Epidemiologia dos acidentes por animais peçonhentos e a distribuição de soros: estado de arte e a situação mundial

Epidemiology of accidents by venomous animals and distribution of antivenon: state of art and world status

Epidemiología de accidentes por animales venenosos y distribución de suero: estado de arte y situación mundial

Maria da Graça Salomão Karla Patricia de Oliveira Luna Claudio Machado Sobre os autores

RESUMO

Acidentes por animais peçonhentos são discutidos sob perspectiva histórica de ações de estado. Considerados doenças negligenciadas eles causam prejuízos sociais e econômicos, em pessoas em idade produtiva de regiões rurais em países pobres. Poucos países dispõem de políticas públicas de saúde para profilaxia e tratamento adequados e as maiores perdas ocorrem na África e Ásia. Os 46 produtores mundiais de soros não suprem as necessidades globais e acesso ao tratamento é difícil, mesmo em países com produção própria. Sistemas de Notificação produzem levantamentos imprecisos sobre necessidades de soro e apesar da notificação compulsória. O Brasil carece de bancos de dados robustos de amplo acesso, que permita uma distribuição do soro em tempo seguro para o atendimento de qualidade. Muito se avançou em testes diagnóstico, porém sua aplicação em áreas pobres é inviabilizada pelos custos. Melhorias na qualidade de produção dos soros, via boas práticas laboratoriais e fabris, minimizam resultados insatisfatórios de tratamentos com produtos de origem e ação duvidosa. Desenvolvimento de soros empregando Biotecnologia e Ensaios Clínicos bem desenhados, são chave para tratamento de envenenamentos por agentes aparentados em diferentes regiões (soros continentais ou universais). Parcerias internacionais são fundamentais, além de estoques reguladores, semelhantes aos adotados em vacinas, para suprir a demanda mundial. A qualificação dos soros antivenenos certamente minimizará equívocos de uso. Apoio governamental à pesquisa é alavanca propulsora e a ferramenta mais eficiente de preservação da vida, evitando sobrecargas social e previdenciária principalmente em países em desenvolvimento.

Palavras-chave:
Animais peçonhentos; soro; desenvolvimento tecnológico; políticas públicas de saúde (fonte: DeCS, BIREME)

ABSTRACT

Accidents by venomous animals are discussed under the historical perspective of state actions. Considered as neglected diseases, they cause social and economic losses in the working age population from rural areas of poor countries, as few of them have public health policies for adequate prophylaxis and treatment; in fact, the largest life losses occur in Africa and Asia. The 46 world producers of antivenin do not meet the global needs, making access to treatment difficult, even in countries with own production. Notification systems lead to inaccurate surveillance surveys and antivenin needs. Despite mandatory notification, Brazil lacks robust databases with full open access in order to allow the timely distribution of antivenin for quality care of these patients. Progress has been made in diagnostic testing, but its application in poor areas is not feasible due to high costs. Improvements in quality antivenin production through good laboratory practices and manufacturing minimize unsatisfactory results of treatments carried out with products of dubious origin. Antivenin development using biotechnology and well-designed clinical trials are key for the treatment of envenoming by agents phylogenetically related from different regions (continental or universal antivenins). International partnerships are fundamental, besides regulatory stocks, similarly to those adopted for vaccines, to supply world demand. The qualification of antivenin will certainly minimize treatment mistakes. Government support to research is a driving force and the most efficient tool for preserving life and avoiding social security surcharges, particularly in developing countries.

Key Words:
Poisonous animals; serum; technological development; public health policy (source: MeSH, NLM)

RESUMEN

Accidentes por animales venenosos se discuten desde una perspectiva histórica de acciones de estado. Consideradas enfermedades olvidadas, causan perjuicios sociales y económicos, en personas en edad productiva de regiones rurales en países pobres. Pocos países disponen de políticas públicas de salud para profilaxis y tratamiento adecuados y las mayores pérdidas ocurren en África y Asia. Los 46 productores mundiales de sueros no suplen las necesidades globales y el acceso al tratamiento es difícil, incluso en países con producción propia. Los sistemas de notificación generan levantamientos imprecisos sobre las necesidades de suero ya pesar de la notificación obligatoria, Brasil carece de bases de datos robustas de amplio acceso, permitiendo la llegada del suero en tiempo seguro para la atención de calidad. Se ha avanzado mucho en pruebas diagnósticas, pero su aplicación en áreas pobres es inviabilizada por los costos. Mejoras en la calidad de producción de los sueros, a través de buenas prácticas de laboratorio y fabril, minimizan resultados insatisfactorios de tratamientos con productos de origen y acción dudosa. El desarrollo de sueros empleando Biotecnología y Ensayos Clínicos bien diseñados, son clave para el tratamiento de envenenamientos por agentes emparentados en diferentes regiones (sueros continentales o universales). Las alianzas internacionales son fundamentales, además de stocks reguladores, similares a los adoptados en vacunas, para suplir la demanda mundial. La pre cualificación de los sueros antivenenos ciertamente minimizará equívocos de uso. El apoyo gubernamental a la investigación es la palanca propulsora y la herramienta más eficiente de preservación de la vida, evitando sobrecargas social y previsional principalmente en países en desarrollo.

Palabras Clave:
Animales venenosos; suero; desarrollo tecnológico; politicas publicas de salud (fuente: DeCS, BIREME)

As crises econômica e política, acentuadas pelo abandono do acordo de Paris, a suspensão de apoio à UNESCO por Estados Unidos e Israel, agravam as reduções orçamentárias em saúde, cuidado ambiental, direito e qualidade de vida.

Doenças da pobreza são causa e consequência de violações dos direitos humanos 11. Hunt P. Neglected diseases: A human rights analysis. Special topics in social, economic and behavioural research report series 2007; no. 6 WHO., matam mais de meio milhão de pessoas/ano, provocando perdas de difícil estimativa quanto à produtividade e tempo de vida 22. Gutiérrez JM, Theakston RDG, Warrell DA. Confronting the neglected problem of snake bite envenoming: the need for a global partnership. PLoS Med 2006; 3:e150.. Verminoses e viroses são muito conhecidas e recebem grande investimento, público e privado. Outras permanecem obscuras, subnotificadas 33. Kasturiratne A, Pathmeswaran A, Wickremasinghe AR, Jayamanne SF, Dawson A, Isbister GK, Silva HJ, Lalloo DG. The socio-economic burden of snakebite in Sri Lanka. PLoS Negl Trop Dis. 2017; 11(7):e0005647., sem espaço nas grades curriculares de graduação, mesmo em regiões endêmicas, caso dos acidentes por animais peçonhentos.

As consequências clínicas e perdas socioeconômicas, pelas hospitalizações, tempo de internação, mortes e aposentadorias por invalidez 44. Harrison RA, Gutiérrez JM. Priority Actions and Progress to Substantially and Sustainably Reduce the Mortality, Morbidity and Socioeconomic Burden of Tropical Snakebite. Toxins 2016; 8, 351:1-14., fizeram a Organização Mundial de Saúde (OMS) incluir tais emergências como doenças tropicais negligenciadas em 2009 e 2017 55. Chippaux JP. Snakebite envenomation turns again into a neglected tropical disease! Journal of Venomous Animals and Toxins including Tropical Diseases. 2017; 23:38.. Acidentes peçonhentos matam mais que malária e a África subsahariana perde 2 milhões de Anos de Vida Ajustados por Incapacidade (Disability-Adjusted Life Years -DALYs)/ano por envenenamentos ofídicos 66. Scheske L, Ruitenberg J, Bissumbhar B. Needs and availability of snake antivenoms: relevance and application of international guidelines. Int J Health Policy Manag. 2015; 4(7): 447-457..

Sendo uma das maiores biodiversidades, a América Latina abriga inúmeras espécies causadoras dessas doenças ambientais e do trabalho, mas a liderança de ocorrências pertence à África e Ásia 77. Alirol E, Sharma SK, Bawaskar HS, Kuch U, Chappuis F. Snake Bite in South Asia: A Review. PLOsNTDs. 2010; 4(1):1-9.. A ampla distribuição, associada à mobilidade humana, a urbanização e a crescente curiosidade em explorar a natureza, tornam esses acidentes mais frequentes.

Na década de 1990 existiam mais de 50 produtores (públicos e privados) de soros no mundo, 57 em 1991 e 53 em 1993 88. Chippaux JP, Goyffon M. Producers of antivenomous sera. Toxicon. 1993; 21(6):739-752.. Em 2012, apenas 46 99. Gutiérrez JM. Improving antivenom availability and accessibility: Science, technology, and beyond. Toxicon. 2012; 60(4):676-687.. Em 2015 esse número persistia 66. Scheske L, Ruitenberg J, Bissumbhar B. Needs and availability of snake antivenoms: relevance and application of international guidelines. Int J Health Policy Manag. 2015; 4(7): 447-457. apesar da desatualização dos cadastros junto à OMS, impedindo a obtenção de informações sobre adesão às Boas Práticas Laboratoriais (BPL) e Fabris (BPF).

Apesar da "aparente" disponibilidade de produto, o acesso dos acidentados ao atendimento é difícil, são poucos os profissionais treinados e o custo por ampola é alto 1010. Boyer LV. On 1000-fold pharmaceutical price markups, and why drugs cost more in the US than in Mexico. The American Journal of Medicine. 2015; 128(12):1265-7.,1111. Warrell D. Unscrupulous marketing of snake bite antivenoms in Africa and Papua New Guinea: choosing the right product 'What's in a name? Trans Royal Soc Trop Med Hyg. 2008; 102:397-9., particularmente nas regiões de maior ocorrência - países pobres. A produção africana de soro supre 25% da demanda 1212. Chippaux JP. Estimating the global burden of snakebite can help to improve management. PLoS Med. 2008; 5:e221.. A situação piorou com o encerramento da produção do FAV-Afrique (soro polivalente para serpentes africanas) pela Sanofi-Pasteur em 2014 e o fim dos estoques em 2016.

Contas hospitalares, atingiram US$150 mil num paciente americano picado por cascavel. Razões desse custo são despesas hospitalares (70%) 1010. Boyer LV. On 1000-fold pharmaceutical price markups, and why drugs cost more in the US than in Mexico. The American Journal of Medicine. 2015; 128(12):1265-7.. Excluídas tais despesas, além das regulatórias, de registro do produto, ensaios clínicos e comercialização, o custo cairia para US$110/ampola, no caso de uma produção hipotética de 500 mil unidades/ano. A produção no México, diminuiria o preço para US$14/ampola, ainda inacessíveis para populações vulneráveis 77. Alirol E, Sharma SK, Bawaskar HS, Kuch U, Chappuis F. Snake Bite in South Asia: A Review. PLOsNTDs. 2010; 4(1):1-9.,1313. Hamza M, Idris MA, Maiyaki MB, Lamorde M, Chippaux JP, Warrell DA, Kuznik A, Habib AG. Cost-Effectiveness of Antivenoms for Snakebite Envenoming in 16 Countries in West Africa. PLOS Neglected. 2016; 10(3): e0004568.,1515. Brown NI. Consequences of Neglect: Analysis of the Sub-Saharan African Snake Antivenom Market and the Global Context. PLoS Negl Trop Dis. 2012; 6(6): e1670.. Raros são países como o Brasil, cujo sistema de saúde universal (SUS) trata gratuitamente envenenados.

A produção brasileira de soros é responsabilidade de quatro laboratórios, o Centro de Pesquisa e Produção de Imunobiológicos (CPPI), a Fundação Ezequiel Dias (FUNED), o Instituto Butantan (IB) e o Instituto Vital Brazil (IVB). A adoção das BPF pela Agência Nacional de Saúde (ANVISA RDC 17/2010) por recomendação da OMS, exigiu uma reconfiguração das linhas fabris e em 2014 a ANVISA instituiu a produção compartilhada de soros até 2016.

Esta estratégia disponibilizou os insumos em cada centro, para que, durante a reforma de um laboratório, os soros fossem produzidos pelos outros, mantendo níveis mínimos de distribuição. Como a capacidade individual de produção não é equivalente, houve redução de aproximadamente 50% na entrega dos soros ao SUS [Nota Informativa do Ministério da Saúde (MS)]. A escassez não foi reconhecida pelas autoridades brasileiras. OMS, passou a fazer uma distribuição "mais criteriosa" dos nove antivenenos e publicou adequações de tratamento dos acidentados, visando reduzir o consumo de soro antibo-trópico em 21% e antiescorpiônico em 33% 1616. Portal Saúde. NOTA INFORMATIVA: Informações da Coordenação-Geral de Doenças Transmissíveis (CGDT) referentes à nova abordagem ao tratamento em casos de acidentes por serpentes do grupo Bothrops ("jararacas") e por escorpiões, em situação de escassez de antivenenos. 2017. http://portalsaude.saude.gov.br (acesso 15/05/2017).
http://portalsaude.saude.gov.br...
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Posteriormente às reformas, o ib passou a contar com a produção dos soros equinos hiperimunes validada experimentalmente, isenta de microorganismos. A produção distribuída ao MS em 2016 foi aproximadamente 196 mil ampolas e até setembro/2017 cerca de 142 mil, abaixo dos valores de 2013 (acima de 240 mil ampolas). O IVB produziu em 2016, 84851 ampolas e em 2017 (janeiro a maio) 21846 ampolas de soros antibotrópico, anticrotálico e antiescorpiônico, destinadas ao MS para redistribuição nacional.

Discutiremos aspectos de inovação tecnológica e comunicação em saúde, visando a retomada sustentável da autossuficiência em soros antipeçonhentos.

Sistemas de informação dos acidentes peçonhentos

Sistema de Informação em Saúde (SIS) é todo processo que permita coleta, armazenamento, processamento, recuperação e disseminação de informações digitais, apoiando funções operacionais, gerenciais e de tomada de decisão em saúde. Os SIS, assistenciais ou epidemiológicos, são ferramentas de diagnóstico para intervenções mais aproximadas das necessidades da população. Prezam por boa cobertura, planejamento na coleta abrangente; exatidão e pontualidade, para disponibilização da informação em tempo hábil e decisão acertada em tempo correto. A pontualidade é garantida pela regularidade de coleta e atualização dos bancos de dados 1717. Carvalho MS. Informação: da produção à utilização. In: Rozenfeld, S. (Org.). Fundamentos da vigilância sanitária. Rio de Janeiro: Editora. Fiocruz; 2000. p.235- 256..

sis são alimentados por notificações, comunicação da ocorrência de doenças ou agravos, à autoridade sanitária, por profissionais de saúde ou qualquer cidadão, para adoção de medidas de intervenção. Sua reunião sistematizada compõe um Sistema de Informação próprio, possibilitando o acompanhamento dos fenômenos, distribuição e tendências. Deficiências nos SIS refletem falhas na concepção do formato dos dados, desde registros até sua transmissão. No Brasil, são comuns disparidades nos dados entre localidades e instâncias de produção. Entretanto, fontes primárias de informação, como forma de avaliar a qualidade dos dados em saúde são pouco estudadas.

Vital Brazil percebendo a importância de informações sobre acidentes peçonhentos, no início da produção de soros no Brasil, criou o "Boletim para observação de accidente ophidico" (1901). Enviado com o soro, solicitava-se seu preenchimento e devolução ao produtor pelos usuários. Iniciou-se a troca de soro por informações, posteriormente usada pelo IVB 1818. Cardoso JLC, França FOS, Wen FH, Málaque CMS, Haddad Jr V. Animais Peçonhentos No Brasil: Biologia, Clínica e Terapêutica dos Acidentes. 2a. Ed, Ed. Sarvier 2009., a base dos atuais sistemas brasileiros de informação para acidentes peçonhentos.

Na década de 1970 houve falta generalizada de soros. Sua disponibilização era regulada pelo mercado, cabendo à Central de Medicamentos do MS a aquisição de uma parcela para distribução aos órgãos governamentais.

Em 1986, um acidente ofídico em Brasília, mata o filho de um diplomata, pela falta de antídoto, exterioriza-se a "crise da falta de soro", revelando a altíssima taxa de óbitos e sequelas por esse agravo, predominantemente em populações rurais e pobres. A crise avançava desde 1983 com a saída da "Syntex do Brasil", devido falhas na produção detectadas pelo ms. A interrupção dessa produção (300 mil ampolas/ano), levou a paralisação quase total do abastecimento. A produção brasileira ficou restrita aos laboratórios oficiais: IB, IVB e FUNED, incapazes, de suprir o país devido suas crises orçamentárias históricas, obsolescência de instalações e falta de recursos humanos 1818. Cardoso JLC, França FOS, Wen FH, Málaque CMS, Haddad Jr V. Animais Peçonhentos No Brasil: Biologia, Clínica e Terapêutica dos Acidentes. 2a. Ed, Ed. Sarvier 2009..

Em 1986, o MS reestruturou os sistemas de suprimento de soros, criando o Programa Nacional de Ofidismo. Através do sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação), os acidentes passaram a ser notificados compulsoriamente e as informações utilizadas como ferramenta de racionalização do abastecimento pelas Secretarias Estaduais de Saúde (SES) e MS. Repetia-se a troca de soro por informação, idealizada por Vital Brazil.

Com a estabilização da produção, houve um afrouxamento da obrigatoriedade de notificação. Dificuldades de comunicação, entraves burocráticos e despreparo dos profissionais, causaram deficiências sérias na qualidade dos dados 1919. Fiszon JT, Bochner R. Subnotificação de acidentes por animais peçonhentos registrados pelo SINAN no Estado do Rio de Janeiro no período de 2001 a 2005 Underreporting of accidents with venomous animals registered by SINAN in the State of Rio de Janeiro from 2001 to 2005. Rev Bras Epidemiol. 2008; 11(1):114-27..

O controle das notificações regulariza-se em 2006. Porém, nem todas as informações nas Fichas de Notificação foram disponibilizadas ao sinan, fato que acontece até hoje (2018). A falta de acesso amplo a esses dados impede que parâmetros importantes sejam considerados em estudos epidemiológicos. Associações entre tipo de acidente, sintomatologia, soro utilizado ou gravidade do acidente e número de ampolas aplicadas, não são verificáveis pela consulta ao site, dificultando análises sobre qualidade de diagnóstico, eficiência de tratamento e qualidade do preenchimento dos dados.

Alterações da ficha de notificação em 2006 pioraram o problema, caso da exclusão do campo "identificação da espécie causadora" nos acidentes escorpiônicos. Apesar das dificuldades e erros na identificação das espécies causadoras de acidentes pelos profissionais de saúde, a retirada desse campo da ficha é "solução" simplista. Ações para manter a qualidade da informação seriam mais apropriadas.

A exclusão do subcampo "cura com sequela" no campo "evolução do caso", impede o dimensionamento da mor-bidade, pois sequelas são muito comuns nos acidentes peçonhentos. Falta de sincronia e interligação dos Sistemas de informação nas esferas federal, estadual e municipal, resultam em discrepâncias na apresentação e análise dos dados 2020. Machado C, Bochner R. A informação dos acidentes crotálicos no Estado do Rio de janeiro, 2001 a 2010. Gazeta Med Bahia. 2012; 82 (1):78-84., num país continental, megadiverso biologica e sócio-economicamente, carente de estudos epidemiológicos regionalizados e robustos sobre acidentes peçonhentos.

Evolução da soroterapia

Quando da descoberta do soro antiofídico por Calmette em 1894 acreditava-se que o produto preparado com veneno de Naja neutralizasse todos os envenenamentos, mas logo depois, Vital Brazil descobre a especificidade do soro 1818. Cardoso JLC, França FOS, Wen FH, Málaque CMS, Haddad Jr V. Animais Peçonhentos No Brasil: Biologia, Clínica e Terapêutica dos Acidentes. 2a. Ed, Ed. Sarvier 2009., achados base das práticas médicas atuais de tratamento.

Desde os levantamentos de incidência de acidentes e entrega das primeiras partilhas de soro em 1901, houve decréscimo de 50% nos óbitos até os níveis atuais entre 2,6% a 4,6% ao ano (Hospital Vital Brazil, IB).

A primeira geração de soros não atendia condições de assepsia. BPL e BPF tem melhorado a efetividade da so-roterapia e minimizado manifestações sistêmicas. Antivenenos são imunoglobulinas purificadas ou fragmentos F(ab')2 (66,68,69), estes últimos reduzem a incidência de reações adversas 2121. Gutiérrez JM, Lomonte B, León G, Alape-Girón A, Flores-Díaz M, Sanz L, Angulo Y, Calvete JJ. Snake venomics and antivenomics: Proteomic tools in the design and control of antivenoms for the treatment of snakebite envenoming. J Proteomics 2009; 165-182..

Países, onde há dificuldades de identificação do agente causador pelo quadro clínico do paciente, desenvolveram testes de identificação de venenos circulantes para agilizar e melhorar a soroterapia.

Um teste rápido (15 a 20 minutos) australiano detecta venenos inoculados pelas serpentes Notechis, Pseudonaja, Pseudechis, Acanthophis e Oxyuranus, o SVDK (CSL® Ltd) (Snake Venom Detection Kit), como um teste ELISA (http://www.csl.com.au/docs/92/398/svDK_Product_Le-aflet,0). Resultados detectam até 0,01ng/ml do veneno inoculado, permitindo a definição do soro para tratamento. Eles são prontos para uso, acompanham reagentes e não exigem equipamento, utilizando urina, plasma, soro, sangue total ou tecido afetado. Erros de até 10% em diagnósticos de acidentes pela Pseudonajae Notechis e resultados incorretos foram constatados em 14% dos envenenamentos, em pacientes criadores dessas serpentes, especialistas na sua identificação. Falsos negativos e falsos positivos somam 25% dos pacientes testados. Assim, o kit deve ser um coadjuvante na seleção do soro, combinado às bases clínica e laboratorial, associadas à distribuição geográfica da serpente e do local onde ocorreu o acidente 2222. Isbister GK, Brown SGA, Page GB, MacCoubrie DL, Greene SL, Buckley NA. Snakebite in Australia: a practical approach to diagnosis and treatment. MJA. 2013; 199:763-768..

Reatividade cruzada entre os 5 antisoros do kit foi registrada com os venenos das serpentes filogeneticamente próximas (Pseudonaja, Oxyuranus e Pseudechis), em contraposição às mais afastadas (Pseudechis, Acanthophis e Note-chis). Sua utilização em países subdesenvolvidos é inviável devido aos custos 2323. Theakston RDG, Gavin D, Laing GD. Diagnosis of Snakebite and the Importance of Immunological Tests in Venom research. Toxins. 2014; 6(5): 1667-95..

Soros específicos para determinadas áreas são necessários, devido à variabilidade geográfica entre venenos 2424. Villalta M, Sánchez A, Herrera M, Vargas M, Segura Á, Cerdas M, et al. Development of a new polyspecific antivenom for snakebite envenoming in Sri Lanka: Analysis of its preclinical efficacy as compared to a currently available antivenom. Toxicon 2016; 122:152-159.,2525. Jorge RJB, Monteiro HSA, Gonçalves-Machado L, Guarnieri MC, Ximenes RM, Borges-Nojosa DM, Luna KPO, Zingali RB, Corrêa-Netto C, Gutiérrez JM, Sanz L, Calvete JJ, Pla D. Venomics and antivenomics of Bothrops erythromelas from five geographic populations within the Caatinga ecoregion of northeastern Brazil. J Proteomics. 2015; 114: 93-111., caso de Bothrops caribbaeus e Bothrops lanceolatus das ilhas de Santa Lucia e Martinica. Esses venenos causam acidente sem coagulopatia, porém pacientes podem desenvolver trombocitopenia 2626. Gutiérrez JM, Sanz L, Escolano J, Fernandez J, Lomonte B, Angulo Y, Rucavado A, Warrell DA, Calvete JJ. Snake Venomics of the Lesser Antillean Pit Vipers Bothrops caribbaeus and Bothrops lanceolatus: Correlation with Toxicological Activities and Immunoreactivity of a He-terologous Antivenom. J Proteome Res. 2008; 7:4396-4408. e não raro (30 a 40%) 2727. Thomas L, Tyburn B, Ketterlé J, Blao T, Mehdaoui H, Moravie V, Rouvel C, Plumelle Y, Bucher B, Canonge D, Marie-Nelly CA, Lang J, Research Group on Snake Bite in Martinique. Prognostic significance of clinical grading of patients envenomed by snake Bothrops lanceolatus in Martinique. Trans R Soc Trop Med Hyg. 1998; 92:542-545., trombose intracraniana fatais 2626. Gutiérrez JM, Sanz L, Escolano J, Fernandez J, Lomonte B, Angulo Y, Rucavado A, Warrell DA, Calvete JJ. Snake Venomics of the Lesser Antillean Pit Vipers Bothrops caribbaeus and Bothrops lanceolatus: Correlation with Toxicological Activities and Immunoreactivity of a He-terologous Antivenom. J Proteome Res. 2008; 7:4396-4408.,2828. Malbranque S, Piercecchi-Marti MD, Thomas L, Barbey C, Courcier D, Bucher B, Ridarch A, Smadja D, Warrell DA. Case Report fatal diffuse thrombotic microangiopathy after a bite by the "Fer-de-Lance" pit viper (Bothrops lanceolatus) of Martinique. Am J Trop Med Hyg. 2008; 78(6):856-861..

A venômica desses venenos, mostra diferenças na composição e abundância das toxinas 2626. Gutiérrez JM, Sanz L, Escolano J, Fernandez J, Lomonte B, Angulo Y, Rucavado A, Warrell DA, Calvete JJ. Snake Venomics of the Lesser Antillean Pit Vipers Bothrops caribbaeus and Bothrops lanceolatus: Correlation with Toxicological Activities and Immunoreactivity of a He-terologous Antivenom. J Proteome Res. 2008; 7:4396-4408.. O antiveneno polivalente para crotalíneos, da Costa Rica, neutraliza as atividades letal, hemorrágica, proteolítica e de fosfolipase A. A Sanofi-Pasteur, desenvolveu o soro específico para B. lanceolatus, o Bothrofav. Porém, ele é utilizado indiscriminadamente em pacientes das duas ilhas, apesar do conhecimento das diferenças geográfica, filogenética e ontogenética dos venenos e da existência do soro da Costa Rica.

O futuro dos soros antipeçonhentos

O avanço contra o ofidismo prossegue com a condução de Ensaios Clínicos. Nos eua, um estudo prospectivo, mul-ticêntrico, cego, randomizado, controlado, fase III, comparou a eficiência dos antivenenos F(ab')2 ao Fab (ovino), contra a coagulopatia tardia seguida de hemorragia e morte no pós alta, dos envenenamentos por Crotalíneos. O F(ab')2 mostrou-se superior ao Fab na neutralização dessa coagulopatia 3030. Bush SP, Ruha A-M, Seifert SA, Morgan DL, Lewis BJ, Arnold TC, Clark RF, Meggs WJ, Toschlog EA, Borron SW, Figge GR, Sollee DR, Shirazi FM, Wolk R, Chazal I de, Quan D, García-Ubbelohde W, Alagón A, Gerkin RD, Boyer LV. Comparison of F(ab')2 versus Fab anti-venom for pit viper envenomation: A prospective, blinded, multicenter, randomized clinical trial. Clinical Toxicology. 2015; 53(1):37-45..

Estudos pré-clínicos com soro poliespecífico mexicano (BIRMEX), baseados na epidemiologia dos acidentes por Bothrops jararaca (Brasil), B. atrox (Peru e Colômbia), B. diporus (Argentina) e B. mattogrossensis (Bolívia), B. Asper (Costa Rica), apontaram neutralização cruzada, mas baixa contra atividades defibrinogenante e coagulante de B. asper e B. atrox (Colômbia) 2929. Segura A, Herrera M, Vargas M, Villalta M, Uscanga-Reynell A, León G, Gutiérrez JM. Preclinical efficacy against toxic activities of medically relevant Bothrops sp. (Serpentes: Viperidae) snake venoms by a polyspecific antivenom produced in Mexico. Rev Biol Trop. 2017; 65(1):345-350..

Em 1993, soros para Bothrops jararaca, produzidos pelo IB, IVB e FUNED foram comparados por teste randomi-zado. Não houve diferença em eficácia porém, reações anafiláticas foram mais frequentes com o soro IB, provavelmente pelas quantidades maiores de proteínas e imunoglobulinas 3131. Cardoso JL, Fan HW, França FO, Jorge MT, Leite RP, Nishioka SA, Avila A, Sano-Martins IS, Tomy SC, Santoro ML. Randomized comparative trial of three antivenoms in the treatment of envenoming by lance-headed vipers (Bothrops jararaca) in São Paulo, Brazil. Quart J Med. 1993; 86(5):315-325., sugerindo uma reavaliação das doses de tratamento. Em 2004 aventou-se a necessidade de um soro específico para Bothrops atrox (sBa), um importante agente etiológico amazônico. Um ensaio randomizado, comparou a efetividade do SBa ao soro botrópico laquético distribuído pelo MS, sem encontrar diferenças significativas 3232. Pardal PPDO, Souza SM, Monteiro MRDCDC, Fan HW, Cardoso JLC, França FOS, Tomy SC, Sano-Martins IS, de Sousa-e-Silva MCC, Colombini M, Kodera NF. Clinical trial of two antivenoms for the treatment of Bothrops and Lachesis bites in the north eastern Amazon region of Brazil. Trans R Soc Trop Med Hyg. 2004; 98(1):28-42..

Soro contra Daboia, Echis, Hypnale, e Naja do Sri Lanka e continentais 2424. Villalta M, Sánchez A, Herrera M, Vargas M, Segura Á, Cerdas M, et al. Development of a new polyspecific antivenom for snakebite envenoming in Sri Lanka: Analysis of its preclinical efficacy as compared to a currently available antivenom. Toxicon 2016; 122:152-159.,3333. Ediriweera DS, Kasturiratne A, Pathmeswaran A, Gunawardena NK, Wijayawickrama BA, Jayamanne SF, Isbister GK, Dawson A, Giorgi E, Diggle PJ, Lalloo DG, de Silva HJ. Mapping the risk of snakebite in Sri Lanka-A national survey with geospatial analysis. PLoS Negl Trop Dis. 2016; 10, e0004813., mostrou-se efetivo em testes pré-clínicos, estando apto a estudos clínicos, neutralizando atividades tóxicas e enzimáticas desses venenos, melhor do que o produto indiano comercializado naquele país 2424. Villalta M, Sánchez A, Herrera M, Vargas M, Segura Á, Cerdas M, et al. Development of a new polyspecific antivenom for snakebite envenoming in Sri Lanka: Analysis of its preclinical efficacy as compared to a currently available antivenom. Toxicon 2016; 122:152-159.. O desenvolvimento e teste desse antiveneno, incluindo pela primeira vez o veneno de Naja, pouco imunogênico em cavalos, reforça o valor e a importância das parcerias internacionais no enfrentamento ao ofidismo 3434. Bawaskar HS, Bawaskar PH, Bawaskar PH. Snake bite in India: a neglected disease of poverty. The Lancet. 2017; 390:1947-194..

A iniciativa do desenvolvimento de um soro regional asiático, vem de encontro às recomendações da OMS, para que os países pobres se estruturem para produzir e testar (Fase I a m) antivenenos próprios, encurtando o tempo entre descobrimento e acesso à população.

A imprensa (The Hindu - Mumbai 29/09/2017), divulgou que a Índia busca um soro antiofídico uniformemente potente e efetivo para todo país (89), pois atualmente, pacientes demandam um número de ampolas díspare para tratamento, na dependência da região do país. O Indian Institute of Science, através da iniciativa "Snake Mitigation Project" (MCBT) já coletou veneno de diversas espécies e procedências, para esse objetivo, para dimunuir óbitos, hospitalizações e morbidades severas, particularmente amputações.

A globalização das pesquisas em antivenenos 3535. Gutiérrez J-M, Burnouf T, Harrison RA, Calvete JJ, Kuch U, Warrell DA. A multicomponent strategy to improve the availability of antivenom for treating snakebite envenoming. Bull World Health Organ. 2014; 92:526-32. pode ser a solução do ofidismo na África, especialmente com participação de países emergentes como o Brasil (IB), que vem desenvolvendo soros para oito espécies de serpentes de Moçambique, com resultados promissores 1414. Guidolin FR, Caricati CP, Marcelino JR, da Silva WD. Development of Equine IgG Antivenoms against Major Snake Groups in Mozambique. PLoS Negl Trop Dis. 2016; 10(1):e0004325..

Na Tanzânia a loja do museu da cultura Masai, Snake Park, Arusha, abriga uma clínica que trata gratuitamente acidentados por serpentes 3636. Chippaux JP. Prise en charge des piqûres de scorpion en Afrique et au Moyen-Orient Management of scorpion stings in Africa and the Mediterranean region. Médecine et Santé Tropicales. 2016; 26:130-133. (http://www.meseranisnakepark.com/snake-park-medical-clinic.html), mantida por doações. Os soros são monovalentes, com exceção do colubrídeo Dispholidus typus (R. O. Piorelli, Comun. Pessoal). Na África subsaariana além de Dispholidus, outro colubrídeo, Thelotornis, ameaça vidas devido às propriedades procoagulantes letais do veneno, entretanto, não existe soro para este agente. A capacidade de neutralização do soro de D. typus, mostrou uma efetividade 11,3 vezes maior contra D. typus do que contra T. mossambicus3737. Debono J, Dobson J, Casewell NR, Romilio A, Li B, Kurniawan N, Mardon K, Weisbecker V, Nouwens A, Kwok HF, Fry BG. Coagulating Colubrids: Evolutionary, Pathophysiological and Biodiscovery Implications of Venom Variations between Boomslang (Dispholidus typus) and Twig Snake (Thelotornis mossambicanus). Toxins 2017; 9: 171..

Erros de identificação de espécies na coleta de veneno e preparo de soro, fraudes e fornecimento de produtos de origem duvidosa, acentuam os problemas africanos e asiáticos. Testes pré clínicos de eficácia de soros realizados no Kenia 3838. Harrison RA, Oluoch GO, Ainsworth S, Alsolaiss J, Bolton F, Arias A-S, Gutierrez J.-M, Rowley P, Ozwara H, Casewell NR. Preclinical antivenom-efficacy testing reveals potentially disturbing deficiencies of snakebite treatment capability in East Africa. PLoS Negl Trop Dis 2017; 11(10): e0005969. apontaram deficiências na neutralização dos venenos. Os autores apelam ao Ministério de Saúde local o estabelecimento de testes padronizados aos produtores e alertas aos profissionais que tratam vítimas.

O uso de frações tóxicas com similaridade proteica estrutural, responsáveis por sintomas graves, pode ser a chave do tratamento de envenenamentos por organismos próximos filogeneticamente em continentes diferentes e, talvez um caminho para soros de ampla cobertura. Envenenamentos por viúva negra, Latrodectus, com espécies no México, Austrália e Rússia tem sido discutidos por especialistas [Alejandro Alagón Cano - Universidade Autônoma Metropolitana Cuajimalpa, México - palestra "Antivenenos para el mundo" (https://www.youtube.com/watch?v=sroHknNpq2c acesso em 20/04/2017)]. Cano detalhou o problema epidemiológico da aranha Loxosceles no México, América Central e do Sul, sugerindo clonagem dessas toxinas e produção recombinante para obtenção de antígenos em quantidades suficientes para imunização equina, resolvendo o problema da dependência de matrizes e da escassa produção individual de veneno.

Por ser o tratamento primário dos acidentes, em 2010 a OMS define soros como "medicamentos essenciais". Tratamentos efetivos dependem de atitudes em cadeia, vinculadas à ação do estado nos investimentos em Ciência e Tecnologia. A distribuição de produtos eficazes e qualificados, num sistema em rede que atenda pontos de difícil acesso, são decisivos para a crise de confiança sobre a soroterapia, comparada a terapias alternativas, via de regra ineficazes e prejudiciais à saúde individual, coletiva e social.

Investimentos em treinamento profissional para identificar, gerenciar e tratar acidentes peçonhentos são fundamentais na diminuição de mortes, sequelas, aposentados por invalidez e, sobrecarga nos sistemas de saúde e previdenciário 1111. Warrell D. Unscrupulous marketing of snake bite antivenoms in Africa and Papua New Guinea: choosing the right product 'What's in a name? Trans Royal Soc Trop Med Hyg. 2008; 102:397-9.

12. Chippaux JP. Estimating the global burden of snakebite can help to improve management. PLoS Med. 2008; 5:e221.

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-1414. Guidolin FR, Caricati CP, Marcelino JR, da Silva WD. Development of Equine IgG Antivenoms against Major Snake Groups in Mozambique. PLoS Negl Trop Dis. 2016; 10(1):e0004325..

Privatizações e produções em pequena escala resultam em aumento de preços, dificultando o acesso dos necessitados e enfraquecendo o mercado. O comércio ilegal de produtos "impróprios", à margem de controles de qualidade e farmacovigilância, trazem retrocessos e perda de vidas. Transferências de tecnologia podem ajudar na capacitação de equipes e estimular a produção local, particularmente nas regiões pobres mais atingidas.

Testes pré clínicos e clínicos de produtos promissores, para avaliação de equivalência e não inferioridade, via ensaios bem desenhados, conduzidos por instituições isentas, dentro de padrões éticos são imprescindíveis. Exemplo disso é o teste do soro antiapílico pelo consórcio CEVAP UNESP (UPECLIN) e IVB desde 2013.

Estoques reguladores de soros administrados pela OMS são meta a perseguir. Planos de Prequalificação de soros, semelhantes aos de vacinas, são ações audaciosas para aumento ao acesso efetivo de demanda estimada pela OMS (10 milhões de ampolas/ano no mundo).

A criação de um fundo global para a pesquisa e produção de soros, semelhante aos existentes para vacinas, coordenado pela oms, reunindo organizações internacionais, agências governamentais, institutos de pesquisa e patrocinadores é ideia discutida pela comunidade científica 66. Scheske L, Ruitenberg J, Bissumbhar B. Needs and availability of snake antivenoms: relevance and application of international guidelines. Int J Health Policy Manag. 2015; 4(7): 447-457.. Tais medidas terão sucesso mediante estudos epidemiológicos robustos, análises em amplos bancos de dados, como os realizados na Colômbia, fornecendo relações entre a incidência de acidentes e condições ambientais 3939. Angarita-Gerlein D, Bravo-Vega CA, Cruz C, Forero-Muñoz NR, Navas-Zuloaga MG, Umaña-Caro JD. Snakebite Dynamics in Colombia: Effects of Precipitation Seasonality on Incidence. IBIO4299 International Research Experience For Students IRES 2017, disponível em https://goo.gl/LoR9GR.
https://goo.gl/LoR9GR...
.

No Brasil, o Programa Nacional de Ofidismo criado na década de oitenta tentou ampliar a disponibilidade dos soros, mas sua finalidade, abrangência e sustentabilidade ficaram comprometidas, particularmente para os venenos elapídicos e laquético. A liofilização dos fabo-terápicos evitando a adição de antimicrobianos e necessidade de cadeia de frio, ainda é um desafio. Em 2017 resultados promissores de um estudo pioneiro de segurança, eficácia e estabilidade termal de soro trivalente (antibotrópico-laquético-crotálico) brasileiro liofilizado, indicam caminhos para estudos de fase m, viabilizando produtos mais longevos 4040. Mendonça-da-Silva I., Magela Tavares, A., Sachett, J., Sardinha, J. F., Zaparolli, L. et al. Safety and efficacy of a freeze-dried trivalent antivenom for snakebites in the Brazilian Amazon: An open randomized controlled phase IIb clinical trial. PLoS Negl Trop Dis 11(11):e0006068. 2017..

A atualização dos cadastros de produtores e distribuidores de soros no mundo é urgente, pois o trânsito de animais peçonhentos, é uma realidade e acidentes com animais peçonhentos exóticos são muito frequentes. A comunicação rápida entre profissionais responsáveis pelo tratamento das vítimas de diferentes países pode salvar vidas. O IB possui um grupo de especialistas, que apoia profissionais do Brasil e do exterior pelo telefone (+55 11 2637-9529).

Finalmente, a obtenção de antígenos e antivenenos de qualidade é a ferramenta mais eficiente de preservação de vidas. A vontade política no estabelecimento de prioridades em saúde pública, prevenção e tratamento apropriados, são únicas vias para cortes de gastos orçamentários efetivos e desenvolvimento sustentável.

Agradecimentos:

Agradecemos a UNIJUÍ e a Professora Francesca Werner Ferreira, pelo convite à participação no "IV Congresso Internacional em Saúde: Inovação em Saúde". Ao Setor de Farmacovigilância do Instituto Butantan e Diretoria Industrial do Instituto Vital Brazil, pelas informações sobre produção e entrega de soros ao Ministério da Saúde. A Dra Roberta de Oliveira Piorelli, pelas discussões sobre ofidismo e informações do atendimento a acidentados na Tanzânia.

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  • Conflito de interesses:
    Não decladado.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2018

Histórico

  • Recebido
    14 Fev 2018
  • Revisado
    30 Abr 2018
  • Aceito
    27 Maio 2018
Instituto de Salud Publica, Facultad de Medicina - Universidad Nacional de Colombia Bogotá - DF - Colombia
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