Nas fronteiras entre saúde, beleza e aprimoramento: uma análise sobre a Síndrome dos Ovários Policísticos

Fabíola Rohden Amandha Sanguiné Corrêa Sobre os autores

Resumo

Este artigo analisa as publicações de mulheres que sofrem da Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP), em grupos na rede social Facebook. A SOP é uma síndrome metabólica experienciada por um vasto número de mulheres em idade fértil. Entre seus sintomas, destacam-se a acne, o aumento de peso e a presença de pelos indesejáveis. Já o tratamento está concentrado na mudança de estilo de vida associado a um controle da dieta e adoção de novos hábitos. Por meio da análise dos depoimentos e imagens postados pelas participantes dos grupos, que expressam as suas transformações entre o antes e depois, constata-se que, atualmente, o diagnóstico, o tratamento e a percepção da SOP estão profundamente associados a fatores estéticos. Discute-se, por fim, como este fenômeno está atrelado ao padrão de gênero binário, centrado nas diferenças corporais, produzido historicamente, e, também, como ilustra a ênfase no aprimoramento de si, especialmente no que se refere à sua expressão nos padrões corporais e estéticos.

Palavras-chave:
Síndrome dos Ovários Policísticos; Gênero; Estética; Antropologia

Introdução

Este artigo está inserido no estudo das novas formas de circulação de conhecimento e de acesso a tecnologias biomédicas em cenários contemporâneos e que estão atreladas a transformações corporais e subjetivas. Em particular, tem como foco discursos sobre a Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP), produzidos e veiculados entre usuárias em grupos da temática na rede social Facebook. A SOP é apresentada como uma síndrome metabólica que atingiria entre 6% e 16% das mulheres em idade reprodutiva, número que é embasado na literatura especializada e adotado nas instituições de referência, como a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO)11 Rosa-e-Silva ACJS. Conceito, epidemiologia e fisiopatologia aplicada à prática clínica. In: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Síndrome dos ovários policísticos. São Paulo: FEBRASGO; 2018. p. 1-15.. A síndrome metabólica engloba um estado de anormalidades clínicas e laboratoriais associado ao risco maior de desenvolvimento de doenças cardiovasculares, hipertensão e diabetes (Soares et al.22 Soares JM, Maciel GA, Baracat MC, Baracat EC. Repercussões metabólicas e uso dos medicamentos sensibilizadores da insulina em mulheres com síndrome dos ovários policísticos. Femina 2019; 47(9):529-534.). Afirma-se que pode afetar diversas áreas da vida da paciente, como a saúde hormonal, nutricional e reprodutiva. Por meio da análise dos depoimentos de mulheres e de suas referências aos profissionais de saúde constata-se que, atualmente, o diagnóstico, o tratamento e a percepção pública do fenômeno estão profundamente associados a fatores estéticos, como o aumento de peso, a acne e a presença de pelos indesejáveis. Embora a SOP seja alvo de grande controvérsia no campo médico, como podemos observar em Wang e Mol33 Wang R, Mol BW. The Rotterdam criteria for polycystic ovary syndrome: evidence-based criteria? Hum Reprod 2017; 32(2):261-264., Buddhavarapu44 Buddhavarapu S. Bearding, Balding and Infertile: Polycystic Ovary Syndrome (PCOS) and Nationalist Discourse in India. J Med Humanit 2020; 4(3):411-427., e entre diferentes especialistas envolvendo a disputa acerca das formas de diagnóstico e tratamento mais adequadas, nosso foco aqui será estritamente em como a síndrome é experenciada e descrita pelas participantes dos grupos analisados.

Nesse sentido, percebemos nos grupos a produção do contraste entre o que pode ser chamado de performance, conforme o conceito de Mol55 Mol A. Política ontológica: algumas ideias e várias perguntas. In: Nunes JA, Roque R, organizadores. Objectos impuros: Experiências em estudos sociais da ciência. Porto: Edições Afrontamento; 2008. p. 63-77., “atualizada” e “desatualizada” da SOP. A performance “atualizada” expressa a preferência das usuárias dos grupos no Facebook e indica suas críticas ao que consideram ultrapassado. Nesta versão, a SOP é entendida como uma síndrome metabólica que afeta “o todo”, ou seja, todas as dimensões da saúde das mulheres. O tratamento, preferencialmente multiprofissional, enfatiza uma mudança de estilo de vida, que inclui adoção de uma alimentação saudável, realização de atividade física e não consumir anticoncepcional. Esta concepção está em sintonia com formas de diagnóstico e abordagem terapêutica “corretas” e afinadas com as informações mais atualizadas. Contrasta com uma abordagem “desatualizada”, termo concebido por meio da análise das postagens no grupo, e que representa o tratamento mais tradicional e usado há bastante tempo para combater o problema. Neste último cenário, a SOP é concebida fundamentalmente como uma síndrome ovariana, tratada por ginecologistas com largo emprego de anticoncepcionais para regularização do ciclo menstrual. Entre as usuárias dos grupos não há consenso ou uma preocupação direta em adotar uma definição precisa sobre a SOP. Estão mais interessadas em resolver suas queixas, por meio de um tratamento adequado. Mas identificamos como perspectiva dominante a performance atualizada, por ser mais recomendada e aceita entre as participantes.

Como será demonstrado no decorrer do artigo, o material empírico revelou, de forma significativa, uma ênfase na mudança de estilo de vida com o objetivo de combater os problemas associados à SOP e melhorar, sobretudo, os fatores estéticos associados à síndrome. Frequentemente, este processo foi traduzido pelas imagens e descrições que reportavam o “antes” e “depois” do movimento de transformação corporal, principalmente no que se refere ao emagrecimento e à diminuição dos pelos indesejados e da acne. Sugerimos que o destaque dado à expressão do “antes” e “depois” revela a necessidade de demonstração material de que as mudanças almejadas foram conquistadas, mediante o esforço feito pelas mulheres durante o tratamento. E para dar conta de entender a importância dada à transformação, propomos que a forma pela qual a SOP é apresentada nos grupos está associada ao privilégio da lógica do aprimoramento de si, em nossa sociedade.

Aprimoramento é aqui entendido por meio da perspectiva de Rose66 Rose N. The politics of life itself: biomedicine, power, subjectivity in the twenty-first century. Princeton: Princeton University Press; 2007., que se questiona sobre o papel das ciências da vida na produção de verdades e subjetividades contemporâneas. Sua hipótese mais geral concerne à relação entre o surgimento de uma “ética somática” e sua articulação com o “espírito do biocapital”. Apresenta esta ideia por meio dos conceitos de molecularização, otimização, subjetivação, expertise e bioeconomia. Para esta análise é particularmente relevante a noção de otimização, apresentada como o uso das tecnologias médicas contemporâneas não mais apenas para curar patologias mas para controlar os processos vitais do corpo e da mente. Essas tecnologias estariam associadas à ideia do aprimoramento como algo direcionado ao futuro e ao aparecimento de indivíduos consumidores desses novos desejos e possibilidades de controle da vida. De acordo com Rose66 Rose N. The politics of life itself: biomedicine, power, subjectivity in the twenty-first century. Princeton: Princeton University Press; 2007., a inovação não está na existência da vontade ou da prática do aperfeiçoamento, mas no fato de começarem a moldar a vida dos sujeitos. Associa este processo à passagem da normalização para a customização, não apenas do corpo, mas também de sensações, desejos, habilidades emocionais e cognitivas. Em sintonia, o conceito de subjetivação serve para descrever o processo pelo qual o sujeito é levado a acreditar que a promoção da saúde é uma questão pessoal, de autogerenciamento e responsabilidade.

Sugerimos que a busca por um corpo idealizado, conforme padrões de gênero estritos, descrita pelas mulheres nos grupos sobre SOP do Facebook, ilustra este processo de aprimoramento. A ênfase na mudança de estilo de vida e nas ilustrações do “antes” e “depois” podem ser interpretadas também como algo que está ancorado nesta lógica do aprimoramento de si. Neste caso, de performatividades de gênero associadas à SOP, o aprimoramento se concentra, principalmente, na melhoria de aspectos estéticos considerados essenciais para estas mulheres e que são diretamente associados à necessidade de um equilíbrio hormonal. E se na performance “desatualizada” bastava o consumo de contraceptivos para tratar a SOP; na performance “atualizada”, predominante no material analisado, o uso do contraceptivo torna-se polêmico e a grande questão é “combater” um suposto excesso de hormônios masculinos por meio de estratégias mais globais. Nesse sentido, os sintomas associados à SOP, a descrição dos tratamentos adotados e seu sucesso revelam uma forte conexão com a projeção de um corpo feminino idealizado no qual os chamados hormônios masculinos precisariam ser altamente controlados.

Este artigo segue com a apresentação dos aspectos metodológicos da pesquisa. Na sequência, são relatados os resultados empíricos observados ao longo do acompanhamento dos grupos no Facebook, com destaque para os sintomas estéticos enfatizados pelas participantes como característicos da SOP, e causa de muito sofrimento, e suas tentativas de transformação, sinalizadas nas postagens que indicam o “antes” e “depois” da mudança de estilo de vida. Nesta direção, apresentamos com mais detalhes a síntese das observações sobre aumento de peso, pelos indesejados e acne. Na discussão final, ressaltamos como este fenômeno está atrelado ao padrão de gênero binário, centrado nas diferenças corporais, produzido historicamente.

Métodos

A abordagem proposta e os grupos no Facebook

Esta investigação está ancorada em trabalhos que discutem a relevância da internet e redes sociais no contexto contemporâneo, como Hine77 Hine C. Ethnography for the internet: embedded, embodied and everyday. Huntingdon: Bloomsbury Publishing; 2015., Segata e Rifiotis88 Segata J, Rifiotis, organizadores. Políticas etnográficas no campo da cibercultura. Brasília: ABA Publicações; 2016., Leitão e Gomes99 Leitão DK, Gomes LG. 2017. Etnografia em ambientes digitais: perambulações, acompanhamentos e imersões. Rev Antropolítica 2017; 42:41-65., Miskolci e Balieiro1010 Miskolci R, Balieiro FF. Sociologia Digital: balanço provisório e desafios. Rev Bras Sociol 2018; 6(12):132-156., problematizando o surgimento de novas formas de sociabilidade e produção identitária via os engajamentos em grupos, como no Facebook. De forma particular, torna-se fundamental atentar para a importância das mídias sociais na configuração de formas de autorrepresentação feminina que têm surgido no cenário mais recente, como observado em Dobson1111 Dobson AS. Postfeminist Digital Cultures: Femininity, Social Media, and Self-Representation. New York: Palgrave Macmillan; 2015. e Rohden e Silva1212 Rohden F, Silva JB. "Se não for pra causar nem quero": a visibilidade das transformações corporais e a produção de feminilidades por meio das cirurgias plásticas. Cad Pagu 2020; 59:e205914..

Nesta direção, realizamos o acompanhamento de seis grupos relacionados à SOP no Facebook. A inserção em campo ocorreu em setembro de 2020 através do perfil pessoal no Facebook de uma das autoras, por meio de uma busca simples na mesma rede social pelos termos “Síndrome dos Ovários Policísticos” e “SOP”. As postagens foram acompanhadas e analisadas até julho de 2021. A entrada e participação nos grupos foi diretamente negociada com as administradoras e foram informados os objetivos da pesquisa. Todos os cuidados éticos foram tomados no sentido de atentar para a preservação do anonimato das participantes e a não identificação dos grupos, incluindo o uso de nomes fictícios quando necessário. Quando reproduzidas aqui, as postagens tiveram suas grafias mantidas no original, destacando a forma particular de interação que ocorre entre os grupos.

Foram selecionados seis grupos privados, criados entre 2014 e 2019, com, no mínimo, 6 mil participantes (Grupo A: 6.763 integrantes; Grupo B: 9.401; Grupo C: 10.044; Grupo D: 11.160; Grupo E: 20.105; Grupo F: 184.818). Todos apresentavam um volume significativo de interações, que consistem em postagens, curtidas e comentários. Após o período de trabalhos de campo e acompanhamento constante dos grupos, foram privilegiadas, para uma análise de conteúdo mais aprofundada, mediante as categorias centrais da investigação, as postagens que provocaram um maior número de interações. Identificamos que essas tratavam, sobretudo, de temas relacionados à estética e à gravidez. Observamos também uma relação direta entre o processo de diagnóstico da mulher com SOP e o momento de sua entrada nos grupos. Ao serem diagnosticadas com SOP, as mulheres buscam suporte nestes espaços, seja para solucionar dúvidas, discutir temas relevantes acerca da síndrome, compartilhar queixas, entre outras possibilidades. A maioria das participantes também consomem conteúdos no Instagram e no YouTube a respeito da SOP, produzidos principalmente por profissionais da área da saúde. Como tem sido observado em estudos recentes, por exemplo Silva1313 Silva JB. Doença do silicone e internet: reconfigurando possibilidades nas trajetórias de mulheres com implantes de silicone [dissertação]. Porto Alegre: Instituto de Filosofia e Ciências Humanas; 2021. e Cavalheiro e Rohden1414 Cavalheiro CS, Rohden F. Antes e depois: O uso de imagens de pacientes na área da saúde e as cirurgias plásticas no Facebook. Rev Edicc 2022; 8(1):17-26., tem se tornado cada vez mais frequente a utilização de espaços digitais para discutir questões relacionadas à saúde e bem-estar. Mas a novidade que ressaltamos aqui é exatamente a força ou o impacto que a sociabilidade nos grupos tem para a conformação da perspectiva “atualizada” sobre a SOP, centrada na mudança de estilo de vida e aprimoramento de si.

Observamos um perfil comum entre as participantes dos grupos no que se refere à raça/etnia, classe social e idade. Não se trata de dados coletados diretamente com elas e sistematizados de forma rigorosa mas de nossa percepção por meio das informações e imagens postadas na rede social. Assim, podemos indicar que as usuárias dos grupos eram majoritariamente brancas, entre seus 18 e 40 anos e predominantemente de classe média e classe média baixa. Algumas participantes relataram ser usuárias do Sistema Único de Saúde (SUS).

Resultados

O valor da transformação visto no “antes” e “depois”

As publicações analisadas reproduzem uma estrutura muito comum, com textos e imagens que se caracterizam pela expressão da dicotomia entre o “antes” e o “depois”, na qual o momento do “depois” parece representar uma conquista para a participante, um momento melhor do que o momento anterior. São atravessadas pela passagem do tempo, as diferentes medidas dos corpos das mulheres e sentimentos de alegria, quando a participante conquista seu objetivo, ou tristeza, quando as metas não são alcançadas. Alguns relatos são mais objetivos e contam apenas sobre o momento atual da participante, enquanto outros são mais detalhados e informam sobre o processo, desde antes do diagnóstico até o momento presente. As publicações mais detalhadas, geralmente, incluem comentários sobre o diagnóstico (consultas, exames e profissionais escolhidos), o tratamento seguido (dieta escolhida, se faz ou não atividade física e se faz uso ou não de alguma medicação), eventuais dificuldades e conquistas. O relato de Bruna pode ser entendido como um bom exemplo das postagens analisadas:

Oi, lindonaas

As 3 mulheres nas fotos sou eu em fases diferentes da minha vida

1 foto: final de 2015 estava pesando uns 63 kg tinha a vida MT corrida, me alimentava de uma forma terrível, tinha cholesterol e triglicerídes alto. Malhava MT para compensar a alimentação ruim. Tinha muita acne, vivia a base de remédio, ainda não sabia que tinha SOP, tomava anticoncepcional.

2 foto: final de 2018, estava no meu maior peso 87,5 kg. Colesterol e triglicérides estavam bons. Alimentação estava melhor, comia comida de verdade. Zero atividade física. (Tenho problema sério de coluna e acabei ficando MT sedentária). Tinha parado com anticoncepcional.

3 foto: atualmente, 75,4 kg. Em busca do equilíbrio com acompanhamento na nutricionista e endócrino. Tomando anticoncepcional e me alimentando melhor, sem restrições, apenas com equilíbrio. Atividade física leve (se minha coluna permite, faço se tenho dor não faço). -12,1 kg. Espero vir aqui com a 4 foto com meu objetivo alcançado.

Bruna apresenta três fotos para expressar o “antes” e o “depois” e contextualiza em que circunstâncias as fotos foram tiradas. Interessante observar que no caso desta participante a conquista do seu objetivo não foi realizada de uma forma linear, ou seja, sobre a segunda foto, ela conta que houve um aumento do seu peso e uma melhora em alguns aspectos da sua saúde e dos seus hábitos. Bruna comenta acerca da sua alimentação, das medidas do seu corpo, da atividade física e do consumo de anticoncepcional. Suas imagens foram produzidas em diferentes momentos e expressam as mudanças do seu corpo que estão associadas à mudança de “estilo de vida”, que é tida como necessária para uma boa administração da SOP.

É pertinente acrescentar que, quando consideramos os comentários realizados nas interações, que também foram alvo de nossa análise, notamos uma intensa busca por reforçar e auxiliar o projeto de transformação que está sendo narrado e ilustrado nas imagens. São frequentes os comentários para parabenizar as mulheres que conseguiram emagrecer. Junto a eles, perguntas e dicas sobre o que foi feito, assim como alguns desabafos de outras participantes. Quando isto acontece, a mulher que publicou busca inspirar a participante em questão, dizendo para ela não desistir do seu objetivo. Esta estrutura geral das postagens e interações foi percebida nos três eixos associados à estética, que descreveremos a seguir.

A centralidade atribuída ao aumento de peso

Nos grupos, quando se discute em relação ao aumento de peso, necessariamente, são encontrados comentários a respeito do emagrecer. As mulheres com SOP podem apresentar aumento de peso e dificuldade para emagrecer, em decorrência das alterações endócrinas no corpo. De acordo com as participantes, os principais motivos para o aumento do peso são resistência à insulina e aumento dos chamados hormônios masculinos.

Identificamos duas situações em relação à variável peso no contexto dos grupos: mulheres que apenas apresentam concentração de gordura no abdômen e mulheres que apresentam aumento das medidas do seu corpo como um todo. Em alguns momentos, estas situações podem ser vivenciadas por uma mesma mulher.

A forte presença das imagens ilustra esses dois tipos de situação nos grupos. Geralmente, é compartilhada apenas uma imagem quando se trata da concentração de gordura no abdômen. Já no caso do aumento de peso como um todo, são diversas imagens, as quais se encaixam no perfil “antes” e “depois” mencionado anteriormente. Nestas publicações, o mais comum é o compartilhamento de fotos que mostram as barrigas das mulheres. Muitos dos relatos são atravessados pela insatisfação, pela insegurança e pelo sofrimento. Algumas participantes, com frequência, relatam ter sido confundidas com mulheres grávidas, o que afeta consideravelmente a sua autoestima. Para elas, a principal causa para estes episódios é o consumo de alimentos inflamatórios, como açúcar, pães, bolos, carboidratos refinados, leite e derivados. Por esta razão, uma parte do tratamento para a SOP, que se concentra na mudança no estilo de vida, inclui a adoção de uma dieta saudável, o que, para algumas usuárias, é entendido como a adoção de uma dieta low carb (redução de carboidratos e consumo de carboidratos de qualidade, ou seja, integrais).

Como dito anteriormente, é pouco comum encontrar discussões acerca do aumento de peso que não façam referências à necessidade de emagrecimento. As mulheres que conquistam o controle dos sintomas da síndrome, principalmente dos estéticos, falam sobre a sua perda de peso e que ela foi importante para ajustar os outros sintomas. A diminuição do peso sempre aparece como um “facilitador” para conquistar o controle de outros sintomas da SOP. Encontramos, nos grupos, discursos que informam sobre a necessidade de controlar a síndrome para conseguir emagrecer. No entanto, por outro lado, encontramos comentários a respeito da necessidade de emagrecer para controlar a síndrome, configurando, assim, um cenário controverso em relação à redução de peso na SOP. Para engravidar, a recomendação é emagrecer antes. Para reduzir os pelos no rosto, também. Nesse sentido, é muito comum a menção a alimentos para consumir ou deixar de consumir com o fim de conquistar o objetivo de emagrecer.

Por meio dos comentários das participantes, foi possível identificar os principais passos para uma mulher com SOP emagrecer, os quais são divididos em três eixos: alimentação, atividade física e medicamentos ou suplementos. A alimentação se concentra na necessidade de adaptação a uma dieta com baixo consumo de carboidratos. Quanto à atividade física, a recomendação é a realização de uma atividade que exija mais força, como a musculação. Já no que diz respeito aos remédios, os principais medicamentos citados são o glifage e a metformina, comumente utilizados para tratamento de diabetes e que, neste caso, ao melhorar os índices de insulina da paciente, também auxiliariam na redução de peso. Por fim, o suplemento mio-inositol cumpre uma função semelhante aos medicamentos mencionados, no que se refere à promoção da redução de peso.

Nesse sentido, ao perceber o forte incentivo e pressão para o estabelecimento de uma nova rotina de cuidados, constatamos como o autogerenciamento se configura em uma categoria fundamental para pensar as mudanças em relação às medidas dos corpos das participantes. Torna-se impossível entender a ênfase na redução de peso, sem levar em conta o gerenciamento contínuo do que se come, quanto se come, que tipo de atividade física é feita, por quanto tempo é realizada, qual medicamento ou suplemento se utiliza e se é consumido da maneira correta.

O incômodo com a acne

Como já mencionado, a SOP é entendida pelas participantes dos grupos como uma doença que afeta o todo e o tratamento mais defendido deve prezar por um acompanhamento multidisciplinar. Neste sentido, não há uma única explicação para a maior presença de acne em mulheres com SOP. No entanto, a principal razão citada é aumento dos hormônios masculinos ou, em termos médicos, hiperandrogenismo. Esta mudança hormonal pode influenciar o aumento na oleosidade da pele, aumentando a acne. Por essa razão, esse parece ser o primeiro caminho a ser investigado quando as mulheres apresentam essa queixa.

Sendo esta uma das principais queixas e desconfortos das mulheres com a síndrome, é recorrente o compartilhamento de publicações com imagens de partes do corpo das mulheres que destacam a quantidade de acne e a região do corpo de maior concentração. As fotografias traziam cravos, espinhas avermelhadas e marcas de espinhas, principalmente, na região do rosto.

Paula exemplifica o desânimo de muitas com sua situação:

É, gurias, a SOP venceu. Não aguento mais acordar e me ver desse jeito! Todo mundo olha e pergunta o que aconteceu com o meu rosto [...]. Não quero chegar em dezembro, na minha tão sonhada formatura e estar com o rosto assim. Cansei!.

Interessante observar o relato de Paula e se atentar para o trecho “a SOP venceu”, caracterizando a convivência com a síndrome como uma batalha, na qual que Paula se sente como perdedora. Ao entendermos que a SOP é tratada através da mudança de estilo de vida, também se faz necessário compreender que manter este estilo de vida saudável devidamente gerenciado não é possível o tempo todo. Nestes momentos, ou até mesmo dentro do gerenciamento indicado, os sintomas estéticos como a acne podem se desordenar. Neste sentido, notamos que as participantes dos grupos parecem associar um estilo de vida saudável com uma pele com pouca ou nenhuma acne. Muitas comentam acerca da necessidade de tratar a causa e não a consequência do problema, neste caso, tratar a desregulação hormonal e não somente a acne em si. As participantes, com frequência, referem-se a isto como tratar “de dentro para fora”.

Também identificamos, no caso da acne, compartilhamentos de dicas a respeito de como controlá-la. Alimentos para consumir ou deixar de consumir, medicamentos, fitoterápicos, nomes de ácidos, cremes hidratantes, sabonetes, assim como receitas caseiras para esse fim. Como disse Bruna, “conviver com a SOP é uma verdadeira montanha russa”, “tem dias que a autoestima está lá no fim do poço aí choro muitoooooo e recomeço as rotinas de limpeza de pele” e outros cuidados. Como tantas outras mulheres, seu relato demonstra o quanto a dimensão do autocontrole e mudança de estilo de vida em direção ao manejo da SOP são percebidos como grandes batalhas que envolvem muito empenho e dedicação.

A luta contra os pelos indesejáveis

A presença de pelos indesejados é um dos sintomas que mais incomodam as mulheres com SOP. De acordo com as participantes dos grupos, a principal causa é o aumento dos chamados hormônios masculinos nos corpos das mulheres e ou a resistência à insulina. Neste sentido, o gerenciamento deste sintoma também está associado a uma mudança de estilo de vida da mulher.

Nas publicações acerca dos pelos, algumas mulheres compartilham imagens dos seus corpos para mostrar a quantidade, a espessura, a cor e a área na qual os pelos crescem com mais frequência. Através dos relatos das participantes e das imagens compartilhadas, observamos um padrão nos pelos das mulheres com SOP, o qual é caracterizado por um crescimento acelerado e em locais entendidos como característicos de corpos masculinos. Os pelos também podem ficar mais grossos e mais escuros. As principais partes do corpo retratadas nas imagens eram o rosto, pescoço e coxas das participantes. Algumas imagens também retratam pelos encravados. Conforme exemplifica Jana:

Eu tenho muito pelo no corpo todo, e da mesma forma sempre sofri. Ando mais de calça jeans do q de short, é muito difícil ver as outras meninas normais usando shorts, biquínis e tudo mais e eu não poder, odeio meu corpo e odeio muito mais esses pelos.

O relato de Jana relaciona a presença dos pelos com o sofrimento, visto que ela não se sente como “as outras meninas normais”, as quais, de acordo com ela, podem usar shorts e biquínis, enquanto ela, por ter muitos pelos, não pode ou não deve. Jana afirma que odeia seu corpo e seus pelos, apresentando uma narrativa sensível e atravessada por questões relacionadas a sua autoestima. Ela exemplifica bem as diversas publicações que encontramos nos grupos expressando a insatisfação das participantes com os seus corpos.

Da mesma forma que muitas outras participantes, Marcela também comenta:

Passo pela mesma coisa, pelos no corpo todo, sinto tanta vergonha, sofro muito com isso, no rosto para mim é o pior, pq as pessoas olham e dizem “nossa, você tem barba?” E eu não sei onde enfiar a cara, e fora isso, tenho pescoço e axilas escuras, horrível.

Em diversos momentos, nos grupos, observamos comentários que nos levam a pensar que os pelos no rosto são os que mais incomodam as participantes. Talvez isso se explique, porque o rosto é o local mais difícil ou até mesmo impossível de esconder os pelos, não tendo uma alternativa a não ser a depilação. A referência à barba aparece em diversos momentos nas publicações, ilustrando ainda mais como os pelos no rosto geram um grande incômodo nas participantes e tensionam o conceito de feminilidade, altamente valorizado pelos padrões de beleza tradicionais. A menção ao escurecimento de partes do corpo pode ser em decorrência da resistência à insulina, como em função de alguns métodos de depilação.

As publicações e comentários também trazem discussões acerca dos métodos de depilação. Cera, fio, lâmina de depilação, laser e pequenos aparelhos eletrônicos são os principais métodos discutidos nos grupos. Segundo as participantes, a cera deixa a pele mais flácida, o fio causa muita dor, a lâmina engrossa o pelo, tornando-o mais resistente e acelerando o seu crescimento, o laser requer um investimento alto e são apenas alguns tipos específicos que funcionam para mulheres com SOP e os aparelhos eletrônicos também causam dor. A dor é uma categoria que aparece com frequência nos comentários sobre a depilação. No entanto, ela se torna aceitável para a maioria das participantes quando elas pensam no resultado final do procedimento. Neste sentido, a desaceleração do crescimento e o afinamento da espessura dos pelos servem como uma compensação pela dor sentida e são, frequentemente, buscados. Mais uma vez, constatamos a produção da necessidade, em função da pressão social por um corpo e rosto femininos sem pelos, e a prescrição de tratamentos que exigem o enfrentamento do incômodo estético e a adoção de práticas regulares de autogerenciamento do problema.

Discussão

Com base no material empírico observado, gostaríamos de discutir algumas implicações do fato da SOP, na forma como é evidenciada pelas mulheres que expõem suas trajetórias diagnósticas e terapêuticas nas redes sociais, estar centrada em fatores associados à dimensão estética. Não foi o objetivo deste trabalho discutir as controvérsias médicas em torno da SOP e mesmo aprofundar o quanto os sinais estéticos estariam ou não associados a outros fatores que indicariam a síndrome, do ponto de vista médico. A meta foi analisar os discursos públicos de mulheres sobre a sua experiência com a SOP. Nesse sentido, é importante ressaltar a intensa troca de experiências e de conhecimento relativo aos sintomas, tratamentos, profissionais indicados para o acompanhamento do problema que, sem dúvida, convertem essas participantes dos grupos em verdadeiras “pacientes especialistas”, como proposto por Dumit1515 Dumit J. Drugs for life: How Pharmaceutical Companies Define Our Health. Durham and London: Duke University Press; 2012.. Na sequência, discutiremos alguns pontos que permitem avançar na interpretação deste fenômeno.

O primeiro deles se refere ao fato de que, embora as postagens sobre a SOP enfatizem a recorrência do uso de contraceptivos, não notamos menções aos debates mais amplos acerca das polêmicas envolvendo o uso desses medicamentos. De forma mais objetiva, como a grande maioria das participantes nos grupos já experimentou o tratamento com contraceptivo, medicamento utilizado preferencialmente durante muitas décadas para tratar a SOP, este se torna o foco dos debates. São, sobretudo, as partidárias da performance atualizada que condenam o uso do contraceptivo, pois apenas esconderia os sintomas da síndrome que retornariam mais intensos quando o tratamento fosse interrompido. Neste debate, o foco recai sobre a inadequação dos contraceptivos como forma de abordagem para a SOP, mas não se tem, por exemplo, uma discussão mais abrangente acerca dos seus efeitos negativos, como tem sido demonstrado em pesquisas acerca das controvérsias públicas e do ativismo de mulheres que se consideram prejudicadas pelo uso desses medicamentos como em Santos1616 Santos ACA. Adeus, hormônios: concepções sobre corpo e contracepção na perspectiva de mulheres jovens [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2018., Pissolito1717 Pissolito C. Um novo capítulo para velhos problemas: o compartilhamento online de experiências e o uso da pílula anticoncepcional [dissertação]. Campinas: Instituto de Estudos da Linguagem e Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo da Universidade Estadual de Campinas; 2021. e Kloppel1818 Kloppel B. A produção da segurança da pílula anticoncepcional: biomedicalização e gênero na ginecologia brasileira [tese]. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2022..

Podemos sugerir que, talvez, a falta de articulação com este debate ocorra por duas razões. A primeira diz respeito ao fato de que a sua relação com os contraceptivos se deu prioritariamente em decorrência dos seus efeitos estéticos secundários, como a melhoria da pele e emagrecimento, e que, de certa forma, situa esses remédios no contexto particular e, a princípio, menos politizado, dos chamados medicamentos de estilo de vida1919 Nucci M. Seria a pílula anticoncepcional uma droga de "estilo de vida"? Ensaio sobre o atual processo de medicalização da sexualidade. Sex Salud Soc 2012; 10:124-139. e do uso de implantes hormonais para fins estéticos e de aprimoramento da performance2020 Manica D, Nucci M. Sob a pele: implantes subcutâneos, hormônios e gênero. Horizontes Antropol 2017; 23:93-129.. A segunda razão se refere ao fato de que as mulheres dos grupos talvez estejam concentradas na sua mudança de estilo de vida, individualmente. As partidárias da performance atualizada da SOP já desacreditaram do valor terapêutico dos contraceptivos e estão orientadas para a busca de novos tratamentos nos quais o compromisso com a adoção de novos hábitos visando o aprimoramento estético se torna central.

Como foi possível notar nas descrições apresentadas, tanto o diagnóstico quanto o tratamento e, sobretudo, as queixas e os resultados satisfatórios, em boa parte dos casos concentram-se em aspectos estéticos. Acne, excesso de pelos e aumento de peso são vistos como indicadores fundamentais de que algo estaria errado e precisaria de acompanhamento clínico. O que gostaríamos de ponderar é exatamente o quanto esses indicadores (ou sintomas) estão associados a padrões tradicionais e estritos de beleza e feminilidade. Talvez se não estivéssemos em uma sociedade que super enfatiza normas tão exigentes em relação ao corpo feminino, as preocupações e sofrimentos de mulheres e adolescentes em relação à presença de acne, pelos e um corpo não necessariamente magro, não fossem tão intensas.

Uma pele lisa, a ausência de pelos em lugares “indesejados” e uma silhueta esguia estão associados a um modelo de corpo feminino historicamente produzido e valorizado. Nesse modelo, privilegia-se a contenção do que poderia representar os “excessos”, de aspereza da pele, de pelos, de gordura, que pudessem indicar uma proximidade maior com o corpo masculino. Conforme os padrões de gênero construídos ao longo dos últimos séculos e que ainda ecoam contemporaneamente, gêneros e corpos de homens e mulheres deveriam representar opostos complementares. Como ilustra a literatura médica, principalmente do século XIX e meados do século XX, desde o esqueleto, passando pelos músculos e outros diferentes tecidos, além de órgãos internos e externos, idealmente, deveriam demonstrar a distinção binária e radical entre masculino e feminino. Segundo Laqueur2121 Laqueur T. Making sex: body and gender from the greeks to Freud. Cambridge: Harvard Univ. Press; 1992. e Rohden2222 Rohden F. Uma ciência da diferença: sexo e gênero na medicina da mulher. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz; 2009., esta distinção estaria profundamente associada à ordem social vigente e, também, às funções sociais atribuídas diferencialmente a homens e mulheres. Atualmente, a busca pela beleza e pela “perfeição” continua profundamente marcada pela diferenciação binária de gênero e associada à desigualdade de oportunidades no contexto neoliberal, como observado em Jarrin2323 Jarrín AE. The Biopolitics of Beauty: Cosmetic Citizenship and Affective Capital in Brazil. Oakland: University of California Press; 2017. e McRobbie2424 McRobbie A. Notes on the perfect: Competitive femininity in neoliberal times. Austral Feminist Stud 2015; 30(83):3-20..

Para além disso, inspiradas no trabalho de Butler2525 Butler J. Bodies that matter. New York, London: Routledge; 1993., sugerimos que se trata de entender como o gênero é uma matriz operacional que se consubstancia e atualiza constantemente. Por meio de padrões referenciados por muitos médicos/as e almejados pelas mulheres, as práticas de intervenção e normalização se constituem em atualizações ou recitações da norma binária de gênero que prescreve a existência de corpos altamente diferenciados. Faz parte desse processo, a promoção de ideais que são compulsoriamente assumidos por muitas pessoas que não se veem em condições de reconhecer alternativas ou padrões divergentes e viáveis neste modelo de sociedade.

É nesse sentido que entendemos como os hormônios ressurgem como entidades fundamentais a orientar as performances de gênero que são vivenciadas pelas participantes dos grupos. Conforme descrito na literatura, os chamados hormônios sexuais têm ocupado um papel central da definição e mesmo na prescrição das diferenças de gênero. Como mostrou de forma pioneira Oudshoorn2626 Oudshoorn N. Beyond the natural body: an archeology of sex hormones. London: Routledge; 1994., a “descoberta” de hormônios que seriam exclusivos de corpos masculinos e femininos, nas primeiras décadas do século XX, impulsionou uma nova lógica de diferenciação entre homens e mulheres embasada nesses “mensageiros”. Além de mensageiros químicos, os hormônios se concretizam também como mensageiros que produzem os padrões de diferenciação concernentes ao binarismo de gênero. A partir de então, a produção das imagens de feminilidade e masculinidade passariam a estar associadas a essas “substâncias”.

No caso do material aqui analisado, a frequência e a insistência no que é definido como um “excesso de hormônios masculinos” em corpos femininos, que caracterizaria a SOP, revela o quanto esta lógica da diferenciação hormonal continua presente, e, também, de que forma as performatividades do gênero feminino, para as mulheres dos grupos, estão associadas a padrões estéticos relacionados com o que, historicamente, se definiu enquanto “caracteres sexuais secundários”, decorrentes da presença ou ausência de determinado hormônio.

Por fim, é importante chamar a atenção para o fato de que esta transformação, no fenômeno analisado, centrada em fatores estéticos, pode não necessariamente implicar em uma vida mais saudável. O que ponderamos é que a busca focada na supressão de fatores estéticos indesejáveis, mas que não são obrigatoriamente indicadores de problemas de saúde, pode, em si, se tornar um fator de produção de sofrimento para essas mulheres. Como discutido em Edmonds e Sanabria2727 Edmonds A, Sanabria E. Entre saúde e aprimoramento: a engenharia do corpo por meio de cirurgias plásticas e terapias hormonais no Brasil. Hist Cien Saude Manguinhos 2016; 23:193-210. e Rohden2828 Rohden F. Vida saudável versus vida aprimorada: tecnologias biomédicas, processos de subjetivação e aprimoramento. Horizontes Antropol 2017; 23:29-60., há que se considerar que a procura por uma vida aprimorada pode também levar a uma vida menos saudável ou com novos riscos associados às novas práticas. Em função disso, torna-se cada vez mais relevante analisar e entender as práticas e os discursos relativos a diagnósticos e recursos terapêuticos que circulam, especialmente na internet e redes sociais, entre as pessoas que fazem uso de diferentes tratamentos. E tentar identificar os significados e as lógicas implicados na adoção não apenas de novas práticas, mas também de ideias e moralidades associadas a possíveis diagnósticos.

Agradecimentos

Este trabalho é resultado do projeto, apoiado pelo CNPq, “Novas formas de circulação de conhecimento e de acesso a tecnologias biomédicas: cenários contemporâneos para transformações corporais e subjetivas”, coordenado por Fabíola Rohden.

Referências

  • 1
    Rosa-e-Silva ACJS. Conceito, epidemiologia e fisiopatologia aplicada à prática clínica. In: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Síndrome dos ovários policísticos. São Paulo: FEBRASGO; 2018. p. 1-15.
  • 2
    Soares JM, Maciel GA, Baracat MC, Baracat EC. Repercussões metabólicas e uso dos medicamentos sensibilizadores da insulina em mulheres com síndrome dos ovários policísticos. Femina 2019; 47(9):529-534.
  • 3
    Wang R, Mol BW. The Rotterdam criteria for polycystic ovary syndrome: evidence-based criteria? Hum Reprod 2017; 32(2):261-264.
  • 4
    Buddhavarapu S. Bearding, Balding and Infertile: Polycystic Ovary Syndrome (PCOS) and Nationalist Discourse in India. J Med Humanit 2020; 4(3):411-427.
  • 5
    Mol A. Política ontológica: algumas ideias e várias perguntas. In: Nunes JA, Roque R, organizadores. Objectos impuros: Experiências em estudos sociais da ciência. Porto: Edições Afrontamento; 2008. p. 63-77.
  • 6
    Rose N. The politics of life itself: biomedicine, power, subjectivity in the twenty-first century. Princeton: Princeton University Press; 2007.
  • 7
    Hine C. Ethnography for the internet: embedded, embodied and everyday. Huntingdon: Bloomsbury Publishing; 2015.
  • 8
    Segata J, Rifiotis, organizadores. Políticas etnográficas no campo da cibercultura. Brasília: ABA Publicações; 2016.
  • 9
    Leitão DK, Gomes LG. 2017. Etnografia em ambientes digitais: perambulações, acompanhamentos e imersões. Rev Antropolítica 2017; 42:41-65.
  • 10
    Miskolci R, Balieiro FF. Sociologia Digital: balanço provisório e desafios. Rev Bras Sociol 2018; 6(12):132-156.
  • 11
    Dobson AS. Postfeminist Digital Cultures: Femininity, Social Media, and Self-Representation. New York: Palgrave Macmillan; 2015.
  • 12
    Rohden F, Silva JB. "Se não for pra causar nem quero": a visibilidade das transformações corporais e a produção de feminilidades por meio das cirurgias plásticas. Cad Pagu 2020; 59:e205914.
  • 13
    Silva JB. Doença do silicone e internet: reconfigurando possibilidades nas trajetórias de mulheres com implantes de silicone [dissertação]. Porto Alegre: Instituto de Filosofia e Ciências Humanas; 2021.
  • 14
    Cavalheiro CS, Rohden F. Antes e depois: O uso de imagens de pacientes na área da saúde e as cirurgias plásticas no Facebook. Rev Edicc 2022; 8(1):17-26.
  • 15
    Dumit J. Drugs for life: How Pharmaceutical Companies Define Our Health. Durham and London: Duke University Press; 2012.
  • 16
    Santos ACA. Adeus, hormônios: concepções sobre corpo e contracepção na perspectiva de mulheres jovens [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2018.
  • 17
    Pissolito C. Um novo capítulo para velhos problemas: o compartilhamento online de experiências e o uso da pílula anticoncepcional [dissertação]. Campinas: Instituto de Estudos da Linguagem e Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo da Universidade Estadual de Campinas; 2021.
  • 18
    Kloppel B. A produção da segurança da pílula anticoncepcional: biomedicalização e gênero na ginecologia brasileira [tese]. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2022.
  • 19
    Nucci M. Seria a pílula anticoncepcional uma droga de "estilo de vida"? Ensaio sobre o atual processo de medicalização da sexualidade. Sex Salud Soc 2012; 10:124-139.
  • 20
    Manica D, Nucci M. Sob a pele: implantes subcutâneos, hormônios e gênero. Horizontes Antropol 2017; 23:93-129.
  • 21
    Laqueur T. Making sex: body and gender from the greeks to Freud. Cambridge: Harvard Univ. Press; 1992.
  • 22
    Rohden F. Uma ciência da diferença: sexo e gênero na medicina da mulher. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz; 2009.
  • 23
    Jarrín AE. The Biopolitics of Beauty: Cosmetic Citizenship and Affective Capital in Brazil. Oakland: University of California Press; 2017.
  • 24
    McRobbie A. Notes on the perfect: Competitive femininity in neoliberal times. Austral Feminist Stud 2015; 30(83):3-20.
  • 25
    Butler J. Bodies that matter. New York, London: Routledge; 1993.
  • 26
    Oudshoorn N. Beyond the natural body: an archeology of sex hormones. London: Routledge; 1994.
  • 27
    Edmonds A, Sanabria E. Entre saúde e aprimoramento: a engenharia do corpo por meio de cirurgias plásticas e terapias hormonais no Brasil. Hist Cien Saude Manguinhos 2016; 23:193-210.
  • 28
    Rohden F. Vida saudável versus vida aprimorada: tecnologias biomédicas, processos de subjetivação e aprimoramento. Horizontes Antropol 2017; 23:29-60.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    Fev 2024

Histórico

  • Recebido
    07 Abr 2023
  • Aceito
    26 Jun 2023
  • Publicado
    28 Jun 2023
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revscol@fiocruz.br