Condições de vida, trabalho e saúde mental: um estudo com trabalhadores brasileiros e espanhóis que atuam em serviço de limpeza hospitalar

Márcia Regina Alves Rocha Maria José Sanches Marin Juana Macias-Seda Sobre os autores

Resumo

O objetivo deste artigo é comparar as condições de vida, trabalho e saúde, com ênfase na saúde mental, de trabalhadores do serviço de limpeza (SL) hospitalar terceirizados da Espanha e do Brasil. Pesquisa quantitativa, transversal realizada em dois hospitais gerais, públicos, sendo um numa cidade no centro-oeste paulista e o outro em uma a sudoeste da Península Ibérica. Foram entrevistados 78 trabalhadores do hospital brasileiro e 39 do espanhol, utilizando-se de um roteiro com dados das condições de vida, de saúde e de trabalho, incluindo alguns questionários já validados como Job Content Questionnaire e o Self Reporting Questionnaire (SRQ-20). Os trabalhadores espanhóis são mais velhos, de cor branca e com renda familiar maior, apresentam escores do SRQ-20 menores em todas as dimensões. Eles fumam mais, têm maior déficit de visão e alergias, trabalham há mais tempo na mesma atividade, com carga horária menor e não contam com dois empregos. Além disso, quase quarenta por cento deles consideram ter autonomia no trabalho. Trabalhadores brasileiros se encontram em condições de vida, trabalho e saúde mental mais precarizadas. Alguns aspectos das condições de saúde foram piores entre os espanhóis, o que provavelmente pode ter ocorrido devido a idade mais avançada dos mesmos.

Palavras-chave
Saúde do trabalhador; Transtorno mental; Serviço de limpeza

Introdução

No âmbito hospitalar, os trabalhadores do Serviço de Higiene e Limpeza (SHL) representam um grande contingente de profissionais, os quais são imprescindíveis na manutenção de um ambiente agradável e livre de riscos, especialmente de infecção. Além de exercerem um trabalho pesado e rotineiro, tem se observado que esse trabalhador, muitas vezes, passa despercebido11 Petean E, Correa da Costa ALR, Ribeiro RLR. Repercussões da ambiência hospitalar na perspectiva dos trabalhadores de limpeza. Trab Educ Saude 2014; 12(3):615-635.. Trata-se de um profissional pouco valorizado socialmente por ter uma atividade que não requer formação específica, absorve uma parcela da sociedade normalmente com baixa escolaridade, sendo majoritariamente ocupada por mulheres.

Agrega-se a isso o fato de que esses serviços são alocados por empresas terceirizadas. O processo de terceirização contribui com a precarização do trabalho e, consequentemente, há menor garantia dos direitos conquistados pelo trabalhador devido à maior flexibilidade nas relações trabalhistas e contratos de trabalho. Essa condição promove sentimentos de discriminação frente a outros trabalhadores que ocupam o mesmo espaço e possuem direitos trabalhistas distintos22 Antunes R, Praun L. A sociedade dos adoecimentos no trabalho. Serv Soc Soc 2015; (123):407-427.

3 Schimith MD, Brêtas ACP, Simon BS, Brum DJT, Alberti GF, Bidó MLD, Gomes TF. Precarização e fragmentação do trabalho na estratégia saúde da família: impactos em Santa Maria (RS). Trab Educ Saude 2017; 15(1):163-182.

4 Druck G. A terceirização na saúde pública: formas diversas de precarização do trabalho. Trab Educ Saude 2016; 14 (Supl. 1):15-43.
-55 Ceolin GF. Crise do capital, precarização do trabalho e impactos no Serviço Social. Serv Soc Soc 2014; (118):239-264..

A terceirização é consequência da internacionalização e das transformações nas formas de produção, decorrentes da introdução da tecnologia em substituição à mão de obra humana, gerando perda de emprego de milhares de trabalhadores66 Assunção-Matos A, Bicalho PPG. O trabalho, a terceirização e o legislativo brasileiro: paradoxos e controvérsias. Rev Psicol Organ Trab 2016; 16(2):120-129.. Essa mudança, então, faz parte da reestruturação produtiva do capital frente a um cenário de crise, o que contribui para maior insegurança no trabalho e sensação de vazio social.

A flexibilização do trabalho, caracterizada por diferentes modalidades de vínculos e jornadas de trabalho longas, produziu a fragmentação da força de trabalho pela exigência de polivalência e, consequentemente, o enfraquecimento político da classe trabalhadora, uma vez que dificulta a ação coletiva em favor dos direitos, resultando em perdas nas conquistas anteriores das lutas de classe77 Pereira HA, Albuquerque RS, Moraes AFG. Terceirização e precarização: um estudo com terceirizados de serviços gerais na Universidade Federal da Paraíba. Rev Principia 2015; (26):106-115.. As consequências advindas dessa organização favorecem o adoecimento mental pela falta de apoio e isolamento social no trabalho, bem como o adoecimento físico em função do aumento dos acidentes e das doenças ocupacionais22 Antunes R, Praun L. A sociedade dos adoecimentos no trabalho. Serv Soc Soc 2015; (123):407-427.. Dentre os inúmeros fatores de risco, encontram-se os psicossociais, tornados uma das principais causas de morbidade88 Chagas D. Riscos psicossociais no trabalho: causas e consequências. Rev INFAD Psicol 2015;1(2):439-446..

Na visão de especialista na área do trabalho, a terceirização no Brasil deve ultrapassar um terço do mercado de trabalho formal. Com a lei nº 13.429, de 31 de março de 2017, que dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros, essa proporção deve aumentar nos próximos anos99 Alves G. Terceirização: o futuro do trabalho no Brasil. Trab Educ Saude 2017; 15(2):337-339.,1010 Brasil. Lei nº 13.429, de 31 de Março de 2017. Dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas e dá outras providências e dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros. Diário Oficial da União 2017; 31 mar.. Essa condição parece não ser diferente de países da Europa, como é o caso da Espanha, considerado o país que mais flexibilizou as leis trabalhistas. O jornal El País, em 17/04/2017, noticiou que as mudanças propostas no Brasil foram inspiradas no programa de reformas do governo espanhol, ocorridas há cinco anos, em virtude de longo período de recessão. Acrescenta que, atualmente, os governantes da Espanha comemoram essa iniciativa por ter levado à redução do desemprego, embora organismos internacionais reconheçam que a iniciativa tenha ampliado a desigualdade1111 Goméz MV. A reforma da Espanha que inspirou Temer: mais empregos (precários) e com menores salários. El País 2017; abr 27..

Ainda que a Espanha tenha condições de trabalho pautadas na flexibilização dos contratos, assim como alguns serviços no Brasil, é possível que trabalhadores dos dois países, que exercem atividades com as mesmas características e propostas, expressem necessidades diferenciadas quando comparados entre si, como é o caso do pessoal do SHL hospitalar. Isso se deve ao fato de a Espanha ser um país menor que o Brasil e ter renda maior com distribuição mais equitativa.

A Espanha foi o país escolhido para estudo comparativo pela possibilidade de complementar a formação de doutorado, pela pesquisadora principal, por meio de uma parceria estabelecida entre da Universidade Estadual Paulista Campus de Botucatu, com a Universidade de Sevilha. O objeto de estudo são as condições de vida, de saúde e de trabalho dos trabalhadores da área hospitalar, para evidenciar as semelhanças e diferenças vividas pelos trabalhadores do SHL do Brasil e da Espanha.

Frente ao exposto e tendo em vista a preocupação com as condições de vida, saúde e trabalho, especialmente daqueles que desenvolvem a atividade em franca precarização, o presente estudo tem como questionamento se existem diferenças entre trabalhadores do SHL hospitalar terceirizado do Brasil e da Espanha, especialmente no que se refere à saúde mental.

Parte-se da compreensão de que o modo de vida das pessoas é determinado pelo contexto social, pelas condições de vida e de trabalho as quais se configuram como produtoras da saúde e das formas de adoecer e morrer1212 Albuquerque GSC, Silva MJS. Sobre a saúde, os determinantes da saúde e a determinação social da saúde. Saude Debate 2014; 38(103):953-965.. Portanto, trata-se de um processo amplo, por envolver múltiplos fatores de forma interligada. Neste sentido, este estudo objetiva comparar as condições de vida, trabalho e saúde, com ênfase na saúde mental de trabalhadores do SHL hospitalar terceirizado da Espanha e do Brasil.

Método

Pesquisa quantitativa, transversal, realizada com trabalhadores do SHL de dois hospitais gerais, públicos, sendo um no Brasil e outro na Espanha. No Brasil, trata-se da cidade de Bauru, localizada no centro-oeste paulista, com cerca de 371.690 habitantes, sendo um dos maiores polos regionais do país pelo comércio diversificado e empresas de todos os portes. A cidade espanhola, refere-se a Sevilha, situada ao sudoeste da Península Ibérica, com aproximadamente 692.773 habitantes, caracterizada como um dos grandes centros comerciais e artísticos dessa região.

No Brasil, o hospital é integrado ao Sistema Único de Saúde, gerido por uma Organização Social de Saúde (OSS) administrada por uma Universidade do Estado de São Paulo. Referência regional para alta complexidade com atendimentos em urgência e emergência e traumatologia, queimaduras, cirurgias gerais (adultos e infantis), possui 364 leitos. É hospital utilizado para aprendizagem de médicos, enfermeiros e fisioterapeutas. Na Espanha, o hospital é universitário, pertence ao sistema de saúde pública, incluindo as gestões clínica e econômica. É acreditado pela Agência de qualidade sanitária de Andaluzia, atende urgências e cirurgias nas áreas de ginecologia e obstetrícia, urologia, ortopedia e traumatologia e possui 880 leitos.

No Brasil, o SHL conta com 94 trabalhadores e na Espanha, 196. Foi considerada como população do estudo a totalidade dos trabalhadores. Foram incluídos no estudo todos trabalhadores com mais de seis meses na instituição e excluídos, quem estava em regime de contratação temporária, os que exerciam apenas funções administrativas, os que estavam afastados em função de algum tipo de licença (saúde, gestação, interesse pessoal) ou férias. A coleta de dados ocorreu de agosto a dezembro de 2015 no Brasil e de maio a julho de 2016 na Espanha. A abordagem dos participantes foi realizada de forma individualizada, em local reservado e a coleta foi encerrada a partir de três tentativas ou quando, de início, o participante já manifestou a recusa. As respostas foram ouvidas apenas pela pesquisadora, mantendo preservadas as identidades.

O instrumento de coleta de dados foi elaborado pelos autores, sendo incluídos alguns instrumentos já validados pela literatura, com os seguintes dados: características sociodemográficas (idade, sexo, situação conjugal, cor da pele, tempo de estudo, número de pessoas que residem na casa, tipo de residência, renda familiar); condições de saúde (serviços de saúde que utiliza, uso de tabaco, Índice de Massa Corporal – IMC), problemas de saúde referidos, uso regular de medicamentos, autopercepção de saúde e presença de Transtorno Mental Comum (TMC). Os dados da autopercepção de saúde foram obtidos pela resposta à pergunta: “De um modo geral, em comparação com pessoas de sua idade, como você considera seu próprio estado de saúde?”, seguida pela escala de likert com cinco possibilidades de resposta, variando do muito insatisfeito ao muito satisfeito1313 Nunes APN, Barreto SM, Gonçalves LG. Relações sociais e autopercepção da saúde: projeto envelhecimento e saúde. Rev Bras Epidemiol 2012; 15(2):415-428..

Para avaliação do TMC foi utilizado o instrumento já validado – Self Reporting Questionnaire (SRQ-20). Esse instrumento se baseia em sintomas vivenciados nos últimos 30 dias com respostas dicotômicas (sim/não) em que a soma pode variar de 0 a 20 permitindo rastreamento de sintomas psiquiátricos menores, como a depressão, a ansiedade, os distúrbios somatoformes e a neurastenia, sem a intencionalidade de fornecer o diagnóstico em relação ao tipo de transtorno existente1414 Moraes RSM, Silva DAS, Oliveira WF, Peres MA. Social inequalities in the prevalence of common mental disorders in adults: a population-based study in Southern Brazil. Rev Bras Epidemiol 2017; 20(1):43-56.. Neste estudo se considerou ponto de corte para classificação de suspeitos de TMC seis ou mais respostas positivas para homens e oito ou mais para as mulheres1515 Marconato CS, Magnago ACS, Magnago TSBS, Dalmolin GL, Andolhe R, Tavares JP. Prevalence and factors associated with minor psychiatric disorders in hospital housekeeping workers. Rev Esc Enferm USP 2017; 51:e03239.. Para a verificação das condições de trabalho, o tempo de trabalho na instituição, ter outro emprego, carga horária de trabalho/semana, ter sofrido acidentes de trabalho, contar com treinamento em serviço, satisfação no trabalho tempo gasto para chegar de casa ao trabalho e o preenchimento JCQ - instrumento adaptado para o português e espanhol, que contém questões sobre o processo laboral com ênfase a aspectos de Demanda (psicológica e física) e Controle (autonomia e habilidade) sobre o trabalho. Com o objetivo de avaliar o estresse psicossocial e ocupacional, por meio do Modelo Demanda-Controle (MDC) proposto por Karasek1616 Araújo TM, Graça CC, Araújo E. Estresse ocupacional e saúde: contribuições do modelo demanda-controle. Cien Saude Colet 2003; 8(4):991-1003., divulgado internacionalmente, é utilizado com trabalhadores de diversas áreas1717 Magnago TSBS, Lisboa MTL, Griep RH, Zeitoune RCG, Tavares JP. Condições de trabalho de profissionais da enfermagem: avaliação baseada no modelo demanda-controle. Acta Paul Enferm 2010; 23(6):811-817.,1818 Teixeira JRB, Boery EN, Casotti CA, Araújo TM, Pereira R, Ribeiro ÍJS, Rios MA, Amorim CR, Moreira RM, Boery RNSO, Sales ZN. Associação entre aspectos psicossociais do trabalho e qualidade de vida de mototaxistas. Cad Saude Publica 2015; 31(1):97-110., baseado nas respostas do tipo escala Likert, cujos escores variam de 1 (discordo fortemente/muy en desacuerdo) a 4 (concordo fortemente/muy de acuerdo). O escore do Controle compreende os itens (aprender coisas novas, trabalho repetitivo, requer criatividade, alto nível de habilidade, variedade de atividades, desenvolver suas habilidades) e de autoridade (decisões próprias, pouca liberdade para decidir). O escore da Demanda se compõe de demanda psicológica, que inclui (trabalhar rápido, trabalho duro, trabalho excessivo, tempo suficiente, demandas conflitantes) e da demanda física (esforço físico, mover ou levantar cargas pesadas, atividade física rápida, manter o corpo ou cabeça e braços em posição fisicamente incômoda).

Para o cálculo das escalas da Demanda e Controle fez se uso das recomendações do manual do JCQ (www.jcqcenter.org). Os quadrantes do MDC foram construídos baseados na mediana da distribuição e dicotomizados em níveis de baixo/alto Controle e baixa/alta Demanda, formando os grupos: trabalho ativo (alto controle e alta demanda), alta exigência (baixo controle e alta demanda), trabalho passivo (baixo controle e baixa demanda) e baixa exigência (alto controle e baixa demanda)1818 Teixeira JRB, Boery EN, Casotti CA, Araújo TM, Pereira R, Ribeiro ÍJS, Rios MA, Amorim CR, Moreira RM, Boery RNSO, Sales ZN. Associação entre aspectos psicossociais do trabalho e qualidade de vida de mototaxistas. Cad Saude Publica 2015; 31(1):97-110..

Para testar associação entre variáveis categóricas usou-se o teste qui-quadrado. Considerou-se associação significativa entre os SHL estudados quando p < 0,05. Foram analisadas diferenças entre as categorias profissionais em relação aos dados sociodemográficos, econômicos, condições de saúde e de trabalho.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa e pelo Núcleo de Pesquisa do Hospital no Brasil e pelo gerente responsável pelo serviço na Espanha.

Para organização e análise dos dados do questionário, foram empregadas ferramentas de informática (planilha eletrônica Microsoft Excel e aplicativo estatístico Statistical Package for the Social Science (SPSS) version 23.0 for Windows).

Resultados

Responderam ao questionário, 78 (81,3%) trabalhadores no Brasil e 39 (19,9%) na Espanha. Na Espanha, somente os que trabalhavam no período da manhã aceitaram fazer parte da pesquisa. Encontrou-se que a carga horária de trabalho no Brasil compreende 12 horas de trabalho com pausa de uma hora para alimentação e 36 horas de descanso e, na Espanha, os profissionais trabalham 35 horas por semana, folgando, em uma semana, sábado e domingo e na outra semana, apenas o domingo, sendo que no sábado trabalham 5 horas. Dentro do horário de trabalho, pausam 30 minutos para alimentação. Os que trabalham nos finais de semana assumem contrato de trabalho reduzido com 20 horas e 45 minutos por semana, em média. Ambos com contratos de trabalho terceirizados. Nos dois hospitais, os trabalhadores se responsabilizam pela limpeza e higienização diária dos quartos ocupados pelos pacientes ficando, em média, com 20 leitos. Cada trabalhador realiza suas tarefas individualmente dentro do tempo determinado pelo empregador. Os encarregados fiscalizam para que se cumpra o tempo estabelecido e todas as tarefas em cada turno.

Quanto aos dados sociodemográficos dispostos na Tabela 1, observa-se que os trabalhadores da Espanha têm mais idade, a totalidade é de cor branca e a renda familiar é maior comparativamente à dos trabalhadores brasileiros, sendo p = 0,00 em todos esses aspectos. Nos demais dados analisados, como, sexo, situação conjugal, tempo de estudo, número de pessoas que residem na mesma casa e tipo de residência, não se observam diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos. No geral, a maioria vive com o companheiro, é do sexo feminino e reside com até quatro pessoas.

Tabela 1
Distribuição da frequência das condições sociodemográficas, entre trabalhadores do serviço de limpeza do Brasil e da Espanha. 2017.

Na Tabela 2, observa-se que, entre os trabalhadores do Brasil comparativamente aos da Espanha, existem diferenças estatisticamente significativas quanto ao uso do fumo, hábito de viajar e ir a bares como lazer, déficit de visão e relato de alergias, p = 0,00; p = 0,002, p = 0,001, p = 0,05 e p = 0,01, respectivamente, sendo esses problemas prevalentes entre os trabalhadores espanhóis. A presença de TMC foi maior entre os brasileiros p = 0,00. Quanto ao IMC, não se observam diferenças significativas entre os grupos, visto que a maioria dos trabalhadores dos dois grupos apresentam sobrepeso ou obesidade. São semelhantes também e com alta prevalência entre os dois grupos os problemas de saúde como dor muscular, problemas ósseos, inchaço nas pernas, lombalgia e o uso contínuo de medicamentos. Na avaliação dos TMC, observa-se, na Tabela 3, que a média de pontuação foi menor entre os espanhóis comparativamente com os brasileiros em todas as dimensões. No que se refere ao humor depressivo, os brasileiros tiveram média de 39,7% e os espanhóis de 14,7%. Em relação aos sintomas somáticos, a média entre os brasileiros foi de 22,8% e 10,3% entre os espanhóis. O pensamento depressivo e energia vital decrescente foram 11,5% e 28,5% entre os brasileiros e entre os espanhóis foram 1,9% e 3,5%, respectivamente.

Tabela 2
Distribuição de frequência das condições de saúde, entre trabalhadores do serviço de limpeza do Brasil e da Espanha. 2017.
Tabela 3
Dimensões do instrumento Self Reporting Questionnaire -20 com os trabalhadores do serviço de limpeza do Brasil e da Espanha. 2017.

A Tabela 4 apresenta dados com diferenças significativas entre as condições de trabalho no Brasil e na Espanha, principalmente no que se refere ao tempo de trabalho na instituição p = 0,00, sendo que quase a totalidade dos espanhóis está na instituição há mais de dez anos e a maioria deles trabalha em um único emprego p = 0,00. A diferença entre a carga horária e a satisfação no trabalho foi significativa, uma vez que os brasileiros apresentaram, por semana, mais horas trabalhadas e os espanhóis mais satisfação com o trabalho.

Tabela 4
Distribuição de frequência das condições de trabalho, entre trabalhadores do serviço de limpeza do Brasil e da Espanha. 2017.

A classificação do trabalho foi reconhecida pelos brasileiros como passivo (baixo controle) e com alta exigência (alta demanda) enquanto para os espanhóis o trabalho é ativo (alto controle) e com baixa exigência (baixa demanda), como demonstra a Tabela 4.

Também foi significativa a diferença da média de tempo gasto de casa para o trabalho p = 0,018 IC99% (0,015-0,022), em que a média na Espanha foi de 27,36 minutos e no Brasil de 43,21 minutos. Nos dois países, a maioria utiliza o transporte público.

Discussões

O presente estudo busca comparar dados de trabalhadores do SHL de empresa terceirizada de um hospital brasileiro e de um hospital espanhol, ainda que haja dificuldade em realizar tal comparação devido às diferenças estruturais existentes entre os dois países. Coloca-se como limitação do estudo o fato de terem participado dele apenas 19,9% dos trabalhadores do SHL da Espanha. Mesmo assim, considera-se relevante verificar as semelhanças e as diferenças dessa forma de trabalho, pois se trata de uma tendência mundial, envolvendo diferentes contextos e cenários do trabalho e com a sinalização de que, em conjunto, as condições de vida, saúde e trabalho são deterioradas com reflexos, especialmente, na saúde mental.

Nos resultados do presente estudo, nos dois países, emerge a presença majoritária de mulheres com baixa escolaridade. Essas características também são encontradas em outras pesquisas semelhantes, pois esse tipo de trabalho não requerer nenhuma formação específica e escolaridade alta77 Pereira HA, Albuquerque RS, Moraes AFG. Terceirização e precarização: um estudo com terceirizados de serviços gerais na Universidade Federal da Paraíba. Rev Principia 2015; (26):106-115.,1919 Martins JTR, Ribeiro RP, Bobroff MCC, Marziale MHP, Robazzi MLCC, Mendes AC. Meaning of workload on the view of cleaning professionals. Acta Paul Enferm 2013; 26(1):63-70.. Apesar do aumento do percentual de mulheres que buscam melhorar seu nível de escolaridade para galgar colocações mais altas no mercado de trabalho e de a legislação espanhola promover medidas que favorecem a equiparação salarial entre homens e mulheres que ocupam as mesmas funções, assim como proteção contra o assédio sexual, benefícios na maternidade e na amamentação, essas mulheres ainda se mantêm nas profissões reconhecidas socialmente como femininas e com menor remuneração2020 Millan Vazquez de La Torre MG, Santos Pita MP, Perez Naranjo LM. Análisis del mercado laboral femenino en España: evolución y factores socioeconómicos determinantes del empleo. Papeles Poblac 2015; 21(84):197-225.. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que, no Brasil, o rendimento das mulheres é 22,9% menor quando comparadas com os homens, o mesmo ocorrendo na Europa11 Petean E, Correa da Costa ALR, Ribeiro RLR. Repercussões da ambiência hospitalar na perspectiva dos trabalhadores de limpeza. Trab Educ Saude 2014; 12(3):615-635.,2020 Millan Vazquez de La Torre MG, Santos Pita MP, Perez Naranjo LM. Análisis del mercado laboral femenino en España: evolución y factores socioeconómicos determinantes del empleo. Papeles Poblac 2015; 21(84):197-225.,2121 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE). Desigualdade de renda atinge regiões, gêneros, cores e escolaridade. Rio de Janeiro: IBGE; 2017.. Desta forma, justifica-se também a baixa proporção de homens na atividade nos dois países e reforça-se a divisão sexual do trabalho, mesmo que vivenciado sob distintas perspectivas históricas.

Apesar de ter havido mudanças na legislação trabalhista espanhola, com reflexo na redução salarial, os trabalhadores participantes desta pesquisa não foram atingidos porque trabalham há mais de vinte anos nessa atividade e os benefícios foram mantidos2222 Gómez MV. La reforma laboral cumple cinco años: más empleo, pero de peor calidad [Periódico da Internet]. El País 2017 [acessado 2018 Maio 15]; 10 fev. Disponível em: https://elpais.com/economia/2017/02/09/actualidad/1486672169_076173.html
https://elpais.com/economia/2017/02/09/a...
. No Brasil, a maioria dos trabalhadores não possui mais que cinco anos na empresa e o trabalho de 12 horas ao dia, antes não permitido, com a terceirização, fica legalizado.

Trabalhadores que se autodeterminam de pele parda ou negra no Brasil não é surpresa uma vez que é próprio do país a miscigenação de raças como também a ocupação deles em cargos menos remunerados no mercado de trabalho. O SHL conta com maior número de profissionais de cor parda ou negra, baixa escolaridade e pertencimento às classes socioeconômicas menos favorecidas.

Este fato é, na verdade, um dos aspectos centrais para compreender as relações sociais de trabalho e a respectiva divisão social do trabalho no país. Ao longo da história da formação social e econômica do Brasil, foram reforçados os mecanismos de preconceito e exclusão da população negra das escolas e do mercado de trabalho formal bem como o acesso às objetivações sociais. Disso resulta que, nos dias de hoje, a população negra ainda realiza as funções de menor status social e salarial, como pode ser considerado o serviço de limpeza. A inserção do negro no mercado de trabalho reforça as raízes históricas do país. Na transição capitalista, ele foi considerado como incompatível com o trabalho assalariado, sobressaindo a política de imigração europeia, o que deixou o negro à margem de atividades mais dinâmicas, restando a ele atividades pouco atrativas, com baixos salários e em condições precarizadas2323 Martins TCS. O negro no contexto das novas estratégias do capital: desemprego, precarização e informalidade. Serv Soc Soc 2012; 111:450-467.. Importante enfatizar que os trabalhadores brasileiros de cor branca recebem salário 45% maior do que os trabalhadores de cor preta, mesmo exercendo a mesma função2121 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE). Desigualdade de renda atinge regiões, gêneros, cores e escolaridade. Rio de Janeiro: IBGE; 2017..

O fato de a Espanha apresentar renda familiar e hábito de lazer (viajar e ir a bares) maiores que os do Brasil se justifica pelo Relatório do Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas, visto que a nação espanhola se encontra na vigésima sexta (26) posição entre os cento e oitenta e oito países avaliados e apresenta Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) 0,876, considerado alto. O Brasil encontra-se estagnado no ranking desde 2014, mantendo-se em septuagésimo nono (79) com IDH de 0,754. O relatório reconhece que nos últimos 25 anos tem havido melhoras importantes, porém não universais, porque nem todo cidadão brasileiro é beneficiado2424 Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Relatório o PNUD destaca grupos sociais que não se beneficiam do desenvolvimento humano. Brasília: PNUD; 2017..

Outro fato a considerar está relacionado ao gasto com transporte. Na Espanha, onde ocorreu a pesquisa, o trabalhador tem a opção de utilizar como transporte público: ônibus, metrô ou bicicleta. Há um plano governamental que incentiva o uso de bicicletas públicas, criação de ciclovias e uso de cartões recarregáveis para ônibus com baixo custo2525 Transportes público de Sevilla [página de Internet]. Sevilha: Ayuntamiento; 2017 [acessado 2018 Maio 18]. Disponível em: https://www.sevilla.org/ayuntamiento/competencias-areas/area-de-seguridad-movilidad-y-fiestas-mayores/dgm/transportes-publicosde-sevilla
https://www.sevilla.org/ayuntamiento/com...
. Isso não ocorre na cidade brasileira que não dispõe de bicicletas públicas e a tarifa do ônibus onera o trabalhador2626 Bauru: nova tarifa de circular entrará em vigor neste sábado. JCNET [periódico da Internet] 2017; ago 27. [acessado 2018 Maio 10]. Disponível em: https://www.jcnet.com.br/Geral/2017/08/bauru-nova-tarifade-circular-entrara-em-vigor-nesta-sexta.html
https://www.jcnet.com.br/Geral/2017/08/b...
. O tempo gasto para ir de casa para o trabalho é maior para os brasileiros, o que gera desgaste físico e mental.

Em relação à saúde, a maioria está com sobrepeso, e a queixa de déficit de visão é maior entre os espanhóis, o que é compreensível, uma vez que está em faixa etária maior2727 Luiz LC, Rebelatto JR, Coimbra AMV, Ricci NA. Associação entre déficit visual e aspectos clínico-funcionais em idosos da comunidade. Rev Bras Fisioter 2009; 13(5):444-450.. Sobrepeso (IMC > 25) e obesidade na população é uma preocupação mundial e a OMS estimula os países a criarem alternativas para diminuição dos índices que crescem com a idade. As ciclovias e as bicicletas públicas são alternativas criadas pelos espanhóis. Neste estudo, sobrepeso apresentou percentual mais elevado (53,8%) do que o estudo de 2014-2015, que encontrou 32,1% entre as mulheres espanholas. Note-se que os dois estudos, basearam-se em informações autorreferidas, podendo apresentar valores subestimados2828 Aranceta-Bartrina J, Pérez-Rodrigo C, Ramos-Carrera N, Lázaro-Masedo S. Prevalencia de obesidad general y obesidad abdominal en la población adulta española (25-64 años) 2014-2015: estudio ENPE. Rev Esp Cardiol 2016; 69(6):579-587..

Os espanhóis fumam mais que os brasileiros. Embora a Espanha tenha implantado políticas públicas para o controle do tabagismo, não houve adesão da maioria das instituições, pois na própria lei há permissão para que se fume em alguns espaços fechados2929 Munhoz EF. Evaluación de las políticas de control del tabaquismo em España (Leyes 28/2005 y 42/2010): revision de la evidencia. Barcelona: Ministerio de Sanidad y Política Social; 2017.. O tabaco na Europa é a primeira causa de morte evitável. Na Espanha, seu uso produz mais de 50.000 mortes anualmente3030 Jimenez-Ruiz C. La prevalencia del tabaquismo de en España: el papel de la legislacion. Bol Hosp V del Mar 2015; 71(2):67-69.. A maior porcentagem de fumantes na Espanha se encontra entre 25 e 39 anos (40%) e 40 e 54 anos (39%), segundo Informe Europeo “el Periodico” de 29 de maio de 20153131 España, entre los países con más fumadores pese a la caída desde 2012. El Periodico; 2015 may 29. e corrobora a faixa etária que predomina neste estudo. A redução do uso de tabaco na Espanha tem ocorrido, porém em menor percentual que no Brasil. Os brasileiros aderiram melhor à campanha contra o cigarro. Após legislação, o percentual de fumantes entre as mulheres reduziu 46%. Atualmente 10,8% dos brasileiros ainda mantêm o hábito de fumar, sendo que os homens fumam mais (12,8%) que as mulheres (9%).

As alergias também estiveram mais presentes entre os espanhóis. As dermatites são frequentes na Europa. As dermatites de contato tiveram incidência de 10,1% entre os 1.213 pacientes atendidos em uma unidade de alergia cutânea de um Hospital de Valência, sendo que entre os trabalhadores de limpeza, a incidência foi de 11,4%. O uso de produtos químicos, comum nessa ocupação, pode favorecer as dermatites quando não se utilizam os Equipamentos de Proteção Individual adequadamente3232 Subriabre-Ferrer D, Zaragoza-Ninet V, Ortiz-Salvador JM, Giacaman-vonder Weth MM, Blasco-Encinas R, Sierra-Talamantes I. Dermatitis de contacto professional, estúdio clinico-epidemiologico entre los años 2011-2015. Med Segur Trab 2016; 62(245):318-326..

Outro fator que chama a atenção são as queixas de dor muscular, lombalgia, problemas osteoarticulares e inchaço nas pernas, comuns entre os trabalhadores dos dois países, embora os do Brasil sejam mais jovens e com menos tempo de serviço. Essa atividade repetitiva, realizada individualmente e que abrange a limpeza dos quartos e banheiros além da retirada dos sacos de lixos das unidades, exige esforço físico e favorece o adoecimento. Portanto, essas queixas são comuns entre eles e têm relação com o trabalho, crescendo com sua precarização3333 Cardoso ACM. O trabalho como determinante do processo saúde-doença. Rev Sociol USP 2015; 27(1):73-94.. A exposição prolongada devido ao tempo de serviço nessas atividades pode ter contribuído para a ocorrência dessas queixas.

O percentual de TMC entre os brasileiros foi maior (25,6%) quando comparado ao dos espanhóis. Em estudo realizado com trabalhadores do SHL, utilizando igual ponto de corte, foi encontrado entre os brasileiros um índice de 29,3%1515 Marconato CS, Magnago ACS, Magnago TSBS, Dalmolin GL, Andolhe R, Tavares JP. Prevalence and factors associated with minor psychiatric disorders in hospital housekeeping workers. Rev Esc Enferm USP 2017; 51:e03239.. Na Espanha é esperado encontrar de 9,6 a 19,9% de desordens mentais3434 European Union. World Mental Health. The burden of mental desorders in the European Union [homepage on the Internet]. [acessado 2017 Mar 10] Disponível em: http://www.eu-wmh.org/PDF/FactSheet_Burden.pdf
http://www.eu-wmh.org/PDF/FactSheet_Burd...
. Estudo de revisão, realizado no Brasil, verificou alto percentual de TMC entre mulheres e trabalhadores variando entre 20% a 56%1515 Marconato CS, Magnago ACS, Magnago TSBS, Dalmolin GL, Andolhe R, Tavares JP. Prevalence and factors associated with minor psychiatric disorders in hospital housekeeping workers. Rev Esc Enferm USP 2017; 51:e03239., o mesmo encontrado no presente estudo. Estudo populacional realizado no sul do Brasil verificou que 20,5% das mulheres apresentaram escores acima do número de corte para TMC3535 Alves AP, Pedrosa LAK, Coimbra MAR, Miranzi MAS, Vanderlei José Hass VJ. Prevalência de transtornos mentais comuns entre profissionais de saúde. Rev Enferm UERJ 2015; 23(1):64-69. Na Etiópia, foi de 25,9%, percentual próximo ao encontrado neste estudo3636 Gelaye B, Lemma S, Deyassa N, Bahretibeb Y, Tesfaye M, Berhane Y. Prevalence and Correlates of Mental Distress Among Working Adults in Ethiopia. Clin Pract Epidemiol Ment Health 2012; 8:126-133.. O grupo de sintomas de maior prevalência para trabalhadores de ambos os países foi sentir-se nervoso, tenso e preocupado na dimensão do Humor Depressivo corroborando outro estudo realizado no Brasil com trabalhadores do SHL1515 Marconato CS, Magnago ACS, Magnago TSBS, Dalmolin GL, Andolhe R, Tavares JP. Prevalence and factors associated with minor psychiatric disorders in hospital housekeeping workers. Rev Esc Enferm USP 2017; 51:e03239.. Mundialmente, calcula-se que 4,4% da população sofre com transtornos depressivos. Na Europa, segundo a OMS, calcula-se a prevalência de 5,2% e no Brasil de 5,8%3737 Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Aumenta o número de pessoas com depressão no mundo. Brasília: OPAS; 2017.. Os trabalhadores brasileiros além do humor depressivo/ansioso também apresentam decréscimo da energia vital, revelando desgaste físico e mental uma vez que foram as respostas mais prevalentes: cansa-se com facilidade e tem dificuldade para tomar decisões. A presença de algum tipo de transtorno mental contribui com o aumento do índice de absenteísmo ou presenteísmo no trabalho, sendo o transtorno de humor, em geral, o que levou a índices mais altos em países como Bélgica, Alemanha, Itália e Espanha3434 European Union. World Mental Health. The burden of mental desorders in the European Union [homepage on the Internet]. [acessado 2017 Mar 10] Disponível em: http://www.eu-wmh.org/PDF/FactSheet_Burden.pdf
http://www.eu-wmh.org/PDF/FactSheet_Burd...
.

Sintomas somáticos foram a segunda dimensão mais prevalente entre os espanhóis, sendo a queixa de dor de cabeça frequente e má digestão as mais apontadas. Esses sintomas evidenciam impacto negativo na saúde e na qualidade de vida uma vez que são sinais de sofrimento psíquico que podem estar associados às relações sociais, familiares, de trabalho ou econômica. A incapacidade de se ajustar às demandas resulta em sintomas como alterações funcionais e gera sofrimento3838 Costa MTP, Borges LO, Barros SC. Condições de trabalho e saúde psíquica: um estudo em dois hospitais universitários. Rev Psicol Organ Trab 2015; 15(1):43-58..

Embora a dimensão que incorpora pensamentos depressivos não tenha sido a mais prevalente, chama a atenção que 10,3% dos trabalhadores brasileiros já pensaram em dar fim à própria vida e ainda 25,6% perderam o interesse pelas coisas. Esses pensamentos são preocupantes uma vez que o suicídio tem sua gênese em processos psíquicos com nexo causal com o trabalho, principalmente após às mudanças nos processos produtivos, promovendo a precarização do trabalho, falta de solidariedade e até o assédio moral. Países como Japão e França têm encontrado relação do suicídio com o trabalho principalmente por causa do seu excesso exigido por grandes empresas3939 Venco S, Barreto M. O sentido social do suicídio no trabalho. Rev TST 2014; 80(1):294-302.. No Brasil não há muitos dados a respeito, porém a morte por suicídio tem aumentado. Em São Paulo, estudo apontou correlação entre atividade laboral, principalmente entre pessoas ocupadas e morte por autoagressão, o que corrobora outras pesquisas realizadas no Japão e EUA, onde o trabalho também é estressante e precarizado4040 Ceccon RF, Meneghel SN, Tavares JP, Lautert L. Suicídio e trabalho em metrópoles brasileiras: um estudo ecológico. Cien Saude Colet 2014; 19(7):2225-2234.. O suicídio, que sempre esteve relacionado a trabalhadores expostos às situações difíceis, como policiais, bombeiros ou a empregos de baixa renda com cobranças excessivas de produção e responsabilidade, com baixa autonomia, atualmente tem sido relatado em outros espaços e, dentre eles, os hospitais, sendo a medicina a profissão de maior risco para o suicídio3939 Venco S, Barreto M. O sentido social do suicídio no trabalho. Rev TST 2014; 80(1):294-302..

Embora os brasileiros tenham menos tempo de trabalho na instituição quando comparados aos espanhóis, possuem carga horária mais alargada além de outro vínculo empregatício, o que ajuda a compreender a dimensão do Decréscimo de Energia Vital. Trabalhadores espanhóis, além de possuírem carga horária menor, são contemplados com direitos à folga que os brasileiros não têm. Essa carga de trabalho é ainda maior se considerar o trabalho doméstico imputado às mulheres (cozinhar, lavar, passar), o que as sobrecarrega com dupla ou tripla jornada de trabalho4141 Schmidt NT. A dupla jornada de trabalho: reflexões sobre o vínculo da mulher com o trabalho doméstico em contexto de ensino e aprendizagem de sociologia para o nível médio. Ens Sociol Debate 2012; 1(1):1-11..

O trabalho do SHL no Brasil é caracterizado como de risco psíquico uma vez que é passivo (com pouca autonomia) e com alta exigência psicológica. Além disso, 32% dos trabalhadores mostram-se insatisfeitos, o que não ocorre entre os trabalhadores espanhóis.

A terceirização levou à diminuição de profissionais do SHL de oito hospitais públicos de Madri. Alguns hospitais chegaram a ter uma redução de 32% e salários menores pagos aos recém-contratados. Outro fator, segundo o sindicato espanhol, que tem contribuído para a diminuição do número de empregos foi a aprovação do Expediente de Regulación Temporal de Empleo (ERTE) que permite a contratação temporária, levando a uma redução de trabalho de 28% em 3 anos4242 Fonseca D. Los hospitales pierden un tercio del personal de limpieza en tres años. El País [página de Internet] 2015; nov 11[acessado 2017 Mar 11]. Disponível em: https://elpais.com/ccaa/2015/11/10/madrid/1447181846_822146.html
https://elpais.com/ccaa/2015/11/10/madri...
. Embora não se tenha pesquisado sobre o número de trabalhadores antes da terceirização, esse hospital exige que as empresas terceirizadas mantenham o mesmo quadro de funcionários, ainda que, ao longo dos anos, ocorra o aumento do número de atendimentos e leitos. Nesse hospital de Sevilha os trabalhadores são contemplados com 2% do salário base a cada ano. A empresa tem como obrigação não permitir discriminação de gênero e salvaguardar diferenças salariais aos que ocuparem cargos de supervisão ou forem encarregados4343 Ferroser Servicios Auxiliares. Base documental de negociação coletiva. Sevilha: Andalucia; 2013..

O incentivo salarial por tempo de serviço não é uma realidade no Brasil. Além disso, observam-se demissões frequentes entre esses trabalhadores. Mesmo frente à insatisfação, o fato de esses trabalhadores se manterem no emprego pode estar relacionado à falta de opção e conformismo, condição comum entre eles77 Pereira HA, Albuquerque RS, Moraes AFG. Terceirização e precarização: um estudo com terceirizados de serviços gerais na Universidade Federal da Paraíba. Rev Principia 2015; (26):106-115..

As condições de trabalho interferem positiva ou negativamente na saúde psíquica e o apoio dos colegas de serviço e encarregados presentes neste estudo, é considerado um fator protetor para a saúde psíquica. Trabalho precário possibilita maior percentual de trabalhadores com riscos psicossociais e, em se tratando do sexo feminino, mais ainda quando comparado ao masculino3838 Costa MTP, Borges LO, Barros SC. Condições de trabalho e saúde psíquica: um estudo em dois hospitais universitários. Rev Psicol Organ Trab 2015; 15(1):43-58..

As questões relacionadas à saúde mental do trabalhador no Brasil têm se tornado cada vez mais evidentes no campo “saúde do trabalhador”, o que guarda estreita relação com a forma de organização e gestão dos serviços. A diversidade de sofrimentos impostos pelas condições de trabalho exige investimentos no conhecimento da situação, com vistas a transformar a realidade vivida por esses trabalhadores4444 Leão LHC, Minayo-Gomez CM. A questão da saúde mental na vigilância em saúde do trabalhador. Cien Saude Colet 2014; 19(12):4649-4658..

Mesmo que a compreensão da saúde mental no contexto do trabalho seja revestida de grande complexidade, decorrente dos múltiplos fatores que podem influenciá-la, nas últimas décadas muitos deles inerentes ao trabalho têm contribuído para isso. Pode-se citar, como exemplo, a divisão das tarefas e a separação entre o fazer e o pensar, muito presente nos serviços hospitalares, levando a prejuízos para a identidade dos profissionais e à alienação progressiva4545 Masumoto LK, Faiman CJS. Saúde mental e trabalho: um levantamento da literatura nacional nas bases de dados em Psicologia da Biblioteca Virtual de Saúde (BVS). Saúde, Ética & Justiça. 2014; 19(1):1-11..

Conclusões

Considerando que a significação do trabalho é construída coletivamente e que a forma de organização e as relações sociais são essenciais nesse processo, podemos compreender que o risco de adoecimento entre os trabalhadores brasileiros é maior.

Na comparação de aspectos relacionados às condições de vida, os trabalhadores espanhóis são mais velhos, de cor predominantemente branca e com renda familiar maior quando comparados com os brasileiros. Em relação às condições de saúde, os espanhóis fumam mais, têm maior déficit de visão e alergias que os brasileiros. Ao contrário disso, os brasileiros apresentam índices mais elevados para TMC.

Em análise mais detalhada do SRQ-20, encontra-se que os brasileiros apresentam escores mais elevados em todas as dimensões avaliadas (humor depressivo/ansioso, sintomas somáticos; decréscimo de energia vital, pensamentos depressivos). Esses dados podem ser explicados, em parte, pelas condições de trabalho, uma vez que os espanhóis trabalham há mais tempo na mesma atividade, com carga horária menor e não contam com dois empregos como se observa em mais de um quarto dos trabalhadores brasileiros. Além disso, quase 40% dos espanhóis consideram seu trabalho como ativo (autonomia e alta demanda psicológica).

Depreende-se, desta forma, que os trabalhadores brasileiros se encontram em condições de vida, trabalho e saúde mental mais precarizadas quando comparados com as dos espanhóis. Apenas alguns aspectos das condições de saúde foram piores entre os espanhóis, o que provavelmente pode decorrer da faixa etária mais alta deles.

Esses dados remetem a reflexões sobre o contexto histórico e as condições sociais e econômicas de cada país. Mesmo que as atividades exercidas e os contratos de trabalho sejam semelhantes, as formas de viver, trabalhar e adoecer se diferenciam de um país para o outro.

Referências

  • 1
    Petean E, Correa da Costa ALR, Ribeiro RLR. Repercussões da ambiência hospitalar na perspectiva dos trabalhadores de limpeza. Trab Educ Saude 2014; 12(3):615-635.
  • 2
    Antunes R, Praun L. A sociedade dos adoecimentos no trabalho. Serv Soc Soc 2015; (123):407-427.
  • 3
    Schimith MD, Brêtas ACP, Simon BS, Brum DJT, Alberti GF, Bidó MLD, Gomes TF. Precarização e fragmentação do trabalho na estratégia saúde da família: impactos em Santa Maria (RS). Trab Educ Saude 2017; 15(1):163-182.
  • 4
    Druck G. A terceirização na saúde pública: formas diversas de precarização do trabalho. Trab Educ Saude 2016; 14 (Supl. 1):15-43.
  • 5
    Ceolin GF. Crise do capital, precarização do trabalho e impactos no Serviço Social. Serv Soc Soc 2014; (118):239-264.
  • 6
    Assunção-Matos A, Bicalho PPG. O trabalho, a terceirização e o legislativo brasileiro: paradoxos e controvérsias. Rev Psicol Organ Trab 2016; 16(2):120-129.
  • 7
    Pereira HA, Albuquerque RS, Moraes AFG. Terceirização e precarização: um estudo com terceirizados de serviços gerais na Universidade Federal da Paraíba. Rev Principia 2015; (26):106-115.
  • 8
    Chagas D. Riscos psicossociais no trabalho: causas e consequências. Rev INFAD Psicol 2015;1(2):439-446.
  • 9
    Alves G. Terceirização: o futuro do trabalho no Brasil. Trab Educ Saude 2017; 15(2):337-339.
  • 10
    Brasil. Lei nº 13.429, de 31 de Março de 2017. Dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas e dá outras providências e dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros. Diário Oficial da União 2017; 31 mar.
  • 11
    Goméz MV. A reforma da Espanha que inspirou Temer: mais empregos (precários) e com menores salários. El País 2017; abr 27.
  • 12
    Albuquerque GSC, Silva MJS. Sobre a saúde, os determinantes da saúde e a determinação social da saúde. Saude Debate 2014; 38(103):953-965.
  • 13
    Nunes APN, Barreto SM, Gonçalves LG. Relações sociais e autopercepção da saúde: projeto envelhecimento e saúde. Rev Bras Epidemiol 2012; 15(2):415-428.
  • 14
    Moraes RSM, Silva DAS, Oliveira WF, Peres MA. Social inequalities in the prevalence of common mental disorders in adults: a population-based study in Southern Brazil. Rev Bras Epidemiol 2017; 20(1):43-56.
  • 15
    Marconato CS, Magnago ACS, Magnago TSBS, Dalmolin GL, Andolhe R, Tavares JP. Prevalence and factors associated with minor psychiatric disorders in hospital housekeeping workers. Rev Esc Enferm USP 2017; 51:e03239.
  • 16
    Araújo TM, Graça CC, Araújo E. Estresse ocupacional e saúde: contribuições do modelo demanda-controle. Cien Saude Colet 2003; 8(4):991-1003.
  • 17
    Magnago TSBS, Lisboa MTL, Griep RH, Zeitoune RCG, Tavares JP. Condições de trabalho de profissionais da enfermagem: avaliação baseada no modelo demanda-controle. Acta Paul Enferm 2010; 23(6):811-817.
  • 18
    Teixeira JRB, Boery EN, Casotti CA, Araújo TM, Pereira R, Ribeiro ÍJS, Rios MA, Amorim CR, Moreira RM, Boery RNSO, Sales ZN. Associação entre aspectos psicossociais do trabalho e qualidade de vida de mototaxistas. Cad Saude Publica 2015; 31(1):97-110.
  • 19
    Martins JTR, Ribeiro RP, Bobroff MCC, Marziale MHP, Robazzi MLCC, Mendes AC. Meaning of workload on the view of cleaning professionals. Acta Paul Enferm 2013; 26(1):63-70.
  • 20
    Millan Vazquez de La Torre MG, Santos Pita MP, Perez Naranjo LM. Análisis del mercado laboral femenino en España: evolución y factores socioeconómicos determinantes del empleo. Papeles Poblac 2015; 21(84):197-225.
  • 21
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE). Desigualdade de renda atinge regiões, gêneros, cores e escolaridade Rio de Janeiro: IBGE; 2017.
  • 22
    Gómez MV. La reforma laboral cumple cinco años: más empleo, pero de peor calidad [Periódico da Internet]. El País 2017 [acessado 2018 Maio 15]; 10 fev. Disponível em: https://elpais.com/economia/2017/02/09/actualidad/1486672169_076173.html
    » https://elpais.com/economia/2017/02/09/actualidad/1486672169_076173.html
  • 23
    Martins TCS. O negro no contexto das novas estratégias do capital: desemprego, precarização e informalidade. Serv Soc Soc 2012; 111:450-467.
  • 24
    Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Relatório o PNUD destaca grupos sociais que não se beneficiam do desenvolvimento humano Brasília: PNUD; 2017.
  • 25
    Transportes público de Sevilla [página de Internet]. Sevilha: Ayuntamiento; 2017 [acessado 2018 Maio 18]. Disponível em: https://www.sevilla.org/ayuntamiento/competencias-areas/area-de-seguridad-movilidad-y-fiestas-mayores/dgm/transportes-publicosde-sevilla
    » https://www.sevilla.org/ayuntamiento/competencias-areas/area-de-seguridad-movilidad-y-fiestas-mayores/dgm/transportes-publicosde-sevilla
  • 26
    Bauru: nova tarifa de circular entrará em vigor neste sábado. JCNET [periódico da Internet] 2017; ago 27. [acessado 2018 Maio 10]. Disponível em: https://www.jcnet.com.br/Geral/2017/08/bauru-nova-tarifade-circular-entrara-em-vigor-nesta-sexta.html
    » https://www.jcnet.com.br/Geral/2017/08/bauru-nova-tarifade-circular-entrara-em-vigor-nesta-sexta.html
  • 27
    Luiz LC, Rebelatto JR, Coimbra AMV, Ricci NA. Associação entre déficit visual e aspectos clínico-funcionais em idosos da comunidade. Rev Bras Fisioter 2009; 13(5):444-450.
  • 28
    Aranceta-Bartrina J, Pérez-Rodrigo C, Ramos-Carrera N, Lázaro-Masedo S. Prevalencia de obesidad general y obesidad abdominal en la población adulta española (25-64 años) 2014-2015: estudio ENPE. Rev Esp Cardiol 2016; 69(6):579-587.
  • 29
    Munhoz EF. Evaluación de las políticas de control del tabaquismo em España (Leyes 28/2005 y 42/2010): revision de la evidencia Barcelona: Ministerio de Sanidad y Política Social; 2017.
  • 30
    Jimenez-Ruiz C. La prevalencia del tabaquismo de en España: el papel de la legislacion. Bol Hosp V del Mar 2015; 71(2):67-69.
  • 31
    España, entre los países con más fumadores pese a la caída desde 2012. El Periodico; 2015 may 29.
  • 32
    Subriabre-Ferrer D, Zaragoza-Ninet V, Ortiz-Salvador JM, Giacaman-vonder Weth MM, Blasco-Encinas R, Sierra-Talamantes I. Dermatitis de contacto professional, estúdio clinico-epidemiologico entre los años 2011-2015. Med Segur Trab 2016; 62(245):318-326.
  • 33
    Cardoso ACM. O trabalho como determinante do processo saúde-doença. Rev Sociol USP 2015; 27(1):73-94.
  • 34
    European Union. World Mental Health. The burden of mental desorders in the European Union [homepage on the Internet]. [acessado 2017 Mar 10] Disponível em: http://www.eu-wmh.org/PDF/FactSheet_Burden.pdf
    » http://www.eu-wmh.org/PDF/FactSheet_Burden.pdf
  • 35
    Alves AP, Pedrosa LAK, Coimbra MAR, Miranzi MAS, Vanderlei José Hass VJ. Prevalência de transtornos mentais comuns entre profissionais de saúde. Rev Enferm UERJ 2015; 23(1):64-69
  • 36
    Gelaye B, Lemma S, Deyassa N, Bahretibeb Y, Tesfaye M, Berhane Y. Prevalence and Correlates of Mental Distress Among Working Adults in Ethiopia. Clin Pract Epidemiol Ment Health 2012; 8:126-133.
  • 37
    Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Aumenta o número de pessoas com depressão no mundo Brasília: OPAS; 2017.
  • 38
    Costa MTP, Borges LO, Barros SC. Condições de trabalho e saúde psíquica: um estudo em dois hospitais universitários. Rev Psicol Organ Trab 2015; 15(1):43-58.
  • 39
    Venco S, Barreto M. O sentido social do suicídio no trabalho. Rev TST 2014; 80(1):294-302.
  • 40
    Ceccon RF, Meneghel SN, Tavares JP, Lautert L. Suicídio e trabalho em metrópoles brasileiras: um estudo ecológico. Cien Saude Colet 2014; 19(7):2225-2234.
  • 41
    Schmidt NT. A dupla jornada de trabalho: reflexões sobre o vínculo da mulher com o trabalho doméstico em contexto de ensino e aprendizagem de sociologia para o nível médio. Ens Sociol Debate 2012; 1(1):1-11.
  • 42
    Fonseca D. Los hospitales pierden un tercio del personal de limpieza en tres años. El País [página de Internet] 2015; nov 11[acessado 2017 Mar 11]. Disponível em: https://elpais.com/ccaa/2015/11/10/madrid/1447181846_822146.html
    » https://elpais.com/ccaa/2015/11/10/madrid/1447181846_822146.html
  • 43
    Ferroser Servicios Auxiliares. Base documental de negociação coletiva Sevilha: Andalucia; 2013.
  • 44
    Leão LHC, Minayo-Gomez CM. A questão da saúde mental na vigilância em saúde do trabalhador. Cien Saude Colet 2014; 19(12):4649-4658.
  • 45
    Masumoto LK, Faiman CJS. Saúde mental e trabalho: um levantamento da literatura nacional nas bases de dados em Psicologia da Biblioteca Virtual de Saúde (BVS). Saúde, Ética & Justiça 2014; 19(1):1-11.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Set 2020
  • Data do Fascículo
    Out 2020

Histórico

  • Recebido
    01 Fev 2018
  • Aceito
    12 Abr 2019
  • Publicado
    14 Abr 2019
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revscol@fiocruz.br