Relação entre maturação sexual e indicadores antropométricos e pressóricos em adolescentes

Luís Eduardo Soares dos Santos Maísa de Lima Claro David de Sousa Carvalho Edina Araújo Rodrigues Oliveira Ana Roberta Vilarouca da Silva Ana Larissa Gomes Machado Wolney Lisboa Conde Luisa Helena de Oliveira Lima Sobre os autores

Resumo

Objetivou-se investigar a relação entre a maturação sexual com indicadores antropométricos e pressóricos de adolescentes. Estudo transversal de base populacional, realizado entre 2018 e 2020, com 345 adolescentes de 10 a 19 anos. Coletou-se variáveis sociodemográficas e antropométricas, pressão arterial e maturação sexual. A análise dos dados foi feita por meio da Análise de Componentes Principais, que gerou três componentes e, posteriormente, testou-se a correlação entre a maturação sexual e os componentes gerados. A maioria dos adolescentes eram do sexo feminino (53%), normotensos (66,1%) e com peso normal (73%). Houve correlação positiva entre o desenvolvimento das mamas com o componente 1 e o componente 2, e correlação negativa entre mamas e o componente 3. Nos meninos, o desenvolvimento dos genitais e pelos pubianos estiveram positivamente correlacionados com o componente 2 e inversamente correlacionados com o componente 3. Conclui-se que existe relação entre a maturação sexual e os indicadores antropométricos e pressóricos, sendo variáveis representativas de risco cardiovascular em adolescentes, mesmo que não em sua totalidade.

Palavras-chave:
Adolescente; Maturidade sexual; Indicadores Antropométricos; Pressão Arterial

Introdução

A adolescência é a fase da vida que se estende entre a infância e a idade adulta, sendo considerada um período em que o crescimento, maturação e o desenvolvimento humano potencializam-se11 Sawyer SM, Azzopardi PS, Wickremarathne D, Patton GC. The age of adolescence. Lancet Child Adolesc Health 2018; 2(3):223-228.. É nesse momento que surgem alterações corporais influenciadas pela puberdade e pela maturidade dos órgãos sexuais22 Ré AAHN. Crescimento, maturação e desenvolvimento na infância e adolescência: Implicações para o esporte. Motri 2011; 7(3):55-67., que resultam no surgimento de caracteres sexuais secundários, modificação da massa corporal, distribuição da gordura corporal e no estirão de crescimento33 Martin RH, Uezu R, Parra SA, Arena S, Bojikian LP, Böhme MT. Auto-avaliação da maturação sexual masculina por meio da utilização de desenhos e fotos. Rev Paulista Educ Fis 2001; 15(2):212-222.

4 Siervogel RM, Demerath EW, Schubert C, Remsberg KE, Chumlea WC, Sun S, Czerwinski SA, Towne B. Puberty and Body Composition. Horm Res 2003; 60(Supl. 1):36-45.
-55 Pereira FN, Oliveira JR, Zöllner CC, Gambardella, AMD. Body weight perception and associated factors in students. J Hum Growth Develop 2013; 23(2):170-176..

Tem-se observado que as modificações do tecido adiposo, assim como a sua distribuição pelo corpo durante a adolescência são fortemente influenciadas pela puberdade. Com isso, a avaliação antropométrica é essencial para investigar possíveis fatores de risco cardiovascular nesse grupo. Contudo, para que essa avaliação seja mais robusta, é preciso considerar o processo de maturação sexual como uma variável importante66 Tumilowicz A, Beal T, Neufeld LM, Frongillo EA. Perspective: challenges in use of adolescent anthropometry for understanding the burden of malnutrition. Adv Nutr 2019; 10(4):563-575., pois estudos têm evidenciado que a maturação sexual precoce, por exemplo, se constitui como um fator de risco para uma maior incidência de sobrepeso e obesidade, principalmente no sexo feminino77 Holst D, Grimaldi PA. New factors in the regulation of adipose differentiation and metabolism. Curr Opin Lipidol 2002; 13(3):241-245.

8 Dai Y, Fu J, Liang L, Gong CX, Xiong F, Luo FH, Liu GL, Chen SK. Association between obesity and sexual maturation in Chinese children: a muticenter study. Int J Obes 2014; 38:1312-1316.
-99 Noipayak P, Rawdaree P, Supawattanabodee B, Manusirivitthaya S. Factors associated with early age at menarche among Thai adolescentes in Bangkok: A cross-sectional study. BMC Women's Health 2017; 17:16..

Em decorrência dessas alterações corporais, outro ponto que merece destaque é a pressão arterial (PA) na adolescência, visto que já foi relatado que a maturação sexual pode influenciar na variação da PA em virtude do crescimento corporal1010 Leccia G, Marotta T, Masella MR, Mottola G, Mitrano G, Golia F, Capitanata P, Guida L, Contaldo F, Ferrara LA. Sex-related influence of body size and sexual maturation on blood pressure in adolescents. Eur J Clin Nutr 1999; 53(4):333-337.. Uma pesquisa que investigou os níveis de PA e a maturação sexual entre jovens negras e brancas, verificou que a maturação sexual das meninas negras contribuiu significativamente tanto quanto o tamanho corporal nos níveis pressóricos quando comparadas às brancas. Tal condição reitera que o estágio de maturação sexual de um sujeito na medição da pressão arterial pode ser tão importante quanto registrar a altura e o peso1111 Kozinetz CA. Sexual maturation and blood pressure levels of a biracial sample of girls. Am J Dis Child 1991; 145(2):142-146..

Nesse contexto, ainda que existam dados sobre a maturação sexual, medidas antropométricas e alterações da PA, pouquíssimas evidências têm destacado de forma agrupada essas variáveis, porém demonstram que a maturação sexual tem implicações diretas na PA e na distribuição da gordura corporal de adolescentes1212 Chen X, Wang Y. The Influence of Sexual Maturation on Blood Pressure and Body Fatness in African-American Adolescent Girls and Boys. Am J Hum Biol 2009; 21(1):105-112.. Entretanto, o entendimento sobre essa condição é incipiente e pouco compreendido. A escassez de estudos acerca da temática ratifica a necessidade de novas investigações que busquem compreender como ocorre esse fenômeno, a fim de trazer contribuições científicas ao escopo de pesquisa na área da saúde coletiva e saúde do adolescente, como forma de fornecer, sobretudo, subsídios para o cuidado em saúde desse grupo de forma integral durante a adolescência.

Assim, este estudo teve como objetivo investigar a relação entre a maturação sexual com indicadores antropométricos e pressóricos de adolescentes.

Percurso metodológico

Trata-se de uma pesquisa transversal de base populacional desenvolvida a partir do Inquérito de Saúde Domiciliar (ISAD), realizado pelo Grupo de Pesquisa em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Piauí (UFPI) em parceria com o Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da Universidade de São Paulo (USP), fruto do Doutorado Interinstitucional em Nutrição em Saúde Pública (DINTER/FSP-UFPI), que é uma parceria entre a Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP) e a UFPI, que foi feito no Município de Picos, Piauí, entre os anos de 2018 e 2020. O inquérito objetivou analisar as condições de saúde da população da zona urbana considerando todos os grupos etários.

O estado do Piauí pertence à região Nordeste do país, possui 224 municípios, limita-se com os estados do Maranhão, Bahia, Tocantins, Ceará e Pernambuco, com uma população estimada em 2019 de 3.273.227 pessoas. Apresenta quatro mesorregiões demográficas: Norte, Centro-Norte, Sudeste e Sudoeste, e o município incluído na pesquisa, Picos, caracteriza-se por apresentarem a maior densidade populacional nas regiões Sudeste, além de ser a terceira maior cidade do Estado (com uma distância de 320 km da capital Teresina). A população estimada em 2020 para Picos foi 78.431 habitantes1313 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Cidades e Estados: Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2020.. Na cidade existe Campus da UFPI, responsável pela condução da pesquisa, o que possibilitou a coleta e o processamento dos dados.

Os participantes do estudo foram adolescentes de ambos os sexos com idade entre 10 e de 19 anos, que residiam em domicílio particular da zona urbana do referido município. Foram excluídos os adolescentes com comprometimento cognitivo que inviabilizasse a comunicação e adolescentes grávidas.

A amostra foi estimada com base nos dados do Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a partir da estratificação da população por faixas de idade. No ano de 2010, 73.414 habitantes residiam em Picos e contava com 16.944 domicílios particulares1414 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010: características da população e dos domicílios: resultados do universo. Sidra: sistema IBGE de recuperação automática. Rio de Janeiro: IBGE; 2010., calculando-se o número médio de indivíduos em cada grupo etário por domicílio.

Para a seleção dos participantes foi realizado o processo de amostragem por conglomerados em dois estágios: Unidades Primárias de Amostragem (UPAs) e domicílios. Considerando que os setores censitários são as menores unidades geográficas disponíveis para as quais existem dados dos residentes com características socioeconômicas semelhantes, e podem ser compostos por cerca de 300 famílias cada (em torno de 1.000 habitantes), eles foram - conforme a necessidade - divididos ou agrupados de modo que o coeficiente de variação para as suas dimensões não excedesse 10%, com a finalidade de melhorar a eficiência da amostragem. Com isso, as UPAs geradas poderiam ser constituídas por apenas um único setor censitário, uma fração de um setor censitário, ou um agrupamento de setores censitários1515 Rodrigues LARL, Silva DMC, Oliveira EAR, Lavôr LCC, Sousa RR, Carvalho RBN, Farias G, Formiga LMF, Sousa AF, Cardoso MRA, Slater B, Conde WL, Paiva AA, Frota KMG. Plano de amostragem e aspectos metodológicos: inquérito de saúde domiciliar no Piauí. Rev Saude Publica 2021; 55:118..

Dessa forma, a amostra de UPAs foi feita de maneira sistemática com base em uma lista ordenada das UPAs do município, com probabilidade proporcional ao tamanho, sendo definido o quantitativo de 24 UPAs. Além disso, o número de domicílios a serem sorteados no segundo estágio de amostragem em cada UPA foi de 261515 Rodrigues LARL, Silva DMC, Oliveira EAR, Lavôr LCC, Sousa RR, Carvalho RBN, Farias G, Formiga LMF, Sousa AF, Cardoso MRA, Slater B, Conde WL, Paiva AA, Frota KMG. Plano de amostragem e aspectos metodológicos: inquérito de saúde domiciliar no Piauí. Rev Saude Publica 2021; 55:118.. Assim, participaram da pesquisa 345 adolescentes.

A coleta de dados foi realizada nos domicílios dos participantes e, para o registro das informações, os pesquisadores utilizaram smartphones e tablets contendo o aplicativo Epicollect5, ferramenta utilizada para criação e armazenamento de formulários digitais. Para a caracterização dos dados sociodemográficos, foram coletadas informações referentes à idade, ao sexo, cor da pele autorreferida, estado civil, escolaridade e trabalho.

As variáveis antropométricas foram: estatura, peso, circunferência do pescoço (CP), prega cutânea tricipital (PCT), prega cutânea subescapular (PSE) e circunferência da cintura (CC). Os equipamentos utilizados para a mensuração foram: estadiômetro portátil; balança digital modelo OMRON (HN-289LA); trena antropométrica inelástica e flexível de 200 cm de comprimento modelo CESCORF e adipômetro científico tradicional modelo CESCORF. Todas as coletas foram feitas em duplicada, a fim de verificar e garantir a padronização da técnica, sendo os dados obtidos na mensuração expressos pela média dos dois valores1616 Lohman TG, Going SB. Body composition as-sessment for development of an international growth standard for preadolescent and adoles-cent children. Food Nutr Bull 2006; 27(4 Supl. 5):S314-S325.,1717 Lohman TG, Roche AF, Martorell R. Anthro-pometric standardization reference manual. Champaign: Human Kinetics Books; 1988..

Sendo assim, o índice de massa corporal (IMC) foi calculado por meio da divisão do peso (kg) pelo quadrado da estatura (m²), e o estado nutricional foi classificado mediante as curvas da Organização Mundial de Saúde em: magreza extrema (IMC Z-escore <-3), magreza (-3 IMC Z-escore <-2), eutrófico (-2 IMC Z-escore < de excesso de peso IMC Z-escore <2 e obesidade 2 IMC Z-escore)1818 World Health Organization (WHO). Growth reference 5-19 years. Geneva: WHO; 2007.. A medida de circunferência da cintura foi realizada sobre o ponto médio entre a última costela e a crista ilíaca1919 World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic. Geneva: WHO; 2000.. O cálculo do índice de conicidade (IC) foi feito a partir da utilização das medidas de peso, estatura e CC2020 Valdez R. A simple model-based index of ab-dominal adiposity. J Clin Epidemiol 1991; 44:955-956., conforme a fórmula apresentada abaixo:

ÍndiceC=Circunferênciadacintura(m)Pesocorporal(kg)Estatura(m)

A pressão arterial foi verificada duas vezes pelo método auscultatório clássico com esfigmomanômentro aneróide calibrado, de acordo os procedimentos recomendados na VII Diretriz Brasileira de Hipertensão. Entre os adolescentes de 10 a 17 anos a PA foi classificada de acordo com o percentil: normotenso: Pressão Arterial Sistólica (PAS)/Pressão Arterial Diastólica (PAD) <p90; pré-hipertensão: PAS/PAD ≥p90<p95 e ≥120/80 mmHg e <p95; hipertensão estágio 1: p95 e 5 mmHg acima do p99). Aqueles com idade entre 18 e 19 tiveram a PA classificada em normotensa (PAS≤120/PAD≤80), pré-hipertensão (PAS121-139/PAD 81-89) e hipertensão estágio 1 (PAS140-159/PAD90-99)2121 Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). VII Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arq Bras Cardiol 2016; 107(3):1-61..

A caracterização puberal dos adolescentes foi feita a partir da utilização de um instrumento autoavaliativo referente aos estágios (escalonado de 1 a 5) da maturação sexual proposto por Marshall e Tanner2222 Marshall WA, Tanner JM. Variations in the pattern of pubertal changes in boys. Arch Dis Child 1970; 45(239):13-23., onde os caracteres avaliados são as mamas, testículos e pelos pubianos.

Para garantir uma coleta de dados efetiva e com minimização de vieses, o grupo de pesquisadores passou por um treinamento que foi realizado num período de três semanas, com a finalidade de garantir a padronização na forma de coletar todos os dados do estudo, incluindo os itens mencionados acima.

As análises foram feitas por meio do Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), com significância estatística de p<0,05 e um intervalo de confiança de 95%. Na análise descritiva das variáveis quantitativas foram utilizadas medidas de tendência central e dispersão. Para avaliar a normalidade dos dados utilizou-se o Teste de Normalidade Kolmogorov-Smirnov (KS), ao nível de significância de 5%. Para as variáveis qualitativas foram utilizadas frequência absoluta e percentual. Ainda nessa categoria de análise, foi feita a descrição das médias e as frequências das variáveis sociodemográficas, antropométricas, pressão arterial e de maturação sexual.

Na análise inferencial, para a comparação de médias entre os grupos das varáveis que não seguiram distribuição normal, utilizou-se o teste Kruskal-Wallis entre os estágios de maturação sexual e as variáveis antropométricas e pressão arterial. Para avaliar quais grupos diferiram entre si utilizou-se a análise de post hoc de Mann-Whitney.

Além disso, foi empregada a Análise de Componentes Principais (PCA) entre as variáveis antropométricas (estatura, peso, circunferência do pescoço, prega cutânea tricipital, prega cutânea subescapular e circunferência da cintura), e pressão arterial. A partir da PCA, foram geradas três variáveis latentes, denominadas de Componentes de Risco Cardiovascular (CRCV). Foram considerados os componentes com valores de eigenvalues superiores a 0,7 e de eigenvectors superiores a 0,2. Depois da extração dos componentes, aplicou-se a rotação ortogonal Varimax. Para a adequação da amostra de acordo com o grau de correlação, foi considerado os valores estimados pelo teste Kaiser-Meyer-Olkin (KMO)2323 Joliffe IT, Morgan BJ. Principal component analysis and exploratory factor analysis. Stat Methods Med Res 1992; 1:69-95.. Por fim, verificou-se a correlação entre os estágios de maturação sexual e os CRCV gerados a partir da PCA por meio do teste de correlação de Spearman com significância estatística de p<0,05 e p<0,01.

O presente estudo foi submetido à apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Piauí e aprovado através do parecer 2.552.426, cumprido as exigências formais dispostas na Resolução 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde (CNS).

Resultados

Na análise descritiva observou-se que 53% (n=183) dos adolescentes investigados eram do sexo feminino, 57,9% (n=191) se autodeclararam pardos, 82,3% (n=284) solteiros, 17,9% (n=59) estavam na 3ª série do ensino médio e 93,5% (n=288) informaram não possuir nenhum tipo de vínculo empregatício. Já a média de idade foi de 14,58 anos (±2,38; 10-19).

No tocante à pressão arterial, observou-se que 66,1% (n=228) dos adolescentes foram classificados como normotensos. Apesar disso, foi encontrado um quantitativo significativo de indivíduos com a pressão arterial alterada (pré-hipertensão + HA estágio 1) representando 33,9% (n=117) do total da amostra (Tabela 1).

Tabela 1
Caracterização da pressão arterial e variáveis antropométricas dos adolescentes pesquisados. Picos-PI, 2020 (N=345).

Já nas variáveis antropométricas a média de altura foi de 1,61 metros (±0,10; 1,24-1,90) e o peso de 54,69 quilogramas (±13,67; 24-136,6). Quanto ao IMC, a prevalência foi o peso normal (73%) (n=252; ±3,99; 13,10-40,09), contudo, 22,6% (n=78) apresentaram o peso elevado (sobrepeso + obesidade). A média da CP foi de 30,11 cm (±2,43; 18-45), PCT com média de 16,22 cm (±6,67; 1-35), PSE com 13,73 cm (±5,85; 1-40), CC com 76,46 cm (±71,55; 35-99,75) e IC com média de 1,12 (±0,0804; 0,6-186) (Tabela 1).

Ao realizar a análise intergrupos, a Tabela 2 mostra que o IMC esteve relacionado com o desenvolvimento das mamas das meninas (p<0,001). A PAS esteve significativamente relacionada com o desenvolvimento dos genitais e dos pelos pubianos (p<0,001), assim como a PAD apenas com os pelos pubianos nos meninos (p<0,001). Em relação à CP, observa-se que a medida esteve relacionada com o desenvolvimento das mamas nas meninas e com o desenvolvimento dos genitais e pelos pubianos dos meninos (p<0,001). Nas demais variáveis não houve diferença significativa entre os grupos.

Tabela 2
Análise de comparação de grupos (estágios de maturação) com IMC, PAS, PAD, CP, PCT, PSE, CC e IC dos adolescentes pesquisados. Picos-PI, 2020 (N=345).

Já na análise intragrupos foi possível observar que, quando comparadas as variáveis antropométricas e pressão arterial segundo os estágios de maturação das mamas em meninas, o IMC daquelas que estavam nos estágios 1, 2 e 5 diferiu entre e si e as que estavam nos estágios 3 e 4 apresentaram IMC semelhante, diferindo também dos demais estágios, informação semelhante a que foi encontrada na CP. Quando comparadas com a PCT, as meninas que estavam nos estágios 1 e 2 diferiram entre si e dos demais, contudo, apresentaram igualdade nos estágios 3, 4 e 5. Na PSE notou-se que àquelas que estavam nos estágios 1 e 5 foram diferentes entre elas e os outros estágios, e as que estavam nos estágios 2, 3 e 4 apresentaram, estatisticamente, o mesmo valor. As demais variáveis (PAS, PAD, CC e IC) quando comparadas às mamas e aos pelos pubianos não demostraram variações, sendo estatisticamente semelhantes independentemente do estágio de maturação sexual.

A investigação da correlação entre as variáveis antropométricas, pressão arterial e maturação sexual dos adolescentes foi forte e positiva (Tabela 3). Somado a isso, foi observada correlação positiva entre algumas variáveis de maturação sexual com algumas variáveis antropométricas (mamas com IMC, CP, PCT, PSE e CC; genitais com CP e CC). Houve correlação positiva entre algumas variáveis de maturação dos meninos (genitais e pelos pubianos) com PAS e PAD. Entretanto, algumas variáveis apresentaram correlação negativa, sendo inversamente proporcionais, como é o caso dos genitais e pelos pubianos dos meninos com a PSE e IC, assim como as mamas com o IC nas meninas.

Tabela 3
Correlação entre as variáveis antropométricas, pressão artrial e maturação sexual dos adolescentes pesquisados. Picos-PI, 2020 (N=345).

Na Análise de Componentes Principais, a matriz rotacionada gerou 3 componentes (CRCV1, CRCV2, CRCV3). Desta forma, os 3 componentes explicaram 69,37% da variância dos dados, onde o valor do teste KMO foi de 0,725. Assim, o CRCV1 possui a maior parte da variância encontrada, e esse componente explica melhor especificamente algumas das variáveis antropométricas de composição corporal como as pregas cutâneas e IMC. O CRCV2 é mais bem descrito pelo misto da pressão arterial e variáveis antropométricas (PAS, PAD e CC). Por fim, o CRCV3 foi melhor explicado por duas variáveis antropométricas (CC e IC), conforme descrito na Tabela 4.

Tabela 4
Descrição dos componentes fatoriais para caracterização de riscos cardiovasculares nos adolescentes pesquisados por meio da matriz rotacionada. Picos-PI, 2020 (N=345).

O teste de correlação entre os componentes encontrados e os estágios de maturação sexual indicou que nas meninas houve correlação positiva entre o desenvolvimento das mamas com o CRVC1 (r=0,229, p=0,002) e o CRCV2 (r=0,226, p=0,002), e correlação negativa entre mamas e o CRVC3 (r=-0,155, p=0,038). Entre os meninos, observa-se que o desenvolvimento dos genitais e pelos pubianos estiveram positivamente correlacionados com o CRVC2 (r=0,417, p=0,000; r=0,465, p=0,000) e inversamente correlacionados com o CRVC3 (r=-0,233, p=0,004; r=-0,207, p=0,010) (Tabela 5).

Tabela 5
Correlação entre os componentes (fatores) e os estágios de maturação dos adolescentes pesquisados. Picos-PI, 2020 (N=345).

Discussão

A verificação da pressão arterial mostrou que entre os adolescentes boa parcela do quantitativo total foi considerada pré-hipertensa, sendo que 21,4% e 12,5% foram classificados com hipertensão arterial estágio 1, estando em consonância com um estudo realizado no Texas, onde 29% dos adolescentes estavam também pré-hipertensos2424 Shipp EV, Cooper SP, Jiang L, Trueblood AB, Ross J. Influence of Work on Elevated Blood Pressure in Hispanic Adolescents in South Texas. Int J Environ Res Public Health 2019; 16(7):1096..

A Hipertensão Arterial Sistêmica tem apresentado índices crescentes entre a população mais jovem em todo o mundo. Apesar dessa problemática, o diagnóstico tem sido feito de forma tardia por causa da falta de inclu são da medida da pressão arterial como rotina no exame físico2525 Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Departamento Científico de Nefrologia. Hipertensão arterial na infância e adolescência. Rio de Janeiro: SBP; 2019.. Na realidade brasileira, existem apontamentos de uma elevação dos níveis pressóricos entre esse grupo específico, caracterizando-a como um problema de saúde pública que demanda estratégias reais de superação. Por não ser uma condição isolada do nosso país, tal agravo à saúde também é realidade entre os adolescentes mundialmente, pois pesquisas realizadas na América do Norte e Europa, por exemplo, evidenciaram níveis pressóricos alterados entre os jovens2626 Lurbe E, Agabiti-Rosei E, Cruickshank JK, Dominiczak A, Erdine S, Hirth A. European Society of Hypertension guidelines for the management of high blood pressure in children and adolescents. J Hypertens 2016; 34(10):1887-1920.,2727 Flynn JT, Kaelber DC, Baker-Smith CM, Blowey D, Carroll AE, Daniels SR. Clinical Practice Guideline for Screening and Management of High Blood Pressure in Children and Adolescents. Pediatrics 2017; 140(3):e20171904..

Isso pode ser explicado, principalmente, pela sua relação com as causas multifatoriais, como o aumento de sobrepeso, obesidade, sedentarismo, hereditariedade, entre outros. Os adolescentes deste estudo apresentaram, em sua grande maioria, peso adequado (73%), entretanto é preocupante vislumbrar que, quando agrupados, sobrepeso e obesidade somam 22,6% do total de adolescentes pesquisados, sendo que o peso e o IMC são reconhecidos como os maiores determinantes de altos níveis de pressão arterial em crianças e adolescentes, pois quanto maior o IMC, maior são os níveis pressóricos2828 Bloch KV, Klein CH, Szklo M, Kuschnir MCC, Abreu GA, Barufaldi LA. ERICA: prevalences of hypertension and obesity in Brazilian adolescents. Rev Saude Publica 2016; 50(Supl. 1):9.,2929 Figueirinha F, Herdy GVH. High Blood Pressure in Pre-Adolescents and Adolescents in Petrópolis: Prevalence and Correlation with Overweight and Obesity. Int J Cardiovasc Sci 2017; 30(3):243-250..

Como aponta um estudo realizado com 8.579 crianças e adolescentes ingleses com sobrepeso ou obesidade, onde constatou que aqueles que foram classificados com maior gravidade da obesidade, apresentaram níveis pressóricos mais elevados, tanto sistólicos quanto diastólicos3030 Skinner AC, Perrin EM, Moss LA, Skelton JA. Cardiometabolic Risks and Severity of Obesity in Children and Young Adults. N Engl J Med 2015; 373(14):1307-1317.. Para além disso, foi possível observar também que os adolescentes considerados obesos possuíam um risco duas vezes maior de desenvolverem hipertensão quando comparados aos sujeitos que tinham o peso considerado normal3131 Parker ED, Sinaiko AR, Kharbanda EO, Margolis KL, Daley MF, Trower NK, Sherwood NE, Greenspan LC, Lo JC, Magid DJ, O'Connor PJ. Change in weight status and development of hypertension. Pediatrics 2016; 137(3):e20151662..

Quanto à caracterização da maturação sexual foi observado que a maioria dos adolescentes, tanto as meninas quanto os meninos, encontravam-se no estágio 4 de maturação para gônadas e pelos, dado esse semelhante, em partes, com o que foi encontrado por Minatto3232 Minatto G, Petroski EL, Silva DAS. Gordura corporal, aptidão muscular e cardiorrespiratória segundo a maturação sexual em adolescentes brasileiros de uma cidade de colonização germânica. Rev Paul Pediatr 2013; 31(2):189-197. onde houve prevalência nos estágios 2 e 4 para ambos os sexos.

Já as meninas pesquisadas apresentaram uma similaridade cronológica entre o desenvolvimento das mamas e do pelos pubianos em todos os estágios de maturação sexual, o que não ocorreu entre os meninos. No entanto, é esperado uma certa variabilidade entre os estágios, uma vez que cada adolescente evolui de maneira diferente entre os estágios seguindo a idade3333 Van Buuren S, Van Schönbeck Y, Van Dommelen P. Collection, collation and analysis of data in relation to reference heights and reference weights for female and male children and adolescents (0-18 years) in the EU, as well as in relation to the age of onset of puberty and the age at which different stages of puberty are reached in adolescents in the EU. EFSA Support Publi 2012; 9(3):225-259..

Para cada sexo, a avaliação da maturação sexual é feita em duas etapas: mamas e pelos pubianos para as meninas, e genitais e pelos pubianos para os meninos. Com isso, alguns adolescentes poderão estar em fases diferentes para cada uma destas características, visto que a maturação delas obedece a mecanismos hormonais e genéticos diferentes. A correlação de alguns eventos pubertários é maior com um determinado componente do estadiamento do que com outro, por exemplo, a idade da menarca se correlaciona mais com o desenvolvimento mamário do que com os pelos pubianos3434 Meneses C, Ocampos DL, Toledo TB. Estagiamento de Tanner: um estudo de confiabilidade entre o referido e o observado. Adolesc Saude 2008; 5(3):54-56..

Os resultados deste estudo demonstraram também que, em alguns casos, as médias de algumas variáveis antropométricas aumentaram gradativamente de acordo como o aumento dos estágios de maturação sexual, fato esse que pode ser observado no IMC das meninas, que foi maior naquelas que se encontravam no estágio 5 em relação àquelas que estavam nos demais estágios. Para Karlberg3535 Karlberg J. Secular Trends in Pubertal Development. Horm Res 2002; 57(Supl. 2):19-30. e Suliga3636 Suliga E. Visceral adipose tissue in children and adolescents: a review. Nutr Res Rev 2009; 22(2):137-147. a altura é caracterizada como um bom indicador de saúde para adolescentes, estando fortemente associada aos estágios de maturação sexual. De acordo com Tanner3737 Tanner JM. Growth and maturation during adolescence. Nutr Rev 1981; 39(2):43-55., a altura está associada com todas as mudanças na fase da puberdade, e não apresenta associação com o peso. Porém, nesta pesquisa não foi possível avaliar esse tipo de resultado, visto que ambas as variáveis não foram analisadas isoladamente, mas sim a relação entre elas (IMC).

Em um estudo que avaliou a associação entre estado nutricional, composição corporal e maturação sexual em adolescentes, evidenciou-se prevalência de excesso de peso entre o sexo feminino (26,4%) além da composição corporal elevada (66,5). Notou-se, ainda, relação entre excesso de peso com excesso de gordura corporal e obesidade abdominal; o percentual de gordura corporal sofreu maior influência do IMC e da idade entre os meninos e do IMC e estágio maturacional entre as meninas (p<0,001). Ao associar o estado nutricional e a maturação sexual, 48,8% dos indivíduos com excesso de peso se encontravam no limite de velocidade de crescimento3838 Gentil MS, Oliveira CC, Silva HMBS. Relationship between bodyfat and sexual maturation of adolescents. Braspen J 2018; 33(1):70-75.. Pinto et al.3939 Pinto ICS, Arruda LKG, Diniz AS, Cavalcanti AMTS. Prevalência de excesso de peso e obesidade abdominal, segundo parâmetros antropométricos, e associação com maturação sexual em adolescentes escolares. Cad Saude Publica 2010; 26(9):1727-1737. destacam que há um incremento significativo no excesso de peso e obesidade abdominal principalmente nos estágios finais da maturação sexual.

A maturação dos genitais e dos pelos pubianos esteve significativamente relacionada com a pressão arterial sistólica, assim como a pressão arterial diastólica apenas com os pelos pubianos nos meninos. Em um estudo realizado com 416 adolescentes, foi observado que a influência da maturação sexual nos valores de pressão arterial deve-se, principalmente, aos efeitos dissociados das variáveis estatura e massa corporal4040 Gaya AR, Cardoso MFDS, Gaya AC. A Efeitos da maturação sexual nos níveis de pressão arterial em crianças e adolescentes do sexo masculino: associação com as variáveis massa corporal, estatura e idade cronológica. Rev Bras Educ Fis Esporte 2005; 19(3):199-207.. Por outro lado, um estudo que comparou as proporções entre meninos e meninas púberes e pós-púberes, não demonstrou diferenças significativas de pressão arterial4141 Martins RV, Watanabe PL, Silva MP, Mazzardo O, Guimaraes RF, Bozza R, Campos W. Sexual maturation, physical activity and food consumption: association with the components of metabolic syndrome in adolescentes. Adolesc Saude 2018; 15(4):16-26..

Em relação à circunferência do pescoço, observa-se que a medida esteve relacionada com o desenvolvimento das mamas nas meninas e com o desenvolvimento dos genitais e pelos pubianos dos meninos. Assim como os resultados encontrados neste estudo, outra pesquisa constatou um crescente aumento da circunferência do pescoço concomitantemente à evolução dos estágios de maturação sexual4242 Medeiros RMV, Arrais RF, Azevedo JCV, Rêgo JTP, Medeiros JA, Andrade RD, Dantas PMS. Contribution of anthropometric characteristics to pubertal stage prediction in young male individuals. Rev Paul Pediatr 2014; 32(3):229-235.. Todavia, não foram encontrados estudos que explicassem ou analisassem a relação entre essa variável e a maturação sexual.

Nas demais variáveis antropométricas não houve diferença significativa entre os grupos. No caso nas pregas cutâneas, não houve diferença significativa entre os estágios de maturação sexual, corroborando com outras pesquisas4242 Medeiros RMV, Arrais RF, Azevedo JCV, Rêgo JTP, Medeiros JA, Andrade RD, Dantas PMS. Contribution of anthropometric characteristics to pubertal stage prediction in young male individuals. Rev Paul Pediatr 2014; 32(3):229-235.

43 Veldre G, Jurimae T. Anthropometric parameters and sexual maturation in 12- to 15-year-old Estonian boys. Anthropol Anz 2004; 62(2):203-215.

44 Himes JH. Examining the evidence for recent secular changes in the timing of puberty in US children in light of increases in the prevalence of obesity. Moll Cell Endocrinol 2006; 25(254-255):13-21.

45 Buyken AE, Bolzenius K, Karaolis-Danckert N, Günther AL, Kroke A. Body composition trajectories into adolescence according to age at pubertal growth spurt. Am J Hum Biol 2011; 23(2):216-224.
-4646 Rogol AD, Roemmich JN, Clark PA. Growth at puberty. J Adolesc Health 2002; 31(Supl. 6):192-200.. Nesse sentido, essa condição pode ser explicada porque nos meninos o aumento do peso nessa fase é acompanhado, principalmente, pelo ganho de massa muscular (de 80% para 90%) e pela estabilização nos níveis de massa de gordura, o que acaba propiciando poucas modificações nos níveis absolutos de gordura subcutânea4747 Mihalopoulos NL, Holubkov R, Young P, Dai S, Labarthe DR. Expected Changes in Clinical Measures of Adiposity During Puberty. J Adolesc Health 2010; 7(4):360-366.,4848 Demerath EW, Li J, Sun SS, Chumlea WC, Remsberg KE, Czerwinski SA, Towne B, Siervogel RM. Fifty-year trends in serial body mass index during adolescence in girls: the Fels Longitudinal Study. Am J Clin Nutr 2004; 80(2):441-446..

Contudo, quando agrupadas variáveis antropométricas, clínicas e de maturação sexual dos adolescentes e analisadas suas correlações dentro da matriz de PCA, houve a presença de correlação forte e positiva entre elas. Confirmando essa condição, outros estudos, com delineamento similar, demonstraram que o IMC ou a adiposidade corporal podem não ser decisivos para desencadear a maturação sexual, mas o aumento da massa corporal e da adiposidade pode ser uma consequência da maturação sexual4545 Buyken AE, Bolzenius K, Karaolis-Danckert N, Günther AL, Kroke A. Body composition trajectories into adolescence according to age at pubertal growth spurt. Am J Hum Biol 2011; 23(2):216-224.,4848 Demerath EW, Li J, Sun SS, Chumlea WC, Remsberg KE, Czerwinski SA, Towne B, Siervogel RM. Fifty-year trends in serial body mass index during adolescence in girls: the Fels Longitudinal Study. Am J Clin Nutr 2004; 80(2):441-446.

49 Laron Z. Is Obesity Associated With Early Sexual Maturation? Pediatric 2004; 113(1):171-172.
-5050 Pierce MB, Leon DA. Age at menarche and adult BMI in the Aberdeen Children of the 1950s cohort study. Am J Clin Nutr 2005; 82(4):733-739..

Outro ponto que merece destaque é a correlação positiva entre algumas variáveis de maturação com as clínicas, como o desenvolvimento dos genitais e dos pelos pubianos com a pressão arterial sistólica e diastólica, pois o aumento gradativo da pressão arterial pode estar associado às diversas alterações biológicas que o adolescente passa, como a maturação sexual5151 Silva KS, Farias Júnior JC. Fatores de risco associados à pressão arterial elevada em adolescentes. Rev Bras Med Esporte 2007; 13(4):237-240.. Na literatura não foi encontrado nenhum dado referente à relação dos pontos constituintes da avaliação da maturação sexual com o índice de conicidade.

Quanto aos componentes de risco cardiovascular e sua correlação com a maturação sexual, não foram encontrados dados que pudessem justificar teoricamente essa condição. Ainda assim, sugere-se que, na avaliação antropométrica de adolescentes do sexo feminino é importante considerar qual o estágio de maturação - das mamas especificamente - se encontram, uma vez que a obesidade pode levar a um desenvolvimento mamário mais precoce5252 Denzer C, Weibel A, Muche R, Sorgo W, Wabitsch M. Pubertal development in obese children and adolescents. Int J Obes 2007; 31(10):1509-1519.. Além disso, pode-se inferir que na avalição dos níveis pressóricos dos adolescentes é necessário investigar a maturação sexual deles.

Um estudo longitudinal que acompanhou durante um ano crianças e adolescentes classificadas como Metabolic Healthy Obese (MHO) e Metabolic Unhealthy Obese (MUO), ou seja, àquelas que mesmo apresentando certo grau de obesidade ainda são consideradas metabolicamente saudáveis e àquelas que juntamente ao grau de obesidade apresentam outros fatores de risco cardiovascular, respectivamente, demonstrou que o melhor preditor para MUO foi o estágio puberal e o melhor preditor para a mudança de MHO para MUO foi a entrada na puberdade. Além disso, a entrada na puberdade foi associada a piora dos níveis de pressão arterial, lipídios e níveis de glicose e aumento do índice de resistência à insulina, enquanto a mudança da puberdade média para tardia foi associada à melhora desses fatores5353 Reinehr T, Wolters B, Knop C, Lass N, Holl RW. Strong effect of pubertal status on metabolic health in obese children: a longitudinal study. J Clin Endocrinol Metab 2015; 100(1):301-308..

Dados mais recentes apontam resultados um pouco diferentes dos relatados acima, na qual uma pesquisa identificou que o excesso de peso associou-se ao estágio de maturação pós-púbere. Mesmo assim, os autores reconhecem que esse é fato contraditório, pois o excesso de peso também esteve associado à idade cronológica mais jovem. Assim, a idade cronológica desempenha um papel secundário, uma vez que os adolescentes da mesma idade encontram-se muitas vezes em diferentes fases da puberdade, por isso reconhecem, também, que a avaliação nutricional do adolescente ainda é muito complexa5454 Lima NMDS, Leal VS, Oliveira JS, Andrade MISD, Santos NFD, Pessoa JT, Aquino NB, Lira PIC. Excess weight in adolescents and associated factors: data from the ERICA study. J Pediatr (Rio J) 2021; 97(6):676-684..

Embora o presente trabalho tenha gerado muitas constatações, também apresentou algumas limitações inerentes à sua implementação, como ser de caráter transversal, uma vez que dificulta o estabelecimento de uma relação direta entre causa e efeito; a impossibilidade de realizar coleta de dados bioquímicos e a verificação da pressão arterial em momentos distintos, já que o indicado é realizar pelo menos a mensuração em três momentos diferentes e em dias distintos.

Pesquisas científicas acerca da relação da maturação sexual com riscos cardiovasculares ainda se mostram incipientes, o que pode dificultar e limitar uma sustentação teórica mais consolidada frente à temática. Por outro lado, isso mostra a autenticidade e o diferencial deste estudo quanto aos dados inéditos encontrados, podendo, portanto, serem pontos de partida para novas e futuras discussões.

Conclusão

Percebeu-se que existe relação entre o processo de maturação sexual e os indicadores antropométricos e pressóricos, sendo variáveis representativas de risco cardiovascular em adolescentes, mesmo que não em sua totalidade. Portanto, é de suma importância considerar, dentro da avaliação das medidas corporais e pressóricas, o estadiamento puberal desses sujeitos, visto que foi evidenciada a real influência de uma medida sobre a outra.

Os resultados desta pesquisa comprovaram a necessidade de se avaliar clinicamente o adolescente considerando diversos parâmetros, tendo em vista que a relação entre a maturação sexual e os indicadores de risco cardiovascular foi comprovada. Espera-se que os dados apresentados sirvam como base de reflexão para uma prática assistencial em saúde integral e, sobretudo, que sejam utilizados como instrumento de fundamentação para a implementação de ações de promoção da saúde dos adolescentes.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    Set 2022

Histórico

  • Recebido
    29 Abr 2021
  • Aceito
    12 Maio 2022
  • Publicado
    14 Maio 2022
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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