Consumo de frutas e verduras por adolescentes catarinenses ao longo de uma década

Fruit and vegetable consumption over a decade among adolescents in the State of Santa Catarina, Brazil

Jaqueline Aragoni da Silva Kelly Samara da Silva Mônica Costa Silva Pablo Magno da Silveira Giovâni Firpo Del Duca Jucemar Benedet Markus Vinicius Nahas Sobre os autores

Resumo

Compreender mudanças no consumo de frutas e verduras por adolescentes é importante para criação de ações de saúde pública. O objetivo deste artigo é investigar mudanças, em dez anos, no consumo diário de frutas e verduras por adolescentes, de acordo com sexo, idade e área de moradia. Estudo de painel (análise secundária) da pesquisa "Estilo de vida e comportamentos de risco de jovens catarinenses". Adolescentes (15-19 anos) de escolas estaduais, em 2001 (n = 5.028) e 2011 (n = 6.529), responderam questionário sobre consumo de frutas e verduras e aspectos sociodemográficos. Estatística descritiva e regressão logística (2001 vs 2011), estratificada para sexo, idade e área de moradia. Houve diminuição no consumo diário de frutas (39,1% e 16,6%) e de verduras (40,1% e 20,6%). Diferentes prevalências são observadas de acordo com subgrupos, principalmente entre moças. A chance para consumo diário de verduras entre rapazes e adolescentes de área rural continuou a mesma. A diminuição na prevalência do consumo diário de frutas e verduras por adolescentes catarinenses de 15 a 19 anos aponta necessidade de criação de estratégias para reversão deste cenário.

Palavras-chave
Escola; Adolescência; Comportamento; Dieta; Nutrição

Abstract

Understanding the changes in the trends of fruit and vegetable consumption among adolescents is important in order to implement public health actions. The scope of this article is to investigate the changes over a ten-year period in the daily fruit and vegetable consumption among adolescents from Santa Catarina, according to sex, age and housing area. It is a secondary analysis of a panel survey entitled "Lifestyle and Risk Behavior of Adolescents in the State of Santa Catarina, Brazil (ComPAC)." Adolescents (15-19 years of age) of state schools in 2001 (n=5.028) and 2011 (n=6.529) answered a questionnaire about fruit and vegetable consumption as well as about sociodemographic aspects. Descriptive statistics and logistic regression were applied, according to sex, age and housing area. There was a decrease in daily fruit (39.1% and 16.6%) and vegetable (40.1% and 20.6%) consumption. Different prevalence levels were observed when analyzing subgroups, mainly among girls. From 2001 to 2011, daily vegetable consumption among boys and adolescents in rural areas remained the same. The decrease in daily consumption of fruit and vegetables among adolescents aged 15 to 19 in Santa Catarina highlights the need for the development of strategies to reverse this scenario.

Key words
School; Adolescence; Behavior; Diet; Nutrition

Introdução

A alimentação saudável é um importante indicador para reduzir o desenvolvimento de uma doença, refletindo diretamente na manutenção da saúde ao longo da vida11 Lien N, Lytle LA, Klepp KI. Stability in consumption of fruit, vegetables, and sugary foods in a cohort from age 14 to age 21. Prev Med 2001; 33(3):217-226. ,22 Buffarini R, Muniz LC, Barros AJD, Araújo CL, Gonçalves H, Menezes AMB, Assunção MCF. Stability and change in fruit and vegetable intake of Brazilian adolescents over a 3-year period: 1993 Pelotas Birth Cohort. Public Health Nutr 2015; 19(3):386-392.. As frutas e verduras, por exemplo, são componentes fundamentais de uma dieta saudável, essenciais para o crescimento, desenvolvimento e manutenção do corpo humano durante o ciclo de vida33 Al Ani MF, L. K. Subhi AL, Bose S. Consumption of fruits and vegetables among adolescents: a multi-national comparison of eleven countries in the Eastern Mediterranean Region. Br J Nutr 2016; 115(6):1092-1099. . Ao considerar a adolescência, uma fase em que o indivíduo passa por mudanças biológicas, psicológicas e sociais, percebe-se que essa é uma fase fundamental para a formação de hábitos saudáveis44 World Health Organization (WHO). Child and adolescent health and development: progress report 2009: highlights. Geneva: WHO; 2010., os quais tendem a persistir na vida adulta55 Lipsky LM, Haynie DL, Liu D, Chaurasia A, Gee B, Li K. Ronald J, Iannotti RJ, Simons-Morton B. Trajectories of eating behaviors in a nationally representative cohort of US adolescents during the transition to young adulthood. Int J Behav Nutr Phys Act 2015; 12(1):138.. Adolescentes representam uma população com potencial para desenvolvimento de ações de políticas públicas para promoção da saúde, e estão na lista de prioridades do Plano Global de Estratégias das Nações Unidas66 United States Department of Agriculture (USDA). Diet quality of Americans in 2001-02 and 2007-08 as measured by the Healthy Eating Index 2010. Center for Nutrition Policy and Promotion. U.S. Department of Agriculture. Nutrition Insight 2013; 51..

Evidências não demonstram melhoria no consumo de frutas e verduras66 United States Department of Agriculture (USDA). Diet quality of Americans in 2001-02 and 2007-08 as measured by the Healthy Eating Index 2010. Center for Nutrition Policy and Promotion. U.S. Department of Agriculture. Nutrition Insight 2013; 51. ou até mesmo apontam para redução no consumo destes alimentos77 Zhang CX, Chen YM, Chen WQ, Su YX, Wang CL, Wu JN. Food group intake among adolescentes in Guangzhou city compared with the Chinese dietary guidelines. Asia Pac J Clin Nutr 2012; 21(3):450-516.,88 Diethelm K, Jankovic N, Moreno LA, Huybrechts I, De Henauw S, De Vriendt T, González-Gross M, Leclercq C, Gottrand F, Gilbert CC, Dallongeville J, Cuenca-Garcia M, Manios Y, Kafatos A, Plada M, Kersting M; HELENA Study Group. Food intake of European adolescentes in the light of diferente food-based dietary guidelines: results of the HELENA (Health Lifestyle in Europe by Nutrition in Adolescence) Study. Public Health Nutr 2012; 15(3):386-398.. Estudo brasileiro aponta que cerca de 80% dos adolescentes possuem consumo inadequado de frutas e verduras e que 30% não consomem nem frutas e verduras99 Machado RHV, Feferbaum R, Leone C. Fruit intake and obesity Fruit and vegetables consumption and obesity in Brazil. J Hum Growth Dev 2016;26(2):243-52. . Dados da Pesquisa Nacional da Saúde do Escolar apontam que houve redução na prevalência de adolescentes que consomem frutas cinco ou mais vezes na semana reduziu de 2009 (31,5%) para 2012 (29,8%)1010 Malta DC, Andreazzi MAR, Oliveira-Campos M, Andrade SSCA, Sá NNB, Moura L, et al. Trend of the risk and protective factors of chronic diseases in adolescents, National Adolescent School-based Health Survey (PeNSE 2009 e 2012). Rev Bras Epidemiol 2014; 17(Supl. 1):77-91. . No Sul do Brasil, estudo de coorte aponta que a média do consumo diário de frutas e verduras reduziu de 2008 (2,97) para 2011 (2,86)2. De 2003 para 2008, houve redução na média padronizada do consumo de verduras (3,6 para 3,4, respectivamente) entre adolescentes de escolas públicas de Niterói-RJ1111 Monteiro LS, Rodrigues PRM, Veiga GV, Marchioni DML, Pereira RA. Diet quality among adolescents has deteriorated: a panel study in Niterói, Rio de Janeiro State, Brazil, 2003-2008. Cad Saude Publica 2016; 32(12):e00124715. . Contudo, evidências indicam que tendências no consumo alimentar apresentam distinções de acordo com aspectos sociodemográficos, regionais e culturais1212 Rekhy R, McConchie R. Promoting consumption of fruit and vegetables for better health. Have campaigns delivered on the goals? Appetite 2014; 79:113-123. , questões estas que justificam a necessidade de estudos nas diferentes regiões do cenário brasileiro.

Levando em consideração que o consumo adequado de frutas, legumes e verduras é um desafio para a prevenção de doenças, faz-se necessário monitoramento do consumo alimentar deste segmento populacional para possíveis intervenções. Informações deste caráter podem auxiliar na criação de estratégias para reverter a elevada taxa de mortalidade associada ao baixo consumo de frutas e verduras1212 Rekhy R, McConchie R. Promoting consumption of fruit and vegetables for better health. Have campaigns delivered on the goals? Appetite 2014; 79:113-123. . Ademais, a compreensão das tendências de acordo com características sociodemográficas podem auxiliar na criação de medidas mais específicas e efetivas, uma vez que ações direcionadas tendem a ter melhores resultados1212 Rekhy R, McConchie R. Promoting consumption of fruit and vegetables for better health. Have campaigns delivered on the goals? Appetite 2014; 79:113-123. . Assim, o presente estudo teve como objetivo investigar as mudanças no consumo diário de frutas e verduras por adolescentes de Santa Catarina, Brasil, ao longo de uma década, de acordo com variáveis sociodemográficas.

Métodos

Trata-se de um estudo transversal, oriundo da pesquisa "Estilo de vida e comportamentos de risco de jovens catarinenses (COMPAC)", que foi realizado nos anos de 2001 e 2011, com adolescentes estudantes do ensino médio, com idades de 15 a 19 anos, matriculadas em escolas públicas estaduais de Santa Catarina, Brasil.

Para o cálculo da amostra, no primeiro inquérito (2001), os dados foram utilizados a partir do censo escolar de 2000, que apontou o total de 205.543 jovens matriculados em escolas públicas. Enquanto no segundo inquérito (2011), o total foi 205.572, de acordo com o censo escolar de 2010. Para o cálculo da amostra utilizou-se os seguintes parâmetros estatísticos: prevalência desconhecida do fenômeno com a estimativa de 50 %, devido às inúmeras variáveis existentes; intervalo de confiança de 95%, com um erro máximo de dois pontos percentuais, resultando em uma amostra mínima de 2.373 alunos. A amostra foi por conglomerado, sendo assim o valor foi multiplicado por dois, passando para uma amostra de 4.746 alunos e posteriormente 25% foi acrescentado caso houvesse perdas ou recusas no decorrer da coleta. Desta forma, o tamanho amostral final foi onde 5.932 participantes. O cálculo de amostragem foi igual para ambos os inquéritos.

Foram consideradas como estratos de amostragem as seis regiões geográficas e seus Conselhos Regionais de Educação, totalizando vinte e seis. A amostragem foi realizada em duas etapas. Primeiramente, as escolas foram estratificadas por tamanho (grande: ≥ 500 alunos; médias: 200 a 499 alunos; e pequenas: < 200 alunos). Na segunda etapa, as classes foram selecionadas de acordo com turno de estudo e ano escolar. Em 2001, 216 escolas foram selecionadas por amostragem sistemática, havendo recusa de 5, totalizando 211 escolas. E em 2011 foram selecionados um total de 90 escolas. A coleta de dados foi realizada na escola, durante o horário de aula, previamente agendado pela equipe. Em média, dois pesquisadores previamente treinados aplicaram questionário em cada turma selecionada (lia-se o questionário em voz alta enquanto todos os alunos respondiam individualmente). Em ambos os anos, foram selecionados todos os estudantes das classes selecionadas que estavam presentes na sala de aula. Maiores informações podem ser obtidas em publicação prévia1313 Silva KS, Lopes AS, Hoefelmann LP, Cabral LGA, De Bem MFL, Barros MVG, Nahas MV. Projeto COMPAC (comportamentos dos adolescentes catarinenses):aspectos metodológicos, operacionais e éticos. Rev. bras. Cineantropom Desempenho Hum 2013; 15(1):1-15..

As varáveis do estudo são provenientes de questionários utilizados na pesquisa de 2001 e 2011, que foi construído com base em outros questionários internacionais destinados à população adolescente1313 Silva KS, Lopes AS, Hoefelmann LP, Cabral LGA, De Bem MFL, Barros MVG, Nahas MV. Projeto COMPAC (comportamentos dos adolescentes catarinenses):aspectos metodológicos, operacionais e éticos. Rev. bras. Cineantropom Desempenho Hum 2013; 15(1):1-15.. As variáveis dependentes foram o consumo semanal de frutas e o consumo semanal de verduras (Em quantos dias de uma semana normal você consome..., categorizadas da seguinte forma: consumo diário (7 dias); consumo semanal (1 a 6 dias) e não consumo (0 dias). As variáveis independentes foram o ano de coleta (2001 e 2011). Sexo, faixa etária (15 a 16; 17 a 19 anos) e área de residência (zona urbana; zona rural) foram considerados estratos.

Inicialmente, foram calculados as prevalências e os respectivos intervalos de confiança (IC95%), bem como o delta percentual para verificar a diferença na prevalência entre os anos:

∆ (%) = [(%2011- %2001) / % 2001 ]*100

Foi utilizada regressão logística multinomial para analisar odds ratio dos adolescentes do inquérito de 2011 consumirem frutas e verduras (0 dias; 1-6 dias; 7 dias) quando comparados aos adolescentes de 2001. As análises foram realizadas para cada subgrupo sociodemográfico: sexo (controlado para faixa etária e área de residência), faixa etária (controlado para sexo e área de residência) e área de residência (controlado para sexo e faixa etária). Utilizou-se o programa estatístico Stata 13.1 (Stata Corp., College Station, EUA).

Os dois inquéritos foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina.

Resultados

Quanto às características dos adolescentes, em ambos os inquéritos de 2001 e 2011, a maioria da amostra foi representada por moças (59,6% e 57,8%, respectivamente) e residentes de área urbana (82,4% e 80,4%, respectivamente). Em 2001, a maioria dos adolescentes (53,0%) estavam com idade entre 17 a 19 anos, e em 2011, maior parte dos adolescentes (60,7%) estavam com idade entre 15 a 16 anos.

A Figura 1 apresenta as mudanças ao longo de uma década nas prevalências em relação ao consumo de frutas e verduras de adolescentes catarinenses. De 2001 para 2011, houve aumento da prevalência daqueles que não consomem frutas (∆ = 125%) e dos que consomem semanalmente (∆ = 33%). Houve redução na prevalência de adolescentes que consomem frutas diariamente (∆ = -58%). Em relação ao consumo de verduras, houve redução da prevalência dos que não consomem (de 15,9% IC95%: 14,4; 17,5 para 11,7% IC95%: 10,6; 13,0) e aumento dos que consomem semanalmente (de 44,0% IC95%: 42,5; 45,5 para 67,7 IC95%, 66,2; 69,3). A prevalência dos que consomem verduras diariamente reduziu de 40,1% (IC95%: 38,2; 42,1), em 2001 para 20,6% (IC95%: 19,2; 22,0), em 2011.

Figura 1
Mudanças ao longo de uma década no consuno de frutas e verduras entre estudantes de escolas públicas de Santa Catarina, no Brasil.

A Tabela 1 informa as mudanças ao longo de uma década no consumo de frutas em adolescentes catarinenses de acordo com sexo, idade e área de moradia. De 2001 para 2011, o consumo diário de frutas reduziu em mais de 50% em todos os estratos investigados. Houve destaque entre as moças, cuja redução foi de 61,4%. Em todos os grupos analisados, a chance de consumir frutas diariamente foi menor entre os adolescentes de 2011, em relação aos de 2001 (OR: 0,16 a 0,25). Embora a prevalência do consumo semanal de frutas tenha aumentado de 2001 para 2011 (∆: 29,6% a 40,5%), adolescentes de 2011 apresentaram menor chance de consumir semanalmente frutas, em relação aos de 2001 (OR: 0,51 a 0,62).

Tabela 1
Prevalências, variações ao longo de uma década e razão de chance (2001 vs 2011) para o consumo de frutas em escolares de Santa Catarina, Brasil.

Quanto ao consumo de verduras pelos adolescentes catarinenses, houve redução de cerca de 50% do consumo diário de verduras em todos os grupos investigados (Tabela 2). Mais uma vez, houve destaque para o grupo das moças, cuja redução foi de 54,2%. Com exceção dos rapazes e adolescentes de área rural, a chance de consumir verduras diariamente foi menor entre adolescentes de 2011 quando comparados aos de 2001 (OR: 0,58 a 0,70). Ademais, tanto a prevalência (∆: 47,7% a 66,1%) quanto a chance (OR: 1,87 a 2,83) de consumir frutas semanalmente foi maior entre adolescentes de 2011 em relação aos de 2001.

Tabela 2
Prevalências, variações ao longo de uma década e razão de chance (2001 vs 2011) para o consumo de verduras em escolares de Santa Catarina, Brasil.

Discussão

Este estudo investigou as mudanças ao longo de uma década no consumo de frutas e verduras em adolescentes catarinenses de 15 a 19 anos. De 2001 para 2011, notou-se que a prevalência de adolescentes que consumiam diariamente frutas e verduras reduziu em torno de 50%. Ainda, houve aumento na prevalência de adolescentes que não consomem frutas (de 2,4% para 5,4%, respectivamente). Essas mudanças também foram observadas em todos os subgrupos analisados, com exceção para o consumo de verduras entre rapazes e adolescentes de área rural. A importância do monitoramento desses aspectos é recomendada na literatura1414 Levin KA, Kirby J, Currie J, Inchley J. Trends in adolescent eating behaviour: a multilevel crosssectional study of 11-15 year olds in Scotland, 2002-2010. J Public Health 2012; 34(4):523-531., dada a sua relevância como ponto de partida para a criação de políticas públicas1515 Kuntsche E, Ravens-Sieberer U. Monitoring adolescent health behaviours and social determinants cross-nationally over more than a decade: introducing the Health Behaviour in School-aged Children (HBSC) study supplement on trends. Eur. J. Public Health 2015; 25(Supl. 2):1-3..

O decréscimo observado ao longo de uma década na prevalência de adolescentes que consumiam diariamente frutas e verduras vai ao encontro de alguns resultados encontrados na pesquisa Health Behavior School-Aged Children1616 Vereecken C, Pedersen TP, Ojala K, Krølner R, Dzielska A, Ahluwalia N, Colette Kelly GM. Fruit and vegetable consumption trends among adolescents from 2002 to 2010 in 33 countries. Eur J Public Health 2015; 25(Supl. 2):16-19.. Dos 33 países investigados, verificou-se que a prevalência de adolescentes com consumo diário de frutas reduziu na Alemanha, Groelândia, Polônia, Grécia e Portugal. O decréscimo no consumo de verduras ocorreu na Alemanha, Lituânia, Letônia, Polônia e Rússia. Outra pesquisa realizada na Coreia do Sul1717 Bae SG, Kim JY, Kim KY, Park SW, Bae J, Lee, WK . Changes in Dietary Behavior Among Adolescents and Their Association With Government Nutrition Policies in Korea, 2005-2009. J Prev Med Public Health 2012; 45(1)47-59. identificou que a prevalência de adolescentes com consumo diário de frutas (mais de uma porção) reduziu de 2005 (32,9%) para 2009 (24,7%) e consumo diário de verduras (três porções ou mais) em 2005 foi de 16,9% e em 2009 foi 17,9%. No Brasil, estudo de coorte em Pelotas-RS com 3915 adolescentes (nascidos em 1993) verificou decréscimo na média de frutas e verduras consumidas diariamente de 2008 (2,97) para 2011 (2,86)2. Dados da Pesquisa Nacional da Saúde do Escolar revelou que o consumo de frutas (cinco ou mais vezes na semana) reduziu de forma estatisticamente significativa de 2009 (31,5%) para 2012 (29,8%)1010 Malta DC, Andreazzi MAR, Oliveira-Campos M, Andrade SSCA, Sá NNB, Moura L, et al. Trend of the risk and protective factors of chronic diseases in adolescents, National Adolescent School-based Health Survey (PeNSE 2009 e 2012). Rev Bras Epidemiol 2014; 17(Supl. 1):77-91. .

Possíveis explicações para este indesejado cenário são a elevação dos preços destes alimentos e maior independência e ocupação dos adolescentes nos dias atuais, resultando em hábitos alimentares mais "cômodos"1616 Vereecken C, Pedersen TP, Ojala K, Krølner R, Dzielska A, Ahluwalia N, Colette Kelly GM. Fruit and vegetable consumption trends among adolescents from 2002 to 2010 in 33 countries. Eur J Public Health 2015; 25(Supl. 2):16-19.. No cenário brasileiro, estudos apontam que as mudanças ocorridas nos preços dos alimentos têm contribuído para o aumento do consumo de alimentos processados e ultraprocessados1818 Wiggins S, Keats S, Han E. The rising cost of a healthy diet. Chang Relat Prices Foods High-Income Emerg Econ. London: Overseas Dev Inst; 2015. Estudo oriundo da Pesquisa de Orçamentos Familiares (2008-09) verificou que preços de frutas são mais elevados que os de alimentos ultraprocessados. Os autores chamam a atenção para a importância de medidas políticas para reverter esta tendência1919 Claro RM, Maia EG, Costa BVL, Diniz DP. Preço dos alimentos no Brasil: prefira preparações culinárias a alimentos ultraprocessados. Cad Saude Publica 2016; 32:8. . Adicionalmente, cabe destacar as transições nas sociedades atuais, inclusive as de países de baixa e média renda, as quais incluem mudanças no sistema agricultor bem como modernização nos setores de serviço alimentício. Estes acontecimentos acarretam em alteração do sistema alimentar e em suas respectivas etapas e dimensões, incluindo desde o modo de produção dos alimentos bem como o consumo destes, apresentando caráter mais industrializado2020 Popkin BM. Nutrition Transition and the Global Diabetes Epidemic. Curr Diab Rep 2015; 15(9):64.,2121 Popkin BM. Nutrition, agriculture and the global food system in low and middle income countries. Food Policy 2014; 47:91-96.. Cabe ainda destacar que estas indústrias destinam-se cada vez mais no investimento de propagandas midiáticas estimulando o consumo destes alimentos, e desencorajando a escolha de alimentos saudáveis2222 Pan American Health Organization (PAHO). Ultra-processed food and drink products in Latin America: trends, impact on obesity, policy implications. Washington: PAHO; 2015., uma vez que maior oferta de alimentos ultraprocessados, como refrigerantes e biscoitos está relacionado à diminuição do consumo de frutas e hortaliças2323 Gomes FS, Silva GA, Castro IRR. Aquisição domiciliar de refrigerantes e de biscoitos reduz o efeito de uma intervenção de promoção de frutas e hortaliças. Cad Saude Publica 2017; 33(3):e00023316. .

Ao analisar as pesquisas que identificaram mudanças positivas ao longo dos anos2424 Larson N, Davey CS, Coombes B, Caspi C, Kubik MY, Nanney MS. Food and beverage promotions in Minnesota secondary schools: secular changes, correlates, and associations with adolescents’ dietary behaviors. J Sch Health 2014; 84(12):777-785., iniciativas para redução do preço de frutas e verduras mostraram-se efetivas. Ademais, especula-se que tais fatos se devem aos investimentos em políticas públicas destinadas ao fomento de consumo de frutas e verduras2525 Fismen AS, Smith ORF, Torsheim T, Rasmussen M, Pagh TP, Augustine L, Ojala K, Samdal. Trends in food habits and their relation to socioeconomic status among Nordic adolescents 2001/2002-2009/2010. PloS One 2016; 11(2):e0148541.,2626 Fismen AS, Smith ORF, Samdal O. A school based study of time trends in food habits and their relation to socio-economic status among Norwegian adolescents, 2001-2009. Int J Behav Nutr Phys Act 2014; 11(1):115.. No Brasil, pode-se citar o Plano Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), o qual objetiva a formação de hábitos alimentares saudáveis dos escolares, ofertando tanto refeições saudáveis quanto ações educacionais2727 Brasil. Presidência da República. Lei 11.947, de 16 de junho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica; altera as Leis nos 10.880, de 9 de junho de 2004, 11.273, de 6 de fevereiro de 2006, 11.507, de 20 de julho de 2007; revoga dispositivos da Medida Provisória no 2.178-36, de 24 de agosto de 2001, e a Lei no 8.913, de 12 de julho de 1994; e dá outras providências. Diário Oficial da União 2009; 17 jun.. Em Santa Catarina, por exemplo, há leis que impedem a venda de produtos não saudáveis nas escolas, como refrigerantes e doces (Lei nº 12.061, 12/2001)2828 Brasil. Health promotion in schools. Rev Saude Publica 2002; 36(4):533-535. . Contudo, tais iniciativas embora possam ser efetivas para redução do consumo destes alimentos em específico, não necessariamente implicam em aumento no consumo de frutas e verduras.

Ao analisar os resultados de acordo com os subgrupos, chama-se atenção para o decréscimo acentuado do consumo diário de frutas e verduras entre as moças. Esta diferença de acordo com o sexo não segue o padrão verificado em pesquisa nacional realizada em 20121010 Malta DC, Andreazzi MAR, Oliveira-Campos M, Andrade SSCA, Sá NNB, Moura L, et al. Trend of the risk and protective factors of chronic diseases in adolescents, National Adolescent School-based Health Survey (PeNSE 2009 e 2012). Rev Bras Epidemiol 2014; 17(Supl. 1):77-91. , bem como pesquisa do inquérito HSBC2929 Zaborskis A, Lagunaite R, Busha R, Lubiene J. Trend in eating habits among Lithuanian school-aged children in context of social inequality: three cross-sectional surveys 2002, 2006 and 2010. BMC Public Health 2012; 12(1):52. , o qual verificou aumento no consumo diário de frutas entre moças (24,2% para 31,0%) e diminuição do consumo diário de verduras entre rapazes (29,3% para 23,1%) entre 2002 e 2010, respectivamente. Neste sentido, os dados indicam a necessidade de programas específicos voltados às moças, a fim de reverter este cenário.. Embora não se alterou a chance de consumir diariamente verduras entre adolescentes de área rural, percebe-se diminuição dos que consomem frutas diariamente. Estas alterações alertam para o fato de que alterações negativas na mudança de hábitos vêm ocorrendo tanto em áreas urbanizadas quanto rurais3030 Yu Z, Han S, Chu J, Xu Z, Zhu C, Guo X. Trends in Overweight and Obesity among Children and Adolescents in China from 1981 to 2010: A Meta-Analysis. Amre D, organizador. PLoS One 2012; 7(12):e51949. . Assim, programas de políticas públicas não devem ser focadas somente nos grandes centros.

Diante do exposto, intervenções destinadas a estes adolescentes são essenciais para reverter este cenário. Ações de cunho educacional e ambiental, por exemplo, permitirão que adolescentes façam escolhas saudáveis tanto em casa como na escola e em outros ambientes2424 Larson N, Davey CS, Coombes B, Caspi C, Kubik MY, Nanney MS. Food and beverage promotions in Minnesota secondary schools: secular changes, correlates, and associations with adolescents’ dietary behaviors. J Sch Health 2014; 84(12):777-785.. Já em nível governamental, a retirada de impostos sobre frutas e verduras poderá alavancar o consumo dos mesmos2626 Fismen AS, Smith ORF, Samdal O. A school based study of time trends in food habits and their relation to socio-economic status among Norwegian adolescents, 2001-2009. Int J Behav Nutr Phys Act 2014; 11(1):115.. Estudo realizado com dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (2008-2009) reforçam a importância deste tipo de ação no cenário brasileiro. Porém, chamam a atenção para que medidas inéditas que aumentem o preço de alimentos processados e ultraprocessados são também necessárias, auxiliando na escolha de alimentos mais saudáveis1919 Claro RM, Maia EG, Costa BVL, Diniz DP. Preço dos alimentos no Brasil: prefira preparações culinárias a alimentos ultraprocessados. Cad Saude Publica 2016; 32:8. .

Contudo, gestores precisam levar em consideração as diferentes características dos adolescentes, uma vez que dados apontam diferenças principalmente entre sexo e área de moradia para o consumo diário de verduras. De fato, outros estudos já haviam relatado diferentes tendências quando analisadas de acordo com características sociodemográficas1616 Vereecken C, Pedersen TP, Ojala K, Krølner R, Dzielska A, Ahluwalia N, Colette Kelly GM. Fruit and vegetable consumption trends among adolescents from 2002 to 2010 in 33 countries. Eur J Public Health 2015; 25(Supl. 2):16-19.,2424 Larson N, Davey CS, Coombes B, Caspi C, Kubik MY, Nanney MS. Food and beverage promotions in Minnesota secondary schools: secular changes, correlates, and associations with adolescents’ dietary behaviors. J Sch Health 2014; 84(12):777-785.,2626 Fismen AS, Smith ORF, Samdal O. A school based study of time trends in food habits and their relation to socio-economic status among Norwegian adolescents, 2001-2009. Int J Behav Nutr Phys Act 2014; 11(1):115.,3131 Iannotti RJ, Wang J. Trends in Physical Activity, Sedentary Behavior, Diet, and BMI Among US Adolescents, 2001-2009. Pediatrics 2013; 132(4):606-614.. Maior compreensão das mudanças de comportamentos nos diferentes grupos sociodemográficos auxilia a fornecer informações sobre por que em alguns grupos determinadas ações funcionam e em outros não3232 Taber DR, Stevens J, Poole C, Maciejewski ML, Evenson KR, Ward DS. State Disparities in Time Trends of Adolescent Body Mass Index Percentile and Weight-Related Behaviors in the United States. J Community Health 2012; 37(1):242-252., permitindo que medidas mais efetivas e direcionadas sejam elaboradas. De fato, evidências apontam que estratégias focadas em grupos específicos (idade, nível econômico, etc.) são mais efetivas do que aquelas focadas em populações como um todo. Ainda, recomenda-se que campanhas e mensagens sejam realizadas separadamente para frutas e verduras1212 Rekhy R, McConchie R. Promoting consumption of fruit and vegetables for better health. Have campaigns delivered on the goals? Appetite 2014; 79:113-123. . Resultados são mais efetivos quando diferentes setores (governo, organizações sem fins lucrativos, indústrias, etc.) trabalham conjuntamente. Ações efetivas são aquelas que incluem estratégias para mudança de comportamento, metas estabelecidas, mensagens claras e bem definidas, envolvimento da família1212 Rekhy R, McConchie R. Promoting consumption of fruit and vegetables for better health. Have campaigns delivered on the goals? Appetite 2014; 79:113-123. .

Quanto aos aspectos positivos do presente trabalho, os resultados desta pesquisa apresentam dados sobre tendências do consumo diário de frutas e verduras de uma amostra representativa de escolares de escolas estaduais de Santa Catarina, Brasil. Além disso, levou-se em consideração as características sociodemográficas desta população, uma vez que essas informações podem contribuir para um melhor entendimento deste cenário2424 Larson N, Davey CS, Coombes B, Caspi C, Kubik MY, Nanney MS. Food and beverage promotions in Minnesota secondary schools: secular changes, correlates, and associations with adolescents’ dietary behaviors. J Sch Health 2014; 84(12):777-785.. Optou-se por analisar separadamente o consumo de frutas e verduras, uma vez que análise individual destes alimentos fornece uma melhor compreensão, permitindo ações específicas para cada um dos mesmos2525 Fismen AS, Smith ORF, Torsheim T, Rasmussen M, Pagh TP, Augustine L, Ojala K, Samdal. Trends in food habits and their relation to socioeconomic status among Nordic adolescents 2001/2002-2009/2010. PloS One 2016; 11(2):e0148541.. Quanto às limitações do presente estudo, o mesmo investigou somente escolas públicas estaduais, o que não permite a extrapolação dos dados para adolescentes de escolas privadas, os quais possuem características socioeconômicas distintas. Ainda, o instrumento utilizado permitiu a análise apenas da frequência semanal do consumo e não da quantidade total do consumo de frutas e verduras, não possibilitando então, realizar tal inferência. Por fim, outros fatores que podem influenciar o consumo de frutas e verduras, como nível econômico1212 Rekhy R, McConchie R. Promoting consumption of fruit and vegetables for better health. Have campaigns delivered on the goals? Appetite 2014; 79:113-123. não foram consideradas no modelo de ajuste. Ademais, as respostas eram de cunho subjetivo, sujeitas ao viés de memória bem como desejabilidade social.

Conclusão

Houve redução do consumo diário de frutas e verduras entre 2001 e 2011 pelos adolescentes de 15 a 19 anos do ensino médio de escolas catarinenses, com exceção do consumo diário de verdura pelos rapazes e estudantes de área rural, onde não houve declínio ao longo de uma década. Investigações são necessárias para compreender os motivos destas mudanças bem como auxiliar na criação de ações para reverter este cenário indesejável. Destaca-se ainda, a importância de levar em consideração as diferentes características sociodemográficas dos adolescentes, uma vez que diferentes tendências foram identificadas. Programas de intervenção para promoção de alimentação saudável destinados a esta população poderão contribuir para escolhas mais saudáveis.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Fev 2020
  • Data do Fascículo
    Fev 2020

Histórico

  • Recebido
    13 Set 2017
  • Aceito
    22 Maio 2018
  • Publicado
    24 Maio 2018
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