ação, que é, também, contexto de definição de si e dos outros (Dubar, 2005DUBAR, C. A socialização: construção das identidades sociais e profissionais. São Paulo: Martins Fontes, 2005.). Assim, aqueles agentes também sentem as repercussões das contradições e das precariedades existentes porque estão enredados naquele contexto e são afetados para além dele, como vimos.

Os elementos identitários dos agentes socioeducativos foram sendo aqui apresentados, tendo sido eles seduzidos pelas vantagens do cargo público em sobreposição ou em compensação das agruras vivenciadas no processo de socialização da profissão à qual passaram a pertencer e que passaram a (re)produzir, dando-lhe vida e continuidade. O lugar de quem fala se legitima pela experiência cotidiana: são profissionais que compartilham e atestam na pele o mundo social institucional e comunicam o que é retido, porque isso os afeta e os marca, ao passo que cada um vai também imprimindo suas marcas e deixando seus rastros.

Resguardadas as singularidades contextuais, este estudo visibilizou aspectos da identidade de um segmento profissional, envolta em processos relacionais e históricos que posicionam sujeitos e reciprocamente produzem suas experiências. Assim, na porosidade e na permeabilidade das interações, forjam-se e são forjados pessoas, profissionais, grupos e instituições - indissociados: gentes e coisas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    10 Jul 2018
  • Aceito
    17 Out 2018
Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. Associação Paulista de Saúde Pública. SP - Brazil
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