Transplante de células-tronco hematopoiéticas: iniquidades na distribuição em território brasileiro, 2001 a 2020

Hematopoietic stem-cell transplants in Brazil: inequities in the distribution in Brazilian territory, 2001 to 2020

Lucas Magedanz Jessica Vick de Oliveira Leal Brenda Leandro dos Santos Evelin Soares de Brito Pamela Alejandra Escalante Saavedra Letícia Santana da Silva Soares Letícia da Costa Lima D’Oliveira Dayani Galato Sobre os autores

Resumo

O objetivo deste artigo é descrever a distribuição de Centros Transplantadores (CTs) e transplantes de células-tronco hematopoiéticas (TCTH) no território brasileiro. Estudo descritivo, que reúne informações sobre a distribuição CTs e o número de procedimentos realizados entre 2001 e 2020, a partir das fontes dos dados: Sociedade Brasileira de Terapia celular e Transplantes de Medula Óssea (SBTMO); Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO); Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS); e Ministério da Saúde (MS). Foram identificados 86 CTs, com predominância na região Sudeste do país (64%). A região Norte não possui CTs. No período contabilizaram-se mais de 30 mil procedimentos, concentrados nas regiões Sudeste e Sul. O TCTH do tipo alogênico foi prevalente. Constataram-se divergências entre os números de transplantes realizados a depender da fonte consultada. Apesar do crescimento do número de procedimentos no período do estudo, tanto a distribuição de CTs quanto o número de TCTHs se concentrou em regiões mais desenvolvidas. Essa heterogeneidade pode ter propiciado iniquidades no acesso ao tratamento pela população.

Key words:
Hematopoietic stem-cell transplants; Bone marrow transplants; Health equity; Accessibility of Health Services

Abstract

The scope of this article is to describe the distribution of Transplant Centers (TCs) and hematopoietic stem-cell transplants (HSCTs) in the Brazilian territory. It is a descriptive study, which brings together information on the distribution of TCs and the number of procedures performed between 2001 and 2020, based on the following data sources: the Brazilian Cell Therapy and Bone Marrow Transplant Society of (SBTMO); the Brazilian Organ Transplant Association (ABTO); the Hospital Information System of the Unified Health System (SIH/SUS); and the Ministry of Health (MS). A total of 86 TCs were identified, predominantly in the Southeastern region of the country (64%). There are no TCs in the Northern region. Throughout the period, there were more than 30,000 procedures, concentrated in the Southeastern and Southern regions. The allogeneic type of HSCT was prevalent. Differences were found between the numbers of transplants performed depending on the source consulted. Despite the increase in the number of procedures during the period studied, both the distribution of TCs and the number of HSCTs were concentrated in more developed regions. This heterogeneity may have led to inequities in the access of the population to treatment.

Key words:
Hematopoietic stem-cell transplants; Bone marrow transplants; Health equity; Accessibility of Health Services

Introdução

O Transplante Células-Tronco Hematopoiéticas (TCTH), por vezes denominado Transplante de Medula Óssea (TMO), é um tratamento indicado para diversos tipos de neoplasias hematológicas, como leucemia, linfoma, mieloma múltiplo, e outras doenças hematológicas autoimunes e imunodeficiências11 Zhang H, Chen J, Que W. Allogeneic peripheral blood stem cell and bone marrow transplantation for hematologic malignancies: Meta-analysis of randomized controlled trials. Leukemia Res 2012; 36(4):431-437.,22 Lima M, Oran B, Champlin RE, Papadopoulos EB, Giralt SA, Scott BL, William BM, Hetzer J, Laille E, Hubbell B, Skikne BS, Craddok C. CC-486 Maintenance after Stem Cell Transplantation in Patients with Acute Myeloid Leukemia or Myelodysplastic Syndromes. Biology Blood Marrow Transplant 2018; 24(10):2017-2024.. A técnica consiste na substituição de células medulares, distinguindo-se, portanto, dos transplantes de órgãos sólidos, como o coração, fígado ou rim.

As células progenitoras hematopoiéticas podem ser obtidas de diferentes fontes: medula óssea, sangue periférico ou cordão umbilical. Os TCTHs são basicamente divididos em alogênicos e autólogos. O transplante alogênico é aquele em que as células são oriundas de um doador externo, seja de um membro da família ou de bancos de células-tronco hematopoiéticas formados a partir de doadores voluntários e, portanto, não aparentados. O autólogo, por sua vez, utiliza células progenitoras do próprio paciente, previamente coletadas, e que podem ser infundidas imediatamente ou criopreservadas. Em ambas o receptor recebe as células por meio de uma transfusão, ou seja, as células-mãe, ou progenitoras do sangue, são colhidas, tratadas em laboratório e, posteriormente, transfundidas ao paciente33 Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA). Transplante de Medula Óssea [Internet]. [acessado 2021 jul 25]. Disponível em: http://redome.inca.gov.br/paciente/transplante-de-medula-ossea/.
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. Considera-se um procedimento bem-sucedido aquele cuja recuperação da medula enxertada com células do doador multiplica-se e produz células sanguíneas suficientemente funcionais e sadias44 Corgozinho MM, Gomes JRAA, Garrafa V. Transplantes de Medula Óssea no Brasil: Dimensão Bioética. Rev Latinoam Bioética 2012; 12(1):36-45..

Mundialmente, dados publicados em 2012 demonstraram que dos 68.146 transplantes realizados em 77 países, 53% foram do tipo autólogo. Estes achados demonstraram um crescimento de 46% no número total de procedimentos entre 2006 e 2012, concentrados principalmente em países desenvolvidos da América do Norte, Europa e Ásia. O Brasil, por sua vez, apesar das taxas superiores a 1 mil transplantes/ano, ainda apresenta uma taxa relativa por milhão de habitantes menor que de países vizinhos como Argentina e México55 Niederwieser D, Baldomero H, Szer J, Gratwohl M, Aljurf M, Atsuta Y, Bouzas LF, Confer D, Greinix H, Horowitz M, Iida M, Lipton J, Mohty M, Novitzky N, Nunez J, Passweg J, Pasquini MC, Kodera Y, Apperley J, Seber A, Gratwohl A. Hematopoietic stem cell transplantation activity worldwide in 2012 and a SWOT analysis of the Worldwide Network for Blood and Marrow Transplantation Group including the global survey. Bone Marrow Transplantation 2016; 51(6):778-785.. No Brasil, uma das entidades responsáveis pela divulgação de dados de transplantes é Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Em seu último reporte, de 2021, contabilizaram 25.307 TCTHs entre 2014 e 202166 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Registro Brasileiro de Transplantes [Internet]. [acessado 2021 ago 15]. Disponível em: https://site.abto.org.br/publicacoes/rbt/.
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.

No Brasil, o protagonismo na área é creditado a um grupo de hematologistas da Universidade Federal do Paraná que, em 1979, realizou o primeiro transplante dessa natureza no país. Anos depois, em 1983, outra unidade de transplante foi inaugurada no Instituto Nacional do Câncer (INCA), no Rio de Janeiro77 Ferreira E, Dulley FL, Morsoletto F, Zanis Neto J, Pasquini R. Bone marrow transplantation in Brazil. Hum Immunol 1985; 14(3):324-332..

O TCTH passou a ter maior representatividade no território nacional a partir da aprovação de leis que regulam o uso de células-tronco embrionárias88 Machado RN, Vargas-Quesada B, Leta J. Intellectual structure in stem cell research: exploring Brazilian scientific articles from 2001 to 2010. Scientometrics 2016; 106(2):525-537.. Entre as normas vigentes mais importantes na área está a Portaria do Ministério da Saúde nº 2.600, de 2009, que trata dos aspectos relativos às indicações, aos critérios para a seleção e busca de doadores não aparentados nos registros nacional e internacional, às normas para autorização de equipes e serviços, dentre outros99 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria nº 2.600, de 21 de outubro de 2009. Aprova o Regulamento Técnico do Sistema Nacional de Transplantes. Diário Oficial da União 2009; 21 out.. Atualmente, existem Centros Transplantadores (CTs) em diversas Unidades Federativas (UFs)1010 Sociedade Brasileira de Terapia Celular e Transplante de Medula Óssea. Centros TCTH [Internet]. [acessado 2021 ago 15]. Disponível em: https://sbtmo.org.br/centros-tcth/.
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. No entanto, a distribuição equitativa a todos os pacientes que necessitam do procedimento ainda está longe de ser uma realidade, tanto em âmbito nacional quanto mundial1111 Batistiolle JV. Acesso aos transplantes de medula óssea no Brasil: uma questão de justiça [tese]. Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz; 2014..

Trabalhos brasileiros já descreveram as características do serviço e o perfil de doadores e pacientes em TCTHs88 Machado RN, Vargas-Quesada B, Leta J. Intellectual structure in stem cell research: exploring Brazilian scientific articles from 2001 to 2010. Scientometrics 2016; 106(2):525-537.,1111 Batistiolle JV. Acesso aos transplantes de medula óssea no Brasil: uma questão de justiça [tese]. Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz; 2014.,1212 Paz A, Rigoni L, Fischer G, Schittler M, Pezzi A, Valim V, Dahmer A, Zambonato A, Amorin B, Sehn F, Silva MA, Daudt L, Silla L. Donor characteristics and hematopoietic stem cell transplantation outcome: experience of a single center in Southern Brazil. Hematol Transfus Cell Ther 2018; 40(2):136-142.. Entretanto, há carência de informações quanto à distribuição territorial desse procedimento, bem como análises de homogeneidade e equidade. Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo descrever a distribuição de CTs e de TCTHs no território brasileiro, analisando as diferenças entre as regiões e tipos de procedimento e possíveis implicações no acesso.

Método

Trata-se de estudo descritivo, com dados de TCTHs realizados no Brasil, a partir do método descrito por Soares et al.1313 Soares LSS, Brito ES, Magedanz L, França FA, Araújo WN, Galato D. Solid organ transplantation in Brazil: a descriptive study of distribution and access inequalities across the Brazilian territory, 2001-2017. Epidemiol Serv Saude 2020; 29:e2018512.. Esse método baseia-se na extração de dados de fontes oficiais, ano a ano, estratificados por UF, e analisados sob as perspectivas temporal e espacial. A observação espacial consiste na criação de mapas georreferenciados para evidenciar diferenças entre regiões. Já a análise temporal indica mudanças de comportamento ao longo do tempo. O estudo considerou o recorte temporal de 2001 a 2020. Os dados foram obtidos em agosto de 2021, com o cuidado adicional de coletar as informações de uma base no mesmo dia, a fim de dirimir possíveis vieses em decorrência de atualização de sistemas. A apresentação georreferenciada da evolução temporal dos transplantes considerou, por conveniência, os anos de 2001, 2010 e 2019.

Informações dos CTs distribuídos por UF foram obtidas nos registros da Sociedade Brasileira de Terapia Celular e Transplantes de Medula Óssea (SBTMO)1010 Sociedade Brasileira de Terapia Celular e Transplante de Medula Óssea. Centros TCTH [Internet]. [acessado 2021 ago 15]. Disponível em: https://sbtmo.org.br/centros-tcth/.
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. O quantitativo de TCTHs realizados foi verificado em três bases de dados: (i) no Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS), mediante acesso ao portal do Departamento de Informática do SUS (Datasus)1414 Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde. Produção hospitalar [Internet] [acessado 2021 ago 15]. Disponível em: https://datasus.saude.gov.br/acesso-a-informacao/producao-hospitalar-sih-sus/.
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; (ii) nas informações divulgadas no portal do Ministério da Saúde (MS)1515 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Doação de Órgãos: transplantes, lista de espera e como ser doador [Internet]. [acessado 2021 ago 15]. Disponível em: https://antigo.saude.gov.br/saude-de-a-z/doacao-de-orgaos/.
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; e (iii) nos registros da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), estes últimos dados divulgados nas publicações do Registro Brasileiro de Transplantes (RBT)66 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Registro Brasileiro de Transplantes [Internet]. [acessado 2021 ago 15]. Disponível em: https://site.abto.org.br/publicacoes/rbt/.
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. As variáveis relacionadas ao número de transplantes consideraram a frequência absoluta estratificada por ano, tipo de procedimento e UF em que foi realizado. Os TCTHs foram tipificados em transplante alogênico aparentado, alogênico não aparentado e o autólogo, contemplando os códigos de procedimentos do Sistema de Gerenciamento da Tabela de Procedimentos (SIGTAP): 505010011, 505010038, 505010054, 505010070, 505010089, 505010020, 505010062, 505010046.

A razão anual de transplantes foi calculada a partir da soma de transplantes realizados dividida pela estimativa da população em cada ano, considerando as estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)1616 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo 2010 [Internet]. [acessado 2021 ago 15]. Disponível em: https://censo2010.ibge.gov.br.
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. A análise descritiva dos dados foi realizada no programa Microsoft Excel®, versão para Microsoft 365. Na análise estatística, a normalidade dos dados foi verificada pelo teste de Shapiro-Wilk, sendo posteriormente selecionado o coeficiente de correlação de Pearson (r) para amostras paramétricas a fim de avaliar a relação entre o número de procedimentos realizados e o tempo em anos. Na interpretação desse resultado, foram considerados valores de r (+ ou -): entre 0 e 0,19 como de correlação bem fraca; entre 0,20 e 0,39 como fraca; entre 0,40 e 0,69 como moderada; entre 0,70 e 0,89 como forte; e acima deste valor como muito forte. As análises foram calculadas no programa IBM SPSS®, versão 25. Os mapas georreferenciados foram construídos no programa QGIS®, versão 2.18.24.

Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Brasília (CEP-UnB), sob o registro 4.607.522.

Resultados

Em 2021 o Brasil registrava 86 centros transplantadores (CTs), predominantemente nas regiões Sudeste e Sul. A região Sudeste concentrava cerca de dois terços desses centros (Tabela 1). A região Norte não apresentou CTs, assim como nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul da região Centro-Oeste, e Maranhão e Piauí da região Nordeste.

Tabela 1
Distribuição dos centros transplantadores de células-tronco hematopoiéticas, por tipo, região, unidade federativa e população residente estimada. Brasil, 2021.

Em relação ao número total de transplantes realizados nas duas primeiras décadas do século XXI, considerando os diferentes tipos, os dados variaram dependendo da base de dados consultada. A ABTO informou um total de 40.134 procedimentos; já a base de dados do SIH/SUS, que contabiliza apenas procedimentos realizados por financiamento público, considerava 31.386 transplantes. O portal do MS, que, no momento da coleta de dados trazia informações até 2019, mostrava um total de 33.338 TCTHs (Figura 1).

Figura 1
Frequência absoluta de transplante de células-tronco hematopoiéticas, de todos os tipos, por ano e fonte de dados, Brasil, 2001 a 2020.

Os procedimentos registrados no SIH/SUS, por tipo e ano, são apresentados na Tabela 2. O transplante do autólogo, a partir de sangue periférico e de medula óssea, revelou-se o mais frequente nas últimas duas décadas, representando cerca de 56,8% do total de procedimentos, ocupando a primeira e terceira posição no ranking de frequência, respectivamente. O alogênico de medula óssea aparentado apareceu em segundo lugar, correspondeu a 22,4% dos TCTHs. Juntos, esses procedimentos somaram quase 80% dos transplantes realizados no Brasil no período estudado. Por sua vez, os TCTHs que usaram o cordão umbilical como fonte de células tiveram baixa participação geral, correspondendo a apenas 1,5% dos procedimentos.

Tabela 2
Frequência absoluta de procedimentos de transplante de células-tronco hematopoiéticas, por tipo, ano e fonte de dados, no Brasil, de 2001 a 2020.

Em geral, evidenciou-se um crescimento de 295% no número absoluto de TCTHs entre os anos de 2001 e 2020, e de 240% se considerarmos a taxa de transplantes por milhão de habitantes. Em 2020, no entanto, percebeu-se uma queda de cerca de 16% em relação a 2019. A correlação de Pearson mostrou uma correlação positiva e muito forte entre o número total de procedimentos, de todos os tipos, e a evolução temporal em anos (r=+0,948, p<0,001).

A Figura 2 apresenta a evolução da frequência absoluta de TCTHs, de todos os tipos, para alguns anos, a partir de mapas georreferenciados por UF, conforme dados do Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde.

Figura 2
Frequência absoluta de autorizações de procedimentos hospitalares de transplantes de células-tronco hematopoiéticas em 2001(a), 2010(b) e 2020(c), e somatório 2001 a 2020(d).

No período de 2001 a 2020, segundo dados do SIH/SUS, a região Sudeste foi responsável pela maior parcela de TCTHs (20.011, 63,8%), sendo São Paulo o estado com maior número de transplantes (15.370, 49,0%). No mesmo período, a região Sul contabilizou 6.395 (20,4%) procedimentos, a Nordeste 3.967 (12,6%), e a Centro-Oeste 1.013 (3,2%). Não foram verificados procedimentos na região Norte.

Discussão

O artigo 196 da Constituição Brasileira estabelece que “a saúde é direito de todos e dever do Estado” e, por intermédio de políticas sociais e econômicas, promove ações de prevenção, tratamento e recuperação a doenças e outros agravos1717 Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União 1988; 5 out... Alinhada a esse princípio, a Política Nacional de Transplantes de Órgãos e Tecidos tem como diretrizes a gratuidade da doação, a beneficência em relação aos receptores e a não maleficência em relação aos doadores vivos99 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria nº 2.600, de 21 de outubro de 2009. Aprova o Regulamento Técnico do Sistema Nacional de Transplantes. Diário Oficial da União 2009; 21 out.. No entanto, as diferenças de distribuição de CTs e TCTHs observadas entre as regiões em nosso estudo, podem suscitar iniquidades no acesso ao tratamento pela população, sobretudo para quem vive em regiões que não contam com tais centros. A concentração de CTs nas regiões mais a leste do país (Sudeste, Sul e Nordeste) provavelmente obriga as pessoas das regiões mais a oeste (Centro-Oeste e Norte) a se deslocarem grandes distâncias para terem acesso ao transplante.

Entre os locais que não possuem CTs, a região Norte é a que concentra os piores índices de utilização dos serviços de saúde no país. Entre as dificuldades observadas está a baixa disponibilidade de médicos (1/1000 habitantes), que é até sete vezes menor em comparação com a verificada nas capitais da região Sul (7,1/1000)1818 Garnelo L, Lima JG, Rocha ESC, Herkrath FJ. Acesso e cobertura da Atenção Primária à Saúde para populações rurais e urbanas na região norte do Brasil. Saude Debate 2018; 42(n. esp. 1):81-99.. Além dos estados dessa região, há mais três UFs localizadas no Nordeste e duas no Centro-Oeste que não dispõem desse serviço. Portanto, dentre as 27 UFs brasileiras, 12 (44,4%) não oferecem o TCTH à sua população, exigindo, nesses casos, que o paciente se desloque a outros estados para ter acesso ao tratamento.

Na tentativa de dirimir os impactos oriundos da diferença de acesso entre as regiões, o programa de Tratamento Fora do Domicílio (TFD) apresenta-se como uma opção para subsidiar a operacionalização das redes assistenciais de alta complexidade, como o TCTH1919 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria nº 55, de 24 de fevereiro de 1999. Dispõe sobre a rotina do Tratamento Fora de Domicílio no Sistema Único de Saúde - SUS, com inclusão dos procedimentos específicos na tabela de procedimentos do Sistema de Informações Ambulatoriais do SIA/SUS e dá outras providências. Diário Oficial da União 2009; 24 fev.. A estratégia, contudo, apresenta limitações, já que depende da capacidade de organização dos municípios e cobre apenas despesas relativas a transporte, diárias para alimentação e pernoite para o paciente e acompanhante. Contudo, muitas vezes, esse auxílio pode não ser suficiente para permitir o afastamento do acompanhante e do paciente hematológico por todo o tempo requerido pelo tratamento de TCTH, que não raramente supera várias semanas ou meses. Soma-se a essa situação o possível impacto social, físico, psicológico e espiritual decorrido do distanciamento familiar e das atividades cotidianas. Entre as consequências imagináveis citam-se o distanciamento familiar, o impacto financeiro dos altos custos de vida nas capitais dos estados - que concentram a maioria dos CTs -, interrupção escolar, depressão, preocupação e ansiedade em diversas esferas sociais, entre outras. Ainda, esse cenário possivelmente dificulta o diagnóstico das pessoas residentes longe dos CTs, bem como os prognósticos daqueles que realizaram o transplante e necessitam de um acompanhamento mais próximo.

Em relação ao quantitativo de procedimentos realizados nas duas décadas analisadas, foram verificadas diferenças nos registros entre as bases de dados consultadas. Ao se comparar os registros da ABTO e do SIH/SUS, observa-se uma diferença de 8.748 (21,8%) TCTHs, a qual se deve, presumivelmente, ao fato de o SIH/SUS considerar apenas procedimentos realizados pelo financiamento público, enquanto a ABTO considera, também, os procedimentos realizados pelo financiamento particular e por convênios. Essa diferença, por sua vez, aponta que 78,2% dos procedimentos realizados no Brasil seriam subsidiados pelo SUS. No entanto, nos dados divulgados pelo MS até 2019, os quais refletem, segundo o órgão, as taxas totais de transplante em território nacional, independente do financiamento, verifica-se uma diferença de 9,7% (3.601), para menos, em relação aos dados apresentados pela ABTO no mesmo período. Até o momento da coleta para este estudo o MS não havia disponibilizado os dados de TCTHs de 2020. Considerando que o Brasil é referência mundial em transplantes, a constatada diferença de dados, que remete a hipóteses de subnotificação e/ou falhas no sistema de informação é preocupante2020 Gómez EJ, Jungmann S, Lima AS. Resource allocations and disparities in the Brazilian health care system: insights from organ transplantation services. BMC Health Serv Res 2018; 18(1):90..

Pela evolução do número de procedimentos de TCTH, por ano e tipo, registrados apenas no SIH/SUS, nota-se um crescimento expressivo de aproximadamente 292% quando se comparam os anos de 2001 e 2020. O ano de 2020, no entanto, mostrou um decréscimo importante (16,7%) em relação a 2019, provável reflexo da pandemia de COVID-19, que promoveu uma alteração aguda na organização e nos investimentos da área da saúde2121 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria nº 188, de 3 de fevereiro de 2020. Declara Emergência em Saúde Pública de importância Nacional (ESPIN) em decorrência da Infecção Humana pelo novo Coronavírus (2019-nCoV). Diário Oficial da União 2020; 4 fev..

Nestas primeiras duas décadas do século XXI, o procedimento mais frequente foi o transplante autólogo de sangue periférico, em consonância com estatísticas mundiais55 Niederwieser D, Baldomero H, Szer J, Gratwohl M, Aljurf M, Atsuta Y, Bouzas LF, Confer D, Greinix H, Horowitz M, Iida M, Lipton J, Mohty M, Novitzky N, Nunez J, Passweg J, Pasquini MC, Kodera Y, Apperley J, Seber A, Gratwohl A. Hematopoietic stem cell transplantation activity worldwide in 2012 and a SWOT analysis of the Worldwide Network for Blood and Marrow Transplantation Group including the global survey. Bone Marrow Transplantation 2016; 51(6):778-785.. Nas primeiras quatro posições, intercalam-se os tipos de transplante autólogo e alogênico aparentado provenientes de sangue periférico e medula óssea. Na quinta e sextas posições aparecem os tipos de transplante alogênico não aparentado que, de acordo com o Redome, conta com uma fila de espera de 850 pacientes33 Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA). Transplante de Medula Óssea [Internet]. [acessado 2021 jul 25]. Disponível em: http://redome.inca.gov.br/paciente/transplante-de-medula-ossea/.
http://redome.inca.gov.br/paciente/trans...
. Nas duas últimas posições estão os TCTHs realizados a partir de células de cordão umbilical, que representa apenas 1,5% dos procedimentos no período estudado.

O Brasil conta, atualmente, com 33 bancos de sangue de cordão umbilical e placentário, sendo 14 públicos e 19 privados. Em números, realizaram-se apenas 52 transplantes aparentados e 402 não aparentados a partir dessa técnica, uma média de pouco mais de 22 transplantes/ano. Esses números mostram a baixa participação desse tipo de TCTH no país. Em contraste a Europa, que conta com 15 bancos públicos e 36 privados, pouco mais que o Brasil, realizou cerca de 400 transplantes apenas em 2015, uma taxa de 0,54 transplantes por milhão de habitantes2222 EUROCORD Non-profit organization. International Registry on Cord Blood Transplantation. Statistics [Internet]. [acessado 2021 ago 15]. Disponível em: https://www.eurocord.org/eurocord-statistics.php.
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. Esses achados merecem atenção, pois há um investimento muito alto para a manutenção desses bancos e, pelo menos quando se aborda o TCTH, parece haver subutilização.

Comparativamente, a taxa de transplantes de cordão umbilical é quase oito vezes maior na Europa do que no Brasil2222 EUROCORD Non-profit organization. International Registry on Cord Blood Transplantation. Statistics [Internet]. [acessado 2021 ago 15]. Disponível em: https://www.eurocord.org/eurocord-statistics.php.
https://www.eurocord.org/eurocord-statis...
. Uma explicação para esses valores pode ser a falta de experiência das equipes de TCTH brasileiras em trabalhar com essa técnica. Ademais, na última década ocorreram avanços expressivos no tratamento por meio da utilização de doadores haploidênticos (quando a compatibilidade é parcial), os quais apresentaram altas taxas de sucesso2323 Kwon M, Bailén R, Díez-Martín JL. Evolution of the role of haploidentical stem cell transplantation: past, present, and future. Expert Rev Hematol 2020; 13(8): 835-850.,2424 Kunacheewa C, Ungprasert P, Phikulsod P, Issaragrisil S, Owattanapanich W. Comparative Efficacy and Clinical Outcomes of Haploidentical Stem Cell Transplantation to Other Stem Sources for Treatment in Acute Myeloid Leukemia and Myelodysplastic Syndrome Patients: A Systematic Review and Meta-Analysis. Cell Transplant 2020; 29:096368972090496.. Dessa forma, é provável que equipes que transplantavam pela técnica do cordão umbilical passaram a recorrer mais a essa nova técnica.

A visualização georreferenciada a partir dos mapas reforça a distribuição desigual de TCTHs no território nacional. Ao analisarmos a evolução ao longo dos anos, no entanto, percebemos uma consolidação dos procedimentos nos grandes centros das regiões Sul e Sudeste, mas também um crescimento considerável no Nordeste e Centro-Oeste. Estudos futuros são necessários para elucidar os motivos dessas discrepâncias e para sugerir medidas para incentivar, ou tornar possível, o crescimento dos TCTHs nessas áreas menos desenvolvidas. Resultados semelhantes quanto a desigualdades regionais foram encontrados por Soares e colaboradores, no que concerne à distribuição de transplantes de órgãos sólidos1313 Soares LSS, Brito ES, Magedanz L, França FA, Araújo WN, Galato D. Solid organ transplantation in Brazil: a descriptive study of distribution and access inequalities across the Brazilian territory, 2001-2017. Epidemiol Serv Saude 2020; 29:e2018512..

Entre as limitações deste estudo destaca-se a não avaliação do local de residência das pessoas submetidas ao TCTH, o que poderia reforçar a tese da iniquidade de acesso em relação ao local de origem. Outra limitação, já citada, é a divergência de informações existentes entre as bases de dados consultadas, sem uma justificativa clara. Sugerimos que estudos futuros foquem nesses temas, a fim de possibilitar conclusões mais robustas sobre a distribuição e o acesso da população brasileira aos serviços de saúde.

Conclusão

O presente apontou um crescimento significativo no número de TCTHs realizados no Brasil nas últimas duas décadas. Apesar disso, verificou-se distribuição heterogênea de CTs no território brasileiro, a qual pode suscitar iniquidades no acesso ao tratamento, sugeridas pela concentração de procedimentos nas regiões Sudeste e Sul. Além disso, constatou-se divergências entre o número de transplantes registrados a depender da base de dados consultada, o que reforça a necessidade de padronização e aproximação entre as entidades mantenedoras e divulgadoras de dados oficiais de saúde. Acreditamos que os resultados e discussões deste estudo instiguem novas pesquisas, bem como auxiliem o aperfeiçoamento das políticas públicas, a fim de fortalecer o SUS e melhorar a equidade no acesso da população brasileira aos serviços de saúde.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    Ago 2022

Histórico

  • Recebido
    06 Out 2021
  • Aceito
    14 Abr 2022
  • Publicado
    16 Abr 2022
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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