Mulheres Comem, Mães Cozinham: uma aproximação da construção da maternidade e das práticas culinárias domésticas na Amazônia Ocidental Brasileira

Women eat, Mothers cook: motherhood and cooking practices in Western Brazilian Amazon

Mayara Sanay da Silva Oliveira Ramiro Andrés Fernandez Unsain Priscila de Morais Sato Mariana Dimitrov Ulian Fernanda Baeza Scagliusi Sobre os autores

Resumo

Este artigo objetiva descrever e discutir as maneiras como a maternidade é praticada e representada nas práticas culinárias domésticas das mulheres na Amazônia ocidental brasileira. Desenvolvemos um estudo qualitativo descritivo, conduzimos entrevistas em profundidade com 16 mulheres que eram mães e que cozinhavam em domicílio. Os dados foram analisados identificando as unidades de significância regulares, expressivas e significativas coletadas por meio das entrevistas. Essas mulheres, quando não tinham filhos, realizavam práticas culinárias atendendo suas demandas pessoais e horários do trabalho extradomiciliar. A partir da gestação, porém mais marcadamente após o parto, as mulheres modificam suas práticas culinárias se apropriando das ideias hegemônicas pré-construídas do que é ser uma mãe, desenvolvendo atividades culinárias mais rotineiras, não discricionárias, focadas no cuidado dos membros da família e com maior investimento de tempo e esforço. Estas mudanças reforçam a concepção de que a relação mãe e criança deve estar orientada para uma maternidade intensiva.

Palavras-chaves:
Culinária Doméstica; Performatividade de Gênero; Feminismo; Pesquisa Qualitativa

Abstract

This paper describes and discusses how motherhood is practiced and represented in women’s domestic cooking practices in Western Brazilian Amazon. A descriptive and qualitative study was conducted with 16 women cooks using in-depth interviews. Data were analyzed by identifying the regular, expressive and significant units of significance. These women, when childless, cooked to meet their individual needs and out-of-home work schedules. During pregnancy, but specially after birth, women modify their cooking practices, appropriating the preconceived hegemonic ideas on what it means to be a mother, focused on homemaking and greater investment of time and effort. Such changes reinforce the belief that mother-child relations should involve intensive motherhood.

Keywords:
Domestic Cooking; Gender Performativity; Feminism; Qualitative Research

Introdução

A maternidade pode ser definida como um conjunto de discursos, comportamentos, atitudes e ações relacionadas à dinâmica das mulheres e suas crianças, e que são aprendidos e reproduzidos socioculturalmente pelos indivíduos (Malacrida, 2009MALACRIDA, C. Performing motherhood in a disablist world: Dilemmas of motherhood, femininity and disability. International Journal of Qualitative Studies in Education, Abingdon, v. 22, n. 1, p. 99-117, 2009. DOI: 10.1080/09518390802581927
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). Desde a década de 1970, estudos no campo da maternidade têm problematizado como a maternidade é institucionalizada, promulgada, aplicada, praticada e representada nas políticas, experiências, identidades e agências dos indivíduos (Badinter, 1981BADINTER, E. Mother love: Myth and reality: motherhood in modern history. New York: Macmillan, 1981.; O’Reilly; Green, 2012O’REILLY, A.; GREEN, F. J. Motherhood Studies. In: O’REILLY, A. Encyclopedia of Motherhood. Boston: SAGE Publications, 2012.).

Dentre outras maneiras, a maternidade pode ser estudada sob a ótica da pessoa que realiza o trabalho relacional e logístico da criação da prole, com ênfase nas práticas sociais de cuidar e nutrir (Kawash, 2011KAWASH, S. New directions in motherhood studies. Signs, Chicago, v. 36, n. 4, p. 969-1003, 2011.; O’Reilly; Green, 2012O’REILLY, A.; GREEN, F. J. Motherhood Studies. In: O’REILLY, A. Encyclopedia of Motherhood. Boston: SAGE Publications, 2012.). Considerando o nutrir, estudos prévios investigaram a relação do trabalho alimentar materno com as ideias, os conhecimentos e as estratégias discursivas e interpessoais para condutas das práticas culinárias materna e da alimentação infantil (Brenton, 2017BRENTON, J. The limits of intensive feeding: maternal foodwork at the intersections of race, class, and gender. Sociology of Health and Illness, Bethesda, v. 39, n. 6, p. 863-877, 2017. DOI: 10.1111/1467-9566.12547
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; Elliott; Bowen, 2018ELLIOTT, S.; BOWEN, S. Defending Motherhood: Morality, Responsibility, and Double Binds in Feeding Children. Journal of Marriage and Family, Hoboken, v. 80, n. 2, p. 499-520, 2018. DOI: 10.1111/jomf.12465
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). Além disso, também foi investigada a relação da transição para a maternidade com a percepção de saúde e do comportamento alimentar dos indivíduos (Moura; Aschemann-Witzel, 2020MOURA, A. F.; ASCHEMANN-WITZEL, J. A downturn or a window of opportunity? How Danish and French parents perceive changes in healthy eating in the transition to parenthood. Appetite, Amsterdam, v. 150, p. 104658, 2020. DOI: 10.1016/j.appet.2020.104658
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).

Estes estudos supracitados evidenciam que em muitas sociedades as mães são responsabilizadas pelo trabalho alimentar doméstico que inclui uma ampla gama de atividades para fornecer alimentos para suas famílias (Cairns; Johnston; Mackendrick, 2013CAIRNS, K.; JOHNSTON, J.; MACKENDRICK, N. Feeding the “organic child”: Mothering through ethical consumption. Journal of Consumer Culture, Thousand Oaks, v. 13, n. 2, p. 97-118, 2013. DOI: 10.1177/1469540513480162
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; Elliott; Bowen, 2018ELLIOTT, S.; BOWEN, S. Defending Motherhood: Morality, Responsibility, and Double Binds in Feeding Children. Journal of Marriage and Family, Hoboken, v. 80, n. 2, p. 499-520, 2018. DOI: 10.1111/jomf.12465
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). Os pesquisadores, ainda, sugerem que o trabalho alimentar apresenta centralidade na construção da identidade das mulheres e das mães, bem como na relação mães e crianças (Cairns; Johnston; Mackendrick, 2013CAIRNS, K.; JOHNSTON, J.; MACKENDRICK, N. Feeding the “organic child”: Mothering through ethical consumption. Journal of Consumer Culture, Thousand Oaks, v. 13, n. 2, p. 97-118, 2013. DOI: 10.1177/1469540513480162
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; Elliott; Bowen, 2018ELLIOTT, S.; BOWEN, S. Defending Motherhood: Morality, Responsibility, and Double Binds in Feeding Children. Journal of Marriage and Family, Hoboken, v. 80, n. 2, p. 499-520, 2018. DOI: 10.1111/jomf.12465
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). Neste sentido, autores como Brenton (2017BRENTON, J. The limits of intensive feeding: maternal foodwork at the intersections of race, class, and gender. Sociology of Health and Illness, Bethesda, v. 39, n. 6, p. 863-877, 2017. DOI: 10.1111/1467-9566.12547
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), e Elliott e Bowen (2018ELLIOTT, S.; BOWEN, S. Defending Motherhood: Morality, Responsibility, and Double Binds in Feeding Children. Journal of Marriage and Family, Hoboken, v. 80, n. 2, p. 499-520, 2018. DOI: 10.1111/jomf.12465
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) colocaram em hipótese que, no geral, a prática culinária materna hegemônica está associada a uma concepção de “maternidade intensiva” que é centrada na criança, orientada por especialistas, emocionalmente absorvente, trabalhosa e financeiramente cara, sendo considerada socialmente mais importante que o trabalho extradomiciliar feminino.

Partindo destas discussões, este estudo tem por objetivo descrever e discutir as maneiras como a maternidade é praticada e representada nas práticas culinárias domésticas de mulheres residentes no Brasil, estado do Acre, cidade de Cruzeiro do Sul.

Perspectiva teórica

Badinter (1981BADINTER, E. Mother love: Myth and reality: motherhood in modern history. New York: Macmillan, 1981.) ressalta que o “amor maternal” não é universal e menos ainda um “instinto natural”, mas um fenômeno construído socialmente. Partindo dessa ideia inicial, neste artigo utilizamos o conceito de performatividade da maternidade (Jeremiah, 2006JEREMIAH, E. Motherhood to Mothering and Beyond: Maternity in Recent Feminist Thought. Journal of the Association for Research on Mothering, London, v. 8, n. 1, p. 21-33, 2006.; Malacrida, 2009MALACRIDA, C. Performing motherhood in a disablist world: Dilemmas of motherhood, femininity and disability. International Journal of Qualitative Studies in Education, Abingdon, v. 22, n. 1, p. 99-117, 2009. DOI: 10.1080/09518390802581927
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) com intuito de problematizar as práticas da maternidade enquanto provisórias e em constante reconstrução. Embasamos nossas análises nos trabalhos de Jeremiah (2006JEREMIAH, E. Motherhood to Mothering and Beyond: Maternity in Recent Feminist Thought. Journal of the Association for Research on Mothering, London, v. 8, n. 1, p. 21-33, 2006.) e Malacrida (2009MALACRIDA, C. Performing motherhood in a disablist world: Dilemmas of motherhood, femininity and disability. International Journal of Qualitative Studies in Education, Abingdon, v. 22, n. 1, p. 99-117, 2009. DOI: 10.1080/09518390802581927
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) que se contrapõem à noção essencialista da maternidade como um “destino natural das mulheres” atrelado a um único comportamento advindo da suposta existência de um “instinto materno” ou “natureza feminina”.

Jeremiah (2006JEREMIAH, E. Motherhood to Mothering and Beyond: Maternity in Recent Feminist Thought. Journal of the Association for Research on Mothering, London, v. 8, n. 1, p. 21-33, 2006.) defende a concepção de uma ética materna performativa, caracterizada pela relacionalidade e corporeidade. Por sua vez, Malacrida (2009MALACRIDA, C. Performing motherhood in a disablist world: Dilemmas of motherhood, femininity and disability. International Journal of Qualitative Studies in Education, Abingdon, v. 22, n. 1, p. 99-117, 2009. DOI: 10.1080/09518390802581927
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) argumenta que a ideologia da maternidade ideal é sustentada pelas ações de inúmeras mulheres que se esforçam para alcançar seus objetivos como mães e que, por sua vez, elas experimentam uma sensação de sucesso como mulheres e mães quando conseguem realizar um trabalho impecável, uma aparente encenação da maternidade ideal. Baseados nos trabalhos supramencionados, nós pensamos a maternidade como uma matriz por meio da qual o “eu” materno emerge em consequência da decisão (e/ou mandato) de ser mãe e da adoção de “estilos” de maternidades possibilitados no interior de um quadro regulatório restrito cultural e temporalmente.

Destaca-se aqui o conceito de trabalho alimentar intensivo que segundo Brenton (2017BRENTON, J. The limits of intensive feeding: maternal foodwork at the intersections of race, class, and gender. Sociology of Health and Illness, Bethesda, v. 39, n. 6, p. 863-877, 2017. DOI: 10.1111/1467-9566.12547
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) está associado à crença generalizada de que uma “boa mãe” precisa performar uma “maternidade intensiva”. Esse modelo de maternidade requer uma responsabilidade individual das mães para manter as crianças saudáveis e seguras, por meio do investimento de trabalho mental, emocional e físico intensivo, bem como recursos financeiros (Brenton, 2017BRENTON, J. The limits of intensive feeding: maternal foodwork at the intersections of race, class, and gender. Sociology of Health and Illness, Bethesda, v. 39, n. 6, p. 863-877, 2017. DOI: 10.1111/1467-9566.12547
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). De outra parte, a maternidade intensiva está relacionada com a “maternidade hegemônica” que assume que a criação dos filhos é um dever da mãe, que a maternidade ocorre dentro de uma família nuclear autossuficiente e que o emprego remunerado entra em conflito com a maternidade (Dow, 2016DOW, D. M. Integrated Motherhood: Beyond Hegemonic Ideologies of Motherhood. Journal of Marriage and Family, Hoboken, v. 78, n. 1, p. 180-196, 2016. DOI: 10.1111/jomf.12264
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). Assim, considerando as ideias de Jeremiah (2006JEREMIAH, E. Motherhood to Mothering and Beyond: Maternity in Recent Feminist Thought. Journal of the Association for Research on Mothering, London, v. 8, n. 1, p. 21-33, 2006.) e Malacrida (2009MALACRIDA, C. Performing motherhood in a disablist world: Dilemmas of motherhood, femininity and disability. International Journal of Qualitative Studies in Education, Abingdon, v. 22, n. 1, p. 99-117, 2009. DOI: 10.1080/09518390802581927
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) de performatividade da maternidade, mesmo que as mães não se conformem com a ideologia de alimentação intensiva, elas continuam a influenciar as mulheres, conforme demonstrado por seus esforços para reformular, redefinir ou rejeitar ativamente essa ideia.

Métodos

Desenho do estudo

Este estudo faz parte do Estudo MINA-Brasil, uma coorte de nascimento que visa identificar determinantes precoces para promover crescimento e desenvolvimento adequados na primeira infância (Cardoso et al., 2020CARDOSO, M. et al. Cohort profile: The Maternal and Child Health and Nutrition in Acre, Brazil, birth cohort study (MINA-Brazil). BMJ Open, London, v. 10, n. 2, p. e034513, 2020. DOI: 10.1136/bmjopen-2019-034513
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). Enquanto subestudo dessa coorte, desenvolvemos um programa de pesquisa qualitativa descritiva (Sandelowski, 2000SANDELOWSKI, M. Whatever happened to qualitative description? Research in Nursing & Health, Bethesda, v. 23, n. 4, p. 334-340, 2000. DOI: 10.1002/1098-240x(200008)23:4<334::aid-nur9>3.0.co;2-g
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) para elucidar como a maternidade é praticada e representada nas práticas culinárias domésticas das mulheres. Nossa pesquisa ocorreu no seguimento de dois anos do Estudo Mina- Brasil, cuja retenção de coorte foi de 69,9%, num total de 868 pessoas elegíveis. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP).

Local do estudo

O estudo foi realizado em Cruzeiro do Sul, AC, Amazônia Ocidental brasileira. Este município é o segundo maior do estado do Acre, com uma população estimada em 87.673 habitantes em 2018 (IBGE, 2019IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Brasil em Síntese - Acre - Cruzeiro do Sul. Brasília, DF, 2019. Disponível em: <Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/ac/cruzeiro-do-sul/panorama >. Acesso em: 20 mai. 2019.
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) e está localizado a 636 quilômetros (395 milhas) da capital Rio Branco. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) deste município é de 0,664, caracterizando o desenvolvimento médio (as médias regional e nacional são 0,683 e 0,759, respectivamente) (IBGE, 2011IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo demográfico 2010. Características da população e dos domicílios: resultados do universo. Rio de Janeiro, 2011.).

Seleção dos participantes

Focamos em uma subamostra do estudo Mina- Brasil composta por mulheres, com idade entre 18 e 41 anos, mães biológicas de pelos menos uma criança com idade entre um e dois anos, e que cozinham em casa pelo menos uma vez ao dia. Para definir o tamanho da amostra, seguimos as recomendações de Kuzel (1992KUZEL, A. Sampling in qualitative inquiry. In: CRABTREE, B.; MILLER, W. (Ed.). Doing qualitative research. Newbury Park: Sage, 1992. p. 31-44.) de que uma heterogeneidade e variação máxima de dados pode ser alcançada com uma amostra entre doze e vinte informantes. Para seleção das participantes, estratificamos os indivíduos elegíveis do estudo Mina-Brasil por nível educacional: ensino fundamental completo; ensino médio completo; e graduado ou acima. Cinco mulheres de cada estrato aceitaram participar da pesquisa, compondo nossa amostra de entrevistadas que tinha, inicialmente, quinze participantes. Uma participante do estudo principal, que foi entrevistada para pré-teste do roteiro de entrevista, foi incluída na subamostra deste estudo qualitativo, totalizando uma amostra de 16 participantes. A participação das mulheres foi voluntária e confidencial após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Produção dos dados

A primeira autora conduziu entrevistas em profundidade (Hesse-Biber, 2014HESSE-BIBER, S. N. Feminist Research Practice: A Primer. Boston: Sage, 2014.) com as 16 participantes, no período de abril a maio de 2018. As entrevistas foram realizadas em português, sendo gravadas e posteriormente transcritas verbatim, mantendo o anonimato das entrevistadas. Todos os nomes foram alterados para pseudônimos para fins de anonimato. As entrevistas duraram de 30 a 90 minutos.

Análise dos dados

Realizamos uma análise de conteúdo dos dados individuais das entrevistas para todas as 16 entrevistadas. A primeira autora utilizou a técnica de cutting and sorting (Bernard; Wutich; Ryan, 2016BERNARD, H. R.; WUTICH, A. Y.; RYAN, G. W. Analyzing Qualitative Data: Systematic Approaches. California: Sage Publications, 2016.) para selecionar os trechos que expressavam as maneiras como a maternidade é praticada e representada nas práticas culinárias domésticas. Ficaram evidentes em quatro períodos - antes da maternidade, na gravidez, no resguardo (puerpério), e de três a quatro meses após o parto - as concepções da maternidade, as práticas culinárias domésticas femininas e a divisão do trabalho culinário doméstico.

Resultados e discussões

As mulheres que participaram do nosso estudo tinham em média 31,8 anos; 2,4 filhos (entre 2 e 17 anos); 87,5% residiam com seus parceiros e dependentes; 46,2% se declararam desempregadas ou trabalhadoras exclusivamente domésticas; e 43,8% eram beneficiárias do programa Bolsa Família.

Antes da Maternidade

Abordando suas vidas de mulheres solteiras ou casadas sem dependentes, as entrevistadas apresentaram a compreensão da maternidade como uma possibilidade de uso dos seus corpos para a autorrealização da condição feminina, para satisfazer seus desejos por companhia, para proporcionar alegria ou ser objeto de cuidados familiares. Conforme sugere a fala de Carlota (31 anos, trabalhadora exclusivamente doméstica):

Ele [marido] saía de madrugada, só chegava em casa às seis da tarde. Eu passava o dia só. No começo do meu casamento, eu ia pegando depressão de viver sozinha, sem ninguém para conversar. Mas aí quando eu fiquei grávida do Samuel [filho mais velho] [foi] porque eu queria. Eu não queria ficar só! (Carlota)

Carlota, assim como outras entrevistadas, deixa explícito um arranjo hierárquico em que o homem se projeta para o mundo externo, buscando o trabalho remunerado que sustentará a família; enquanto a mulher, em segundo plano, se introjeta na casa e seus afazeres domésticos. Além disso, essa fala aborda a solidão da mulher em uma casa sem um dependente. Nesse sentido, a gestação pode, então, ser compreendida como uma tentativa de cessação da solidão. Dentro de casa as mulheres eram as principais responsáveis por realizar o trabalho culinário doméstico devido ao engajamento de seus companheiros nas atividades remuneradas e à menor disponibilidade deles para realizar tarefas domésticas. Destaca-se que, mesmo realizando as atividades domésticas sozinhas, as entrevistadas sinalizavam que essas atividades eram menos cansativas ou onerosas, dada a ausência de tarefas de cuidados infantis. Como expresso por Dandara (37 anos, desempregada):

Ah, eu achava muito bom. Eu não sei o que eu fiz que eu tive que pegar esse monte de menino. Minha vida antes de ser mãe era muito boa, eu não tinha preocupação com nada (Dandara)

Dandara, assim como outras entrevistadas, deixa subjacente a concepção do cuidado infantil ser um trabalho oneroso para as mulheres e que modifica suas práticas culinárias. Nesta fala, a entrevistada relata a restrição das escolhas das mães e uma maior preocupação com a alimentação infantil (Brenton, 2017BRENTON, J. The limits of intensive feeding: maternal foodwork at the intersections of race, class, and gender. Sociology of Health and Illness, Bethesda, v. 39, n. 6, p. 863-877, 2017. DOI: 10.1111/1467-9566.12547
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; Dow, 2016DOW, D. M. Integrated Motherhood: Beyond Hegemonic Ideologies of Motherhood. Journal of Marriage and Family, Hoboken, v. 78, n. 1, p. 180-196, 2016. DOI: 10.1111/jomf.12264
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). Visto que antes da maternidade elas realizavam práticas culinárias domésticas de maneira mais flexível (cardápios, técnicas e tempo de preparo ou horários de consumo), sendo descontinuadas e dedicadas ao autocuidado. Esse contexto ressalta a alimentação como atividade de lazer, dedicada ao prazer, e ao consumo de fast- food. Assim, as entrevistadas consideravam que seus padrões alimentares eram compostos por “besteira”, ou seja, alimentos que apresentam poucos nutrientes ou não são saudáveis (como hambúrgueres, pizzas e cachorros-quentes). Conforme sugere Bertha (25 anos, enfermeira):

Eu comia muito fora. Eu comia muita besteira, eu gostava muito de sair para comer sanduíche, essas coisas. Até porque a gente sabe que é errado, então a gente não quer que nossa filha coma (Bertha)

Bertha ressalta que realizou mudanças nos seus padrões alimentares para melhorar a saúde de sua criança. Interpretamos que essa prática sugere que uma mãe deve se envolver em uma disciplina alimentar, adequando-se e promovendo um padrão saudável de alimentação para sua criança (Ruddick, 2009RUDDICK, S. On Maternal Thinking. Women’s Studies Quarterly, Ann Arbor, v. 37, n. 3/4, p. 305-308, 2009.). Ressaltamos que a mudança de conduta de Bertha pode gerar um desfecho positivo de saúde, contudo sua fala sinaliza uma reificação da maternidade intensiva em que as mulheres são responsáveis por garantir o cuidado alimentar e de saúde para o crescimento e desenvolvimento adequado das crianças.

Nossos dados mostram que as entrevistadas apresentavam uma concepção da maternidade como um uso possível do corpo para atender aos seus projetos de vida e desejos pessoais, como ser “reconhecida como mulher” ou “ter uma companhia em casa”. Nesse cenário, as práticas culinárias domésticas se alinham à concepção de maternidade intensiva e são vistas como responsabilidade feminina para a expressão da feminilidade, ou seja, a experiência subjetiva daquilo que é necessário para ser percebida como uma mulher e do autocuidado (Fürst, 1997FÜRST, E. L. ORANG. Cooking and femininity. Women’s Studies International Forum, Amsterdam, v. 20, n. 3, p. 441-449, 1997. DOI: 10.1016/S0277-5395(97)00027-7
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). Observamos que as entrevistadas valorizam as práticas culinárias comprometidas com elas mesmas (seus horários, seus gostos, suas tradições culinárias, entre outros), como representações de liberdade. Justamente, essa perspectiva dialoga com o conceito de Hillery, Dudley e Morrow (1977HILLERY, G. A.; DUDLEY, C. J.; MORROW, P. C. Toward a Sociology of Freedom. Social Forces, Oxford, v. 55, n. 3, p. 685, 1977. DOI: 10.2307/2577463
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) de “liberdade de ego” que pode ser interpretado como a importância de ter (ou adquirir) os direitos ou meios de fazer o que se deseja. Assim, a liberdade das mulheres se expressa nos procedimentos como comprar comida fora, uma menor preocupação com horários ou o conteúdo das refeições, o preparar e comer o que gostam e o comer como lazer.

Durante a Gravidez

Nesse momento as entrevistadas apresentaram uma compreensão da maternidade como experiências corporais relacionadas ao crescimento das crianças em seus corpos. Isso implica a necessidade de desenvolver conhecimentos, atitudes e comportamentos que garantam a manutenção da gestação. Nesse cenário, o exercício das práticas culinárias domésticas está relacionado aos significados atribuídos às experiências corporais da gestação (como ganho de peso, dificuldade de respirar, inchaço, cansaço, náuseas, entre outras). As mulheres relataram mal-estares que dificultavam ou as impediam de realizar a prática culinária doméstica cotidiana. Como o relatado por Laudelina (33 anos, técnica de enfermagem):

Na gravidez dela [filha mais nova], eu emagreci seis quilos. [Eu] não podia sentir um cheiro de comida, enjoei, eu nem cozinhava. Nos quatros primeiros meses, só que sabia o que sentia (Laudelina)

A situação expressa por Laudelina é realidade para outras entrevistadas, que mencionaram que solicitavam para outras mulheres assumirem a prática culinária doméstica ou recebiam doações de refeições de outros familiares, amigas ou vizinhas. As participantes, ainda, referiram uma participação esporádica de seus companheiros na prática culinária doméstica: os maridos se restringiam a cozinhar apenas em seus dias de folga, quando percebiam que suas esposas estavam muito cansadas ou com mal-estar. Muitas vezes as práticas culinárias dos maridos se limitavam a comprar algumas preparações culinárias para reduzir obstáculos de engajamento das mulheres nessa atividade. Conforme relata Francisca (33anos, cabelereira):

Minha cunhada fazia a faxina, depois Marta [filha mais velha] começou a assumir. Era uma fase que eu não conseguia fazer quase nada. Teve uma fase que o pai dele [da criança mais nova] lavou roupa. Ele também trazia comida de fora, marmita (Francisca)

Outras entrevistadas também mencionaram realizar atividades culinárias em algum momento na gestação (as únicas exceções foram as mulheres em situação de gestação de risco). Elas destacaram as estratégias que utilizavam para preparar os alimentos, mesmo em situação de náuseas ou cansaço, como cortar legumes, verduras e hortaliças rapidamente; temperar a comida e pedir para outras pessoas cozinhá-las; e preparar refeições mais simples.

Durante a gravidez, as entrevistadas apresentaram uma concepção da maternidade relacionada às “experiências corporais” de gestar uma criança (por exemplo, acompanhar o crescimento da barriga e das mamas ou sentir enjoos). Tais experiências corporais geram um reconhecimento social: trata-se de uma mulher que irá se tornar “mãe” (Uusimäki; Johansson, 2020UUSIMÄKI, L.; JOHANSSON, K. The vulnerability of pregnancy and the motherhood myth. In: HENDERSON, E. et al. Palgrave Studies in Gender and Education. London: Palgrave Macmillan, 2020. p. 185-204.). Neste processo de transição, as práticas culinárias domésticas também mudam, atendendo ao modelo de maternidade hegemônica (Dow, 2016DOW, D. M. Integrated Motherhood: Beyond Hegemonic Ideologies of Motherhood. Journal of Marriage and Family, Hoboken, v. 78, n. 1, p. 180-196, 2016. DOI: 10.1111/jomf.12264
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). Seguir as práticas alimentares prévias, mais marcadas pelas suas preferências e por uma falta de preocupação com a qualidade nutricional, já não parece mais uma opção apropriada: a qualidade nutricional da alimentação desta gestante influencia no crescimento e o desenvolvimento fetal.

As mulheres também apresentam a ideia de que, na condição de gestantes ou mães, elas devem investir grandes quantidade de energia, tempo e dinheiro para cuidar e nutrir seus fetos e suas crianças, por vezes “sacrificando” suas próprias vontades - forçando uma maternidade intensiva (Brenton, 2017BRENTON, J. The limits of intensive feeding: maternal foodwork at the intersections of race, class, and gender. Sociology of Health and Illness, Bethesda, v. 39, n. 6, p. 863-877, 2017. DOI: 10.1111/1467-9566.12547
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). Por outro lado, as “experiências corporais” das entrevistadas relacionadas ao mal- estar gravídico necessitavam ser reconhecidas por outras pessoas próximas (como mães, sogras, maridos, entre outros) para que elas fossem liberadas das práticas culinárias domésticas (Elliott; Bowen, 2018ELLIOTT, S.; BOWEN, S. Defending Motherhood: Morality, Responsibility, and Double Binds in Feeding Children. Journal of Marriage and Family, Hoboken, v. 80, n. 2, p. 499-520, 2018. DOI: 10.1111/jomf.12465
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).

Finalmente, os esforços para realizar as práticas culinárias durante a gravidez expressam não apenas uma tentativa de entrarem em sintonia com uma suposta “natureza feminina” ou “papel da mulher” de cuidadora da família, mas, também, a manutenção da sua autonomia alimentar frente às próprias realidades financeiras e à organização familiar (Topham ., 2010TOPHAM, G. L. et al. Maternal depression and socio-economic status moderate the parenting style/child obesity association. Public Health Nutrition, Bethesda, v. 13, n. 8, p. 1237-1244, 2010. DOI: 10.1017/S1368980009992163
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).

Durante o resguardo (puerpério)

Durante o pós-parto, as entrevistadas apresentaram a concepção da maternidade como experiências corporais e emocionais relacionadas ao retorno a um estado pré-gravídico e uma relação com a criança concretizada nas responsabilidades de cuidar e promover o crescimento e o desenvolvimento adequado. Como expressa Laudelina:

Para mim ser mãe foi um choque. Quando está na barriga está tudo bem, mas depois que sai, é cuidar, é alimentar! (Laudelina)

Laudelina destaca o nascimento da criança como mais um momento de modificação e ajustes de comportamentos. Isso também foi relatado por outras participantes que enfatizaram a realização do resguardo após o parto - uma prática tradicional (transmitida geracionalmente) caracterizada por um período de repouso para que o corpo se recupere do trabalho de parto e retorne à sua condição pré-gravídica. Diversas pesquisas sugerem que o resguardo é marcado por práticas e crenças socioculturais tradicionais que são relacionadas à vulnerabilidade da saúde da mulher parturiente (Baião; Deslandes, 2006BAIÃO, M. W.; DESLANDES, S. F. Alimentação na gestação e puerpério. Revista de Nutrição, Campinas, v. 19, n. 2, p. 245-53, 2006. DOI: 10.1590/S1415-52732006000200011
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; Jordá; Bernal, 2010JORDÁ, D. G.; BERNAL, Z. D. Anthropological and gender perspective in the analysis of care provided to pregnancy, delivery and puerperium. Revista Cubana de Salud Publica, Amsterdam, v. 36, n. 4, p. 330-336, 2010. DOI: 10.1590/s0864-34662010000400007
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)

Para as entrevistadas, o resguardo durou até quatro meses, dependendo do tipo de parto. As mulheres que tiveram um parto normal voltaram mais cedo a realizar atividades domésticas e laborais (realizando apenas 15 a 30 dias de resguardo). Durante o resguardo, mencionaram não realizar atividades domésticas ou apenas se dedicar aos cuidados infantis. Assim, elas narraram a participação de outras mulheres (mães, irmãs, cunhadas ou empregadas domésticas) nas atividades domésticas, como o preparo de alimentos e os cuidados infantis. Como comenta Bertha (25 anos, enfermeira):

[No resguardo] a minha mãe [cozinhava]. Porque o meu marido estava trabalhando, então não tinha como ele fazer. Ela ficou um tempo comigo enquanto eu conseguia me adaptar ao neném (Bertha)

Contrariando a Bertha, algumas entrevistadas - que não possuíam parentes na cidade e nem recursos financeiros para contratar uma pessoa - realizaram as atividades culinárias domésticas no período do resguardo e por consequência realizavam um resguardo mais curto: até 30 dias. Para isso elas empregavam estratégias semelhantes àquelas utilizadas durante a gravidez. Nesse contexto, elas eram requeridas a realizarem uma gestão do tempo dedicado ao descanso, à realização do trabalho doméstico e aos cuidados infantis, além das suas próprias experiências corporais puerperais (como dores e cansaço). Josefina comenta (38 anos, desempregada):

Quando o Lucas (filho mais novo) nasceu, os primeiros 20 dias teve uma pessoa que veio pra fazer comida: o almoço e o jantar. Mas, aí com 20 dias a gente teve que dispensar ela. [Preparar a comida era] muito cansativo. (Josefina)

Interpretamos que as mulheres realizavam poucas atividades culinárias domésticas no período do resguardo, pois os outros familiares reconheciam a ideia construída socioculturalmente da vulnerabilidade feminina frente às complicações do pós-parto. Esta construção social destaca o papel feminino que ordena uma maior necessidade de dedicar atenção aos cuidados dos recém-nascidos. Ressaltamos que, nesse momento, as mulheres assumem a responsabilidade de alimentar, e, sobretudo, amamentar, sendo este um elemento importante no julgamento moral que lhes permite autoreivindicar uma identidade de “boa mãe”, ainda validada por seus familiares (Malacrida, 2009MALACRIDA, C. Performing motherhood in a disablist world: Dilemmas of motherhood, femininity and disability. International Journal of Qualitative Studies in Education, Abingdon, v. 22, n. 1, p. 99-117, 2009. DOI: 10.1080/09518390802581927
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). Isso acontece pelo compartilhamento dos membros da família da necessidade do “resguardo” para as mulheres parturientes, sendo esta crença dotada de poder simbólico que orienta a estruturação de condutas e comportamentos para as puérperas e para seus familiares (., 2012ACOSTA, D. F. et al. Influências, crenças e práticas no autocuidado das puérperas. Revista da Escola de Enfermagem, São Paulo, v. 46, n. 6, p. 1328-1334, 2012. DOI: 10.1590/S0080-62342012000600007
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).

No período de resguardo, as entrevistadas também ressaltaram que seus companheiros não se engajaram nas atividades culinárias domésticas devido ao trabalho remunerado extra doméstico, ao “não saber cozinhar” ou por estarem aprendendo a cuidar da criança recém-nascida. Conforme expressa Nísia (25 anos, desempregada):

Ele [marido] pegou uma semana de folga [licença paternidade]. Assim que eu tive a nossa filha, ele ajudava assim: ele prestava muita atenção, porque homem não tem tanto jeito como a gente [mulher] tem (Nísia)

Nísia, como outras participantes, reportou que a chegada de um bebê provoca alteração nos familiares que precisam assumir novos papéis e responsabilidades. Homens que foram socializados para serem apenas provedores financeiros precisam desenvolver suas habilidades de cuidados infantis (Soares ., 2015SOARES, R. L. S. F. et al. Ser pai de recém-nascido prematuro na unidade de terapia intensiva neonatal: da parentalidade a paternidade. Escola Anna Nery - Revista de Enfermagem, Rio de Janeiro, v. 19, n. 3, p. 409-416, 2015. DOI: 10.5935/1414-8145.20150054
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; Sorrentino; Bógus; Venancio, 2021SORRENTINO, E.; BÓGUS, C. M.; VENANCIO, S. A participação dos homens na alimentação infantil: novos caminhos para a equidade de gênero? Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 30, n. 3, p. 1-11, 2021. DOI: 10.1590/S0104-12902021200815
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). Alguns homens podem ter dificuldades na transição para a paternidade, diante da não socialização para os cuidados infantis ou pelo curto período da licença paternidade (apenas cinco dias). Nesse cenário, a mulher é duplamente responsabilizada: deve cuidar da criança e ensinar o marido a realizar cuidados infantis, construindo outra faceta da desigualdade de gênero.

De 3 a 24 meses após parto

No período de 3 a 24 meses após o parto, as entrevistadas apresentaram a percepção da maternidade como atividades mentais, emocionais e físicas mais exigentes. Nesse período foram relatadas significativas mudanças nas práticas culinárias domésticas, considerando o retorno da mulher ao trabalho remunerado extra doméstico, o desmame e o processo de introdução alimentar das crianças.

A partir dos três meses de vida das crianças, as entrevistadas relataram que foram introduzidos outros alimentos para além do leite materno. Muitas vezes a oferta dos alimentos para as crianças havia sido realizada por outros membros da família (com destaque para outras mulheres) que eram responsáveis por cuidar delas enquanto as mães estavam trabalhando fora de casa. Isso gerava uma sensação de desconhecimento do processo de introdução alimentar do filho. Francisca (33 anos, desempregada) comenta:

Três meses [pós-parto], eu tive que voltar a trabalhar [fora de casa]. A minha mãe quem cuidava dele [filho]. Às 6h30min eu deixava lá na casa dela [mãe], dava de mamar e ia pro trabalho. Quando era 11h eu saía para ir dar de mamar de novo. Então, não dá para dizer que se foi tal dia que ele passou a conhecer algum alimento (Francisca)

A fala de Francisca sugere que o cuidado alimentar é intercambiado intergeracionalmente entre as mulheres da família, reforçando o lugar da mulher como responsável pelo trabalho alimentar. Em relação à introdução alimentar, as entrevistadas seguiam orientações de outras mulheres (como mãe, avó, sogra ou amigas), bem como dos profissionais de saúde. Nesse contexto, as mulheres e os profissionais de saúde assumem lugares semelhantes de detentores de saberes, mesmo que sejam diferentes, e, de certa forma, as mães são colocadas como guardiãs da saúde das crianças (Brenton, 2017BRENTON, J. The limits of intensive feeding: maternal foodwork at the intersections of race, class, and gender. Sociology of Health and Illness, Bethesda, v. 39, n. 6, p. 863-877, 2017. DOI: 10.1111/1467-9566.12547
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) e responsáveis por seus hábitos alimentares (Cairns; Johnston, 2015CAIRNS, K.; JOHNSTON, J. Food and femininity. London: Bloomsbury Academic, 2015.), o que reforça a reprodução social da maternidade intensiva.

A maioria das entrevistadas mencionou preparar alimentos exclusivamente para as crianças, seguindo a recomendação para progressão da textura dos alimentos da pastosa até a “comida de panela” (comida caseira de consistência sólida e mais próxima daquela consumida pela família). Na prática culinária era realizado o preparo de alimentos exclusivos para crianças, com métodos de cocção no vapor ou em água e a utilização de pouco ou nenhum sal ou temperos (com exceção dos legumes e verduras). Também, elas apontaram a necessidade de mudança das práticas alimentares da família para atender um padrão mais adequado às necessidades das crianças, como o deixar de comer “besteiras”, comer menos fora de casa e preparar menos alimentos fritos. As refeições infantis eram compostas por: sopas, papas, purês, caldos (à base de peixe, carne ou feijão), pirão escaldado mole (prato tradicional de consistência viscosa feita à base de farinha de mandioca e caldos quentes), mingaus (naturais ou espessados com misturas ultraprocessadas), leite, sucos e frutas.

De maneira semelhante a Brenton (2017BRENTON, J. The limits of intensive feeding: maternal foodwork at the intersections of race, class, and gender. Sociology of Health and Illness, Bethesda, v. 39, n. 6, p. 863-877, 2017. DOI: 10.1111/1467-9566.12547
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), argumentamos que as mulheres entrevistadas entendiam e reconheciam-se como “boas mães” quando alimentavam suas crianças de forma satisfatória, sendo que este grau de satisfação era associado à quantidade de energia, tempo, esforço e dinheiro investido nas práticas culinárias domésticas. Tais práticas visavam garantir a qualidade nutricional da alimentação da criança (Beck , 2018BECK, A. L. et al. Beliefs and practices regarding solid food introduction among Latino parents in Northern California. Appetite, Bethesda, v. 120, p. 381-387, 2018. DOI: 10.1016/j.appet.2017.09.023
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) para maximizar seu potencial de crescimento e desenvolvimento (Glenn; Chang; Forcey, 1994GLENN, E. N.; CHANG, G.; FORCEY, L. R. Mothering: Ideology, experience, and agency. New York: Routledge, 1994.; Ruddick, 2009RUDDICK, S. On Maternal Thinking. Women’s Studies Quarterly, Ann Arbor, v. 37, n. 3/4, p. 305-308, 2009.). A saliência da alimentação infantil como meio para o desenvolvimento da criança abria caminhos para que as práticas culinárias domésticas se inscrevessem em um sistema normativo de gênero que orienta para a “alimentação intensiva”, atrelando a capacidade de alimentar bem a criança ao seu desempenho, capacidade e identidade de mãe.

As entrevistadas apresentavam sentimentos ambivalentes e contraditórios em relação ao serem responsáveis por realizarem as práticas culinárias para a introdução de novos alimentos para além do leite materno. Elas reconheciam os êxitos de suas experiências em questões como a reduzida ocorrência de episódios de diarreia, alergia, intolerâncias alimentares ou outras doenças; o constante ganho de peso, mas dentro dos parâmetros normais de saúde; e o consumo de alimentos considerados adequados. Conforme relatado por Mietta (35 anos, enfermeira):

Muito prazeroso [cozinhar para os meus filhos]. E eu acho assim, que deu certo, porque eles nunca tiveram diarreia, nunca tiveram alergia, uma infecção intestinal, nada (Mietta)

Embora Mietta considere preparar alimentos como algo prazeroso, outras entrevistadas mencionaram que sentimentos negativos estavam relacionados à desigualdade de distribuição das atividades culinárias domésticas, aos cuidados infantis e aos trabalhos remunerados extradomiciliares. Isso é resultado de uma hierarquia e distribuição desigual de poder e recursos no ambiente familiar que molda as experiências e a autopercepção das mulheres como as pessoas que devem fazer o trabalho doméstico (Brenton, 2017BRENTON, J. The limits of intensive feeding: maternal foodwork at the intersections of race, class, and gender. Sociology of Health and Illness, Bethesda, v. 39, n. 6, p. 863-877, 2017. DOI: 10.1111/1467-9566.12547
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). Essas concepções ressaltam a maternidade hegemônica que coloca a prática culinária das mães como invisíveis para os sistemas econômicos, legais e sociais, além de considerá-la como dedicada à criança e realizada em nome da “natureza”, “amor” e “deveres maternos” (Dow, 2016DOW, D. M. Integrated Motherhood: Beyond Hegemonic Ideologies of Motherhood. Journal of Marriage and Family, Hoboken, v. 78, n. 1, p. 180-196, 2016. DOI: 10.1111/jomf.12264
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). Dow (2016DOW, D. M. Integrated Motherhood: Beyond Hegemonic Ideologies of Motherhood. Journal of Marriage and Family, Hoboken, v. 78, n. 1, p. 180-196, 2016. DOI: 10.1111/jomf.12264
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) destaca que esta visão essencialista valoriza o trabalho remunerado extradomiciliar, em detrimento do trabalho doméstico não remunerado. Por consequência, existe a cobrança do marido (e outros membros da família) para que as entrevistadas fizessem as crianças se alimentarem da forma como eles achassem adequado; a elaboração de dois cardápios em cada refeição (um para a família e outro para a criança); o desenvolvimento da criatividade para criar cardápios e preparações culinárias com alimentos e texturas variadas para as crianças e a adequação da rotina para atender às demandas das crianças, da casa e do trabalho. Conforme sugere Josefina (38 anos, desempregada):

Assim, acho que como mãe era minha obrigação, eu tinha que fazer pra cuidar do meu filho. Estou cuidando do meu filho, estou cuidando da saúde dele. Procurei as pessoas mais velhas, a minha mãe ou o pediatra mesmo, pra gente saber o que eu tinha que fazer (Josefina)

As entrevistadas que apresentavam maiores problemas para realizar as práticas culinárias domésticas preferiam alimentar seus filhos com leite materno (“viciá-los em peito”), fórmulas infantis, mingaus espessados com farinhas de cereais ou alimentos ultraprocessados para bebês. Essas mulheres ressaltavam que esses alimentos, quando necessitavam de preparo, utilizavam técnicas culinárias mais simples (como o misturar com leite aquecido), tinham menor tempo de cocção e sujavam menos utensílios domésticos. Conforme ressalta Celina (34 anos, trabalhadora doméstica exclusiva):

Eu queria tanto que ele [filho mais novo] comesse mingau, para eu não fazer mais [a sopinha]. Já lutei e ele não come, porque ele foi criado no peito, não quer o mingau (Celina)

Assim, evidenciamos que o trabalho culinário das mulheres é frequentemente interpretado como meio de exercer a maternidade idealizada, promover o bem-estar físico e emocional para a prole e maximizar o potencial de seus filhos (Elliott; Bowen, 2018ELLIOTT, S.; BOWEN, S. Defending Motherhood: Morality, Responsibility, and Double Binds in Feeding Children. Journal of Marriage and Family, Hoboken, v. 80, n. 2, p. 499-520, 2018. DOI: 10.1111/jomf.12465
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). De outra parte, em nosso campo, algumas entrevistadas mencionaram sua sobrecarga com as atividades de preparo de alimentos, de cuidados infantis e de trabalhos remunerados extradomiciliares. Contudo, suas estratégias para modificar os efeitos da desigualdade de gênero no trabalho culinário doméstico são sutis (como a supramencionada simplificação da alimentação infantil).

Limitações do estudo

Nossas principais limitações estão relacionadas à realização de entrevistas apenas com mulheres. Por um lado, esta decisão metodológica é coerente com o objetivo do estudo, privilegiando as questões, vozes e as experiências as de vida das mulheres (Hesse-Biber, 2014HESSE-BIBER, S. N. Feminist Research Practice: A Primer. Boston: Sage, 2014.). Por outro, reconhecemos a necessidade de aprofundamento dos resultados encontrados. Ouvir os cônjuges das mulheres nos próximos estudos pode ajudar a identificar quais são as percepções deles sobre a maternidade intensiva e hegemônica e seus papéis na construção desta. Nossos dados, por exemplo, sugerem que os maridos apresentam menor engajamento nas atividades culinárias domésticas, além de cobrarem as mulheres que se responsabilizem por alimentar e cuidar das crianças. Conforme sugere Brenton (2017BRENTON, J. The limits of intensive feeding: maternal foodwork at the intersections of race, class, and gender. Sociology of Health and Illness, Bethesda, v. 39, n. 6, p. 863-877, 2017. DOI: 10.1111/1467-9566.12547
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), essas estratégias podem favorecer a problematização da universalidade das mensagens de promoção da saúde e localizar as ideias das mães sobre as práticas culinárias domésticas e suas experiências alimentando crianças em uma rede de problemas sociais mais amplos. Dito isso, nossa abordagem permitiu identificar algumas das práticas culinárias domésticas relacionadas à maternidade e as maneiras como as mulheres representavam seus estilos de maternidade através dessas práticas.

Considerações finais

Nossos resultados sugerem que as práticas culinárias domésticas são desenvolvidas ou reformuladas durante o curso da vida, se relacionando com a mudança de status sociais dos indivíduos, como a transição para a maternidade. Ficou evidente que antes da maternidade as entrevistadas desempenhavam suas práticas culinárias de maneira menos preocupada com os horários ou a qualidade daquilo que seria consumido. No momento da gravidez as práticas culinárias se tornam uma preocupação para as mulheres, contudo ainda estão voltadas à saúde do feto e ao desejo de manter a gravidez. Essa percepção da culinária doméstica é significativamente mudada a partir do nascimento da criança, sendo que as mulheres modificam suas práticas culinárias domésticas para se apropriarem das ideias hegemônicas de maternidade (relacionadas ao amamentar, cozinhar e alimentar as crianças), tentando alcançar o status de “boa mãe”. Essas práticas culinárias reforçam uma divisão sexual do trabalho culinário doméstico, em que a mulher (na condição de mãe) é considerada aquela que deve preparar os alimentos para a família.

Nesse cenário, elas aproveitam as fissuras no sistema hegemônico de gênero para negociar práticas culinárias mais flexíveis (em termos de composição de cardápio, técnicas de preparo e horários) no momento antes da gravidez. No processo de gestação e parto as práticas culinárias foram progressivamente modificadas, saindo das demandas das mulheres e se transformando em estratégias de cuidado da saúde delas e das crianças. Assim, reconhecemos que as entrevistadas mudaram suas práticas culinárias com intuito de desenvolver cardápios e preparações culinárias que promovessem o desenvolvimento e crescimento infantil. Além disso, modificaram sua própria relação com a alimentação para diminuir o consumo de alimentos considerados “besteiras” e ser exemplo para a criança.

Nossas entrevistadas gerenciavam suas práticas culinárias domésticas a partir da interpretação de um sistema de gênero que exige das mulheres a realização do trabalho culinário doméstico diária e continuamente, de maneira a atender padrões alimentares saudáveis. Nesse cenário elas (re)fizeram e (re)significaram suas práticas culinárias, durante o processo de transição para a maternidade, dialogando com seus projetos de vida e desejos pessoais; suas experiências corporais e subjetivas no curso da vida; os cenários de possibilidades para as práticas dentro do sistema de gênero; as pressões culturais e sociais para seguir as concepções dominantes de feminilidade e maternidade no curso da vida; e a hierarquia de gênero no ambiente familiar.

Todas essas práticas culinárias são desenvolvidas no ambiente familiar doméstico em que se organiza uma hierarquia de gênero na qual os cônjuges se dedicam ao trabalho remunerado extradomiciliar que promove o sustento material da família. Enquanto isso acontece, a mulher é responsabilizada pelo espaço familiar e o trabalho doméstico dedicado aos cuidados com os membros da família. Ao se tornarem mães, as mulheres entrevistadas sentiam “cobrança” social para atender às normativas das feminilidades relacionadas às culinárias domésticas que lhes eram impostas para assim serem reconhecidas ou se reconhecerem como uma “boa mãe”.

Por fim, os resultados aqui apresentados sugerem que as mulheres constroem, disputam e negociam seus modelos de maternidade. Nesse sentido, elas organizam suas atividades culinárias domésticas de maneira condizente com as suas experiências corporais e emocionais e situações de vida.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Out 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    04 Abr 2022
  • Revisado
    04 Abr 2022
  • Aceito
    13 Maio 2022
Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. Associação Paulista de Saúde Pública. SP - Brazil
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