A pessoa com deficiência auditiva: os múltiplos olhares da família, saúde e educação

Mikael Lima Brasil Gisetti Corina Gomes Brandão Lais Vasconcelos Santos Sobre os autores
2016

Realizar um retrato da deficiência como fenômeno social, nos contextos atuais, é partir da reflexão de um prisma de possibilidades temáticas que misturam experiências, superações e nuances para se pensar a inclusão social nas práticas familiares, de profissionais educadores e trabalhadores da saúde. Nesse direcionamento, encontra-se na obra A pessoa com deficiência auditiva: os múltiplos olhares da família, saúde e educação um convite para apreciar, enxergar e vivenciar questões relacionais à deficiência auditiva.

A obra se desenvolve sob a organização de Jane de Carlos Santana Capelli, Maria Fernanda Larcher de Almeida, Inês Leoneza de Souza, Vivian de Oliveira Sousa Corrêa, Juliana Montani Raimundo, Uliana Pontes Vieira, Angélica Nakamura, Raquel Miguel Rodrigues e Flavia de Miranda Fernandes, apresentando três eixos temáticos (família, saúde e educação) desenvolvidos em 312 páginas a partir das contribuições de 43 autores.

Releva-se, ainda, o contexto apresentado pela obra a partir de concepções trazidas por movimentos sociais que culminaram, em 2015, na aprovação da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência) destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais pela pessoa com deficiência, visando a sua inclusão social e cidadania11. Brasil. Presidência da República. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Diário Oficial da União 2015; 7 jul..

Desta maneira, em família, depara-se com um capítulo retratando quatro histórias. Há compartilhamentos de diferentes pessoas e lócus familiares, mas que em comum traduzem vivências com a deficiência auditiva, as quais mostram dificuldades, desafios e superação, indo ao encontro do que colocam Vieira et al.22. Vieira SS, Bevilacqua MC, Ferreira NML, Andrade DG. Descoberta da deficiência auditiva pela família: vendo o futuro idealizado desmoronar. Acta paul. enferm. 2012; 25(n. esp. 2):82-88. ao retratarem que quando há a descoberta da deficiência auditiva pela família ocorre um sentimento de desmoronamento, ficando essa ótica perceptível nos relatos apresentados no livro, ao ponto que vãose entendendo as famílias descritas por cada história e o processo de enfretamento das situações citadas.

Desta forma, compreende-se que é interessante trazer o contexto da família para o universo da deficiência auditiva, uma vez que há relação entre a classificação socioeconômica e a qualidade de vida de familiares e usuários, existindo a necessidade para a implementação de políticas públicas em atenção à saúde auditiva, visando melhor atender a essa população, proporcionando bem-estar através de intervenções contextualizadas à realidade dos sujeitos33. Nascimento GB, Schiling NO, Ubal SR, Biaggio EPR, Kessler TM. Classificação socioeconômica e qualidade de vida de familiares de crianças e adolescentes com deficiência auditiva. Rev. CEFAC 2016; 18(3):657-666..

A partir dos enredos familiares, inicia-se uma aproximação com as circunstâncias da saúde auditiva. Assim, a obra traz, nos escritos do eixo saúde, treze capítulos que abordam diferentes campos de atuação, como a farmacologia, a fonoaudiologia, a psicologia, a enfermagem e a nutrição, além de um aporte político, proporcionando a visualização da deficiência auditiva diante de diferentes saberes, pluralizando ideias e definindo contextos que se solidificam no decorrer da leitura dos textos e se apresentam como objetos de reflexão a partir das experiências demonstradas.

Neste eixo, ainda é importante frisar que autores e organizadoras fazem uma composição temática que vai desde a perspectiva que relaciona a linguagem até a compreensão da saúde auditiva e as possibilidades apresentas pela pesquisa sobre o assunto, passeando por colocações que se tematizam, entre outras nuances, pelos conteúdos de cuidados de enfermagem, abordagem alimentar e nutricional para a pessoa com deficiência auditiva, toxicidade de produtos que interferem na saúde auditiva, bem como o funcionamento da Rede de Atenção à Saúde para o acolhimento e a resolutividade das questões relacionadas à deficiência auditiva.

Referente à educação, três capítulos conduzem o pensamento a importantes temas que precisam ainda avançar no campo educacional brasileiro, tais como as dificuldades da implantação das políticas inclusivas, o preparo dos profissionais que recebem crianças com deficiência auditiva e as ações para capacitar e formar pessoas que consigam desenvolver suas práticas pautadas na inclusão.

Diante do atual modelo de educação, nota-se, ainda, que este não contempla as necessidades pedagógicas e linguísticas das pessoas com deficiência auditiva, pois, como coloca Gomes no livro, são perceptíveis, na rede de ensino, alunos com deficiência auditiva que apresentam dificuldades de aprendizagem na escola inclusiva, além do cenário do sistema educacional não contribuir com o desenvolvimento de práticas de ensino que favoreçam a comunicação visual ou muito menos trabalhem com a interação fluente na Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS).

Ao término da leitura da obra, fica notória a constatação de que o corpo de conhecimento trazido pela mesma contrasta com a pouca literatura ainda disponível sobre a temática. A reunião dos capítulos, através de uma coletânea de textos, possibilita um desvendar necessário a profissionais, usuários de serviços de saúde e educação, bem como seus familiares, para que possam conhecer desde histórias de vida até a lógica pela qual se operacionaliza o cuidado à pessoa com deficiência auditiva.

A construção de conhecimento caracterizada pelos textos em que se desenvolve o livro traz ao leitor um misto de sabores que caminham pela doce necessidade em se trabalhar o tema, mas também pela amarga constatação dos desafios que ainda precisam ser superados para o desenvolvimento de um leque de possibilidades que vise à melhoria da qualidade de vida da pessoa com deficiência através do intercâmbio entre diversos saberes. Saberes, também, mediados pelos diferentes sujeitos implicados no cuidado.

Referências

  • 1
    Brasil. Presidência da República. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Diário Oficial da União 2015; 7 jul.
  • 2
    Vieira SS, Bevilacqua MC, Ferreira NML, Andrade DG. Descoberta da deficiência auditiva pela família: vendo o futuro idealizado desmoronar. Acta paul. enferm. 2012; 25(n. esp. 2):82-88.
  • 3
    Nascimento GB, Schiling NO, Ubal SR, Biaggio EPR, Kessler TM. Classificação socioeconômica e qualidade de vida de familiares de crianças e adolescentes com deficiência auditiva. Rev. CEFAC 2016; 18(3):657-666.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov 2017
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