Perfil das áreas técnicas de alimentação e nutrição de Mato Grosso do Sul, Brasil: organização para tomadas de decisão

Alline Lam Orué Karine Domingos de Araújo Henrique Bello Bruna Paola Murino Rafacho Cláudia Cristina Vieira Gonçalves Pastorello Maria Ligia Rodrigues Macedo Camila Medeiros da Silva Mazzeti Sobre os autores

Resumo

Mato Grosso do Sul é líder nacional em mortes atribuíveis ao excesso de peso. O objetivo foi analisar a organização da gestão das ações da área de alimentação e nutrição dos municípios de MS. Estudo descritivo-exploratório realizado em MS, no qual cada gestor municipal de alimentação e nutrição respondeu sobre seu perfil, atuação, governança e financiamento. A análise de dados valeu-se de frequência, teste qui-quadrado e árvore de decisão. Todos participaram (n=79), a maioria era do sexo feminino (92,4%), raça/cor branca (62%), enfermeiros (45,6%) ou nutricionistas (36,7%). A gestão financeira mostrou-se tão incipiente no estado, que financiamentos específicos da área foram desprezados. A ausência de área técnica no organograma do município foi congruente com o desconhecimento de ações, metas e alocação de recursos; sua presença coincidiu com haver responsáveis técnicos formalmente indicados, política de alimentação e nutrição municipal, metas e elaboração de materiais. A árvore de decisão mostra que ter nutricionista na equipe traz efeitos positivos, como mais participação em processos decisórios. Falhas encontradas esclarecem, em parte, causas da grave situação do estado, e podem apoiar a criação de estratégias de intervenção.

Palavras-chave:
Administração de Serviços de Saúde; Atenção Primária à Saúde; Programas e Políticas de Nutrição e Alimentação; Gestão em Saúde

Introdução

A Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN), aprovada em 1999, abrange um conjunto de políticas públicas cujo propósito é melhorar as condições de alimentação, nutrição e saúde, bem como tratar os agravos relacionados a elas, no esforço para garantir a saúde e Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) da população brasileira, por meio de diretrizes que norteiam as ações de atenção nutricional no âmbito da Atenção Primária à Saúde (APS) do Sistema Único de Saúde (SUS)11 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 1ª ed. Brasília: MS; 2013..

Com vistas a organizar a Atenção Nutricional e aproximá-la do que está previsto na PNAN, de forma resolutiva, a Área Técnica de Alimentação e Nutrição (ATAN) foi instituída como responsável pela gestão dos programas e Ações de Alimentação e Nutrição (AAN), bem como pela adequação destas às singularidades locais, seja em âmbito municipal, estadual ou regional. De acordo com as diretrizes da PNAN, a ATAN deve priorizar alguns temas específicos, como a organização da atenção nutricional, a promoção da alimentação saudável, a cooperação e articulação para a SAN, e a qualificação da força de trabalho dos profissionais e equipes11 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 1ª ed. Brasília: MS; 2013.,22 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Matriz de ações de alimentação e nutrição na atenção básica de saúde. Brasília: MS; 2009..

A composição das ATAN deve ser diversificada em relação às formações, bem como as ações de alimentação e nutrição devem envolver todo o território que abrange atenção nutricional. Ao instituir as ATAN municipais, é necessário considerar as questões enfrentadas pela alimentação e nutrição nas últimas décadas, com grandes transformações políticas, econômicas, sociais e ambientais que propiciaram modificações no padrão de consumo alimentar e, consequentemente, na saúde dos brasileiros. A PNAN, em sua revisão em 2011, chama a atenção para a transição nutricional, sendo que esta está relacionada às mudanças socioeconômicas que exercem influência no perfil alimentar da população (rápida urbanização, melhoria do acesso à saúde, aumento da escolaridade e do poder aquisitivo da população), as quais provocaram declínio no nível de atividade física, diminuição do consumo de alimentos in natura ou minimamente processados e aumento do consumo de produtos ultraprocessados11 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 1ª ed. Brasília: MS; 2013..

Sob esse novo cenário, houve redução das taxas de desnutrição, retardo estatural infantil e deficiências de micronutrientes, mas, simultaneamente, o Brasil tem enfrentado aumento significativo do sobrepeso e obesidade: em 2019, o país já apresentava 63% da população adulta com excesso de peso e 28,5% diagnosticados com obesidade, que se constitui como um dos maiores problemas de saúde pública atual11 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 1ª ed. Brasília: MS; 2013.,33 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Situação alimentar e nutricional no Brasil: excesso de peso e obesidade da população adulta na Atenção Primária à Saúde. Brasília: MS; 2020.. Em Mato Grosso do Sul (MS), as frequências de adultos com sobrepeso ou obesidade foram ainda mais elevadas que a média nacional, com 36,6% da população obesa e 64,5% com excesso de peso. Destaca-se, ainda, que constitui o terceiro estado com mais casos de obesidade no país e o primeiro em número de mortes atribuíveis ao excesso de peso, com 959,7 mortes por milhão de habitantes33 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Situação alimentar e nutricional no Brasil: excesso de peso e obesidade da população adulta na Atenção Primária à Saúde. Brasília: MS; 2020.,44 Rezende LFM, coordenador. A epidemia de obesidade e as DCNT: Causas, custos e sobrecarga no SUS [Internet]. 2021 [acessado 2022 abr 28]. Disponível em: https://rezendelfm.github.io/obesidade-e-as-dcnt/.
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No mesmo sentido, a Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL) revela aumento em fatores de risco ligados à alimentação, com evolução desfavorável entre 2006 e 2021, como sobrepeso/obesidade, consumo abusivo de álcool, hipertensão arterial e diabetes, que são problemas diretamente ligados a ações das ATAN no país55 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Vigilância em Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Vigitel Brasil 2006: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: MS; 2007.,66 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis. Vigitel Brasil 2021: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico: estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal em 2021. Brasília: MS; 2022..

A fim de que os hábitos de alimentação saudável sejam fortalecidos na população, entre outras estratégias para a redução dos casos de sobrepeso e obesidade no âmbito da APS, é necessário investir tempo, recurso humano e dedicação na organização da gestão municipal de saúde, para que ocorra o planejamento de ações por técnicos capacitados no tema, preferencialmente organizados e formalizados como ATAN, com a correta alocação de recursos, com vistas a elevar as chances de resolutividade de um dos principais desafios que o SUS vem enfrentando nos últimos anos: o excesso de peso e as Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT). Tais problemas reduzem a expectativa de vida geral dos brasileiros em três anos, com 74% de mortes prematuras por DCNT e, ao considerar apenas o recorte de custos do SUS em 2019, tem-se aproximadamente 1,5 bilhão de reais atribuíveis a sobrepeso/obesidade, o equivalente a 22% de todo o valor gasto com DCNT33 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Situação alimentar e nutricional no Brasil: excesso de peso e obesidade da população adulta na Atenção Primária à Saúde. Brasília: MS; 2020.,44 Rezende LFM, coordenador. A epidemia de obesidade e as DCNT: Causas, custos e sobrecarga no SUS [Internet]. 2021 [acessado 2022 abr 28]. Disponível em: https://rezendelfm.github.io/obesidade-e-as-dcnt/.
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Apesar de primordial, uma ATAN composta de membros qualificados é dificilmente alcançada, devido ao despreparo dos profissionais para trabalhar com gestão em saúde, que, segundo estudo sobre gestão do trabalho77 Magnago C, Pierantoni CR. Dificuldades e estratégias de enfrentamento referentes à gestão do trabalho na Estratégia Saúde da Família, na perspectiva dos gestores locais: a experiência dos municípios do Rio de Janeiro (RJ) e Duque de Caxias (RJ). Saude Debate 2015; 39(104):9-17.(p.13), se dá pelas “limitações impostas por um processo de formação deficiente, que não prepara os profissionais para aceitar e atuar na perspectiva do modelo de gestão apregoado pelo SUS; a infraestrutura precária; e os vínculos e a remuneração praticados”, que remetem à falta de cultura de incentivo e de atribuir a devida importância à organização da gestão.

Considerando a necessidade do mapeamento das ações de gestão sobre A&N, para otimizar as ações em saúde, o objetivo deste estudo foi analisar a organização da gestão das ações da área de alimentação e nutrição dos municípios de Mato Grosso do Sul.

Materiais e métodos

Estudo descritivo-exploratório, transversal, de abordagem quantitativa e com base em dados primários, desenvolvido em MS, com todos os 79 municípios - a maioria (n=65) com menos de 30 mil habitantes -, no final do ano de 2020, em meio à pandemia de COVID-19, enquanto sua incidência voltava a crescer no estado, com maior risco de hospitalização e/ou óbito entre pessoas com DCNT. Todos os gestores da ATAN foram convidados a participar do estudo, totalizando 79 participantes (universo amostral total), um por município, segundo a ordem de preferência: 1) gestor da área de A&N; 2) gestor da APS; 3) Secretário Municipal de Saúde. Tal preferência foi determinada tendo em vista a maior proximidade do gestor da área de A&N com a pauta do questionário, sem excluir os municípios que não apresentam este cargo e/ou função na secretaria municipal de saúde (SMS).

A coleta de dados ocorreu de forma on-line, entre outubro e dezembro de 2020, com a Gerência Técnica Estadual de Alimentação e Nutrição (GEAN) fazendo o intermédio com as gerências técnicas municipais, para que estas retornassem o estudo para diagnóstico do estado. A coleta de dados foi realizada com auxílio do questionário “Diagnóstico da Gestão das Ações de Alimentação e Nutrição nos Municípios”, por meio da ferramenta SurveyMonkey®.

Este questionário foi elaborado em parceria entre Ministério da Saúde e Instituições de Ensino Superior (IES), em 2019, exclusivamente para verificar como estava a implementação da PNAN nos municípios, com aplicação descentralizada em todo o país.

Foram coletadas informações sobre: 1) Caracterização pessoal e profissional do gestor (raça, sexo, vínculo empregatício, formação básica, cargo/função atual, tempo de serviço); 2) Organização da gestão e participação em processos decisórios (indicação formal de responsabilidade técnica pelas AAN, participação em processos decisórios no município); 3) Governança, documentos e canais norteadores (ações e metas, presença de política municipal de A&N, elaboração de materiais orientativos e protocolos sobre AAN); e 4) Gestão financeira/orçamentária (planejamento e acompanhamento dos recurso financeiros da área, acompanhamento de processos licitatórios para AAN, recebimento de incentivos para AAN e local de alocação dos recursos financeiros recebidos).

Os dados foram transformados em unidades contínuas e categóricas de acordo com a necessidade de cada informação armazenada. A análise dos dados foi conduzida de forma descritiva, com medidas de frequência, média e dispersão para descrição do panorama geral dos dados e diagnóstico da gestão da APS no estado de MS; e exploratória, para aprofundar a compreensão acerca do tema, construir hipóteses e investigar este objeto pouco explorado, em vistas de averiguar os motivos por trás dos resultados.

A análise dos dados tabulados foi realizada no software R Studio 1.4.1717®. Para análise entre os municípios divididos em dois grupos, com e sem ATAN, conduziu-se o teste de qui-quadrado, o nível de significância adotado foi de 5% (p≤0,05). Para análise da influência da existência de um Responsável Técnico (RT) formalmente indicado para área de A&N nos municípios, conduziu-se análise de valor da informação de cada uma das variáveis do questionário levantado e, a partir das variáveis consideradas relevantes e estatisticamente significativas, construiu-se um algoritmo de árvore de decisão. Para condução dessa análise utilizou o pacote rpart do software.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (CEP/UFMS) sob parecer de número 3.981.748 (CAAE: 20532419.0.0000.0021) e todos os participantes que aceitaram participar do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) on-line.

Resultados

Participaram todos os 79 gestores responsáveis pela ATAN ou pelas AAN dos municípios de MS. Como características principais, podemos observar que a maioria dos gestores são mulheres (92,4%) e autorreferiu ser da cor/raça branca (62%). A enfermagem e a nutrição foram as duas profissões mais comuns entre os gestores, com frequências de 45,6% e 36,7%, respectivamente.

A maioria dos participantes estava no cargo ou função de coordenador ou referência da APS no município (58,2%) no momento do preenchimento do questionário e mais da metade encontrava-se em tais cargos ou funções há dois anos ou menos (55,7%). O vínculo empregatício mais comumente relatado entre os gestores respondentes foi o de servidor público municipal (74,7%).

Sobre a caracterização das ATAN municipais de MS, observou-se que municípios que referiram ter área técnica instituída no organograma da SMS, possuíam mais RT formalmente indicados (82,8%) quando comparados com os municípios que referiram que ATAN não existia no organograma da SMS (p<0,001).

Entre os municípios que referiram existir um RT pela ATAN (n=40), observou-se que 60% destes profissionais exerciam a função há menos de 3 anos (n=24), a maioria eram nutricionistas (n=34; 85%) e mais da metade participava dos processos decisórios do planejamento e da gestão da SMS (n=27; 67,5%). Os demais resultados da caracterização dos gestores e da ATAN dos municípios de MS podem ser observados na Tabela 1.

Tabela 1
Caracterização dos gestores e das áreas técnicas de alimentação e nutrição dos municípios de MS, 2020.

Sobre a caracterização da governança e os documentos norteadores sobre as AAN, pode-se notar que, entre os municípios que referiram possuir ATAN no organograma da SMS, foi mais frequente que ações e metas da área estivessem previstas no Plano Municipal de Saúde (75,9%), no Plano Anual de Saúde (65,5%), nos Relatórios Anual e Quadrienal da Gestão (58,6%) e no Plano Plurianual (55,2%). Destaca-se também que, entre os municípios que não instituíram ATAN, foi mais comum o desconhecimento em relação às metas sobre A&N nos “Relatórios Anual e Quadrienal da Gestão” (40,8%; p=0,006) e no “Plano Plurianual” (32,7%; p=0,028), em comparação com os municípios que a instituíram.

Quando questionados sobre uma política de alimentação e nutrição municipal que orientasse a atuação da SMS na temática de A&N, observou-se que SMS que instituíram a ATAN no organograma tiveram mais respostas positivas sobre a condução da A&N na APS do que os demais municípios (p=0,034). Esse mesmo fenômeno foi observado quando o município foi questionado sobre a inserção de metas de A&N no Plano Plurianual municipal (p=0,017) e se o município elaborava protocolos/guias/manuais orientativos da APS (p=0,043). Demais informações sobre a caracterização da governança e dos documentos norteadores dos municípios de MS podem ser observados na Tabela 2.

Tabela 2
Caracterização da governança e dos documentos norteadores utilizados na gestão das áreas técnicas (n=78).

Acerca da caracterização da gestão financeira/orçamentária das AAN de MS, verificou-se que o planejamento e o acompanhamento aconteceram em menos da metade dos municípios, independentemente de possuírem ou não ATAN no organograma, porém estes últimos referiram maior insipiência na questão financeiro/orçamentária da área (com ATAN 3,4% vs. 14,3% sem ATAN). Observou-se que a maioria dos municípios não fazem reuniões frequentes com a área de gestão orçamentária para destinação dos recursos para AAN (56,4%) e também evidenciou-se que os mesmos fazem pouco ou nenhum acompanhamento e solicitações do processo licitatório relativo à área.

Sobre o recebimento de Financiamento de Ações de Alimentação e Nutrição (FAN) e incentivo financeiro para apoiar a estruturação das ações da Vigilância Alimentar e Nutricional (VAN), pode-se notar que a maioria dos municípios, independentemente da instituição de ATAN, relatam que não sabem se recebem o incentivo financeiro federal para AAN (60,3%) e de vigilância na área (61,5%). Mais informações sobre a gestão financeira e orçamentária de AAN de MS estão dispostas na Tabela 3.

Tabela 3
Caracterização da gestão financeira/orçamentária da área técnica de alimentação e nutrição (n=78).

A respeito da alocação de recursos para AAN nos municípios de MS, para o ano de 2019, podemos observar que quando comparamos o grupo que referiu constar ATAN no organograma em relação aos que referiram não constar, vemos diferenças entre os grupos no quesito “Avaliação Antropométrica da população ou com recortes específicos” (p=0,003), para “Aquisição e manutenção de equipamentos antropométricos” (p=0,004), “Ações de diagnóstico, prevenção e controle de carências nutricionais” (p=0,012), “Ações de diagnóstico, prevenção e controle da Desnutrição” (p=0,044), “Formação de trabalhadores da saúde em ações relacionadas à A&N” (p=0,039), e para “Avaliação do consumo alimentar” (p=0,017), sendo que os grupos se diferenciaram expressivamente na categoria “Não sei” para aqueles que referiram não possuir ATAN. Os demais resultados sobre a alocação de recursos de AAN pelos municípios do estado, podem ser observados na Tabela 4.

Tabela 4
Temas da área para os quais foram alocados recursos financeiros no último ano (n=78).

Em relação a caracterização do fomento à educação permanente e continuada em temas da área de A&N no estado, observou-se que, de maneira geral, 66,7% dos municípios referem que a SMS incentiva a ação quando voltada para a prevenção e controle do excesso de peso. Quando se fez a comparação entre os municípios com ou sem ATAN não se verificou diferença entre os grupos (79,3% vs. 59,2%, respectivamente; p=0,197), bem como quando se perguntou se as AAN contribuíram para o planejamento e realização da formação em serviço, com temática em obesidade, DCNT ou PAAS (48,3% vs. 30,6%; p=0,589).

Em relação aos resultados da análise da árvore de decisão, ilustrada na Figura 1, a partir do questionamento da existência de um profissional formalmente indicado para assuntos de A&N no município, foi observado que a ausência de nutricionistas na equipe de A&N atrelada ao desconhecimento do respondente sobre a existência de metas nos planos anuais e plurianuais (acurácia de 80%) e desconhecimento da existência de protocolos de terapia nutricional (acurácia de 67%) denunciavam a ausência de profissional formalmente indicado como responsável pelas AAN. Por outro lado, um município com nutricionistas na equipe e informado sobre ambas as questões citadas (sabia referir que “sim” ou “não”) colabora com a existência de um gestor formalmente indicado (acurácia de 82%).

Figura 1
Árvore de decisão - Probabilidade de existência de um responsável técnico formalmente indicado para todas as ações de alimentação e nutrição na Secretaria Municipal de Saúde?

Na árvore de decisão notou-se que, nos municípios com nutricionistas na equipe de A&N, a existência do profissional gestor está atrelada ao maior relato da participação da ATAN nos processos decisórios de planejamento da SMS (acurácia de 67%). E quando não há essa participação formalizada e regular na gestão e planejamento, há alta probabilidade de não existir alguém formalmente indicado à A&N (acurácia de 89%).

Discussão

As informações acerca dos profissionais à frente da ATAN ou das AAN dos municípios de MS mostraram que a maioria destes eram de raça/cor branca, do sexo feminino, enfermeiros ou nutricionistas, com vínculo empregatício de servidor público municipal, responsáveis pela APS e estavam há pouco tempo no cargo/função.

A proporção de pessoas de cor ou raça branca na gestão das AAN (62%) é maior do que a encontrada na população de MS (47,3%), o que resultou em proporções menores do que as do estado em todas as demais cores ou raças88 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Censo demográfico 2010: características da população e dos domicílios - resultados do universo. Rio de Janeiro: IBGE; 2011.. De acordo com informativo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), esta situação é reflexo da desigualdade social no país, na qual pessoas não brancas representam a maior parte da força de trabalho do Brasil, mas a taxa de subutilização de tal força é sempre maior nesta população, independentemente do grau de instrução, além de serem a maioria em ocupações informais (65,4%) e a minoria em cargos gerenciais (31,4%). Bem como a renda média mensal das pessoas ocupadas brancas foi 73,9% superior às demais. Ressalta-se que a desigualdade salarial se manteve tanto em ocupações formais como informais em 2018, também em todos os níveis de instrução e quando considerado o rendimento por hora trabalhada99 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Diretoria de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2019.. Do ponto de vista da A&N, esse perfil ser repetido entre seus gestores pode se apresentar como uma ferramenta de reforço das desigualdades sociais, sendo que a inclusão e visão dos problemas que a desigualdade social causa na alimentação e no estado nutricional das pessoas pode ser interpretada apenas sob o viés de um grupo populacional historicamente mais privilegiado.

Conforme observado, o sexo feminino ocupou 92,4% dos cargos de gestor da ATAN, ou da função de representante da área, nos municípios em que não existe tal cargo. O que já era de se esperar, pois, segundo o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) e o último censo do IBGE, as mulheres representam a maioria dos trabalhadores da área da saúde, inclusive em cargos de gestão, tanto no setor público como no privado. Cabe destacar que as principais profissões encontradas no presente estudo foram as de enfermagem e nutrição, carreiras nas quais as mulheres ultrapassam 80% e 90% de participação, respectivamente1010 Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS). Protagonismo feminino na saúde: mulheres são a maioria nos serviços e na gestão do SUS [Internet]. 2020 [acessado 2021 dez 29]. Disponível em: https://www.conasems.org.br/o-protagonismo-feminino-na-saude-mulheres-sao-a-maioria-nos-servicos-e-na-gestao-do-sus/.
https://www.conasems.org.br/o-protagonis...
,1111 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Censo Demográfico 2010: Trabalho e rendimento - Resultados da amostra. Rio de Janeiro: IBGE; 2010., principalmente porque o cuidado é considerado uma função feminina na sociedade atual.

Apesar de a enfermagem e a nutrição apresentarem-se como as profissões mais comuns nesses cargos, o que salta aos olhos é a existência de gestores com formações alheias à área da saúde e até mesmo sem ensino superior completo (esta última apenas em municípios onde a ATAN não estava presente no organograma da SMS), o que confronta a PNAN, visto que esta orienta que gestores e outros profissionais de saúde devem ser qualificados para a implementação de AAN. Isso é reforçado pelo tempo de experiência no cargo, já que mais da metade estava no cargo ou função por no máximo 2 anos, o que pode indicar que é papel recente no município ou que há grande rotatividade de recursos humanos. Ambas as hipóteses são problemáticas, uma vez que as AAN deveriam estar inseridas e organizadas nos municípios há décadas, visto que a PNAN foi aprovada em 199911 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 1ª ed. Brasília: MS; 2013., e que a alta rotatividade dos profissionais nos serviços públicos de saúde pode prejudicar a melhoria da qualidade dos mesmos, pois desmotiva a elaboração de estratégias e planos de médio e longo prazo, e barra sua execução, impedindo a continuidade e longitudinalidade tão importante neste âmbito1212 Pialarissi R. Precarização do trabalho. Rev Adm Saude 2017; 17(66):1-12..

Os resultados reforçam que a institucionalização da ATAN nos municípios tem potencial de promover melhora na organização, planejamento e envolvimento da AAN dentro da gestão do cuidado nutricional, no preparo dos territórios para enfrentamento das doenças e agravos de cunho nutricional e na ampliação da integralidade do cuidado aos usuários do SUS, por apresentar ações e metas de A&N em planos/relatórios, elaborar protocolos, guias e/ou manuais de APS e possuir RT formalmente indicados à AAN, com participação nos processos decisórios da SMS.

A definição de metas de A&N demanda conhecimento acerca da temática, do diagnóstico atualizado do território (inclusive estimativas e progressões) e dos recursos humanos, materiais e estruturais aos quais a SMS tem acesso. E a presença de tais metas nos planos e relatórios do município remetem a relevância que este atribui à área, com monitoramento sistemático que fundamenta a elaboração de estratégias para que os resultados sejam sempre satisfatórios e/ou progressivos, e, assim, percebidos, reconhecidos e incentivados. A importância da indicação formal de RT pela área será discutida mais adiante, a partir da árvore de decisão.

A elaboração de protocolos, guias e manuais de APS, bem como o acesso a estes materiais, aproxima os gestores e profissionais das evidências científicas tão cruciais à tomada de decisão em saúde, que, de acordo com Becker et al.1313 Becker LA, Rech CR, Reis RS. Acesso à informação para tomada de decisão com base em evidências segundo a percepção de Secretários Municipais de Saúde do Estado do Paraná, no ano de 2014. Cad Saude Publica 2018; 34(7):e00003918., dificilmente ocorreria por outras vias, já que a maioria dos gestores aponta dificuldades no acesso a periódicos científicos, seja por falta de tempo, alto custo ou por não saber escolher as melhores opções disponíveis. E, claro, é a participação nos processos decisórios que permite reais transformações, adequações, investimentos e melhorias à gestão da área de A&N e, consequentemente, ao serviço de saúde/nutrição e seus resultados aos usuários.

Em contrapartida, não institucionalizar a ATAN no organograma pode enfraquecer a gestão do cuidado nutricional, pois sem uma política específica na qual possa se fundamentar, o cuidado em A&N, paulatinamente essencial no atual perfil epidemiológico do país, pode se estabelecer de forma desorganizada e/ou limitada a determinadas demandas, como consultas para emagrecimento, palestras sobre hipertensão e diabetes, programas de transferência de renda e de suplementação de micronutrientes, que, apesar de importantes, não devem ser as únicas ações dentro desta temática11 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 1ª ed. Brasília: MS; 2013.. Para a efetiva implementação de ações e estratégias, para além do reconhecimento de sua importância pelos profissionais de saúde, é necessário que estes tenham acesso à política que a valide, educação permanente e/ou continuada e reflexões acerca da gestão democrática, com tomada de decisões compartilhadas1414 Silva KL, Sena RR, Seixas CT, Silva MEO, Freire LAM. Desafios da política, da gestão e da assistência para a promoção da saúde no cotidiano dos serviços. Rev Mineira Enferm 2012; 16(2):178-187..

Assim como a falta de metas de A&N no planejamento, ou o desconhecimento acerca delas, prejudica a priorização, a qualificação e o monitoramento das ações da área. Com isso, a gestão da promoção da saúde, da prevenção de doenças e do manejo destas ficam comprometidas, de forma sistêmica e prejudicial ao SUS.

No que tange AAN de maneira geral, é importante destacar que o monitoramento das questões de A&N por parte de uma ATAN bem instituída e organizada, permitiria identificar quais aspectos necessitam de mais atenção e recursos, inclusive financeiros, para aumentar a efetividade dos serviços e melhorar o diagnóstico do território. Porém, como visto anteriormente, a gestão financeira e/ou orçamentária consiste em uma fragilidade da área de A&N no estado, que perpassa pela falta de acompanhamento da gestão dos recursos e processos licitatórios da área até a inexistente ou reduzida frequência de reuniões com a área de gestão financeira/orçamentária para discutir o uso da verba da A&N. Como a maioria dos municípios referiu não saber se recebe FAN e de VAN, a escassez destas reuniões é congruente, pois, se a gestão da área de A&N desconhece os apoios financeiros disponíveis para custear de suas ações e equipamentos, dificilmente se organizará em torno da gestão orçamentária sobre estes aspectos. Desta forma, falhas na coordenação administrativa da ATAN, como despreparo profissional e consequente subutilização de recursos financeiros, enfraqueceram sua condução técnica, ferindo pelo menos metade dos objetivos da gestão1515 Souza LEPF. O SUS necessário e o SUS possível: gestão. Uma reflexão a partir de uma experiência concreta. Cien Saude Colet 2009; 14(3):911-918..

Em contraponto ao desconhecimento em larga escala dos gestores em relação às AAN, pode se destacar que o VAN, recurso instituído por meio da Portaria nº 2.975, de 14 de dezembro de 2011, para compra de equipamentos antropométricos1616 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria nº 2.975, de 14 de dezembro de 2011. Apoiar financeiramente a estruturação da Vigilância Alimentar e Nutricional. Diário Oficial da União 2011; 15 dez., estava presente na conta de 73 dos 79 municípios, com valores de até 85 mil reais no ano de 2020, de acordo com a Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso do Sul1717 Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso do Sul (SES/MS). Gerência Estadual de Alimentação e Nutrição (GEAN). O uso do FAN - Fundo de Alimentação e Nutrição. Campo Grande: SES/MS; 2021.. Já o FAN, recurso para auxiliar na estruturação e implementação de ações de alimentação e nutrição, que previamente beneficiava somente municípios com mais de 150 mil habitantes, passou a abranger municípios com mais de 30 mil habitantes a partir da Portaria nº 1.012, de 18 de maio de 20201818 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria nº 1.012, de 18 de maio de 2020. Estabelece, no ano de 2020, incentivo de custeio para a estruturação de ações de alimentação e nutrição pelas Secretarias de Saúde dos Municípios que possuem população entre 30.000 e 149.999 habitantes com base na Política Nacional de Alimentação e Nutrição - PNAN. Diário Oficial da União 2020; 25 maio., e, assim, o FAN que era disponibilizado a apenas dois municípios do estado, tornou-se possível a outros doze municípios, totalizando 20% do estado amparado por este incentivo financeiro. Em suma, as ações de vigilância e educação alimentar e nutricional, promoção da saúde, prevenção, acompanhamento, tratamento e reabilitação, principalmente relativas ao sobrepeso e à obesidade, incluindo a aquisição de equipamentos adequados para o atendimento integral dessa população (com dimensões e capacidades inclusivas, visando conforto, segurança e não estigmatização da pessoa obesa) estavam subutilizadas no estado, pois grande parte dos municípios que deveria contar com os recursos do VAN e/ou FAN para ampliar a resolutividade, escopo e acesso, subutilizava esse orçamento por falta de preparo/informação dos gestores frente às AAN.

Além destes recursos específicos e direcionados, menos da metade dos municípios afirmou realocar recursos para os diversos temas da área de A&N, salvo o da avaliação antropométrica da população ou com recortes específicos, provavelmente devido à obrigatoriedade da realização de antropometria nos beneficiários do então Programa Bolsa Família (PBF), substituído pelo Programa Auxílio Brasil, regulamentado por meio do Decreto nº 10.852, de 8 de novembro de 20211919 Brasil. Atos do Poder Executivo. Decreto nº 10.852, de 8 de novembro de 2021. Regulamenta o Programa Auxílio Brasil, instituído pela Medida Provisória nº 1.061, de 9 de agosto de 2021. Diário Oficial da União; 2021.. Cabe destacar que, entre estes temas que não recebem recurso da maioria dos municípios, estão as ações de PAAS, diagnóstico, prevenção e controle de excesso de peso e DCNT. O que parece ir na contramão na atual situação endêmica de sobrepeso/obesidade e outras condições crônicas relacionadas, que demandam estratégias de manejo urgentes, integrais e contínuas, com vistas a melhorar não apenas a saúde da população como também reduzir os custos com procedimentos ambulatoriais e hospitalizações, que custaram mais de 23 milhões de reais ao estado em 2019 (25,5% do gasto com DCNT), sem contar outras consequências onerosas de tal negligência44 Rezende LFM, coordenador. A epidemia de obesidade e as DCNT: Causas, custos e sobrecarga no SUS [Internet]. 2021 [acessado 2022 abr 28]. Disponível em: https://rezendelfm.github.io/obesidade-e-as-dcnt/.
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Ao considerar as diferenças entre municípios, é nítido como os sem ATAN instituída no organograma apresentam a maior taxa de desconhecimento sobre a alocação de recursos para os temas “Avaliação Antropométrica da população ou com recortes específicos”, “Aquisição e manutenção de equipamentos antropométricos”, “Ações de diagnóstico, prevenção e controle de carências nutricionais”, “Ações de diagnóstico, prevenção e controle da Desnutrição”, “Formação de trabalhadores da saúde em ações relacionadas à AAN” e “Avaliação do consumo alimentar”. Em outras palavras, nem mesmo os gestores ou representantes da área sabem se a educação permanente e/ou continuada e grande parte da avaliação alimentar e nutricional estão, ou não, recebendo recursos financeiros para seu desenvolvimento, monitoramento e qualificação nestes municípios.

Em linhas gerais, a falta de informação sobre a área pela qual se é responsável pode ser reflexo do pouco tempo no cargo; do despreparo profissional pela falta de educação permanente/continuada e/ou formação acadêmica nos aspectos referentes à gestão e principalmente a questões financeiras e orçamentárias; da falta de organização da área, por não se ter ATAN no organograma; pela falta de política pública municipal e/ou manual fornecido pela SMS acerca das competências do cargo; da sobrecarga de trabalho que dificulta o acompanhamento de todo o âmbito da área, em especial quando atribuído a apenas um indivíduo, ao invés de uma equipe multiprofissional e, ainda maior, quando a gestão e as ações da ponta são ambas centralizadas nesta mesma pessoa; da dificuldade ou falta de interesse pessoal do gestor, entre outros motivos possíveis.

A técnica conhecida como Árvore de Decisão se destaca por ser amplamente utilizada em sistemas de tomada de decisão aplicados à saúde, tendo em vista o seu rápido aprendizado de conceitos e facilidade de implementação2020 Medeiros ARC, Araújo YB, Vianna RPT, Moraes RM. Modelo de suporte à decisão aplicado à identificação de indivíduos não aderentes ao tratamento anti-hipertensivo. Saude Debate 2014; 38(100):104-118.,2121 Funchal JPS, Adanatti DF. Um Estudo Sobre a Classificação de Risco na Área da Saúde Utilizando Árvores de Decisão. ISys 2016; 9(3):89-111.. Sobre o algoritmo de árvore de decisão, é possível notar que a indicação formal de um profissional à área de A&N dos municípios é essencial, pois isso determinou a ausência/presença de nutricionistas na equipe (profissional capacitado para gestão e condução de AAN), o desconhecimento/conhecimento dentro do organograma da prefeitura sobre metas de A&N dentro dos planos anuais e plurianuais da gestão, e o desconhecimento/conhecimento de protocolos de terapia nutricional para atender sua população. Pensando no contexto de transição nutricional11 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. 1ª ed. Brasília: MS; 2013., piora nos fatores de risco para DCNT55 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Vigilância em Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Vigitel Brasil 2006: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: MS; 2007.,66 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis. Vigitel Brasil 2021: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico: estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal em 2021. Brasília: MS; 2022. e com o estado de MS sendo recordista de mortes atribuíveis ao excesso de peso44 Rezende LFM, coordenador. A epidemia de obesidade e as DCNT: Causas, custos e sobrecarga no SUS [Internet]. 2021 [acessado 2022 abr 28]. Disponível em: https://rezendelfm.github.io/obesidade-e-as-dcnt/.
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, se faz necessário repensar a organização da atenção nutricional de uma ótica mais institucionalizada pelas prefeituras e SMS.

Como limitações do estudo destacamos que acessar municípios de todo o estado em relação à A&N durante o período de pandemia da COVID-19 foi bastante desafiador para se obter respostas precisas e informativas no estado. E, como o presente estudo é um recorte das 82 questões coletadas desses gestores (cerca de 1 hora e meia para preenchimento), pode significar sobrecarga ao profissional e possível não entendimento a algumas questões, pois o período coincidiu com profundas transformações na gestão da APS frente à pandemia. Ainda podemos chamar a atenção para o fato de a pesquisa ser on-line, o que pode gerar dúvidas quanto ao teor de algumas questões, podendo o respondente se confundir ou deixar alguns questionamentos em branco. Porém, acreditamos que isto não comprometa muito os dados, pois a pesquisa foi aderida em totalidade pelo universo de municípios de MS.

Por se tratar de estudo pioneiro na área, devido a inexistência de dados sobre a relação entre gestão em A&N, desafio de subfinanciamento e situação epidemiológica, tanto estadual quanto nacional, a discussão dos achados precisou valer-se de publicações externas ao tema e, por vezes, além do setor saúde, principalmente por reconhecermos a importância da gestão baseada em evidências para melhor alocamento de recursos financeiros e humanos, para controle mais efetivo de agravos à saúde multifatoriais como a obesidade.

Assim, demonstrou-se que nos municípios sul-mato-grossenses com nutricionistas na equipe de A&N, a existência do profissional gestor estava atrelada ao maior relato da participação da ATAN nos processos decisórios de planejamento da SMS, o que é positivo e importante para os desafios atrelados a A&N que perpassam pela APS, pensando em resolubilidade de problemas.

Além disso, ficou nítido que a dimensão financeira/orçamentária representa grande fragilidade da gestão das AAN em MS, em especial nos municípios que não incluíram a ATAN no organograma da SMS. E o simples fato de saber para onde os recursos estão sendo direcionados já constitui grande vantagem dos municípios com ATAN sobre os demais, visto que se pode ter mais controle da situação, organizar, planejar, priorizar e monitorar a gestão da área, bem como saber quanto recurso se tem e distribuí-los de acordo com as demandas mais urgentes, para tentar alcançar resultados cada vez melhores e mais eficientes.

Também ficou destacada a importância da formalização de RT pela área de A&N pelas SMS, principalmente alguém que seja capacitado no assunto para fazer frente aos problemas relacionados a carga de má nutrição que afligem a APS e consomem recursos consideráveis do SUS.

Referências

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  • Financiamento

    Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - Processo 439696/2018-6. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Código de Financiamento 001.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    Maio 2023

Histórico

  • Recebido
    26 Jul 2022
  • Aceito
    25 Out 2022
  • Publicado
    27 Out 2022
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revscol@fiocruz.br