Diferenças e desigualdades no acesso a terapia renal substitutiva nos países do BRICS

Fábio Humberto Ribeiro Paes Ferraz Cibele Isaac Saad Rodrigues Giuseppe Cesare Gatto Natan Monsores de Sá Sobre os autores

Resumo

A doença renal terminal (DRT) é um importante problema de saúde pública, sobretudo nos países em desenvolvimento, em vista dos altos recursos econômicos necessários para manutenção dos pacientes nas diversas formas de terapias renais substitutivas (TRS) existentes. O objetivo deste artigo é analisar as diferenças e as desigualdades que envolvem o acesso a TRS nos países que compõem o BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Estudo aplicado, descritivo, transversal, qualitativo e quantitativo, com análise documental e pesquisa bibliográfica, tendo como fonte de dados censos nacionais e publicações científicas envolvendo o acesso a TRS em tais países. Verificou-se evidências de iniquidade no acesso a TRS em todos os países do BRICS, ausência de censos de diálise e transplante nacionais (Índia), ausência de legislações efetivas que inibam a comercialização de órgãos (Índia e África do Sul) e uso de transplantes de doador falecido de prisioneiros (China). A construção de mecanismos que promovam compartilhamento de benefícios e de solidariedade no campo da cooperação internacional na área da saúde renal passa pelo reconhecimento das questões bioéticas que envolvem o acesso a TRS nos países do BRICS.

Bioética; Diálise; Desigualdades em saúde; Epidemiologia; Transplante de rim

Introdução

A doença renal terminal (DRT) é um importante problema de saúde pública devido à sua crescente prevalência e aos altos custos para manutenção dos pacientes nas formas de terapias renais substitutivas (TRS) existentes (hemodiálise, diálise peritoneal e transplante renal)11. Anand S, Bitton A, Gaziano T. The gap between estimated incidence of end-stage renal disease and use of therapy. PLoS One 2013; 8(8):72860.

2. Thomas B, Wulf S, Bikbov B, Perico N, Cortinovis M, Courville de Vaccaro K, Flaxman A, Peterson H, Delossantos A, Haring D, Mehrotra R, Himmelfarb J, Remuzzi G, Murray C, Naghavi M. Maintenance Dialysis throughout the World in Years 1990 and 2010. J Am Soc Nephrol 2015; 26(11):2621-2633.
-33. Wang V, Vilme H, Maciejewski ML, Boulware LE. The Economic Burden of Chronic Kidney Disease and End-Stage Renal Disease. Semin Nephrol 2016; 36(4):319-330..

Esta situação é agravada nos países em desenvolvimento, devido à coexistência de recursos escassos para investimentos em saúde, condições sanitárias precárias, transição demográfica recente (com progressivo envelhecimento populacional e aumento na incidência de doenças crônicas não transmissíveis) e alta prevalência de doenças infecciosas contagiosas (como Chagas, malária, dengue, dentre outras)44. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan and South Africa. Kidney Int Suppl 2003; (83):S119-1122.

5. Naicker S. Burden of end-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Clin Nephrol 2010; 74(Supl. 1):S13-16.
-66. Gonzalez-Bedat M, Rosa-Diez G, Pecoits-Filho R, Ferreiro A, Garcia-Garcia G, Cusumano A, Fernandez-Cean J, Noboa O, Douthat W. Burden of disease: prevalence and incidence of ESRD in Latin America. Clin Nephrol 2015; 83(7 Supl. 1):3-6..

Diversos estudos têm demonstrado falhas recorrentes na garantia da equidade no acesso a TRS no mundo. Revisão sistemática estimou que dos nove milhões de indivíduos que necessitavam de diálise, em 2010, menos de um terço tinha acesso, e que mais de 90% destes indivíduos residiam em países desenvolvidos77. Liyanage T, Ninomiya T, Jha V, Neal B, Patrice HM, Okpechi I, Zhao MH, Lv J, Garg AX, Knight J, Rodgers A, Gallagher M, Kotwal S, Cass A, Perkovic V. Worldwide access to treatment for end-stage kidney disease: a systematic review. Lancet (London, England) 2015; 385(9981):1975-1982.. Estudos têm evidenciado uma correlação linear entre prevalência de pacientes em TRS e valores de Produto Interno Bruto (PIB) das nações66. Gonzalez-Bedat M, Rosa-Diez G, Pecoits-Filho R, Ferreiro A, Garcia-Garcia G, Cusumano A, Fernandez-Cean J, Noboa O, Douthat W. Burden of disease: prevalence and incidence of ESRD in Latin America. Clin Nephrol 2015; 83(7 Supl. 1):3-6..

A despeito da hipertensão arterial e da diabetes serem as principais causas de DRT, estudos tem procurado identificar outros fatores que poderiam justificar o aumento da prevalência da DRT nos países em desenvolvimento88. Garcia-Garcia G, Jha V. Chronic kidney disease in disadvantaged populations. Braz J Med Biol Res 2015; 48(5):377-381.. Neste contexto, a pobreza e outros determinantes sociais associados a vulnerabilidades biológicas (como baixo peso ao nascer e nutrição inadequada), aos riscos ambientais (falta de saneamento básico, alta prevalência de doenças infecciosas e exposição frequente a poluentes) e potencializados pelas dificuldades no acesso aos sistemas de prevenção, promoção e tratamento de saúde, poderiam explicar a epidemia de DRT em tais países88. Garcia-Garcia G, Jha V. Chronic kidney disease in disadvantaged populations. Braz J Med Biol Res 2015; 48(5):377-381..

O acrônimo BRIC foi cunhado inicialmente em 2001 para designar quatro países emergentes, com progressivo protagonismo econômico mundial: Brasil, Rússia, Índia e China. O termo foi posteriormente modificado para BRICS, após a inclusão da África do Sul (South Africa) no bloco99. McKee M, Marten R, Balabanova D, Watt N, Huang Y, Finch AP, Fan VY, Van Damme W, Tediosi F, Missoni E. BRICS’ role in global health and the promotion of universal health coverage: the debate continues. Bull World Health Organ 2014; 92(6):452-453.. Estes cinco países respondem por cerca de um quarto de todo o PIB global e neles residem cerca de 40% da população mundial. A despeito da potencial pujança econômica e força política, tais países respondem por 40% da carga global de doenças e 50% da pobreza mundial, fato este agravado pelas iniquidades no acesso à saúde verificadas nos mesmos1010. Acharya S, Barber S-L, Lopez-Acuna D, Menabde N, Migliorini L, Molina J, Schwartländer B, Zurn P. BRICS and global health. Bull World Health Org 2014; 92(6):386-386A..

Nos últimos anos houve reformas nos sistemas de saúde de tais países, com o intuito de melhorar a equidade e a qualidade no acesso. Aparentemente, a meta foi a construção de sistemas de saúde com ampla cobertura1111. Rao KD, Petrosyan V, Araujo EC, McIntyre D. Progress towards universal health coverage in BRICS: translating economic growth into better health. Bull World Health Organ 2014; 92(6):429-435., a fim de garantir melhores índices de saúde e manter um papel de destaque na construção de uma agenda de saúde global1212. Tediosi F, Finch A, Procacci C, Marten R, Missoni E. BRICS countries and the global movement for universal health coverage. Health Policy Plan 2016; 31(6):717-728.. Estudos têm procurado entender as possibilidades de cooperação conjunta de tais países em campos como produção de medicamentos e vacinas, no combate à tuberculose, no tratamento do HIV/AIDS e das doenças historicamente negligenciadas1313. Ezziane Z. Essential drugs production in Brazil, Russia, India, China and South Africa (BRICS): opportunities and challenges. Int J Heal policy Manag 2014; 3(7):365-70.

14. Kaddar M, Milstien J, Schmitt S. Impact of BRICS’ investment in vaccine development on the global vaccine market. Bull World Health Organ 2014; 92(6):436-446.

15. Creswell J, Sahu S, Sachdeva KS, Ditiu L, Barreira D, Mariandyshev A, Mingting C, Pillay Y. Tuberculosis in BRICS: challenges and opportunities for leadership within the post-2015 agenda. Bull World Health Organ 2014; 92(6):459-460.

16. Sun J, Boing AC, Silveira MPT, Bertoldi AD, Ziganshina LE, Khaziakhmetova VN, Khamidulina RM, Chokshi MR, McGee S, Suleman F. Efforts to secure universal access to HIV/AIDS treatment: a comparison of BRICS countries. J Evid Based Med 2014; 7(1):2-21.
-1717. Cashwell A, Tantri A, Schmidt A, Simon G, Mistry N. BRICS in the response to neglected tropical diseases. Bull World Health Organ 2014; 92(6):461-462..

Tais formas de cooperação entre países em desenvolvimento, abrangendo aspectos de desenvolvimento científico e tecnológico (no campo da saúde, no caso) são denominadas Cooperação Sul – Sul, em contraponto à Cooperação Norte – Sul, isto é, entre países desenvolvidos e em desenvolvimento1010. Acharya S, Barber S-L, Lopez-Acuna D, Menabde N, Migliorini L, Molina J, Schwartländer B, Zurn P. BRICS and global health. Bull World Health Org 2014; 92(6):386-386A.,1818. Santana JP. An overview of South-South Cooperation on Health. Cien Saude Colet 2011; 16(6):2993-3002.,1919. Carrillo Roa A, Santana JP. Regional integration and south-south cooperation in health in Latin America and the Caribbean. Rev Panam Salud Publica 2012; 32(5):368-375..

Os analistas internacionais apontam que os principais denominadores comuns entre os países do BRICS são: protagonismo econômico, grandes extensões territoriais e recentes transformações socioeconômicas. Por outro lado, são heterogêneos tanto na localização geográfica quanto em seus processos históricos, políticos e culturais. Tais diferenças explicariam as distintas percepções e respostas aos conflitos bioéticos no que tange ao acesso a tecnologias em saúde (no caso, as TRS).

Este trabalho objetiva, portanto, analisar os principais dilemas bioéticos associados às diferenças e desigualdades no acesso a TRS nos países que compõem o BRICS.

Métodos

Trata-se de um estudo quali-quantitativo, transversal, de caráter descritivo, baseado em dados levantados por análise documental e pesquisa bibliográfica sistemática.

A identificação de informações da literatura especializada se fez através de pesquisa nos sites Scielo, Google Acadêmico e Pubmed – Medline, utilizando-se as palavras-chave doença renal terminal e terapia renal substitutiva (em inglês: end stage renal disease and renal replacement therapy), tendo sido pesquisado os dados relacionados a cada país membro do BRICS. Em seguida, realizou-se uma triagem temática, identificando-se artigos que versavam sobre aspectos bioéticos relacionados ao acesso a TRS nos países que compõem o BRICS.

A pesquisa documental visou identificar informações e dados nefrológicos acerca de censos nacionais de diálise e transplante renal. Isto foi realizado uma vez que dados sobre diálise e transplante renal de alguns países (como Índia e China) não constavam no capítulo de comparações internacionais do censo americano de diálise, denominado United States Renal Data System (USRDS), que é uma referência na comparação de dados acerca da TRS em todo o mundo2020. Collins AJ, Foley RN, Chavers B, Gilbertson D, Herzog C, Johansen K, Kasiske B, Kutner N, Liu J, St Peter W, Guo H, Gustafson S, Heubner B, Lamb K, Li S, Li S, Peng Y, Qiu Y, Roberts T, Skeans M, Snyder J, Solid C, Thompson B, Wang C, Weinhandl E, Zaun D, Arko C, Chen SC, Daniels F, Ebben J, Frazier E, Hanzlik C, Johnson R, Sheets D, Wang X, Forrest B, Constantini E, Everson S, Eggers P, Agodoa L. United States Renal Data System 2011 Annual Data Report: Atlas of chronic kidney disease & end-stage renal disease in the United States. American journal of kidney diseases: the official journal of the National Kidney Foundation 2012; A7(59):e1-420..

Foram obtidos através do site do Banco Mundial2121. Group World Bank. World Development Indicators 2012. Washington: World Bank Publications; 2012. os dados referentes aos valores dos países do BRICS quanto às variáveis PIB, expectativa de vida ao nascer, percentagem de gasto PIB/saúde. Os dados referentes ao IDH global destes países foram retirados do site do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento2222. Programa das nações unidas para o desenvolvimento (PNUD). [cited 2017 Jan 10]. Available from: http://www.br.undp.org/
http://www.br.undp.org/...
. O ano-base escolhido para o levantamento de tais dados foi o de 2012.

A escolha de 2012 teve como objetivo permitir uma análise mais distanciada dos dados, além do fato de que várias publicações importantes sobre as questões nefrológicas e bioéticas no acesso a TRS nos países do BRICS terem sido publicadas próximas a este ano.

Resultados e Discussão

Os dados comparativos referentes às variáveis IDH (valores e ranking), PIB (valores e ranking), expectativa de vida ao nascer, percentagem de gasto PIB em saúde encontram-se expressos na Tabela 1.

Tabela 1
Comparação entre os países do BRICS com relação as varíaveis econômicas e sociais (ano base: 2012).

Os dados comparativos referentes a informações nefrológicas sobre as diferenças e as desigualdades no acesso a TRS nos países do BRICS, bem como as principais questões bioéticas envolvidas, encontram-se expressos no Quadro 1.

Quadro 1
Quadro comparativo com dados nefrológicos e questões bioéticas associadas no acesso a TRS nos países do BRICS.

1. Brasil

Maior país da América do Sul, em comparação com os demais países do BRICS o Brasil apresenta o segundo melhor valor de IDH (atrás da Rússia), de PIB e de expectativa de vida (atrás da China), sendo o primeiro na prevalência de pacientes em TRS e na proporção de investimentos do PIB em saúde (Tabela 1).

É um país de destaque no cenário nefrológico global, com uma das maiores populações em programa de diálise ambulatorial crônica no mundo2323. Grassmann A, Gioberge S, Moeller S, Brown G. ESRD patients in 2004: global overview of patient numbers, treatment modalities and associated trends. In: European Renal Association. Nephrology, dialysis, transplantation: official publication of the European Dialysis and Transplant Association. London: European Renal Association; 2005. p. 2587-2593. Vol. 20., e um dos maiores em número bruto de transplantes renais por ano2424. Kasiske BL, Skeans MA, Leighton TR, Ghimire V, Leppke SN, Israni AK. OPTN/SRTR 2011 Annual Data Report: international data. Am J Transplant 2013; 13(Supl. 1):199-225..

O Brasil possui um dos maiores sistemas de saúde públicos do mundo, denominado Sistema Único de Saúde (SUS), que confere acesso a saúde de maneira universal, gratuita e irrestrita a seus cidadãos2525. Paim J, Travassos C, Almeida C, Bahia L, Macinko J. The Brazilian health system: history, advances, and challenges. Lancet (London, England) 2011; 377(9779):1778-1797..

Uma das fontes de dados para análise da situação da diálise é o Censo Brasileiro de Diálise (CBD), instituído há mais de dez anos pela Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN)2626. Sesso RC, Lopes AA, Thome FS, Lugon JR, Dos Santos DR. Brazilian Chronic Dialysis Survey 2013 - trend analysis between 2011 and 2013. J Bras Nefrol 2014; 36(4):476-481.. Segundo dados do CBD de 2013, a principal forma de TRS é a hemodiálise, responsável pelo tratamento de mais de 90% dos pacientes portadores de DRT. Esta forma de tratamento é realizada em hospitais, entidades filantrópicas e em clínicas privadas conveniadas ao SUS, presentes em todos os Estados ao longo do território nacional. Mais de cem mil pacientes encontram-se regularmente em programa de diálise crônica, e cerca de 90% de todos os pacientes têm seu tratamento custeado pelo SUS2626. Sesso RC, Lopes AA, Thome FS, Lugon JR, Dos Santos DR. Brazilian Chronic Dialysis Survey 2013 - trend analysis between 2011 and 2013. J Bras Nefrol 2014; 36(4):476-481..

Dados do USRDS mostraram uma prevalência média de DRT de 771 pacientes /pmp (por milhão de pessoas)2020. Collins AJ, Foley RN, Chavers B, Gilbertson D, Herzog C, Johansen K, Kasiske B, Kutner N, Liu J, St Peter W, Guo H, Gustafson S, Heubner B, Lamb K, Li S, Li S, Peng Y, Qiu Y, Roberts T, Skeans M, Snyder J, Solid C, Thompson B, Wang C, Weinhandl E, Zaun D, Arko C, Chen SC, Daniels F, Ebben J, Frazier E, Hanzlik C, Johnson R, Sheets D, Wang X, Forrest B, Constantini E, Everson S, Eggers P, Agodoa L. United States Renal Data System 2011 Annual Data Report: Atlas of chronic kidney disease & end-stage renal disease in the United States. American journal of kidney diseases: the official journal of the National Kidney Foundation 2012; A7(59):e1-420.. As principal causas de DRT são a hipertensão arterial, a diabetes e a glomerulonefrites. Estima-se que um terço dos pacientes em diálise encontram-se em fila de espera para transplante renal2626. Sesso RC, Lopes AA, Thome FS, Lugon JR, Dos Santos DR. Brazilian Chronic Dialysis Survey 2013 - trend analysis between 2011 and 2013. J Bras Nefrol 2014; 36(4):476-481..

Os dados acerca dos transplantes renais são compilados regularmente pela Associação Brasileira de Transplante de Órgãos e Tecidos (ABTO). O Brasil apresenta um dos maiores programas de transplante públicos do mundo, custeado pelo SUS e coordenado e regulamentado pelo Sistema Nacional de Transplantes (SNT)2727. Medina-Pestana JO, Galante NZ, Tedesco-Silva HJ, Harada KM, Garcia VD, Abbud-Filho M, Campos HH, Sabbaga E. Kidney transplantation in Brazil and its geographic disparity. J Bras Nefrol 2011; 33(4):472-484..

Dados de 2011 evidenciavam que o Brasil era o segundo maior país do mundo em número bruto de transplantes renais, atrás apenas dos Estados Unidos, com predomínio dos provenientes de doadores falecidos2828. Associação Brasileira de Transplante de Órgãos e Tecidos (ABTO) . Dimensionamento dos transplantes no Brasil em cada estado (2005-2012). Regist Bras Transplantes 2012; 18(4)..

Historicamente, as questões relacionadas a TRS no Brasil resultaram em importantes dilemas bioéticos. A expansão dos serviços de diálise durante a década de 1980 não foi acompanhada de legislação específica que normatizasse as peculiaridades que envolvem o tratamento hemodialítico. Isto culminou no episódio conhecido como “Tragédia de Caruaru”, ocorrida em 1996, onde a presença de contaminação por cianobactérias (algas) no reservatório de uma clínica de hemodiálise resultou em óbito de mais de cinquenta indivíduos, por insuficiência hepática2929. Azevedo SMFO, Carmichael WW, Jochimsen EM, Rinehart KL, Lau S, Shaw GR, Eaglesham GK. Human intoxication by microcystins during renal dialysis treatment in Caruaru-Brazil. Toxicology 2002; 181-182:441-446.. Tal situação promoveu mudanças na legislação federal, a fim de resguardar a segurança dos pacientes com DRT.

Nas questões relacionadas ao transplante renal, a criação da lei 9434/97 e o Decreto 2268/97, de “doação presumida” (ou seja, todo brasileiro era um doador potencial de órgãos, a menos que manifestasse desejo contrário), com o intuito de aumentar o número de transplantes renais, resultaram em efeito contrário. Foi alterada por medida provisória, confirmada pela Lei 10.211 de 2001, na qual foi dada prerrogativa de destino dos órgãos do indivíduo falecido à sua família, o que relativizava a autonomia da tomada de decisão do potencial doador em vida2727. Medina-Pestana JO, Galante NZ, Tedesco-Silva HJ, Harada KM, Garcia VD, Abbud-Filho M, Campos HH, Sabbaga E. Kidney transplantation in Brazil and its geographic disparity. J Bras Nefrol 2011; 33(4):472-484..

Atualmente, a doação de órgãos de doadores falecidos só é permitida após anuência familiar, e as transplantações de doadores vivos só são permitidas até os parentes com quarto grau de parentesco e também de cônjuges compatíveis. O transplante de doadores vivos não relacionados só é permitido após trâmite judicial, com vistas a coibir o tráfico de órgãos2727. Medina-Pestana JO, Galante NZ, Tedesco-Silva HJ, Harada KM, Garcia VD, Abbud-Filho M, Campos HH, Sabbaga E. Kidney transplantation in Brazil and its geographic disparity. J Bras Nefrol 2011; 33(4):472-484..

Os atuais dilemas morais, no cenário brasileiro, residem nas questões relativas a iniquidade e justiça no acesso a TRS. A prevalência total de pacientes em diálise/pmp no Brasil é pequena quando comparada com alguns países latino-americanos66. Gonzalez-Bedat M, Rosa-Diez G, Pecoits-Filho R, Ferreiro A, Garcia-Garcia G, Cusumano A, Fernandez-Cean J, Noboa O, Douthat W. Burden of disease: prevalence and incidence of ESRD in Latin America. Clin Nephrol 2015; 83(7 Supl. 1):3-6.. Isto reforça a percepção da existência de subdiagnóstico e de dificuldades no acesso ao tratamento. Além disso, estudos evidenciam desigualdade na distribuição das clínicas ao longo do território nacional, com uma forte correlação entre a proporção de clínicas/pmp e os valores de PIB estaduais3030. Junior JER, Pinto SWL, Canziani ME, Praxedes JLS, Moreira JCM. Censo SBN 2002: informações epidemiológicas das unidades de diálise do Brasil. J Bras nefrol 2003; 25(4):188-199.. Tese recente verificou uma correlação linear entre os centros de diálise e os valores de Índice de Desenvolvimento Humano Municipais (IDH-M)3131. Ferraz FHRP. Vulnerabilidade no acesso ao tratamento dialítico no Brasil: uma análise bioética [tese]. Brasília: Universidade de Brasília; 2015..

Acerca das questões bioéticas relacionadas ao transplante renal, a despeito do elevado número bruto de transplantes, os dados corrigidos pela população brasileira (26 transplantes renais/pmp em 2011) colocam o Brasil no modesto 33° lugar em proporção de transplantes renais, atrás de países latino-americanos como Uruguai e Argentina2828. Associação Brasileira de Transplante de Órgãos e Tecidos (ABTO) . Dimensionamento dos transplantes no Brasil em cada estado (2005-2012). Regist Bras Transplantes 2012; 18(4).. As disparidades econômicas e regionais nas questões do transplante também são verificadas, com uma maior taxa de transplantes nas regiões do país com maiores níveis de renda2727. Medina-Pestana JO, Galante NZ, Tedesco-Silva HJ, Harada KM, Garcia VD, Abbud-Filho M, Campos HH, Sabbaga E. Kidney transplantation in Brazil and its geographic disparity. J Bras Nefrol 2011; 33(4):472-484.,3232. Machado EL, Caiaffa WT, Cesar CC, Gomes IC, Andrade EIG, Acurcio FA, Cherchiglia ML. Iniquities in the access to renal transplant for patients with end-stage chronic renal disease in Brazil. Cad Saude Publica 2011; 27(Supl. 2):S284-297..

2. África do Sul

A África do Sul encontra-se localizada na região conhecida como África Subsaariana, no extremo sul do continente africano. A África é o segundo maior continente do mundo, sendo que a África Subsaariana ocupa cerca de 80% deste território3333. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):13-15. e abriga aproximadamente 70% dos países menos desenvolvidos do mundo55. Naicker S. Burden of end-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Clin Nephrol 2010; 74(Supl. 1):S13-16..

Em comparação com os outros países do BRICS, apresenta a segunda maior percentagem de investimento do PIB em saúde (atrás apenas do Brasil), valores modestos de IDH (na frente apenas da Índia), tendo a menor expectativa de vida dentre todos. Diferentemente dos outros países do BRICS, a África do Sul não se encontra entre as dez maiores economias do mundo, tendo desta forma o menor PIB dentre todos (Tabela 1).

Os dados oficiais referentes à situação da diálise e transplante renal na África do Sul podem ser obtidos através do South African Dialysis and Transplant Registry. Entretanto, segundo Naicker44. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan and South Africa. Kidney Int Suppl 2003; (83):S119-1122., tais dados devem ser interpretados com cautela, uma vez que refletem a acessibilidade a TRS, e não necessariamente a real prevalência de DRT. De fato, a grande maioria dos países africanos não dispõe de registros de diálise e transplante, o que dificulta a criação de um censo africano integrado3434. Davids MR, Eastwood JB, Selwood NH, Arogundade FA, Ashuntantang G, Benghanem Gharbi M, Jarraya F, MacPhee IA, McCulloch M, Plange-Rhule J, Swanepoel CR, Adu D. A renal registry for Africa: first steps. Clin Kidney J 2016; 9(1):162-167..

As principais causas de DRT são a hipertensão arterial, as glomerulonefrites e a diabetes44. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan and South Africa. Kidney Int Suppl 2003; (83):S119-1122.,3333. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):13-15.,3535. Okunola O, Akinsola A, Ayodele O. Kidney diseases in Africa: aetiological considerations, peculiarities and burden. Afr J Med Med Sci 2012; 41(2):119-133.. Estima-se que a hipertensão arterial afete um quarto da população adulta sul-africana e que a prevalência de doença renal crônica seja 3 a 4 vezes maior do que em países desenvolvidos44. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan and South Africa. Kidney Int Suppl 2003; (83):S119-1122.,3333. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):13-15.. As doenças glomerulares são mais prevalentes e agressivas do que em outros países ocidentais, em vista da correlação com a elevada prevalência de doenças infecciosas, parasitárias e virais (como HIV)55. Naicker S. Burden of end-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Clin Nephrol 2010; 74(Supl. 1):S13-16.,3535. Okunola O, Akinsola A, Ayodele O. Kidney diseases in Africa: aetiological considerations, peculiarities and burden. Afr J Med Med Sci 2012; 41(2):119-133.,3636. Fabian J, Naicker S. HIV and kidney disease in sub-Saharan Africa. Nat Rev Nephrol 2009; 5(10):591-598..

Houve um importante declínio na expectativa de vida na região da África Sub-Saariana, secundário a guerras, crimes e violência, agravado com as condições econômicas e sociais precárias após tais eventos3333. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):13-15.. Neste contexto, o perfil do paciente em diálise na África são indivíduos jovens, portadores de glomerulonefrites ou hipertensão arterial, enquanto nos países desenvolvidos os pacientes são mais idosos, tendo como principal causa de DRT a diabetes3333. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):13-15..

A prevalência de pacientes com DRT segundo dados do USRDS é de 167/pmp2020. Collins AJ, Foley RN, Chavers B, Gilbertson D, Herzog C, Johansen K, Kasiske B, Kutner N, Liu J, St Peter W, Guo H, Gustafson S, Heubner B, Lamb K, Li S, Li S, Peng Y, Qiu Y, Roberts T, Skeans M, Snyder J, Solid C, Thompson B, Wang C, Weinhandl E, Zaun D, Arko C, Chen SC, Daniels F, Ebben J, Frazier E, Hanzlik C, Johnson R, Sheets D, Wang X, Forrest B, Constantini E, Everson S, Eggers P, Agodoa L. United States Renal Data System 2011 Annual Data Report: Atlas of chronic kidney disease & end-stage renal disease in the United States. American journal of kidney diseases: the official journal of the National Kidney Foundation 2012; A7(59):e1-420., com predomínio da hemodiálise como forma de TRS44. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan and South Africa. Kidney Int Suppl 2003; (83):S119-1122.,3333. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):13-15.. A taxa de transplante renal é em torno de 9.2/pmp, sendo a África do Sul um dos poucos países da África Subsaariana no qual são realizados transplantes renais e é o único no qual são realizados transplantes de doador falecido55. Naicker S. Burden of end-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Clin Nephrol 2010; 74(Supl. 1):S13-16.. Em vista do tratamento de TRS ser realizado preferencialmente em centros urbanos, em muitas partes da África Subsaariana simplesmente não existem médicos nefrologistas.

Segundo Naicker3333. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):13-15., grande parte do custeio da TRS em toda a África é privado, com os governos de poucos países africanos (entre eles a Africa do Sul) custeando o tratamento de um número pequeno de pacientes, havendo priorização dos pacientes elegíveis para transplante renal3333. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):13-15.. Em muitos países africanos, a diálise ambulatorial crônica é insustentável, com a maioria dos pacientes incapazes de arcar com os custos de seu próprio tratamento após os meses iniciais3333. Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):13-15..

Do ponto de vista da história da bioética, a África do Sul foi palco em 1967 da realização do primeiro transplante cardíaco de doador falecido. A ocorrência deste fato, na ausência de um critério definidor de morte encefálica, suscitou discussões sobre o estabelecimento de critérios que permitissem o impulso dos programas de transplante de doador falecido com maior eticidade3737. Silveira PVP, Silva AA, Oliveira ACS, Alves AJ, Quaresemin CR, Moraes Dias C, Oliveira FC, Magalhães MJ, Alves RM. Aspectos éticos da legislação de transplante e doação de órgãos no Brasil. Rev Bioética 2009; 17(1)..

Atualmente, além das intensas desigualdades na África Subsaariana no acesso a todas as formas de TRS, um outro dilema bioético existente, a despeito da proibição legislativa, é o turismo de órgãos, sobretudo rins3838. Bass D. Kidneys for cash and egg safaris--can we allow “transplant tourism” to flourish in South Africa? S Afr Med J 2005; 95(1):42-44.,3939. Brasileiros venderam rim a rede de tráfico. O Estado de São Paulo 2011; Jan 9. [cited 2017 oct 1]. Available in: http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,brasileiros-venderam-rins-a-rede-de-trafico-imp-,663803
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias...
. Em 2003 o Parlamento da África do Sul rediscutiu sua Lei Nacional de Saúde, inserindo um capítulo específico que trata do uso de sangue e hemoderivados, de tecidos e de gametas humanos.

3. Índia

Localizada no Sudoeste da Ásia, uma das regiões mais populosas do mundo (com mais de 2 bilhões de indivíduos)4040. Jha V. Current status of end-stage renal disease care in South Asia. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):S1-27-32., a Índia, dentre os países que compõem o BRICS, apresenta comparativamente os menores valores de IDH, menor percentagem de investimento em saúde e a segunda pior expectativa de vida ao nascer (66 anos), acima apenas da África do Sul (56 anos) (Tabela 1) .

A despeito do crescente entendimento da importante morbimortalidade da DRT e dos esforços da Indian Society of Nefrology, não existe um Censo Unificado de Diálise e de Transplante Renal na Índia4141. Rajapurkar MM, John GT, Kirpalani AL, Abraham G, Agarwal SK, Almeida AF, et al. What do we know about chronic kidney disease in India: first report of the Indian CKD registry. BMC Nephrol 2012; 13:10.

Estima-se uma incidência de DRT entre 150 a 200 indivíduos/pmp, e uma prevalência de 800 indivíduos/pmp4242. Modi GK, Jha V. The incidence of end-stage renal disease in India: a population-based study. Kidney Int 2006; 70(12):2131-2133.

43. Sakhuja V, Kohli HS. End-stage renal disease in India and Pakistan: incidence, causes, and management. Ethn Dis 2006; 16(2 Supl. 2):S2-20-23.

44. Sakhuja V, Sud K. End-stage renal disease in India and Pakistan: burden of disease and management issues. Kidney Int Suppl 2003; (83):S115-S118.
-4545. Agarwal SK, Srivastava RK. Chronic kidney disease in India: challenges and solutions. Nephron Clin Pract 2009;111(3):c197-203; discussion c203.. A forma de TRS predominante também é a hemodiálise4040. Jha V. Current status of end-stage renal disease care in South Asia. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):S1-27-32.,4545. Agarwal SK, Srivastava RK. Chronic kidney disease in India: challenges and solutions. Nephron Clin Pract 2009;111(3):c197-203; discussion c203.

46. Jha V. End-stage renal care in developing countries: the India experience. Ren Fail 2004; 26(3):201-208.
-4747. Jha V. Peritoneal dialysis in India: current status and challenges. Perit Dial Int 2008; 28(Supl. 3):S36-41.. As principais causas de DRT são as glomerulonefrites, a diabetes e as causas indeterminadas, acometendo indivíduos do gênero masculino e de faixa etária média jovem4040. Jha V. Current status of end-stage renal disease care in South Asia. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):S1-27-32.,4242. Modi GK, Jha V. The incidence of end-stage renal disease in India: a population-based study. Kidney Int 2006; 70(12):2131-2133.

43. Sakhuja V, Kohli HS. End-stage renal disease in India and Pakistan: incidence, causes, and management. Ethn Dis 2006; 16(2 Supl. 2):S2-20-23.
-4444. Sakhuja V, Sud K. End-stage renal disease in India and Pakistan: burden of disease and management issues. Kidney Int Suppl 2003; (83):S115-S118..

Estudos demonstram esforços no sentido de ampliar o acesso à diálise e ao diagnóstico precoce4545. Agarwal SK, Srivastava RK. Chronic kidney disease in India: challenges and solutions. Nephron Clin Pract 2009;111(3):c197-203; discussion c203.,4848. Jha V. Setting up a National Dialysis Service in India - Change, Choice and Principles. Nephrology (Carlton) 2016; 21(11):913-915.. Entretanto, menos de um terço dos pacientes referenciados tem acesso a algum tipo de TRS, sendo frequente a interrupção do tratamento de hemodiálise nos primeiros meses pela incapacidade econômica de custear o próprio tratamento4343. Sakhuja V, Kohli HS. End-stage renal disease in India and Pakistan: incidence, causes, and management. Ethn Dis 2006; 16(2 Supl. 2):S2-20-23.. Existem poucos nefrologistas e hospitais que oferecem diálise e transplante, sobretudo nas regiões mais pobres, sendo a qualidade da hemodiálise discutível, devido ao reuso frequente de capilares de acetato de celulose (de menor qualidade) e a não utilização de medicações importantes (como a eritropoetina), com o intuito de minimizar os custos da diálise, mas que geram maior morbimortalidade, inadequada reabilitação e pior qualidade de vida dos pacientes com DRT4646. Jha V. End-stage renal care in developing countries: the India experience. Ren Fail 2004; 26(3):201-208.. Menos de 10% dos pacientes com DRT são submetidos a transplantes renais, predominando os transplantes de doadores vivos relacionados, com discrepâncias de gênero entre doadores (2/3 do sexo feminino) e receptores (3/4 do sexo masculino)4343. Sakhuja V, Kohli HS. End-stage renal disease in India and Pakistan: incidence, causes, and management. Ethn Dis 2006; 16(2 Supl. 2):S2-20-23.. Cerca de 30% dos transplantes renais são de doadores vivos não relacionados4343. Sakhuja V, Kohli HS. End-stage renal disease in India and Pakistan: incidence, causes, and management. Ethn Dis 2006; 16(2 Supl. 2):S2-20-23., sendo que apenas 1 a 2% correspondem a doadores falecidos, em vista da inexistência de políticas públicas voltadas à doação post mortem4343. Sakhuja V, Kohli HS. End-stage renal disease in India and Pakistan: incidence, causes, and management. Ethn Dis 2006; 16(2 Supl. 2):S2-20-23.,4444. Sakhuja V, Sud K. End-stage renal disease in India and Pakistan: burden of disease and management issues. Kidney Int Suppl 2003; (83):S115-S118.,4646. Jha V. End-stage renal care in developing countries: the India experience. Ren Fail 2004; 26(3):201-208..

Após o transplante renal, o uso de drogas imunossupressoras (como a ciclosporina) é geralmente descontinuada, pela incapacidade econômica dos pacientes em adquirir esta medicação4343. Sakhuja V, Kohli HS. End-stage renal disease in India and Pakistan: incidence, causes, and management. Ethn Dis 2006; 16(2 Supl. 2):S2-20-23.,4444. Sakhuja V, Sud K. End-stage renal disease in India and Pakistan: burden of disease and management issues. Kidney Int Suppl 2003; (83):S115-S118., com consequente perda do enxerto renal, além da não cobertura dos custos relacionados a tratamentos de rejeições córtico-resistentes e infecções por citomegalovírus4646. Jha V. End-stage renal care in developing countries: the India experience. Ren Fail 2004; 26(3):201-208.. Vários estudos relatam a venda de rins para realização de transplantes intervivos como uma prática habitual na Índia, respondendo por até 70% dos transplantes renais intervivos4444. Sakhuja V, Sud K. End-stage renal disease in India and Pakistan: burden of disease and management issues. Kidney Int Suppl 2003; (83):S115-S118.,4646. Jha V. End-stage renal care in developing countries: the India experience. Ren Fail 2004; 26(3):201-208..

Segundo Garrafa4949. Garrafa V. O Mercado de Estruturas Humanas. Rev Bioética 2009; 1(2)., a argumentação de que a doação de um rim é um ato de bondade e que o incentivo financeiro para tal ato é moralmente justificável se iniciou no final da década de 80, tendo sido cunhada na comunidade científica a expressão reward donors4949. Garrafa V. O Mercado de Estruturas Humanas. Rev Bioética 2009; 1(2).. Uma das grandes questões éticas é justamente o conflito sobre incentivos econômicos à doação altruísta em face da necessidade crescente de órgãos5050. Martin DE, White SL. Financial Incentives for Living Kidney Donors: Are They Necessary? Am J Kidney Dis 2015; 66(3):389-395. e a aplicabilidade dos princípios bióeticos principialistas de justiça e autonomia em um contexto de importante exclusão econômica e social5151. Berlinguer G, Garrafa V. O mercado humano: estudo bioético da compra e venda de partes do corpo. Brasília: Universidade de Brasília; 1996.. Em artigo contundente, Jha5252. Jha V. Paid transplants in India: the grim reality. Nephrol Dial Transplant 2004; 19(3):541-543. questiona a argumentação sobre a equidade de benefícios entre doadores e receptores em um mercado regulatório de compra de órgãos, arguindo o papel do Comitê Autorizador da Indian Organ Transplant Act e demonstrando que grande parte dos países em que o pagamento de transplantes é realizado (como Índia, Irã, Paquistão e Filipinas) apresentam um baixo escore no Índice de Percepção de Corrupção compilado pela Organização Transparência Internacional5252. Jha V. Paid transplants in India: the grim reality. Nephrol Dial Transplant 2004; 19(3):541-543.

53. Padilla BS. Regulated compensation for kidney donors in the Philippines. Curr Opin Organ Transplant 2009; 14(2):120-123.
-5454. Rizvi AHS, Naqvi ASA, Zafar NM, Ahmed E. Regulated compensated donation in Pakistan and Iran. Curr Opin Organ Transplant 2009; 14(2):124-128..

4. China

Situada na parte leste do continente asiático, é o terceiro maior país do mundo em extensão territorial e abriga uma população acima de um bilhão e indivíduos. Comparativamente aos demais países que compõem o BRICS, a China apresenta os maiores valores de PIB e de expectativa de vida ao nascer, apresentando o terceiro melhor IDH (superada por Rússia e Brasil) e o penúltimo em percentagem de investimento do PIB em saúde (superando apenas a Índia) (Tabela 1).

Estudos demonstram haver um progressivo aumento na incidência de doenças crônicas não transmissíveis, tais como obesidade e diabetes, além do envelhecimento populacional, levando a um crescimento nos casos de DRT5555. Liu Z-H. Nephrology in china. Nat Rev Nephrol 2013; 9(9):523-528.. As principais causas de DRT são as glomerulonefrites, diabetes e hipertensão arterial5656. Zuo L, Wang M. Current burden and probable increasing incidence of ESRD in China. Clin Nephrol 2010; 74(Supl. 1):S20-S22.

57. Gan L, Zuo L. Current ESRD burden and its future trend in Beijing, China. Clin Nephrol 2015; 83(7 Supl. 1):17-20.

58. Zuo L, Wang M. Current status of hemodialysis treatment in Beijing, China. Ethn Dis 2006; 16(2 Supl. 2):S2-31-4.
-5959. Lin S. Nephrology in China: a great mission and momentous challenge. Kidney Int Supl 2003; (83):S108-110.. Fontes de dados podem ser obtidas através da Chinese Society of Blood Purification e da Chinese Society of Nephrology5555. Liu Z-H. Nephrology in china. Nat Rev Nephrol 2013; 9(9):523-528.,5656. Zuo L, Wang M. Current burden and probable increasing incidence of ESRD in China. Clin Nephrol 2010; 74(Supl. 1):S20-S22., havendo também censos regionais5757. Gan L, Zuo L. Current ESRD burden and its future trend in Beijing, China. Clin Nephrol 2015; 83(7 Supl. 1):17-20.,5858. Zuo L, Wang M. Current status of hemodialysis treatment in Beijing, China. Ethn Dis 2006; 16(2 Supl. 2):S2-31-4..

A despeito de uma prevalência de DRT de 79,1 pacientes/pmp na China Continental (inferior a muitas outras regiões da Ásia), estima-se uma taxa de crescimento anual de prevalência de DRT em torno de 52,9%5656. Zuo L, Wang M. Current burden and probable increasing incidence of ESRD in China. Clin Nephrol 2010; 74(Supl. 1):S20-S22.. É descrita uma importante iniquidade na distribuição dos centros de diálise ao longo das províncias e regiões do território chinês5555. Liu Z-H. Nephrology in china. Nat Rev Nephrol 2013; 9(9):523-528.,5757. Gan L, Zuo L. Current ESRD burden and its future trend in Beijing, China. Clin Nephrol 2015; 83(7 Supl. 1):17-20.,5858. Zuo L, Wang M. Current status of hemodialysis treatment in Beijing, China. Ethn Dis 2006; 16(2 Supl. 2):S2-31-4.. Verificam-se também assimetrias na distribuição de médicos nefrologistas (com presença maior próximo às grandes metrópoles como Beijing, Shangai)5959. Lin S. Nephrology in China: a great mission and momentous challenge. Kidney Int Supl 2003; (83):S108-110., e disparidades importantes entre a zona urbana e rural no acesso ao tratamento dialítico6060. Zhang W, Gong Z, Peng X, Tang S, Bi M, Huang W. Clinical characteristics and outcomes of rural patients with ESRD in Guangxi, China: one dialysis center experience. Int Urol Nephrol 2010; 42(1):195-204..

A forma de tratamento dialítico que predomina é a hemodiálise em 80% dos casos6161. Yu X, Yang X. Peritoneal dialysis in China: meeting the challenge of chronic kidney failure. Am J Kidney Dis 2015; 65(1):147-151.. Em vista do crescimento exponencial dos casos de DRT, estima-se que em 2030 a taxa de prevalência de DRT atinja 1505 casos/pmp, com taxa de crescimento anual de custos em saúde de 6% ao ano, e um aumento na prevalência de transplantados renais em torno de 10%6262. Sun L, Zou L-X, Han Y-C, Huang H-M, Tan Z-M, Gao M, Ma KL, Liu H, Liu BC. Forecast of the incidence, prevalence and burden of end-stage renal disease in Nanjing, China to the Year 2025. BMC Nephrol 2016; 17(1):60.. Neste contexto, cresce o entendimento por parte da Chinese Society of Nephrology sobre a necessidade do diagnóstico precoce e prevenção como forma de retardar o surgimento de novos casos de DRT5555. Liu Z-H. Nephrology in china. Nat Rev Nephrol 2013; 9(9):523-528..

Estima-se uma taxa de transplantação renal de 5000 casos/ano, predominantemente de doadores falecidos5959. Lin S. Nephrology in China: a great mission and momentous challenge. Kidney Int Supl 2003; (83):S108-110.. Tais órgãos são muitas vezes oriundos de prisioneiros que são executados (entre eles dissidentes políticos e ativistas de direitos humanos), residindo aí um dos grandes problemas éticos no programa de transplante renal chinês. Alguns artigos científicos e o governo chinês relativizam esta situação, focando na aparente normalidade do sistema e do beneficio utilitarista pro societatis destes órgãos6363. Huang J, Wang H, Fan ST, Zhao B, Zhang Z, Hao L, Huo F, Liu Y. The national program for deceased organ donation in China. Transplantation 2013; 96(1):5-9., que iria ao encontro da moralidade da ética confucionista6464. Wang M, Wang X. Organ donation by capital prisoners in China: reflections in Confucian ethics. J Med Philos 2010; 35(2):197-212.. Todavia, há pouca transparência nos dados do programa de transplante renal chinês com consequentes agressões aos direitos humanos e aos princípios bioéticos da autonomia e justiça e que violam todas as recomendações éticas da World Health Association (WHO), a World Medical Association e a Declaração de Istambul6565. Sharif A, Singh MF, Trey T, Lavee J. Organ procurement from executed prisoners in China. Am J Transplant 2014; 14(10):2246-2252.

66. Danovitch GM, Shapiro ME, Lavee J. The use of executed prisoners as a source of organ transplants in China must stop. Am J Transplant 2011; 11(3):426-428.

67. Trey T, Sharif A, Schwarz A, Fiatarone Singh M, Lavee J. Transplant Medicine in China: Need for Transparency and International Scrutiny Remains. Am J Transplant 2016; 16(11):3115-3120.
-6868. Cohen C, Bucci D. A doação compulsória de órgãos e os prisioneiros condenados à morte: uma análise sob o ponto de vista da bioética. Rev Bioét 2011; 19(2):383-396..

5. Rússia

A Rússia ou Federação da Rússia é uma nação transcontinental que ocupa um vasto território da Europa e da Ásia. Comparativamente com os outros países que compõem o BRICS, a Rússia apresenta os melhores valores de IDH, a terceira melhor expectativa de vida ao nascer (atrás de China e Brasil) e a terceira maior percentagem de investimento do PIB em saúde (atrás de Brasil e África do Sul) (Tabela 1).

A Rússia é membro efetivo da ERA-EDTA (European Renal Association – European Dialysis and Transplant Association), uma associação que compila os dados nacionais e regionais de mais de 30 países europeus com o intuito de traçar um cenário sobre a situação da DRT no continente europeu6969. Noordzij M, Kramer A, Abad Diez JM, Alonso de la Torre R, Arcos Fuster E, Bikbov BT, et al. Renal replacement therapy in Europe: a summary of the 2011 ERA-EDTA Registry Annual Report. Clin Kidney J 2014; 7(2):227-238.. A Russian Dialysis Society é a responsável por estes dados, podendo ser acessada via o site da ERA-EDTA (www.era-edta.org) ou diretamente (através do site www.nephro.ru).

Dados do USRDS evidenciam uma prevalência de pacientes com DRT em torno de 241/pmp2020. Collins AJ, Foley RN, Chavers B, Gilbertson D, Herzog C, Johansen K, Kasiske B, Kutner N, Liu J, St Peter W, Guo H, Gustafson S, Heubner B, Lamb K, Li S, Li S, Peng Y, Qiu Y, Roberts T, Skeans M, Snyder J, Solid C, Thompson B, Wang C, Weinhandl E, Zaun D, Arko C, Chen SC, Daniels F, Ebben J, Frazier E, Hanzlik C, Johnson R, Sheets D, Wang X, Forrest B, Constantini E, Everson S, Eggers P, Agodoa L. United States Renal Data System 2011 Annual Data Report: Atlas of chronic kidney disease & end-stage renal disease in the United States. American journal of kidney diseases: the official journal of the National Kidney Foundation 2012; A7(59):e1-420.. Foi verificado que houve uma taxa de transplantação renal em torno de 6.8 pacientes/pmp durante o ano de 2011, com predomínio de doadores falecidos.

Verifica-se dificuldade na obtenção de artigos que versem sobre a situação da diálise e transplante na Federação Russa, além dos dados oficiais. Percebem-se valores tanto de prevalência de DRT quanto de taxas de realização de transplantes renais inferiores ao verificado em vários países europeus6969. Noordzij M, Kramer A, Abad Diez JM, Alonso de la Torre R, Arcos Fuster E, Bikbov BT, et al. Renal replacement therapy in Europe: a summary of the 2011 ERA-EDTA Registry Annual Report. Clin Kidney J 2014; 7(2):227-238., o que pode, no contexto da análise realizada nos outros países do BRICS, ser um indício de iniquidade no acesso a TRS. Khan et al.7070. Khan IH, Hunter AH, Smirnov A, Dobronravov V, Shirshov I, MacLeod AM. Chronic renal failure and end-stage renal disease in St Petersburg, Russia. In: European Renal Association. Nephrology, dialysis, transplantation: official publication of the European Dialysis and Transplant Association. London: European Renal Association; 1998. p. 1608-1609. Vol. 13., em carta ao jornal europeu Nephrology, Dialysis and Transplantation em 1998, alertavam sobre as dificuldades enfrentadas pelo modelo de healthcare universal russo, principalmente após o colapso da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), e suas repercussões na tentativa de obtenção de dados sobre TRS. Boesken et al.7171. Boesken WH, Ahmed KE, Mery JP, Segaert MF, Bourgoignie JJ. Observations on renal replacement services in Russia, Belarus and Lithuania. Nephrol Dial Transplant. 1995; 10(11):2013-6., em artigo de 1995, também comentam as dificuldades de manter os programas de TRS em um “ambiente econômico hostil”.

Autores alegam que um dos motivos pelos quais a Federação Russa não exerce um papel de maior influência no BRICS, no que diz respeito a construção de uma agenda global de saúde, é justamente o fato de ser um país tradicionalmente mais voltado para seus problemas domésticos internos99. McKee M, Marten R, Balabanova D, Watt N, Huang Y, Finch AP, Fan VY, Van Damme W, Tediosi F, Missoni E. BRICS’ role in global health and the promotion of universal health coverage: the debate continues. Bull World Health Organ 2014; 92(6):452-453.. Isto explicaria, de certa forma, as dificuldades na obtenção de dados científicos além dos oficiais.

Considerações Finais

Conforme já demonstrado, a DRT pode ser encarada como importante problema de saúde pública, em vista de sua crescente prevalência a nível mundial. Esta situação é particularmente agravada em países emergentes como o BRICS, em vista da rápida transição demográfica associada à manutenção das iniquidades econômicas, sanitárias e sociais.

As soluções para combater tal epidemia são complexas. Segundo White et al.7272. White SL, Chadban SJ, Jan S, Chapman JR, Cass A. How can we achieve global equity in provision of renal replacement therapy? Bull World Health Organ 2008; 86(3):229-237., a expansão do acesso ao tratamento conservador, a produção local de insumos (como capilares, linhas de diálise, comumente importados), a utilização de fontes não governamentais de financiamento e o planejamento sobre contenção de custos poderiam minimizar o impacto econômico da DRT. Garcia-Garcia et al.7373. Garcia-Garcia G, Harden P, Chapman J. The Global role of kidney transplantation. J Nephropathol 2012; 1(2):69-76. argumentam que a expansão de programas de doadores falecidos em larga escala poderia também ser uma opção.

A construção de uma Cooperação Sul – Sul poderia, neste contexto, ter um papel importante, uma vez que tais países partilham de várias semelhanças em vista das iniquidades verificadas no acesso a TRS em tais nações. Esta Cooperação abrange a visão bioética expressa na Declaração Universal de Bioética e Direitos Humanos (DUBDH), nos seus Artigos 13 (que versa sobre a necessidade de solidariedade e cooperação internacional entre as nações) e 14 (que versa sobre a necessidade de promoção a saúde e desenvolvimento social serem objetivos centrais dos governos)7474. UNESCO. Declaração Universal de Bioética e Direitos Humanos. Tradução: Ana Tapajós e Mauro Machado do Prado. Revisão: Volnei Garrafa. Unesco, 2005. [acessado 2017 jan 1]. Disponível em www.sbbioetica.org.br/wp-content/uploads/22011/11/TEXTODADUBDH.pdf
www.sbbioetica.org.br/wp-content/uploads...
.

Em elegante artigo, Cunha e Garrafa7575. Cunha T, Garrafa V. Vulnerability. Cambridge Q Healthc ethics CQ Int J Healthc ethics committees 2016; 25(2):197-208. verificaram que o princípio bioético da “vulnerabilidade”, pode assumir diversos significados em diferentes países, desde uma simples “privação de autonomia” (na visão bioética principialista norte-americana) a uma conotação social (na visão bioética sul-americana)7575. Cunha T, Garrafa V. Vulnerability. Cambridge Q Healthc ethics CQ Int J Healthc ethics committees 2016; 25(2):197-208.,7676. Porto D, Garrafa V. The Brazilian Sanitary Reform’s influence in the construction of a national bioethics. Cien Saude Colet 2011; 16(Supl. 1):719-729.. Isto explicaria as diversas formas de enfrentamento de tais países para tentar lidar com a questão da DRT, com base na visão bioética predominante em cada país.

Desta forma, a construção de pontes interdisciplinares de entendimento7777. Cunha TR, Santana JP. Construindo pontes interdisciplinares. História, Ciências, Saúde-Manguinhos 2015; 22(1):313-315., o investimento na criação de legislações que permitam maior integração tecnológica e o acesso compartilhado a novos medicamentos e terapias poderiam ajudar a resolver algumas dificuldades no acesso às TRS.

Referências

  • 1
    Anand S, Bitton A, Gaziano T. The gap between estimated incidence of end-stage renal disease and use of therapy. PLoS One 2013; 8(8):72860.
  • 2
    Thomas B, Wulf S, Bikbov B, Perico N, Cortinovis M, Courville de Vaccaro K, Flaxman A, Peterson H, Delossantos A, Haring D, Mehrotra R, Himmelfarb J, Remuzzi G, Murray C, Naghavi M. Maintenance Dialysis throughout the World in Years 1990 and 2010. J Am Soc Nephrol 2015; 26(11):2621-2633.
  • 3
    Wang V, Vilme H, Maciejewski ML, Boulware LE. The Economic Burden of Chronic Kidney Disease and End-Stage Renal Disease. Semin Nephrol 2016; 36(4):319-330.
  • 4
    Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan and South Africa. Kidney Int Suppl 2003; (83):S119-1122.
  • 5
    Naicker S. Burden of end-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Clin Nephrol 2010; 74(Supl. 1):S13-16.
  • 6
    Gonzalez-Bedat M, Rosa-Diez G, Pecoits-Filho R, Ferreiro A, Garcia-Garcia G, Cusumano A, Fernandez-Cean J, Noboa O, Douthat W. Burden of disease: prevalence and incidence of ESRD in Latin America. Clin Nephrol 2015; 83(7 Supl. 1):3-6.
  • 7
    Liyanage T, Ninomiya T, Jha V, Neal B, Patrice HM, Okpechi I, Zhao MH, Lv J, Garg AX, Knight J, Rodgers A, Gallagher M, Kotwal S, Cass A, Perkovic V. Worldwide access to treatment for end-stage kidney disease: a systematic review. Lancet (London, England) 2015; 385(9981):1975-1982.
  • 8
    Garcia-Garcia G, Jha V. Chronic kidney disease in disadvantaged populations. Braz J Med Biol Res 2015; 48(5):377-381.
  • 9
    McKee M, Marten R, Balabanova D, Watt N, Huang Y, Finch AP, Fan VY, Van Damme W, Tediosi F, Missoni E. BRICS’ role in global health and the promotion of universal health coverage: the debate continues. Bull World Health Organ 2014; 92(6):452-453.
  • 10
    Acharya S, Barber S-L, Lopez-Acuna D, Menabde N, Migliorini L, Molina J, Schwartländer B, Zurn P. BRICS and global health. Bull World Health Org 2014; 92(6):386-386A.
  • 11
    Rao KD, Petrosyan V, Araujo EC, McIntyre D. Progress towards universal health coverage in BRICS: translating economic growth into better health. Bull World Health Organ 2014; 92(6):429-435.
  • 12
    Tediosi F, Finch A, Procacci C, Marten R, Missoni E. BRICS countries and the global movement for universal health coverage. Health Policy Plan 2016; 31(6):717-728.
  • 13
    Ezziane Z. Essential drugs production in Brazil, Russia, India, China and South Africa (BRICS): opportunities and challenges. Int J Heal policy Manag 2014; 3(7):365-70.
  • 14
    Kaddar M, Milstien J, Schmitt S. Impact of BRICS’ investment in vaccine development on the global vaccine market. Bull World Health Organ 2014; 92(6):436-446.
  • 15
    Creswell J, Sahu S, Sachdeva KS, Ditiu L, Barreira D, Mariandyshev A, Mingting C, Pillay Y. Tuberculosis in BRICS: challenges and opportunities for leadership within the post-2015 agenda. Bull World Health Organ 2014; 92(6):459-460.
  • 16
    Sun J, Boing AC, Silveira MPT, Bertoldi AD, Ziganshina LE, Khaziakhmetova VN, Khamidulina RM, Chokshi MR, McGee S, Suleman F. Efforts to secure universal access to HIV/AIDS treatment: a comparison of BRICS countries. J Evid Based Med 2014; 7(1):2-21.
  • 17
    Cashwell A, Tantri A, Schmidt A, Simon G, Mistry N. BRICS in the response to neglected tropical diseases. Bull World Health Organ 2014; 92(6):461-462.
  • 18
    Santana JP. An overview of South-South Cooperation on Health. Cien Saude Colet 2011; 16(6):2993-3002.
  • 19
    Carrillo Roa A, Santana JP. Regional integration and south-south cooperation in health in Latin America and the Caribbean. Rev Panam Salud Publica 2012; 32(5):368-375.
  • 20
    Collins AJ, Foley RN, Chavers B, Gilbertson D, Herzog C, Johansen K, Kasiske B, Kutner N, Liu J, St Peter W, Guo H, Gustafson S, Heubner B, Lamb K, Li S, Li S, Peng Y, Qiu Y, Roberts T, Skeans M, Snyder J, Solid C, Thompson B, Wang C, Weinhandl E, Zaun D, Arko C, Chen SC, Daniels F, Ebben J, Frazier E, Hanzlik C, Johnson R, Sheets D, Wang X, Forrest B, Constantini E, Everson S, Eggers P, Agodoa L. United States Renal Data System 2011 Annual Data Report: Atlas of chronic kidney disease & end-stage renal disease in the United States. American journal of kidney diseases: the official journal of the National Kidney Foundation 2012; A7(59):e1-420.
  • 21
    Group World Bank. World Development Indicators 2012 Washington: World Bank Publications; 2012.
  • 22
    Programa das nações unidas para o desenvolvimento (PNUD). [cited 2017 Jan 10]. Available from: http://www.br.undp.org/
    » http://www.br.undp.org/
  • 23
    Grassmann A, Gioberge S, Moeller S, Brown G. ESRD patients in 2004: global overview of patient numbers, treatment modalities and associated trends. In: European Renal Association. Nephrology, dialysis, transplantation: official publication of the European Dialysis and Transplant Association London: European Renal Association; 2005. p. 2587-2593. Vol. 20.
  • 24
    Kasiske BL, Skeans MA, Leighton TR, Ghimire V, Leppke SN, Israni AK. OPTN/SRTR 2011 Annual Data Report: international data. Am J Transplant 2013; 13(Supl. 1):199-225.
  • 25
    Paim J, Travassos C, Almeida C, Bahia L, Macinko J. The Brazilian health system: history, advances, and challenges. Lancet (London, England) 2011; 377(9779):1778-1797.
  • 26
    Sesso RC, Lopes AA, Thome FS, Lugon JR, Dos Santos DR. Brazilian Chronic Dialysis Survey 2013 - trend analysis between 2011 and 2013. J Bras Nefrol 2014; 36(4):476-481.
  • 27
    Medina-Pestana JO, Galante NZ, Tedesco-Silva HJ, Harada KM, Garcia VD, Abbud-Filho M, Campos HH, Sabbaga E. Kidney transplantation in Brazil and its geographic disparity. J Bras Nefrol 2011; 33(4):472-484.
  • 28
    Associação Brasileira de Transplante de Órgãos e Tecidos (ABTO) . Dimensionamento dos transplantes no Brasil em cada estado (2005-2012). Regist Bras Transplantes 2012; 18(4).
  • 29
    Azevedo SMFO, Carmichael WW, Jochimsen EM, Rinehart KL, Lau S, Shaw GR, Eaglesham GK. Human intoxication by microcystins during renal dialysis treatment in Caruaru-Brazil. Toxicology 2002; 181-182:441-446.
  • 30
    Junior JER, Pinto SWL, Canziani ME, Praxedes JLS, Moreira JCM. Censo SBN 2002: informações epidemiológicas das unidades de diálise do Brasil. J Bras nefrol 2003; 25(4):188-199.
  • 31
    Ferraz FHRP. Vulnerabilidade no acesso ao tratamento dialítico no Brasil: uma análise bioética [tese]. Brasília: Universidade de Brasília; 2015.
  • 32
    Machado EL, Caiaffa WT, Cesar CC, Gomes IC, Andrade EIG, Acurcio FA, Cherchiglia ML. Iniquities in the access to renal transplant for patients with end-stage chronic renal disease in Brazil. Cad Saude Publica 2011; 27(Supl. 2):S284-297.
  • 33
    Naicker S. End-stage renal disease in sub-Saharan Africa. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):13-15.
  • 34
    Davids MR, Eastwood JB, Selwood NH, Arogundade FA, Ashuntantang G, Benghanem Gharbi M, Jarraya F, MacPhee IA, McCulloch M, Plange-Rhule J, Swanepoel CR, Adu D. A renal registry for Africa: first steps. Clin Kidney J 2016; 9(1):162-167.
  • 35
    Okunola O, Akinsola A, Ayodele O. Kidney diseases in Africa: aetiological considerations, peculiarities and burden. Afr J Med Med Sci 2012; 41(2):119-133.
  • 36
    Fabian J, Naicker S. HIV and kidney disease in sub-Saharan Africa. Nat Rev Nephrol 2009; 5(10):591-598.
  • 37
    Silveira PVP, Silva AA, Oliveira ACS, Alves AJ, Quaresemin CR, Moraes Dias C, Oliveira FC, Magalhães MJ, Alves RM. Aspectos éticos da legislação de transplante e doação de órgãos no Brasil. Rev Bioética 2009; 17(1).
  • 38
    Bass D. Kidneys for cash and egg safaris--can we allow “transplant tourism” to flourish in South Africa? S Afr Med J 2005; 95(1):42-44.
  • 39
    Brasileiros venderam rim a rede de tráfico. O Estado de São Paulo 2011; Jan 9. [cited 2017 oct 1]. Available in: http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,brasileiros-venderam-rins-a-rede-de-trafico-imp-,663803
    » http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,brasileiros-venderam-rins-a-rede-de-trafico-imp-,663803
  • 40
    Jha V. Current status of end-stage renal disease care in South Asia. Ethn Dis 2009; 19(1 Supl. 1):S1-27-32.
  • 41
    Rajapurkar MM, John GT, Kirpalani AL, Abraham G, Agarwal SK, Almeida AF, et al. What do we know about chronic kidney disease in India: first report of the Indian CKD registry. BMC Nephrol 2012; 13:10
  • 42
    Modi GK, Jha V. The incidence of end-stage renal disease in India: a population-based study. Kidney Int 2006; 70(12):2131-2133.
  • 43
    Sakhuja V, Kohli HS. End-stage renal disease in India and Pakistan: incidence, causes, and management. Ethn Dis 2006; 16(2 Supl. 2):S2-20-23.
  • 44
    Sakhuja V, Sud K. End-stage renal disease in India and Pakistan: burden of disease and management issues. Kidney Int Suppl 2003; (83):S115-S118.
  • 45
    Agarwal SK, Srivastava RK. Chronic kidney disease in India: challenges and solutions. Nephron Clin Pract 2009;111(3):c197-203; discussion c203.
  • 46
    Jha V. End-stage renal care in developing countries: the India experience. Ren Fail 2004; 26(3):201-208.
  • 47
    Jha V. Peritoneal dialysis in India: current status and challenges. Perit Dial Int 2008; 28(Supl. 3):S36-41.
  • 48
    Jha V. Setting up a National Dialysis Service in India - Change, Choice and Principles. Nephrology (Carlton) 2016; 21(11):913-915.
  • 49
    Garrafa V. O Mercado de Estruturas Humanas. Rev Bioética 2009; 1(2).
  • 50
    Martin DE, White SL. Financial Incentives for Living Kidney Donors: Are They Necessary? Am J Kidney Dis 2015; 66(3):389-395.
  • 51
    Berlinguer G, Garrafa V. O mercado humano: estudo bioético da compra e venda de partes do corpo Brasília: Universidade de Brasília; 1996.
  • 52
    Jha V. Paid transplants in India: the grim reality. Nephrol Dial Transplant 2004; 19(3):541-543.
  • 53
    Padilla BS. Regulated compensation for kidney donors in the Philippines. Curr Opin Organ Transplant 2009; 14(2):120-123.
  • 54
    Rizvi AHS, Naqvi ASA, Zafar NM, Ahmed E. Regulated compensated donation in Pakistan and Iran. Curr Opin Organ Transplant 2009; 14(2):124-128.
  • 55
    Liu Z-H. Nephrology in china. Nat Rev Nephrol 2013; 9(9):523-528.
  • 56
    Zuo L, Wang M. Current burden and probable increasing incidence of ESRD in China. Clin Nephrol 2010; 74(Supl. 1):S20-S22.
  • 57
    Gan L, Zuo L. Current ESRD burden and its future trend in Beijing, China. Clin Nephrol 2015; 83(7 Supl. 1):17-20.
  • 58
    Zuo L, Wang M. Current status of hemodialysis treatment in Beijing, China. Ethn Dis 2006; 16(2 Supl. 2):S2-31-4.
  • 59
    Lin S. Nephrology in China: a great mission and momentous challenge. Kidney Int Supl 2003; (83):S108-110.
  • 60
    Zhang W, Gong Z, Peng X, Tang S, Bi M, Huang W. Clinical characteristics and outcomes of rural patients with ESRD in Guangxi, China: one dialysis center experience. Int Urol Nephrol 2010; 42(1):195-204.
  • 61
    Yu X, Yang X. Peritoneal dialysis in China: meeting the challenge of chronic kidney failure. Am J Kidney Dis 2015; 65(1):147-151.
  • 62
    Sun L, Zou L-X, Han Y-C, Huang H-M, Tan Z-M, Gao M, Ma KL, Liu H, Liu BC. Forecast of the incidence, prevalence and burden of end-stage renal disease in Nanjing, China to the Year 2025. BMC Nephrol 2016; 17(1):60.
  • 63
    Huang J, Wang H, Fan ST, Zhao B, Zhang Z, Hao L, Huo F, Liu Y. The national program for deceased organ donation in China. Transplantation 2013; 96(1):5-9.
  • 64
    Wang M, Wang X. Organ donation by capital prisoners in China: reflections in Confucian ethics. J Med Philos 2010; 35(2):197-212.
  • 65
    Sharif A, Singh MF, Trey T, Lavee J. Organ procurement from executed prisoners in China. Am J Transplant 2014; 14(10):2246-2252.
  • 66
    Danovitch GM, Shapiro ME, Lavee J. The use of executed prisoners as a source of organ transplants in China must stop. Am J Transplant 2011; 11(3):426-428.
  • 67
    Trey T, Sharif A, Schwarz A, Fiatarone Singh M, Lavee J. Transplant Medicine in China: Need for Transparency and International Scrutiny Remains. Am J Transplant 2016; 16(11):3115-3120.
  • 68
    Cohen C, Bucci D. A doação compulsória de órgãos e os prisioneiros condenados à morte: uma análise sob o ponto de vista da bioética. Rev Bioét 2011; 19(2):383-396.
  • 69
    Noordzij M, Kramer A, Abad Diez JM, Alonso de la Torre R, Arcos Fuster E, Bikbov BT, et al. Renal replacement therapy in Europe: a summary of the 2011 ERA-EDTA Registry Annual Report. Clin Kidney J 2014; 7(2):227-238.
  • 70
    Khan IH, Hunter AH, Smirnov A, Dobronravov V, Shirshov I, MacLeod AM. Chronic renal failure and end-stage renal disease in St Petersburg, Russia. In: European Renal Association. Nephrology, dialysis, transplantation: official publication of the European Dialysis and Transplant Association London: European Renal Association; 1998. p. 1608-1609. Vol. 13.
  • 71
    Boesken WH, Ahmed KE, Mery JP, Segaert MF, Bourgoignie JJ. Observations on renal replacement services in Russia, Belarus and Lithuania. Nephrol Dial Transplant. 1995; 10(11):2013-6.
  • 72
    White SL, Chadban SJ, Jan S, Chapman JR, Cass A. How can we achieve global equity in provision of renal replacement therapy? Bull World Health Organ 2008; 86(3):229-237.
  • 73
    Garcia-Garcia G, Harden P, Chapman J. The Global role of kidney transplantation. J Nephropathol 2012; 1(2):69-76.
  • 74
    UNESCO. Declaração Universal de Bioética e Direitos Humanos. Tradução: Ana Tapajós e Mauro Machado do Prado. Revisão: Volnei Garrafa. Unesco, 2005. [acessado 2017 jan 1]. Disponível em www.sbbioetica.org.br/wp-content/uploads/22011/11/TEXTODADUBDH.pdf
    » www.sbbioetica.org.br/wp-content/uploads/22011/11/TEXTODADUBDH.pdf
  • 75
    Cunha T, Garrafa V. Vulnerability. Cambridge Q Healthc ethics CQ Int J Healthc ethics committees 2016; 25(2):197-208.
  • 76
    Porto D, Garrafa V. The Brazilian Sanitary Reform’s influence in the construction of a national bioethics. Cien Saude Colet 2011; 16(Supl. 1):719-729.
  • 77
    Cunha TR, Santana JP. Construindo pontes interdisciplinares. História, Ciências, Saúde-Manguinhos 2015; 22(1):313-315.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul 2017

Histórico

  • Recebido
    23 Set 2016
  • Aceito
    28 Nov 2016
  • Revisado
    31 Jan 2017
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revscol@fiocruz.br