Perfil das pessoas com deficiência física e Políticas Públicas: a distância entre intenções e gestos

Giovani Cavalheiro Nogueira Soraia Dornelles Schoeller Flávia Regina de Souza Ramos Maria Itayra Padilha Laura Cavalcanti de Farias Brehmer Ana Maria Fernandes Borges Marques Sobre os autores

Resumo

Trata-se de um estudo transversal, com abordagem quantitativa cujo objetivo principal foi descrever o perfil epidemiológico das pessoas com deficiência física residentes no município de Florianópolis, Santa Catarina e analisá-lo frente às políticas públicas voltadas a esta população. A amostra mínima foi determinada por cálculo estatístico, considerando a população do município com deficiência física, conforme dados do Censo Populacional de 2010. Os dados foram coletados via formulário eletrônico instalado em dispositivos móveis e armazenados em um provedor virtual. A análise e tratamento dos dados foram realizados no programa Statistical Package for the Social Sciences. Foram considerados 139 questionários. Os resultados foram divididos em Atributos individuais; Atributos sociais e Características relacionadas à deficiência. Além do perfil descritivo das pessoas com deficiência física o estudo analisa e discute o distanciamento entre a proposta das políticas públicas mundiais e brasileiras e as ações efetivas de atenção aos direitos destas pessoas. Assim, é fundamental agir frente às reais necessidades da população e consolidar as propostas de promoção, proteção e reabilitação da saúde.

Perfil de saúde; Pessoas com deficiência; Saúde Pública

Introdução

Ao analisar os fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de risco na população, reconhecemos a distribuição e os determinantes das enfermidades, bem como os danos à saúde e os eventos associados. Este entendimento é fundamental para o aperfeiçoamento das políticas públicas, pois permite propor medidas específicas de prevenção, controle, ou erradicação de agravos à saúde11. Almeida Filho N, Rouquayrol MZ. Epidemiologia & Saúde. 6ª ed. Rio de Janeiro: MEDSI/Guanabara Koogan; 2009.. Conhecer o perfil das causas de adoecimento das populações subsidia o planejamento das políticas públicas de saúde para melhor atendimento de suas necessidades.

Particularmente, estudos do perfil das pessoas com deficiência física são essenciais para melhorar o planejamento, a administração, a execução e a avaliação das ações de saúde para esta parcela da população. As pessoas com deficiência, para além das determinações sociais do processo saúde-doença, enfrentam também barreiras atitudinais, arquitetônicas e financeiras, inerentes à própria condição22. World Health Organization (WHO). World report on disability 2011. [página da internet] 2011. [acessado 2015 mar 1]. Disponível em: http://www.who.int/disabilities/world_report/2011/report.pdf
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Na formulação de programas, ações ou iniciativas voltadas para as pessoas com deficiência, seja na esfera privada ou pública, deve-se ter como ponto de partida a realidade social em que elas estão inseridas. Do contrário, as políticas públicas e as iniciativas de entidades privadas, mesmo que bem-intencionadas, serão limitadas em termos de abrangência e efetividade22. World Health Organization (WHO). World report on disability 2011. [página da internet] 2011. [acessado 2015 mar 1]. Disponível em: http://www.who.int/disabilities/world_report/2011/report.pdf
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,33. Barata RB. Como e por que as Desigualdades Sociais fazem Mal a Saúde? Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2010..

A deficiência está relacionada ao impedimento, físico, sensorial, mental e intelectual, que resulte em limitações substanciais para a pessoa realizar uma ou mais atividades importantes de sua vida44. United Nations (UN). Final report of the Ad Hoc Committee on a Comprehensive and Integral International Convention on the Protection and Promotion of the Rights and Dignity of Persons with Disabilities. 2006. [página da internet] [acessado 2015 mar 15]. Disponível em: http://daccess-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/LTD/N06/645/30/PDF/N0664530.pdf?OpenElement
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,55. Myers KA, Lindburg JJ, Nied DM. Allies for Inclusion: Disability and Equity in Higher Education. ASHE Higher Education Report; 2014.. A definição de deficiência ainda é desafiadora, pois congrega elementos complexos, dinâmicos, multidimensionais e questionáveis, sendo histórica e socialmente determinada22. World Health Organization (WHO). World report on disability 2011. [página da internet] 2011. [acessado 2015 mar 1]. Disponível em: http://www.who.int/disabilities/world_report/2011/report.pdf
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. Não se pode falar o termo de forma abstrata e generalista, mas sim, em pessoas com deficiência, que são das mais diversas sociedades, classes sociais e culturas. Portanto, deve-se tratar de cada pessoa com deficiência de forma individual, sabendo que esta possui uma história de vida única e (coletivamente compartilhada); e que, a sociedade em que vive, determinará, com maior ou menor intensidade, as possibilidades dela enfrentar essa condição e as limitações às quais estará submetida, a partir de uma ideia historicamente determinada sobre o que é ser deficiente e quais pessoas são consideradas assim66. Singh A. Representation of Disabilities in Indian English Fiction: A Viewpoint. IJELLH 2015; 10(2):607-616..

A deficiência física é parte das deficiências. As acepções mais atualizadas sobre os domínios das deficiências elencam quatro elementos como essenciais, padronizando a linguagem, para possibilitar a comparação dos diversos países44. United Nations (UN). Final report of the Ad Hoc Committee on a Comprehensive and Integral International Convention on the Protection and Promotion of the Rights and Dignity of Persons with Disabilities. 2006. [página da internet] [acessado 2015 mar 15]. Disponível em: http://daccess-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/LTD/N06/645/30/PDF/N0664530.pdf?OpenElement
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,77. United Nations (UN). Principles and Recommendations for Population and Housing Censuses. Revision 2. New York: UN; 2008.; são eles: mobilidade, visão, audição e cognição77. United Nations (UN). Principles and Recommendations for Population and Housing Censuses. Revision 2. New York: UN; 2008.. Logo, a deficiência física relaciona-se à mobilidade.

De acordo com o último Censo Demográfico realizado no Brasil, em 2010, cerca de 45.623.910 pessoas, 23,9% da população brasileira, refere algum tipo de deficiência. Segundo este censo, mais de 13 milhões de pessoas apresenta deficiência motora, o que corresponde a 6,95% da população do país. A deficiência física é mais significativa no sexo feminino, afetando 9,75%, das mulheres, o que representa 8 milhões desta população. No sexo masculino a prevalência descrita fica em 5,33%, o que totaliza 5 milhões de homens88. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010: Características gerais da população, religião e pessoas com deficiência. [página da internet] [acessado 2014 jun 6]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/caracteristicas_religiao_deficiencia/caracteristicas_religiao_deficiencia_tab_gregioes_xls.shtm
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O Estado de Santa Catarina (SC) é formado por uma população residente de 6.248.436 (100%) habitantes e a população de homens com deficiência física corresponde a 163.547 (5,27%) e a população de mulheres na mesma condição é de 255.646 (8,12%), totalizando no estado uma população de 419.193 (6,71%) pessoas com deficiência física88. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010: Características gerais da população, religião e pessoas com deficiência. [página da internet] [acessado 2014 jun 6]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/caracteristicas_religiao_deficiencia/caracteristicas_religiao_deficiencia_tab_gregioes_xls.shtm
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Faz-se necessário reunir informações para responder as perguntas relacionadas às causas desencadeantes da deficiência física, bem como as principais necessidades dessa parcela da população e assim promover políticas públicas efetivas. Diferentemente de países que possuem centros de estudos e linhas de pesquisa voltadas exclusivamente para a condição social da deficiência, no Brasil ainda são escassas as investigações destinadas a este tema99. Bernardes LCG, Araujo, TCCF. Deficiência, políticas públicas e bioética: percepção de gestores públicos e conselheiros de direitos. Cien Saude Colet 2012; 17(9):2435-2445..

O presente estudo tem por objetivo descrever o perfil epidemiológico das pessoas com deficiência física residentes no município de Florianópolis/SC, e analisá-lo frente às políticas públicas voltadas a esta população. Por perfil epidemiológico considerou-se algumas características relacionadas à deficiência física, como idade, sexo, condições socioeconômicas, ocupação, estado civil, escolaridade, atividades de lazer, tipo e causa de deficiência, as comorbidades e as complicações associadas e as condições de acessibilidade que são disponibilizadas a este grupo de pessoas.

O estudo do perfil da coletividade que apresenta deficiência teve por intuito revelar alguns determinantes sociais envolvidos no processo saúde-doença desta população. Consequentemente, poderá servir como ferramenta estratégica para que os gestores que atuam na área saúde, dando condições para que estes possam implementar e gerenciar Políticas públicas mais eficazes que aspirem efetividade ao contingente de pessoas com deficiência.

O Brasil tem avançado na implementação de leis e planos para apoio ao pleno e efetivo exercício da capacidade legal das pessoas com deficiência. Um exemplo se refere ao Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência – Viver sem Limite, por meio do Decreto 7.612, de 17 de novembro de 20111010. Brasil. Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Viver sem Limite – Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com deficiência. Brasília: SDH; 2013.. A proposta do Viver sem Limite é que Governo Federal, Estados, Distrito Federal e municípios articulem políticas governamentais de acesso desta parcela populacional à educação, inclusão social, atenção à saúde e acessibilidade.

Porém, a inclusão destas pessoas, o acesso à saúde e educação, pressupõe o conhecimento de seu perfil epidemiológico, respondendo, minimamente, sobre QUEM é esta parcela populacional e QUAIS são suas principais características, a fim de que, intenção e gesto se aproximem nas políticas a elas direcionadas.

Método

Trata-se de um estudo transversal (cross-sectional study), com abordagem quantitativa cujo objetivo principal foi descrever o perfil epidemiológico das pessoas com deficiência física residentes no município de Florianópolis/SC e analisá-lo frente às políticas públicas voltadas a esta população. Para Aragão1111. Aragão J. Introdução aos estudos quantitativos utilizados em pesquisas científicas. Rev Práxis 2011; 3(6):59-62., os estudos transversais são capazes de visualizar a situação populacional em um determinado tempo, como instantâneo da realidade. Para sua realização foi utilizado como base o Strobe Statement1212. Elm E, Altman DG, Egger M, Pocock SJ, Gotzsche PC, Vanderbroucke JP. The Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) Statement: Guidelines for Reporting Observational Studies. Plos Med 2007; 4(10):1623-1627..

A população do estudo foi constituída por pessoas com deficiência física residentes no município de Florianópolis. Foram consideradas pessoas com deficiência física aquelas que apresentam tetraplegia, paraplegia, hemiplegia, tetraparesia, paraparesia, hemiparesia, amputação do membro superior esquerdo, amputação do membro superior direito, amputação do membro inferior esquerdo e amputação do membro inferior direito1313. Australian Institute of Health and Welfare (AIHW). Spinal Cord Injury, Australia 2007-08. Caberra: AIHW; 2010. (Injury research and statistics series nº 52).. Os sujeitos do estudo foram selecionados a partir das listas geradas pelos agentes comunitários de saúde do município de Florianópolis, disponibilizadas às equipes de Estratégia de Saúde da Família.

A amostra mínima foi determinada por cálculo estatístico, considerando a população do município com deficiência física, conforme dados do Censo do IBGE de 2010, que apontou para aproximadamente 28.349 pessoas88. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010: Características gerais da população, religião e pessoas com deficiência. [página da internet] [acessado 2014 jun 6]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/caracteristicas_religiao_deficiencia/caracteristicas_religiao_deficiencia_tab_gregioes_xls.shtm
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. Como critérios de inclusão os sujeitos deveriam possuir algum tipo de deficiência física e ser residente em Florianópolis. No caso de pessoas menores de idade, foram convidados os responsáveis legais para acompanhar a entrevista. O critério de exclusão foi a impossibilidade de comunicação verbal por parte da pessoa com deficiência física.

A coleta de dados foi realizada no período de janeiro a julho de 2014, sendo as entrevistas agendadas por contato telefônico e realizadas na residência dos participantes. O pré-teste foi realizado entre o período de outubro de 2013 a janeiro de 2014, com a aplicação do questionário a 21 pessoas com deficiência física que foram selecionadas aleatoriamente em instituições de longa permanência de Florianópolis. Esta fase do estudo se encerrou na 19ª versão do instrumento de coleta de dados, possibilitando os ajustes necessários para aplicação do mesmo. A realização dos treinamentos para os coletadores ocorreu entre dezembro de 2013 e janeiro de 2014.

A amostra final se constituiu de 139 questionários preenchidos, o que representa um grau de confiança de 95% e erro amostral de 5%. Os dados foram coletados via formulário eletrônico instalado em dispositivos móveis e armazenados em um provedor virtual (Go Canvas). A análise e o tratamento dos dados foram realizados no programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), sendo que na análise estatística descritiva das variáveis qualitativas foram utilizadas a medidas de frequência simples e relativa, e para as quantitativas foram utilizadas a medidas de tendência central e dispersão.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética de Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina, por meio da Plataforma Brasil. Assim, todos os aspectos éticos foram respeitados conforme a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde.

Resultados

Os resultados apresentados a seguir correspondem à análise estatística descritiva dos 139 questionários respondidos. Foram divididos em Atributos individuais (sexo, idade e estado civil); Atributos sociais (escolaridade, renda, atividade física e relação com serviço de saúde) e Características relacionadas à deficiência (tipos, causas e comorbidades).

Atributos individuais

A idade média dos participantes foi de 53 anos e a mediana de 55, sendo que as idades variaram de 10 a 99 anos. A idade com maior número de pessoas foi a de 72 anos (Gráfico 1).

Gráfico 1
Idade (em anos) das pessoas com deficiência física residentes em Florianópolis, 2014.

Evidenciou-se que 41,7% são do sexo feminino e 58,3% do masculino.

Do total dos participantes 33,8% são casados, 30,9% solteiros e 14,4% viúvos, os demais são divorciados, separados, ou estão namorando.

Atributos sociais

Segundo a variável escolaridade a pesquisa revelou que 64,4% dos entrevistados são analfabetos ou cursaram até o ensino fundamental incompleto.

Os recursos financeiros dos entrevistados provem da aposentadoria, 64% das pessoas, seguido pelo recebimento de beneficio por invalidez, que corresponde a 22,3%. Destaca-se que 10,8% das pessoas pesquisadas possui emprego assalariado.

O rendimento médio mensal das famílias foi mensurado pelo salário-mínimo nacional vigente no Brasil, que equivalia aproximadamente U$ 243,00 na época da coleta dos dados. Os rendimentos diminuem após a ocorrência da deficiência. Aumentou o número de famílias recebendo até 4 salários-mínimos mensais e diminuíram as que recebiam entre 04 e 10 salários-mínimos (Gráfico 2).

Gráfico 2
Rendimento médio mensal das famílias de pessoas com deficiência física antes e depois da causa, Florianópolis, 2014.

A prática de atividades físicas é um atributo social e de saúde para o ser humano e permanece assim também após a ocorrência de alguma deficiência física. Portanto, a realização de alguma atividade deste tipo é uma variável importante para conhecer e discutir o perfil das pessoas com deficiência. Nesta pesquisa, destacou-se negativamente a realização de algum tipo de atividade física, 78,4% das pessoas refere não realizar nenhum tipo. Os demais, 21,6% dos participantes referem praticar atividades como musculação, basquete, natação e rugby.

Ainda no contexto social das pessoas com deficiência física, a pesquisa revelou que, considerando um ano anterior a realização da coleta de dados, 34,97% dos participantes buscaram serviços de saúde em unidades básicas de saúde, 8,63% nos serviços de reabilitação, 17,99% em serviços de fisioterapia, e 18,70% em hospitais.

Características relacionadas à deficiência física

Quanto às características relacionadas à própria deficiência física, o Gráfico 3 ilustra a amostra segundo o tipo.

Gráfico 3
Distribuição segundo tipo de deficiência física, Florianópolis, 2014.

As lesões medulares são as mais significativas, principalmente as paraplegias, que estão presentes em 23,7% e tetraplegias com 10.8%. Em seguida participam as amputações com 15,11%.

As causas predominantes das deficiências foram as ocorrências de doenças crônicas não transmissíveis (47,48%) e aos acidentes de trânsito (30,22%) (Gráfico 4).

Gráfico 4
Causas das deficiências físicas, Florianópolis, 2014.

Em relação as comorbidades e/ou complicações, foi constatada, predominantemente, a presença das Doenças Crônicas Não Transmissíveis, com um percentual de 66%, sendo que entre elas a Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) e o Diabetes Mellitus (DM) representam 23%, além de dor (neuropática ou no coto) e infecção urinária (Gráfico 5).

Gráfico 5
Comorbidades e complicações das pessoas com deficiência física residentes em Florianópolis, 2014.

Discussão

Os resultados deste estudo indicam que a deficiência física em Florianópolis acomete mais as pessoas do sexo masculino. Outras pesquisas vão ao encontro dos achados deste estudo, no qual o sexo masculino é, também, mais acometido. Por outro lado, os dados encontrados em relação ao sexo não corroboram com a publicação do relatório do censo demográfico do IBGE de 2010. Este descreveu uma prevalência de deficiência física mais significativa em mulheres. Porém, pesquisadores e associações de pessoas com deficiência contestam os dados do IBGE, uma vez que o censo é feito com base em perguntas não muito específicas, o que pode levar a imprecisões ou informações errôneas1414. Andreuccetti G, Carvalho HB, Cherpitel CJ, Ponce JC, Kahn T, Leyton V. Reducing the legal blood alcohol concentration limit for driving in developing countries: a time for change? Results and implications derived from a time–series analysis (2001–2010) conducted in Brazil: reducing blood alcohol limits for driving. Addiction 2011; 106(12):2124-2131..

Na população estudada, a deficiência física prevalece nas pessoas com idade igual ou superior aos 60 anos, decorrente do envelhecimento e da prevalência de doenças crônico-degenerativas. O crescente envelhecimento da população mundial, inclusive no Brasil, tem provocado alterações profundas nas sociedades com grande impacto na área da saúde1515. Martins JJ, Silva RM, Nascimento ERN, Coelho FL, Schweitzer G, Silva RDM, Erdmann AL. Idosos com necessidades de cuidado domiciliar. Rev Enferm UERJ 2008; 16(3):19-25..

O estudo também revelou o predomínio de pessoas casadas, seguidas das solteiras e viúvas. Isto é explicado se levarmos em conta a fase do ciclo de vida de cada um, já que a população casada tende a pertencer a uma faixa etária mais elevada e, por isso, mais suscetível a adquirir algum tipo de deficiência. Pode-se justificar, também, pelo fato destas pessoas buscarem relações mais estáveis e duradouras, que tragam maior segurança pessoal e emocional1616. Marmot M, Allen J, Bell R, Bloomer E, Goldblatt P. Consortium for the European Review of Social Determinants of Health and the Health Divide. WHO European review of social determinants of health and the health divide. Lancet 2012; 380(9846):1011-1029..

No âmbito dos atributos sociais, foi evidenciado baixo nível escolar na população estudada. Além de outras barreiras sociais, esta condição também pode dificultar o acesso aos serviços de saúde e às informações quanto aos cuidados de saúde. A baixa escolaridade pode resultar em um conhecimento deficitário sobre a importância da promoção à saúde e da prevenção de agravos. Esta situação influencia nas ações que dizem respeito ao autocuidado, tornando-se um determinante do processo de adoecimento1717. Fontes WD, Barboza TM, Leite MC, Fonceca LRS, Santos LCF, Nery TCL. Atenção à saúde do homem: interlocução entre ensino e serviço. Acta Paul Enferm. 2011; 24(3):430-433.. A educação é um dos fatores-chave para a inclusão, não apenas das pessoas que possuem alguma deficiência, mas da população em geral1818. Krause JS, Carter RE. Risk of mortality after spinal cord injury: Relationship with social support, education, and income. Spinal Cord 2009; 47(8):592-596..

O perfil escolar das pessoas com deficiência também se articula com as características relacionadas à condição socioeconômica desta população do estudo. Uma amostra preponderante deste grupo recebe aposentadoria e beneficio por invalidez, o que evidencia o comprometimento da deficiência física para o trabalho e/ou a baixa inserção destas pessoas no mercado de trabalho, seja por condições para desempenhar as funções ou por oportunidades.

A pobreza em geral pode ser refletida nos altos índices de desemprego das pessoas com deficiência física1919. Bieler RB. Desenvolvimento Inclusivo: uma abordagem universal da Deficiência [página da internet]. 2007 [acessado 2013 jun 14]. Disponível em: http://www.uefs.br/disciplinas/exa519/Des_Inclusivo_Paper_Port_Final.pdf
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. Ao se investigar as desigualdades socioeconômicas por um conjunto abrangente de indicadores de saúde entre pessoas com lesão medular em país desenvolvido, a Suíça, conclui-se que a dificuldade financeira das pessoas resulta essencialmente de seus problemas de saúde2020. Fekete C, Siegrist J, Reinhardt JD, Brinkhof MWG. Is Financial Hardship Associated with Reduced Health in Disability? The Case of Spinal Cord Injury in Switzerland. Plos One 2014; 9(2):1-7..

A não realização de atividades físicas também caracteriza a população desta pesquisa. Isto pode ser corroborado com a realidade de outros paises, em estudo sobre a longevidade das pessoas com deficiência física residentes nos Estados Unidos atestou que, de maneira genérica, estas pessoas são mais propensas a serem obesas e sedentárias2121. Clarke P, Latham K. Life course health and socioeconomic profiles of Americans aging with disability. Disabil Health J 2014; 7(10):15-23..

Muitas podem ser as causas que impossibilitam a realização de atividades físicas pelas pessoas com deficiência, dentre estas, as barreiras arquitetônicas impostas em nossa sociedade. Esta lógica pode ser comprovada analisando a arquitetura da maioria das cidades brasileiras. Nestas, as pessoas com deficiência se vêm com dificuldade e, até mesmo, impedidas de viver com qualidade e autonomia, pois existem dificuldades de acesso aos espaços de lazer, transportes públicos adaptados, edifícios, escolas, universidades, sanitários públicos, entre outros. Para se ter ideia do problema, é só pensar no acesso às calçadas que, na maioria das cidades, não estão adaptadas às necessidades dessas pessoas. Facilmente, são observados espaços, equipamentos e comportamentos da sociedade, em sua maioria, seguindo um padrão que atende somente às necessidades das pessoas tidas como normais2222. Teixeira MCA. Políticas públicas para pessoas com deficiência no Brasil [dissertação]. São Paulo: Escola de Administração de Empresas de São Paulo; 2010.. Aqui se constata a fragmentação vigente, onde, apesar da tentativa de se incluir as pessoas com deficiência via legislação, as barreiras arquitetônicas e atitudinais impedem ou obstaculizam esta inclusão.

Outro dispositivo social fundamental para o cuidado à saúde da pessoa com deficiência física, se não o primeiro, são os serviços de saúde. Este estudo revelou uma baixa procura pelas unidades básicas de saúde e por serviços de reabilitação. Tal situação pode se dar pelas necessidades individuais, mas também podem ter relação direta com a oferta e o acesso aos serviços de saúde. Este achado contraria um estudo transversal que comparou a utilização dos serviços primários de saúde por parte das pessoas com lesão medular no Canadá, no Reino Unido e nos EUA2323. Donnely C, McColl MA, Charlifue S. Glass C, O’Brien P, Savic G, Smith K. Utilization, access and satisfaction with primary care among people with spinal cord injuries: a comparison of three countries. Spinal Cord 2007. 45(1):25-36.. Os autores concluíram que as pessoas com deficiência motora procuram os profissionais de saúde que possam atender suas necessidades de cuidados a nível primário de saúde. Mais de dois terços dos participantes do estudo consideraram o médico de família como o profissional de saúde mais adequado para cuidar dos novos problemas de saúde, bem como problemas relacionados com a lesão medular. Os entrevistados no Canadá e no Reino Unido tendem a procurar mais a ajuda de um médico de família do que os seus homólogos dos EUA, que tiveram uma maior utilização de serviços especializados2323. Donnely C, McColl MA, Charlifue S. Glass C, O’Brien P, Savic G, Smith K. Utilization, access and satisfaction with primary care among people with spinal cord injuries: a comparison of three countries. Spinal Cord 2007. 45(1):25-36..

Apesar do acesso universal preconizado pela Estratégia de Saúde da Família, no qual a cobertura deve ser de 100% da população para a promoção da saúde, e da necessidade de cuidado constante pela pessoa com deficiência física, a procura pelos serviços de saúde se concentrou nos de maior complexidade e especificidade, com praticamente metade buscando serviços de reabilitação, de fisioterapia ou hospitalares.

Este estudo apontou duas grandes causas da deficiência, as Doenças Crônicas não Transmissíveis em mulheres idosas e os traumas em homens jovens. A primeira causa descrita encontra respaldo no Relatório Mundial sobre a Deficiência22. World Health Organization (WHO). World report on disability 2011. [página da internet] 2011. [acessado 2015 mar 1]. Disponível em: http://www.who.int/disabilities/world_report/2011/report.pdf
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, o qual consta que nos próximos anos a deficiência será uma preocupação ainda maior porque sua incidência tem aumentado e isso se deve ao envelhecimento das populações, bem como ao aumento global de doenças crônicas tais como diabetes, doenças cardiovasculares, câncer e distúrbios mentais.

A violência no trânsito confere ao Brasil uma realidade distinta quando comparado a outros países, pois as causas de deficiência física na Europa e nos Estados Unidos tambem decorrem do envelhecimento da população, afetando mais o sexo feminino e não é significativa frente aos acidentes de trânsito na população jovem do sexo masculino.

Os acidentes de trânsito, além de provocarem a deficiência também trazem outras complicações de saúde, requerendo maior tempo para recuperação. Esta constatação vai ao encontro de outros estudos que atestam que a deficiência está associada à violência urbana, especialmente aos acidentes de trânsito. Nestes, os mais acometidos são os homens jovens, com menos de 40 anos de idade2424. Schoeller SD, Silva DMGV, Vargas MAO, Borges AMF, Pires DEP, Bonetti A. Características das pessoas amputadas atendidas em um centro de reabilitação. Rev Enferm UFPE on line [periódico da internet] 2013 [acessado 2016 maio 31];7(2):445-451. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/article/download/3351/5326.
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25. Gutiérrez C, Romaní F, Wong-Chero P, Montenegro-Idrogo JJ. Perfil epidemiológico de la discapacidad por accidentes de tránsito en el Perú, 2012. Rev Peru Med Exp Salud Publica 2014; 31(2):267-273.
-2626 Cripps RA, Lee BB, Wing P, Weerts E, Mackay J, Brown D. A global map for traumatic spinal cord injury epidemiology: towards a living data repository for injury prevention. Spinal Cord. 2011; 49(4):493-501..

Para Reichenheim et al.2727. Reichenheim ME, Souza ER, Moraes CL, Jorge MHPM, Silva CMFP, Minayo MCS. Violência e lesões no Brasil: efeitos, avanços alcançados e desafios futuros [página da internet]. Lancet; 2011. [acessado 2015 mar 12]. Disponível em: http://www.escoladesaude.pr.gov.br/arquivos/File/Material_1_violencia_lancet.pdf
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, os acidentes de trânsito no Brasil têm alto custo pessoal e social. No nível individual, não apenas a mortalidade é elevada, como também os sobreviventes que sofreram lesões acabam com sequelas físicas e psicológicas significativas, particularmente no caso das vítimas jovens.

Em 2008 foi sancionada a Lei Nº 11.705, que trata da punição a motoristas que tenham ingerido qualquer quantidade de bebida alcoólica, estabelecendo a política de Tolerância Zero. A partir daí foi constatada uma diminuição nos acidentes de trânsito com e sem vítimas, conforme mostrou investigação retrospectiva, de janeiro de 2001 a junho de 2010, em 645 municípios do Estado de São Paulo. Ficou comprovada diminuição de 16% na capital e de 7,2% nos demais municípios nos acidentes com mortes e uma redução de 2,3% na capital e de 1,8% no restante do Estado nos sem mortes. Foram avaliados 1.522.648 acidentes1414. Andreuccetti G, Carvalho HB, Cherpitel CJ, Ponce JC, Kahn T, Leyton V. Reducing the legal blood alcohol concentration limit for driving in developing countries: a time for change? Results and implications derived from a time–series analysis (2001–2010) conducted in Brazil: reducing blood alcohol limits for driving. Addiction 2011; 106(12):2124-2131.. Esta foi uma política de alto impacto na prevenção de pessoas com deficiência.

A realidade também demonstrou o frequente acometimento das pessoas com deficiência por Doenças Crônicas Não Transmissíveis. A preocupação com estas esteve presente no discurso do representante Brasileiro, no ano de 2011, na abertura da 66ª Conferência de Alto Nível da Organização das Nações Unidas, em Nova York, nos Estados Unidos da América, onde se debateu a sua crescente ocorrência no mundo. O Brasil está elaborando novas políticas públicas para atender as pessoas que sofrem de doenças como hipertensão, diabetes, câncer e doenças respiratórias, pois estas foram responsáveis por 63% dos óbitos no país, no ano de 2010, com aproximadamente 80% dessas mortes ocorrendo em locais de baixa e média renda, sendo que dois terços delas em pessoas com mais de 60 anos de idade. A incidência desproporcional destas doenças entre os mais pobres, demonstra a necessidade de resposta integral ao problema. Portanto, é fundamental que haja coordenação entre as políticas de saúde e as demais destinadas a lidar com os determinantes socioeconômicos destas enfermidades2828. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Declaração Brasileira para a Prevenção e Controle das Doenças Crônicas não Transmissíveis. Brasília: MS; 2011..

As políticas públicas voltadas às pessoas com deficiência se articulam ao enfoque da Organização das Nações Unidas de abordagem socioecológica, na qual a deficiência resulta do ambiente social, cultural e físico2929. Shogren A, Turnbull HR. Core Concepts of Disability Policy, the Convention on the Rights of Persons With Disabilities, and Public Policy Research With Respect to Developmental Disabilities. J Policy Pract Intellect Disabil 2014; 11(1):19-26.,3030. Marques AMFB, Vargas MAO, Schoeller SD, Kinoshita EY, Ramos FRS, Trombetta AP. O cuidado à saúde á pessoa com amputação: na perspectiva da bioética. Texto Contexto Enferm. [Internet]. 2014 out-dez [acessado 2016 jun 1];23(4). Disponível em: http://www.index-f.com/textocontexto/2014/230898.php
http://www.index-f.com/textocontexto/201...
. Os conceitos fundamentais envolvidos nas políticas públicas internacionais advêm da Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, promulgada em 2006 e ratificada por 138 países até 2013. São direitos articulados com os princípios fundamentais do direito à vida, à liberdade e à igualdade3131. Brasil. Presidência da República. Casa Civil. Lei 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Diário Oficial da União 2015; 7 jul..

O Brasil aderiu à Convenção Internacional por meio do Decreto Nº 6.949, de 25 de agosto de 2009. Nos últimos anos têm sido elaboradas e lançadas diversas políticas voltadas à população com deficiência. Um exemplo disso é o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência – Viver sem Limite, do ano de 2011, no qual é ressaltado o compromisso com as prerrogativas da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada pelo nosso país com equivalência de emenda constitucional. Reforçando este Plano, em julho de 2015 foi sancionado o Estatuto da Pessoa com Deficiência, para assegurar e promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania1010. Brasil. Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Viver sem Limite – Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com deficiência. Brasília: SDH; 2013..

A proposta do Viver sem Limite e do Estatuto visa a que o Governo Federal, articulado aos estados e municípios, possibilite a consolidação dos preceitos da Convenção Internacional, por meio de políticas governamentais de acesso à educação, inclusão social, atenção à saúde e acessibilidade. Estas políticas consideram que é obrigação do Estado a garantia dos direitos da pessoa com deficiência, especialmente os da Constituição Brasileira e da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

O Brasil é rico em legislações voltadas à pessoa com deficiência: a Norma Brasileira 9050 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT/NBR 9050/1994), prevê que as construções devem proporcionar condições de mobilidade, com autonomia e segurança, eliminando as barreiras arquitetônicas e urbanísticas nas cidades, nos meios de transportes e de comunicação. O Decreto Federal nº 5.296/04, defende que os projetos arquitetônicos e urbanísticos devem atender aos princípios do desenho universal. A toda pessoa é garantido o direito constitucional de ir e vir. Há normas para a construção de logradouros, edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo (Constituição Federal 1988). Da mesma maneira, é vasta a legislação sobre promoção da acessibilidade (Leis Federais nos 10.048 e 10.098 de 2000). O artigo 9 da Convenção da ONU sobre os direitos da pessoa com deficiência, transformada em emenda constitucional pelo Decreto 6949/2009, prevê a adoção de medidas apropriadas para assegurar o acesso, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, ao meio físico, ao transporte, à informação e comunicação, bem como a outros serviços e instalações abertos ao público, tanto na zona urbana quanto na rural. Paralelamente às políticas do Governo Federal, em articulação com o Ministério da Saúde, os estados também propõem medidas de intervenção visando ampliar a inclusão da pessoa com deficiência física.

Neste contexto, destaca-se o Plano Operativo para a Organização da Rede de Assistência à Pessoa com Deficiência Física, lançado no estado de Santa Catarina, no ano de 2008, e que, em consonância com as normas federais, constituiu o início do processo de reconhecimento dos direitos destes cidadãos, com a possibilidade de ampliar as ações e as áreas envolvidas, numa perspectiva de busca progressiva da integralidade e universalidade das ações de saúde.

É importante registrar que as atividades implementadas a partir das diretrizes das políticas públicas e da promulgação do Plano Operativo para a Organização da Rede de Assistência à Pessoa com Deficiência Física deveriam garantir ganhos a esta parcela populacional. Entre estes se destaca acesso destes cidadãos a um conjunto de ações e serviços necessários à resolução de seus problemas de saúde, considerando qualquer nível de atenção à saúde, desde o primário, até os de maior complexidade.

Por outro lado, apesar das políticas voltadas às pessoas com deficiência, tanto no âmbito Federal como no Estadual, ainda há um descompasso entre as políticas públicas de saúde e as causas da deficiência no país: as primeiras devem possibilitar o enfrentamento das últimas a fim de diminuir sua incidência. Isso é corroborado pela grande participação da violência (apesar da Lei de Tolerância Zero) nas deficiências de homens jovens e respectiva falta de articulação entre os setores saúde e segurança para a sua prevenção. O setor saúde, responsável pela assistência à pessoa com deficiência, não participa da elaboração de programas e políticas de promoção da saúde e prevenção às causas das deficiências. Também contribui para este descompasso, a falta de acessibilidade dos serviços de saúde, especialmente os da atenção primária. Estudo apontou que a falta de acessibilidade acontece para além das barreiras arquitetônicas, incluindo o transporte até a unidade de saúde, as barreiras geográficas e as atitudinais3232. Girondi JBR, Santos SMA. Deficiência física em idosos e acessibilidade na atenção básica em saúde: revisão integrativa da literatura. Rev. Gaúcha Enferm. (Online)2011 June [cited 2016 Jun 01]; 32(2):378-384. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-14472011000200023&lng=en. http://dx.doi.org/10.1590/S1983-14472011000200023.
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Ter todo um aparato jurídico a favor, não necessariamente se concretiza em direitos. Por outro lado, na medida em que o processo de inclusão avança, e que o convívio entre pessoas com e sem deficiência se torna mais frequente, a legislação assume papel coadjuvante e, naturalmente, os indivíduos começam a questionar um histórico de exclusão e passam a exigir uma sociedade mais consciente, mais equilibrada em torno de suas diferenças, mais justa e pensada para todos.

Considerações finais

O estudo evidenciou um descompasso entre a proposta das políticas públicas no país e a realidade de perfil das pessoas com deficiência em Florianópolis. As informações obtidas com a realização deste estudo quanto ao perfil epidemiológico das pessoas com deficiência física comprovaram a necessidade urgente de trabalhar questões relacionadas à prevenção frente à ocorrência das doenças crônicas não transmissíveis, alertando para situações de maior risco, tendo em vista que se identificou os grupos mais suscetíveis à ocorrência deste tipo de deficiência. O estudo é relevante, pois alerta para a necessidade de adoção de práticas que diminuam os acidentes de trânsito, bem como práticas que oportunizem o acesso ao trabalho, à educação e ao lazer para essa parcela da população.

Foi possível concluir que as pessoas que apresentam deficiência física necessitam de intervenções capazes de eliminar as barreiras tanto ambientais como sociais. Estes indivíduos apresentam as mesmas necessidades de saúde de qualquer outra pessoa e têm seus estados de saúde influenciados pelo contexto social em que vivem, como a renda, a dificuldade de acesso aos serviços e à reabilitação. Esta questão deve ser sanada, pois estas pessoas são mais vulneráveis ao desenvolvimento de problemas de saúde, como úlceras de pressão ou infecções do trato urinário, decorrentes da deficiência.

Este estudo pretende contribuir com o desenvolvimento de soluções e com a formulação de propostas de políticas públicas de inclusão social e atenção à saúde, que venham somar ou adequar as políticas já existentes à realidade vivida pelas pessoas com deficiência. Tem como limitações a necessidade de ampliação do número de municípios investigados, a fim de conhecer a realidade de forma mais ampla.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Out 2016

Histórico

  • Recebido
    27 Jan 2016
  • Revisado
    28 Jun 2016
  • Aceito
    30 Jun 2016
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