Autocuidado autorreferido: contribuições da Medicina Clássica Chinesa para a Atenção Primária à Saúde

Self-referred self-care: the contributions of traditional Chinese Medicine to Primary Health Care

Autocuidado auto-referido: contribuciones de la medicina clásica china a la Atención Primaria de la Salud

Octávio Augusto Contatore Charles Dalcanale Tesser Nelson Filice de Barros Sobre os autores

Resumos

As recomendações biomédicas para o autocuidado tendem a prescrições comportamentais preventivistas (heterorreferidas). A introdução de lógicas não biomédicas no Sistema Único de Saúde (SUS), como a Medicina Chinesa, não tem sido suficiente para mudar a perspectiva do autocuidado na Atenção Primária à Saúde (APS). Frente à redução do autocuidado da Medicina Chinesa na sua diáspora para o Ocidente, discute-se o potencial de enriquecimento do autocuidado a partir da totalidade de práticas da Medicina Clássica Chinesa e sua possibilidade de contribuir para os objetivos da APS. Este ensaio é baseado em três fontes: entrevistas com acupunturistas da APS, autoetnografia e análise da literatura. Conclui-se que a Medicina Clássica Chinesa fomenta o autoconhecimento, autopercepção e aprendizado (autorreferidos) pelas suas técnicas e ou sua abordagem, podendo ser um potencializador das ações de fomento ao autocuidado na APS.

Palavras clave
Atenção Primária à Saúde; Medicina Chinesa tradicional; Autocuidado


Biomedical recommendations on self-care tend towards (hetero-referred) preventive behavioral prescriptions. The incorporation of non-biomedical approaches such as Chinese medicine into the public health care system has not been enough to change perspectives on self-care in primary health care (PHC). In the face of the reduction of self-care in Chinese medicine in its diaspora to the West, the literature has discussed the potential for enhancing self-care by building on the practices of traditional Chinese medicine and its potential to contribute to the objectives of PHC. This essay draws on three sources: interviews with acupuncturists working in primary care services, autoethnography and an analysis of the literature. It is concluded that traditional Chinese medicine fosters (self-referred) self-knowledge, self- awareness and learning through its techniques or approach, potentiating actions designed to promote self-care in PHC.

Keywords
Primary health care; Traditional Chinese medicine; Self-care


Las recomendaciones biomédicas para el autocuidado tienden a prescripciones comportamentales de prevención (hetero-referidas). La introducción de lógicas no biomédicas en el Sistema Único de Salud, como la medicina china, no ha sido suficiente para cambiar la perspectiva del autocuidado en la atención primaria de la salud (APS). Ante la reducción del autocuidado de la medicina china en su diáspora hacia occidente, se discute el potencial de enriquecimiento del autocuidado a partir de la totalidad de prácticas de la medicina clásica china y su posibilidad de contribuir con los objetivos de la APS. Este ensayo se basa en tres fuentes: entrevistas con profesionales de acupuntura de la APS; autoetnografía y análisis de la literatura. Se concluyó que la medicina clásica china fomenta el autoconocimiento, la autopercepción y al aprendizaje (auto-referidos) por sus técnicas o su abordaje, pudiendo ser un potenciador de las acciones de fomento al autocuidado en la APS.

Palabras-chave
Atención primaria de la salud; Medicina china tradicional; Autocuidado


Introdução

Desde meados do século XX, com o movimento da Medicina preventiva até a atualidade, com a incorporação de ações clínicas individuais de controle baseadas no risco, observa-se no cuidado clínico biomédico a indicação para que profissionais, sobretudo da Atenção Primária à Saúde (APS), pessoas e populações assumam protagonismo preventivo e promocional da sua saúde11 Tesser CD. Por que é importante a prevenção quaternária na prevenção? Rev Saude Publica. 2017; 51:116.. A Biomedicina reconhece a importância do autocuidado, o que é observado pelo intenso apelo para a adoção dos chamados estilos de vida saudáveis, que se confundem com comportamentos preventivos das principais doenças crônicas, cada vez mais importantes com o aumento da longevidade.

Paralelamente, o autocuidado é valorizado nas medicinas tradicionais, as quais substancialmente estimulam práticas para sua efetivação. Nas últimas quatro décadas, houve uma crescente procura e valorização das chamadas Medicinas Tradicionais, Complementares e Integrativas (MTCI), entendidas como cuidados em saúde que não pertencem à mainstream medicine, com seu aumento exponencial de pesquisas científicas22 Yulia Treister-Goltzman PR. Trends in publications on complementary and alternative medicine in the medical literature. J Complement Integr Med. 2015; 12(2):111-5. Doi: https://doi.org/10.1515/jcim-2014-0055.
https://doi.org/10.1515/jcim-2014-0055...
e progressiva institucionalização de parte delas nos sistemas nacionais de saúde33 World Health Organization. WHO traditional medicine strategy: 2014-2023 [Internet]. Geneva: WHO; 2013 [citado 02 Mar 2020]. Disponível em: https://www.who.int/medicines/publications/traditional/trm_strategy14_23/en/
https://www.who.int/medicines/publicatio...
,44 Sousa IM, Tesser CD. Traditional and complementary medicine in Brazil: inclusion in the Brazilian Unified National Health System and integration with primary care. Cad Saude Publica. 2017; 33(1):e00150215.. O Brasil regulamentou e expandiu o uso de MTCI no Sistema Único de Saúde (SUS) a partir da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares55 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 971, de 4 de Maio de 2006. Dispõe sobre a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde. Diário Oficial da União. 4 Maio 2006., a qual tem sido implementada na APS66 Lima KMSV, Silva KL, Tesser CD. Práticas integrativas e complementares e relação com promoção da saúde: experiência de um serviço municipal de saúde. Interface (Botucatu). 2014; 18(49):261-72. Doi: https://doi.org/10.1590/1807-57622013.0133.
https://doi.org/10.1590/1807-57622013.01...
.

As MTCI são procuradas especialmente nas situações de doenças crônicas, em que a Biomedicina tem notórios limites de eficácia e efeitos adversos. Nessas situações, a participação dos doentes no cuidado e no seu autocuidado são altamente relevantes. Todavia, as MTCI têm sido pouco estudadas no seu potencial para o desenvolvimento de ações de autocuidado. Isso é válido também e especialmente para a Medicina Chinesa tradicional, cuja diáspora, entendida aqui como um processo migratório do conhecimento, sobrevalorizou os seus aspectos curativos, sobretudo com a prática da acupuntura, e subvalorizou o seu potencial de enriquecimento do autocuidado.

O objetivo deste ensaio é debater o potencial do autocuidado desenvolvido via Medicina Clássica Chinesa (MCC) e o empobrecimento dessa possibilidade na sua diáspora para o Ocidente, que favoreceu que alguns dos seus princípios fossem desvinculados do conjunto constitutivo da racionalidade original desse sistema médico. Metodologicamente, está baseado em literatura especializada e em uma pesquisa de doutorado, que investigou o uso da acupuntura em serviços da APS de Campinas, SP77 Contatore OA. Cuidado, acupuntura e atenção primária à saúde: conceitos em construção e correlação [tese]. Campinas: Departamento de Saúde Coletiva, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas; 2020.. Foram realizadas entrevistas com profissionais e usuários e desenvolvida uma autoetnografia sobre o aprendizado de práticas de autocuidado ensinadas em uma escola de Medicina Chinesa tradicional de São Paulo, SP(d(d)Pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Campinas, n. 61666016.0.0000.5404.). Nas entrevistas com quase todos os profissionais acupunturistas da APS, a maioria médicos, foi observado que eles aprenderam e praticavam acupuntura sob a lógica da Medicina Chinesa tradicional. Porém, igualmente relatavam pouco ou nenhum conhecimento sobre a totalidade de práticas terapêuticas que compõe a Medicina Chinesa. Os entrevistados, na maioria dos casos, mesmo demonstrando interesse em aplicar outras práticas de cuidado relacionadas à Medicina Chinesa, não tinham formação além da acupuntura ou dispunham de reduzido repertório sobre outras práticas, sobretudo àquelas que oferecem recursos para o desenvolvimento do autocuidado77 Contatore OA. Cuidado, acupuntura e atenção primária à saúde: conceitos em construção e correlação [tese]. Campinas: Departamento de Saúde Coletiva, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas; 2020..

O pressuposto aqui desenvolvido é que diversas práticas terapêuticas da Medicina Chinesa, sobretudo as que foram formuladas em seu período clássico88 Contatore OA, Tesser CD, Barros NF. Chinese medicine/acupuncture: historical notes on the colonization of a body of knowledge. Hist Cienc Saude Manguinhos. 2018; 25(3):841-58., contêm características que estimulam o desenvolvimento pessoal para um autocuidado autônomo, apesar de serem preservadas e transmitidas por professores “especializados”, mestres ou curadores99 Hemsi AR. Taijiquan e educação: trajetórias de alunos-professores da Escola Pai Lin [tese]. São Paulo: Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo; 2000.,1010 Bizerril Neto J. Mestres do Tao: tradição, experiência e etnografia. Horiz Antropol. 2005; 11(24):87-105.. Tais práticas podem ser ensinadas e estimuladas, mas são escolhidas para uso próprio a partir de um processo de significação, em que seu valor pessoal é autonomamente construído. Outro pressuposto é que parte significativa da fundamentação do saber da Medicina Chinesa tradicional é radicada em experiências e aprendizados pessoais passíveis de socialização, que podem ser enriquecedores para o estímulo ao autocuidado autorreferido - modo como propomos chamar o autocuidado autonomamente construído.

Cuidado heterônomo, cuidado autônomo, autocuidado autorreferido

Illich1111 Illich I. A expropriação da saúde: nêmeses da medicina. 3a ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1975. criticou a Biomedicina por sua iatrogenia clínica, social e cultural, mas também por sua ação no rompimento do equilíbrio entre o cuidado autônomo e heterônomo. O cuidado autônomo é mais do que aquele realizado pelas pessoas para si mesmas, ele é por elas controlado, decidido, monitorado e avaliado, tendo relação direta com o universo cultural de valores e de saberes/competências das pessoas, das comunidades e das sociedades. Menendez1212 Menendez EL. Modelos de atención de los padecimientos: de exclusiones teóricas y articulaciones prácticas. Cienc Saude Colet. 2003; 8(1):185-207. o nomeou de autoatenção e o chamamos aqui de autocuidado (embora seja comum uma restrição do escopo desse termo, concebido como orientado por saberes científicos). O autocuidado relaciona-se a conhecimentos e práticas socialmente construídas que potencializam a capacidade pessoal de atender às necessidades próprias de saúde. Geralmente é concretizado por práticas que circulam nos ambientes e grupos sociais em que as pessoas crescem e vivem, sendo que são aprendidos ao longo da vida, na educação formal e informal, como, também, no contato com curadores diversos, sobretudo os profissionais de saúde, incluindo os da APS.

Já o cuidado heterônomo refere-se a ações realizadas por um profissional ou curador que utiliza seus conhecimentos e técnicas para prescrever ações de cuidado ou cura por meio de uma relação terapêutica, geralmente iniciada pelo sujeito que se sente adoecido e procura ajuda. Quando são ações voltadas à prevenção, em parte podem ser incorporadas ao autocuidado, em parte continuam sendo manejadas profissionalmente, persistindo heterônomas. Por exemplo, para controlar a pressão arterial, uma pessoa toma hipotensores, um tratamento heterônomo preventivo decidido e prescrito profissionalmente, embora realizado em casa pelo indivíduo diariamente. O mesmo profissional pode orientar uma dieta hipossódica e caminhada diária, visando também controlar a pressão, e a pessoa pode assumir isso como um hábito preventivo e assim o realizar, caracterizando um autocuidado heterorreferido, pois é orientado heteronomamente com base nos saberes desenvolvidos pela Biomedicina.

Nesse caso, o controle da hipertensão corresponde às orientações preventivas e comportamentais que tendem, na Biomedicina, a serem diretivas e verticalizadas, dada sua fundamentação científica e técnica. Centradas na redução do risco, tais orientações prescindem de significação particular ou pessoal para além de controlar a pressão e assim evitar acidente vascular cerebral e infarto do coração: estão reduzidas às acepções de saúde-doença-cuidado construídas pela Biomedicina1313 Caponi S. A saúde como abertura ao risco. In: Czeresnia D, Freitas CM, editores. Promoção da saúde: conceitos, reflexões, tendências. 2a ed. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2009. p. 55-77.. A atuação dos profissionais de saúde hegemonicamente tem como foco o diagnóstico e tratamento ou controle de doenças e riscos, a partir do saber biomédico, que é especializado, distante e desvinculado dos usuários. Há um grande afastamento entre as concepções de saúde do profissional e o saber do universo cultural da pessoa cuidada1414 Boltanski L. As classes sociais e o corpo. 4a ed. Rio de Janeiro: Graal; 2004..

O médico e o saber biomédico valorizam o autocuidado, mas geralmente apenas ou principalmente aquele orientado pelo saber científico, ou seja, o heterorreferido, estabelecido como o adequado e desejável, que deve ser seguido independentemente de ser compreendido ou conectado com as perspectivas existenciais, percepções ou necessidades sentidas das pessoas. Mesmo com boas habilidades comunicativas, que negociem e levem em conta as subjetividades e contextos dos sujeitos, em última instância se pretende apenas conformidade das práticas de autocuidado ao que é cientificamente proposto.

Para a produção e aplicação do saber científico, não importa o que as pessoas percebem ou entendem como saúde, cuidado ou prevenção. O que importa é a validação científica do saber e a sua subsequente aceitação, a se dar em função da legitimidade epistemológica (saber científico testado e confiável) e social (do profissional de saúde). O saber científico é um saber eminentemente impessoal e de terceira pessoa1515 Varela F. Conocer: las ciencias cognitivas. Barcelona: Gedisa; 1990.,1616 Varela F, Thompson E, Rosch E. The emboied mind: cognitive science and human experience. Cambridge: MIT Press; 1991.. Mesmo que parte do autocuidado biomedicamente orientado tenha sido já incorporada na cultura e na sociedade (como talvez hoje escovar os dentes com escova e dentifrício industrializados), a sua origem e os processos de compreensão, significação e legitimação passam ao largo dos valores e saberes das pessoas, radicando-se no domínio social e cultural do saber biomédico e das outras profissões da saúde de mesma raiz.

Segundo Illich1111 Illich I. A expropriação da saúde: nêmeses da medicina. 3a ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1975., haveria nas sociedades pré-modernas um equilíbrio dinâmico entre cuidado autônomo e heterônomo. Apenas quando o cuidado autônomo é insuficiente, a situação é grave ou o sofrimento é intenso ou insuportável é que as pessoas procuravam o cuidado heterônomo, realizado por curadores especializados. Para o autor, a industrialização e expansão da Biomedicina rompeu esse equilíbrio, gerando um círculo vicioso em que há empobrecimento da cultura (que dá significação ao viver, adoecer, sofrer, cuidar, tratar e morrer) e do cuidado autônomo (incompetência crescente para o autocuidado autorreferenciado), com progressiva dependência do cuidado heterônomo para cada vez mais problemas menores e corriqueiros, frustrações, sofrimentos, dores, adoecimentos, luto, nascimento e morte, além da proliferação disseminada do autocuidado biomedicamente referenciado.

O processo de medicalização nas sociedades ocidentais urbanizadas é antigo e complexo, já tendo sido incorporado nas culturas e nas subjetividades dos indivíduos e populações1717 Rose G. Estratégias da medicina preventiva. Porto Alegre: Artmed; 2010., o que amplificou o poder simbólico e a capilaridade do autocuidado biomedicamente orientado, tornando mais complexa a relação entre ele e o restante do autocuidado. Mesmo assim, há consenso nos estudos sociológicos e antropológicos de que o autocuidado é muito mais amplo do que a sua parcela cientificamente orientada1818 Helman CG. Cultura saúde e doença. 5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2009.,1919 Contatore OA, Malfitano APS, Barros NF. Por uma sociologia do cuidado: reflexões para além do campo da saúde. Trab Educ Saude. 2019; 17(1):1-23..

Outra parcela do autocuidado é desenvolvida dentro de uma perspectiva autorreferida: um processo comum e disseminado de aprendizado, testagem e aperfeiçoamento das práticas, saberes e crenças das pessoas na sua vida e entre seus próximos2020 Silva LF, Alves F. Compreender as racionalidades leigas sobre saúde e doença. Physis. 2011; 21(4):1207-29.,2121 Andrade APM, Maluf SW. Loucos/as, pacientes, usuários/as, experientes: o estatuto dos sujeitos no contexto da reforma psiquiátrica brasileira. Saude Debate. 2017; 41(112):273-84.. Essa parcela é baseada na experimentação pessoal a partir dos saberes disponíveis já manejados e frutos de experiências prévias, que tornam as pessoas “experientes” em conhecer suas necessidades de cuidado2121 Andrade APM, Maluf SW. Loucos/as, pacientes, usuários/as, experientes: o estatuto dos sujeitos no contexto da reforma psiquiátrica brasileira. Saude Debate. 2017; 41(112):273-84.. Mesmo no autocuidado realizado com práticas biomédicas, como a automedicação, tal racionalidade foi observada2222 Lopes NM. Automedicação, saberes e racionalidades leigas em mudança. Rev Crit Cienc Sociais. 2007; 78:119-38..

A construção autorreferida do autocuidado é eclética e sincrética; nela estão presentes os símbolos, significados e sentidos da cultura e do indivíduo em um mosaico sui generis e personalizado que orienta o autocuidado de cada pessoa, dentro das possibilidades, contextos e experiências vividas. Em que pese a força da cultura e dos símbolos e crenças compartilhadas socialmente (e dentre estes a grande força e legitimidade dos saberes biomédicos e científicos em geral), que estão dentro e fora das pessoas, nesse processo de construção está inevitavelmente a experimentação empírica dos indivíduos consigo mesmos e com os instrumentos, símbolos e práticas de autocuidado correntes no seu contexto social, interpretados a partir de sua experiência de vida singular.

Os saberes formadores do autocuidado autorreferido estão disponíveis e circulantes nos ambientes comunitários, ou podem ser neles introduzidos por especialistas ou curadores especializados, profissionalizados ou não, referenciados na biociência ou não. Se não forem profissionais nem cientificizados, há que se conhecer o tipo de valores, saberes e relações estabelecidos, bem como o tipo de orientações oferecidas às pessoas. Geralmente esses saberes se fundam no saber especializado do curador. Nossa hipótese é a de que na MCC podem significar o compartilhamento de informações benéficas ao desenvolvimento autorreferido do autocuidado, via construção de um entendimento do significado dessas práticas para o próprio bem-estar, se passíveis de experimentação e aprendizado, facilitando e estimulando a autonomia no autocuidado por meio da auto-observação e do reconhecimento de necessidades pessoais.

O cuidado na Atenção Primária à Saúde

A APS, no âmbito do SUS, denominada no Brasil de Atenção Básica em Saúde (ABS)(e(e)Opta-se aqui por utilizar APS englobando as características particulares da política brasileira, nomeada ABS23, a qual ressalta as práticas territoriais no SUS. Contudo, por não se tratar do objeto de discussão em tela, não se adentrou nesse debate e foi utilizada a nomenclatura APS, em consonância com referências internacionais acerca da aplicação das PICs nos serviços primários de saúde.), caracteriza-se ou deve caracterizar-se por um conjunto de ações, individuais ou coletivas, que envolvem a manutenção; o diagnóstico; o tratamento; a reabilitação; a promoção e a proteção da saúde; e a prevenção de agravos, visando redução de danos ou de sofrimentos que prejudiquem as chances de viver de modo saudável2323 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção À Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. 4a ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2007.. Espera-se que os sujeitos na APS sejam considerados na sua singularidade, integralidade, complexidade e inserção sociocultural. Busca-se também ampliar a corresponsabilidade dos indivíduos pela sua saúde, a qualificação do acolhimento, a construção do vínculo entre profissional e usuário, a orientação de hábitos de vida saudáveis e a produção da autonomia com o incentivo ao autocuidado77 Contatore OA. Cuidado, acupuntura e atenção primária à saúde: conceitos em construção e correlação [tese]. Campinas: Departamento de Saúde Coletiva, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas; 2020.. Chamaremos tais atributos e objetivos de “princípios consensuais” dos serviços de saúde da APS.

Para tanto, a atenção majoritária é focada em um cuidado heterônomo centralizado nos saberes biomédicos e nos profissionais de saúde. Contudo, muitas estratégias são possibilitadas via APS, sendo que lógicas de cuidado não biomédicas que favoreçam um cuidado autônomo devem também ser consideradas para que os princípios consensuais da APS sejam alcançados. A legislação do SUS prevê várias estratégias para tanto, incluindo a oferta de Práticas Integrativas e Complementares55 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 971, de 4 de Maio de 2006. Dispõe sobre a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde. Diário Oficial da União. 4 Maio 2006. como possíveis ações na APS66 Lima KMSV, Silva KL, Tesser CD. Práticas integrativas e complementares e relação com promoção da saúde: experiência de um serviço municipal de saúde. Interface (Botucatu). 2014; 18(49):261-72. Doi: https://doi.org/10.1590/1807-57622013.0133.
https://doi.org/10.1590/1807-57622013.01...
.

Fomentos ao autocuidado autorreferido podem contribuir para que a APS se efetive para além da necessária oferta de cuidado heterônomo. Nessa direção, a concepção de cuidado e autocuidado da Medicina Chinesa podem integrar de forma contributiva a oferta de uma APS efetiva para a população, seguindo os princípios consensuais da APS2323 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção À Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. 4a ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2007..

A medicina chinesa e sua interligação com a produção autônoma do cuidado

As práticas chinesas de cuidado à saúde têm sido conhecidas no Ocidente mais por seus elementos heterônomos para cura e cuidado de doentes do que por sua capacidade de produção e desenvolvimento de cuidado autônomo autorreferido. A Medicina Tradicional Chinesa (MTC), denominação criada por Mao Tse Tung em meados do século XX, foi constituída sob influência da ciência Ocidental e da Biomedicina e, em sua diáspora para o Ocidente, teve seus aspectos heterônomos destacados. No entanto, até o fim do século XIX, período anterior à hibridização entre os conhecimentos tradicionais médicos chineses com os ocidentais, a Medicina Tradicional da China, chamada, academicamente, de Medicina Clássica Chinesa (MCC)77 Contatore OA. Cuidado, acupuntura e atenção primária à saúde: conceitos em construção e correlação [tese]. Campinas: Departamento de Saúde Coletiva, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas; 2020.,2424 Souza EFAA. Nutrindo a vitalidade: questões contemporâneas sobre a Racionalidade Médica Chinesa e seu desenvolvimento histórico cultural [tese]. Rio de Janeiro: Instituto de Medicina Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro; 2008., desenvolveu várias estratégias de cuidado à saúde que privilegiam atitudes e ações de autocuidado.

A Medicina Chinesa tem sido divulgada no mundo ocidental principalmente como uma prática de cuidado exercida por um especialista, e não como um conhecimento que pode ser socializado para todos. A acupuntura, entre as suas práticas terapêuticas, é a mais conhecida e, dada a sua complexidade teórica e especificidade prática, favorece essa visão. Porém, isso também acontece com outras modalidades terapêuticas chinesas, como a massagem, a fitoterapia e o conhecimento dietético. Esse processo aconteceu em menor grau com o tai chi chuan e o tao-in (meditação), provavelmente porque o acesso a tais práticas é feito por meio de um instrutor, e não de um terapeuta.

Alguns pontos da visão de cuidado da MTC e da MCC têm sido destacados para diferenciá-las da Biomedicina: concepção vitalista de saúde; avaliação e atuação singularizada, que busca propiciar o equilíbrio vital de cada organismo; visão holística e integral no entendimento dos processos de adoecimento, que facilitam atitudes empáticas de acolhimento durante o diagnóstico e os tratamentos; e potencial para propiciar a horizontalização do cuidado e a construção de uma consciência corporal que amplie a capacidade individual de autocuidado77 Contatore OA. Cuidado, acupuntura e atenção primária à saúde: conceitos em construção e correlação [tese]. Campinas: Departamento de Saúde Coletiva, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas; 2020.,88 Contatore OA, Tesser CD, Barros NF. Chinese medicine/acupuncture: historical notes on the colonization of a body of knowledge. Hist Cienc Saude Manguinhos. 2018; 25(3):841-58.,2424 Souza EFAA. Nutrindo a vitalidade: questões contemporâneas sobre a Racionalidade Médica Chinesa e seu desenvolvimento histórico cultural [tese]. Rio de Janeiro: Instituto de Medicina Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro; 2008.

25 Cintra MER, Figueiredo R. Acupuntura e promoção de saúde: possibilidades no serviço público de saúde. Interface (Botucatu). 2010; 14(32):139-54. Doi: https://doi.org/10.1590/S1414-32832010000100012.
https://doi.org/10.1590/S1414-3283201000...

26 Freire Jr MB. Conhece-te a ti mesmo: uma proposta de educação popular para a saúde. Saude Debate. 1993; 41:4-8.
-2727 Camargo TCA, Telles SCC, Souza CTV. A (re) invenção do cotidiano no envelhecimento pelas práticas corporais e integrativas: escolhas possíveis, responsabilização e autocuidado. Cad Bras Ter Ocup. 26(2):367-80. Doi: https://doi.org/10.4322/2526-8910.ctoao1238.
https://doi.org/10.4322/2526-8910.ctoao1...
.

No caso da MTC, sua institucionalização na China, em que pese tentar resgatar também técnicas autônomas, foi influenciada pelos saberes materialistas científicos modernos. O nosso pressuposto é que parte dos saberes, valores e abordagens originários da MCC, que eram fundamentais para a disseminação e enriquecimento de noções e práticas de autocuidado, foi eliminado ou subvalorizado, gerando relativo empobrecimento do cuidado autônomo na MTC. O potencial para ser autorreferido tende a se converter em heterorreferido2828 Tesser CD, Dallegrave D. Práticas integrativas e complementares e medicalização social: indefinições, riscos e potências na atenção primária à saúde. Cad Saude Publica. 2020; 36(9):e00231519. Doi: https://doi.org/10.1590/0102-311x00231519.
https://doi.org/10.1590/0102-311x0023151...
e, como tal, menos facilmente praticável e socializável, conforme ilustrado na figura 1.

Figura 1
Principais diferenças entre biomedicina, MTC e MCC.

Mesmo que a Medicina Chinesa tenha se aproximado dos parâmetros biomédicos, antes e após sua diáspora, as suas características autóctones a distanciam da Biomedicina. O trabalho seminal de Madel Luz, ao cunhar o conceito “racionalidades médicas”2929 Luz MT, Barros NF. Racionalidades médicas e práticas integrativas em saúde: estudos teóricos e empíricos. Rio de Janeiro: Cepesc, IMS, UERJ, Abrasco; 2012., demonstrou com precisão tais diferenças. No entanto, coerentemente com a Biomedicina e a Ciência, o cuidado heterônomo foi o principal aspecto da MTC valorizado em sua ocidentalização. Um exemplo é o fato de a acupuntura ter se tornado no Ocidente a prática da Medicina Chinesa mais pesquisada e aplicada por médicos e com maior adaptação à Biomedicina, com crescente foco no tratamento de patologias específicas77 Contatore OA. Cuidado, acupuntura e atenção primária à saúde: conceitos em construção e correlação [tese]. Campinas: Departamento de Saúde Coletiva, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas; 2020.,3030 Contatore OA, Barros NF, Durval MR, Barrio PCCC, Coutinho BD, Santos JA, et al. Uso, cuidado e política das práticas integrativas e complementares na Atenção Primária à Saúde. Cienc Saude Colet. 2015; 20(10):3263-73.,3131 Lin CA, Hsing WT, Pai HJ. Acupuntura: prática baseada em evidências. Rev Med (São Paulo). 2008; 87(3):162-5..

A MCC, pelo que temos contato por meio da literatura especializada e de seus praticantes remanescentes diaspóricos, parece ser baseada em uma dupla tradição de cuidado, com ações heterônomas e autônomas via autocuidado autorreferido, que pode ser ativamente estimulado e socializado para não praticantes. Ou seja, a MCC porta um cabedal de práticas e saberes destinados a ampliar a autonomia e capacidade de autocuidado autorreferido das pessoas. Embora tais saberes estejam em geral concentrados em especialistas, ao serem transmitidos e socializados, há neles a característica de incentivo à autonomia; especialmente pelo fato de que são desenvolvidos a partir da experiência autônoma e pessoal desses especialistas (contextualizados na sua cultura), experiência que é acessível a qualquer um e não está segmentada ou restrita aos profissionais que desenvolvem ações de cuidado heterônomo, mesmo que esse tipo de cuidado seja, tradicionalmente, parte importante no processo de transmissão do conhecimento na MCC.

Uma intepretação que permite compreender essa característica da MCC é que há uma diferença na forma como são arquitetados os saberes da Biomedicina. Nessa característica, o conhecimento é construído cientificamente e se pretende independente do saber e do autocuidado autorreferido, pois seria advindo, supostamente, de uma primeira ruptura epistemológica, caracterizada pela desconfiança radical dos saberes sociais, tradicionais ou não, desenvolvidos e presentes na vida cotidiana3232 Santos BS. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. 2a ed. São Paulo: Cortez; 2000.. Na MCC, distintamente, há uma continuidade epistemológica entre o seu saber esotérico (especializado) e o saber exotérico (próprio dos usuários), ambos atrelados à experiência pessoal dos envolvidos; uma continuidade epistemológica entre diferentes círculos sociocognitivos que é estranha ao modo científico de produção de saber.

Na MCC, o saber erudito e especializado é construído a partir de uma interação e consonância entre aprendizado de saberes estruturados pela tradição, revividos e transmitidos pelos professores e mestres em sua prática clínica, com saber pessoal derivado de práticas de autocuidado autorreferido. Estas últimas servem como algo análogo ao laboratório para os cientistas, mas no qual o objeto do experimento é a própria pessoa (ou corpo) em sua materialidade fisiológica e fenomenologia existencial. Ao cultivar a livre circulação, a preservação, o fortalecimento e a percepção da própria vitalidade, via práticas de autocuidado autorreferido (propiciadas pela tradição via professores e mestres), o iniciante na MCC aprende simultaneamente os saberes estruturados acumulados e os confronta com sua própria significação e experimentação empírica, sua própria percepção pessoal e, depois, em um segundo momento, pelas pessoas por ele cuidadas. A construção do saber especializado na MCC parece envolver uma elaboração e sofisticação perceptiva-cognitiva progressivas derivadas das práticas do autocuidado autorreferidas, a serem associadas ao aprendizado dos saberes e métodos acumulados previamente pela tradição, aprendidos dos professores.

Essa Medicina tradicional, assim, parece diluir ou hibridizar a experiência de autocuidado heterorreferido e autorreferido, dado que o autocuidado orientado pela MCC vai justamente estimular e explorar (ao mesmo tempo que orientar) o processo de autorreferenciamento do autocuidado. Não parece haver um conceito equivalente na Biociência ou na Biomedicina.

Nessa lógica, devido à forte influência ocidental na MTC, esta é insuficiente para a exploração e exercício do autocuidado na Medicina Chinesa, sendo necessário acessar a MCC (no que se consegue) para uma sistematização e exploração do conhecimento tradicional chinês voltado para o autocuidado autorreferido. Para tanto, é preciso superar a ideia de que a acupuntura por si só representa o máximo ou o melhor da Medicina Chinesa Tradicional, aproximando-se do conjunto de técnicas terapêuticas chinesas de cuidado à saúde. Essa perspectiva é relevante para potencializar as ações de autocuidado e a prevenção/promoção da Medicina Chinesa na APS.

A MCC e a construção de práticas de autocuidado autorreferidas

A tradição taoista99 Hemsi AR. Taijiquan e educação: trajetórias de alunos-professores da Escola Pai Lin [tese]. São Paulo: Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo; 2000.,1010 Bizerril Neto J. Mestres do Tao: tradição, experiência e etnografia. Horiz Antropol. 2005; 11(24):87-105.,2424 Souza EFAA. Nutrindo a vitalidade: questões contemporâneas sobre a Racionalidade Médica Chinesa e seu desenvolvimento histórico cultural [tese]. Rio de Janeiro: Instituto de Medicina Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro; 2008. tem sido considerada a base conceitual da MCC. O Taoismo é um pensamento filosófico chinês e uma tradição de práticas que concebe a relação harmônica entre o ser humano e o universo, em que há identidade e correspondência, expressa na equivalência micro/macrocósmica, descrevendo-os em constante movimento e mutação. Está associado a práticas transmitidas oralmente por sucessivas gerações de praticantes1010 Bizerril Neto J. Mestres do Tao: tradição, experiência e etnografia. Horiz Antropol. 2005; 11(24):87-105.. Nele, a busca pelo autoconhecimento é parte fundamental do sentido de estar no mundo e cabe a cada um desenvolvê-lo em todos os aspectos da vida. Isso se estende à aprendizagem das necessidades próprias de cuidado e sua aplicação pelo autocuidado.

As reflexões aqui apresentadas têm como base uma autoetnografia77 Contatore OA. Cuidado, acupuntura e atenção primária à saúde: conceitos em construção e correlação [tese]. Campinas: Departamento de Saúde Coletiva, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas; 2020. focada no aprendizado com o professor Liu Pai Lin (1907-2000), imigrante chinês que ensinou práticas tradicionais em São Paulo, SP, desde o fim da década de 1970 até falecer77 Contatore OA. Cuidado, acupuntura e atenção primária à saúde: conceitos em construção e correlação [tese]. Campinas: Departamento de Saúde Coletiva, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas; 2020.,99 Hemsi AR. Taijiquan e educação: trajetórias de alunos-professores da Escola Pai Lin [tese]. São Paulo: Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo; 2000.,1010 Bizerril Neto J. Mestres do Tao: tradição, experiência e etnografia. Horiz Antropol. 2005; 11(24):87-105..

Há uma linha mais filosófica e laica e outra mais religiosa do pensamento e práticas taoistas. Liu Pai Lin foi aluno de vários mestres da primeira linha. Para ele, as ações de cuidado à saúde heterônomas e autônomas estão fundamentadas na interdependência e interrelação entre três pilares de práticas: medicina, movimento e meditação (serenidade).

Esses três conjuntos de práticas fundamentavam suas orientações para o autocuidado e faziam parte da formação técnica em MCC. Para ele, o terapeuta, ao saber autoavaliar e atender suas próprias necessidades de cuidado, amplia a compreensão das necessidades do outro e as dificuldades implícitas na absorção de conhecimentos e práticas para o autocuidado. Implicitamente, na MCC há o desenvolvimento de habilidades que não partem apenas de um conhecimento intelectual, mas que também exigem uma prática pessoal para serem adquiridas.

Como terapeuta tradicional chinês, Liu Pai Lin prescrevia o uso de práticas específicas para o reequilíbrio da vitalidade. Essas práticas eram instruídas por seus auxiliares, o que os induzia a praticá-las e cuidar de sua própria saúde. Na linguagem dessa tradição: quem se atreve a cuidar da saúde dos outros, no mínimo, tem que ser capaz de cuidar da própria saúde.

Na concepção taoista, a saúde é um potencial de vitalidade que cada pessoa tem em si para ser utilizada durante a vida. Sua manutenção – e, portanto, a vida em si – está diretamente relacionada com a preservação dessa vitalidade e a sua circulação pelo corpo. Isso é a base comum das práticas de cuidado autônomo e heterônomo da MCC, com alguma diferenciação entre elas na forma de aplicação. As práticas de autocuidado ajudam a aprender a não dispersar; sustentar e circular essa vitalidade; e, por meio de exercícios especiais, reaver parte da vitalidade consumida no decorrer da vida. O envolvimento pessoal com as práticas de cuidado progressivamente amplia a percepção pelo praticante dos seus efeitos.

Algumas noções utilizadas na MCC não encontram similaridade com as concepções científicas atuais, o que levou a MTC a realizar adaptações para viabilizar algumas equivalências ou analogias. A vitalidade é um exemplo. A palavra tchi (ou qi, na literatura) na MCC e na MTC é a denominação usada para definir a vitalidade do organismo, porém, há diferenças entre a MCC e a MTC sobre sua origem2424 Souza EFAA. Nutrindo a vitalidade: questões contemporâneas sobre a Racionalidade Médica Chinesa e seu desenvolvimento histórico cultural [tese]. Rio de Janeiro: Instituto de Medicina Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro; 2008.. No processo de hibridização da Medicina Chinesa com o pensamento científico moderno, a MTC simplificou a visão clássica do tchi, aumentando a dependência de um outro (profissional) para se obter o cuidado de si. Na base da MCC taoista há uma inter-relação entre o macro (natureza) e micro (ser humano)99 Hemsi AR. Taijiquan e educação: trajetórias de alunos-professores da Escola Pai Lin [tese]. São Paulo: Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo; 2000.,1010 Bizerril Neto J. Mestres do Tao: tradição, experiência e etnografia. Horiz Antropol. 2005; 11(24):87-105.,2929 Luz MT, Barros NF. Racionalidades médicas e práticas integrativas em saúde: estudos teóricos e empíricos. Rio de Janeiro: Cepesc, IMS, UERJ, Abrasco; 2012., sendo que para essa tradição o tchi está em tudo que existe e há uma permeabilidade entre macro e microcosmo, sendo buscado o cultivo e a preservação do tchi original como fundamentos para a sustentação da saúde.

De modo geral, tanto para a MCC quanto para a MTC, a influência da gestação, das relações sociais, da qualidade dos alimentos, do sono, das atividades físicas no decorrer da vida (laborais e de lazer) e dos fatores climáticos e a interligação desses elementos com os sentimentos e emoções, refletidas nas características próprias de cada sujeito, são contempladas no entendimento das condições de saúde, adoecimento e cuidado.

É importante notar que, para essa tradição, os hábitos de vida favorecem ou prejudicam o tchi na sua circulação e equilíbrio e protegem ou não a pessoa de sua dispersão. Também o tchi pode ser individualmente percebido, acessado, movimentado e sustentado. Em menor escala e com maior dificuldade, o tchi poderia ser reabsorvido da natureza, a partir de práticas de serenidade. Liu Pai Lin concebia a natureza como a principal fonte de alimento e dizia: “O alimento mais importante vem da mãe. O que é mãe? É a energia criadora de todas as coisas”. Na visão taoísta, a constituição do ser humano é idêntica à da natureza; deve-se buscar o alimento diretamente da mãe natureza.

Entre as representações taoistas relacionadas ao tchi, o conceito de yin e yang é parte essencial da Medicina Chinesa3333 Coutinho BD, Dulcetti PGS. O movimento Y+n e Yáng na cosmologia da medicina chinesa. Hist Cienc Saude Manguinhos. 2015; 22(3):797-811.. Trata-se do conceito mais difundido e sua significação se aproxima do cotidiano das pessoas, por estabelecer uma interrelação entre a natureza, o corpo humano e suas manifestações. Atuar na obtenção do equilíbrio entre yin e yang no corpo é a primeira das ações heterônomas empreendidas pela MCC e MTC, sendo também fundamental para entender o autocuidado. Liu Pai Lin os descrevia como opostos complementares por meio dos quais a vida se manifesta no processo da criação. Representam, respectivamente, o recolhimento e a expansão, a noite e o dia, o frio e o calor, o feminino e o masculino, o que acalma e o que estimula. Para ele, yin é a matéria e yang, o raio que vivifica. Sempre estão presentes, mesmo quando desbalanceados; unidos geram a vida, separados não se sustentam.

Na concepção taoista, o surgimento da vida e sua sustentação estão relacionados à união entre yin e yang. A separação entre eles desencadeia o adoecimento e acelera a chegada da morte. Yin e yang estão em constante movimento na natureza e nos seres humanos.

A vida, ao ser entendida via movimento do yin (recolhimento) e do yang (expansão), não é caracterizada pela ideia de estabilidade ou normalidade. A busca por equilíbrio seria a tentativa de harmonizar-se com o movimento da vida, representado, em um plano maior, pelos fatores ambientais e sociais aos quais cada indivíduo está sujeito e, no plano pessoal, às características próprias de cada pessoa, incluindo a sua constituição física, suas variações emocionais e aspectos de sua personalidade. O escritor taoista Chuang Tzu3434 Merton T. A via de Chuang Tzu. Petrópolis: Vozes; 2002. descreveu em um poema a variabilidade da vida:

aquele que quiser possuir o certo sem o erradoA ordem sem a desordem, não percebe os princípios do céu e da terra.Não percebe como as coisas se unem.Pode o homem apegar-se apenas ao céu e nada saber da terra?São correlatos: conhecer um é conhecer outro, recusar um é recusar ambos.Pode um homem apegar-se ao positivo sem nenhuma negativa, em contraste com o que é positivo?3434 Merton T. A via de Chuang Tzu. Petrópolis: Vozes; 2002. (p. 136-7)

Para Liu Pai Lin, as práticas de cuidado clássicas chinesas favoreceriam a união do yin e yang no corpo, bem como sua concentração e distribuição.

Exemplos de práticas de autocuidado

Liu Pai Lin usava uma forma simples e direta para descrever hábitos favoráveis para a manutenção pessoal da saúde. Para ele, cinco ações de autocuidado eram necessárias de serem praticadas diariamente: comer bem, movimentar-se bem, dormir bem, respirar bem e serenar bem. Liu indicava que a constância e persistência em qualquer prática resultava em facilidade ao fazê-la e afirmava: é fácil viciar-se em coisas que fazem mal, é preciso viciar-se em coisas que fazem bem – é preciso se dar carinho todos os dias.

Comer bem refere-se à alimentação não como um recurso curativo, mas, sim como uma forma de manter a vitalidade em equilíbrio. Há na tradição clássica chinesa informações sobre as qualidades vitais dos alimentos e sua utilização para o equilíbrio pessoal em variadas situações. O intuito é compor cada refeição com variabilidade de alimentos, com cores, sabores e propriedades estimulantes ou calmantes, que equilibrem o organismo considerando as interferências causadas por variações climáticas e as necessidades pessoais de saúde em cada momento da vida, para o seu autocuidado. O uso interno de plantas medicinais também fazia parte da aprendizagem sobre alimentos e se estendia ao seu uso externo em compressas e emplastros para o tratamento de problemas na pele, olhos, hematomas e problemas em tendões, músculos e articulações.

Movimentar-se bem tem o intuito de estimular a circulação harmoniosa da vitalidade pelo corpo, de preferência não a concentrando na sua parte superior e intensificando a sua circulação na parte inferior. Na escola de Liu Pai Lin, eram ensinados, entre outros elementos, várias sequências tradicionais chinesas de movimentos: exercícios de aquecimento para a flexibilidade das articulações e estímulo aos órgãos internos; exercícios respiratórios; sequências de automassagem; sequências de movimentos intercalados, como o Tai Chi Chuan; e várias outras práticas, tais como as conhecidas como tchi kun (ou qi gong), utilizadas para concentrar a vitalidade.

Na visão tradicional chinesa, a qualidade do sono faz parte dos requisitos para se ter uma boa saúde. Quando profundo e tranquilo, o sono é entendido como uma forma de o organismo recuperar parte da vitalidade utilizada no dia e reorganizar a sua circulação. A qualidade do repouso interfere no potencial físico e intelectual durante a vigília, na saúde e na flexibilidade dos tendões e articulações. Entre as práticas introspectivas ensinadas por Liu Pai Lin, algumas tinham o intuito de ajudar a dormir serenamente.

Os exercícios respiratórios têm várias funções como práticas de autocuidado e são feitos com diferentes intenções no decorrer do dia. Pela manhã, ajudam a fortalecer o tchi e a eliminar impurezas acumuladas no organismo. No fim da tarde e à noite, ajudam a conduzir a vitalidade para a parte inferior do corpo e têm efeito calmante. Certas práticas respiratórias servem como técnicas introdutórias à meditação. Liu Pai Lin chamava de “treinamentos de porta de entrada” alguns exercícios respiratórios que proporcionavam a introspecção e facilitavam a percepção de si, principalmente por ajudarem o praticante a sentir e soltar o seu corpo, requisitos básicos para alcançar serenidade.

Por fim, a prática diária de serenidade era, para Liu Pai Lin, o mais importante dos cinco cuidados à saúde. Isso porque, na concepção taoista, a pessoa, ao serenar, ao estar consigo mesma e ao perceber-se em profundidade, pode desenvolver o autoconhecimento, recurso essencial para o incremento do autocuidado. A autopercepção que o recolhimento traz permite que o praticante consiga eventualmente entrar no “vazio” (ou seja, no estado de meditação). Meditar, na acepção taoista, é um estado alterado de consciência em que não se sente o corpo, não há emoções e cessam os pensamentos. No entanto, tem-se a nítida percepção de si, mas por uma perspectiva totalmente diferente do que normalmente acontece ao observar-se. Ao entrar no estado de meditação, sabe-se de si mergulhado no silêncio e, ao mesmo tempo, o praticante se sente conectado a tudo que existe.

Considerações finais

A proposta geral dos ensinamentos para o autocuidado originários da MCC oferece recursos para que cada um aumente a autonomia no seu viver. Essa perspectiva tem sido diluída na diáspora do conhecimento da Medicina Chinesa em direção ao Ocidente, em que a acupuntura se tornou a prática chinesa de cuidado à saúde mais difundida e utilizada. A acupuntura ganhou contornos biomédicos, por meio de uma ação clínica desvinculada da totalidade dos conhecimentos de saúde chineses. Em consequência, pouco se sabe sobre as múltiplas práticas terapêuticas tradicionais chinesas e sua possibilidade de favorecer a criação de uma cultura de autocuidado autorreferido que valorize a autonomia, o que é especialmente importante na APS.

A diferenciação entre MTC e MCC é necessária para uma melhor exploração da contribuição da Medicina Chinesa ao autocuidado, à prevenção e à promoção da saúde. Pesquisas que explorem o potencial da MCC para o autocuidado podem ajudar a ampliar e qualificar as ações de cuidado possíveis de serem realizadas a partir da Medicina Chinesa na APS, no sentido de enriquecer o autocuidado autorreferido. A MCC parece ser especialmente fértil para facilitar a construção de práticas preventivas e promocionais individuais e coletivas na APS que se conectem com o autocuidado autorreferido, mas isso ainda é pouco reconhecido e explorado.

  • (d)
    Pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Campinas, n. 61666016.0.0000.5404.
  • (e)
    Opta-se aqui por utilizar APS englobando as características particulares da política brasileira, nomeada ABS2323 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção À Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. 4a ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2007., a qual ressalta as práticas territoriais no SUS. Contudo, por não se tratar do objeto de discussão em tela, não se adentrou nesse debate e foi utilizada a nomenclatura APS, em consonância com referências internacionais acerca da aplicação das PICs nos serviços primários de saúde.

  • Financiamento

    Este trabalho contou com financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) – Código 001.
  • Contatore OA, Tesser CD, Barros NF. Autocuidado autorreferido: contribuições da Medicina Clássica Chinesa para a Atenção Primária à Saúde. Interface (Botucatu). 2021; 25: e200461 https://doi.org/10.1590/interface.200461

Referencias

  • 1
    Tesser CD. Por que é importante a prevenção quaternária na prevenção? Rev Saude Publica. 2017; 51:116.
  • 2
    Yulia Treister-Goltzman PR. Trends in publications on complementary and alternative medicine in the medical literature. J Complement Integr Med. 2015; 12(2):111-5. Doi: https://doi.org/10.1515/jcim-2014-0055.
    » https://doi.org/10.1515/jcim-2014-0055
  • 3
    World Health Organization. WHO traditional medicine strategy: 2014-2023 [Internet]. Geneva: WHO; 2013 [citado 02 Mar 2020]. Disponível em: https://www.who.int/medicines/publications/traditional/trm_strategy14_23/en/
    » https://www.who.int/medicines/publications/traditional/trm_strategy14_23/en/
  • 4
    Sousa IM, Tesser CD. Traditional and complementary medicine in Brazil: inclusion in the Brazilian Unified National Health System and integration with primary care. Cad Saude Publica. 2017; 33(1):e00150215.
  • 5
    Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 971, de 4 de Maio de 2006. Dispõe sobre a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde. Diário Oficial da União. 4 Maio 2006.
  • 6
    Lima KMSV, Silva KL, Tesser CD. Práticas integrativas e complementares e relação com promoção da saúde: experiência de um serviço municipal de saúde. Interface (Botucatu). 2014; 18(49):261-72. Doi: https://doi.org/10.1590/1807-57622013.0133.
    » https://doi.org/10.1590/1807-57622013.0133
  • 7
    Contatore OA. Cuidado, acupuntura e atenção primária à saúde: conceitos em construção e correlação [tese]. Campinas: Departamento de Saúde Coletiva, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas; 2020.
  • 8
    Contatore OA, Tesser CD, Barros NF. Chinese medicine/acupuncture: historical notes on the colonization of a body of knowledge. Hist Cienc Saude Manguinhos. 2018; 25(3):841-58.
  • 9
    Hemsi AR. Taijiquan e educação: trajetórias de alunos-professores da Escola Pai Lin [tese]. São Paulo: Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo; 2000.
  • 10
    Bizerril Neto J. Mestres do Tao: tradição, experiência e etnografia. Horiz Antropol. 2005; 11(24):87-105.
  • 11
    Illich I. A expropriação da saúde: nêmeses da medicina. 3a ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1975.
  • 12
    Menendez EL. Modelos de atención de los padecimientos: de exclusiones teóricas y articulaciones prácticas. Cienc Saude Colet. 2003; 8(1):185-207.
  • 13
    Caponi S. A saúde como abertura ao risco. In: Czeresnia D, Freitas CM, editores. Promoção da saúde: conceitos, reflexões, tendências. 2a ed. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2009. p. 55-77.
  • 14
    Boltanski L. As classes sociais e o corpo. 4a ed. Rio de Janeiro: Graal; 2004.
  • 15
    Varela F. Conocer: las ciencias cognitivas. Barcelona: Gedisa; 1990.
  • 16
    Varela F, Thompson E, Rosch E. The emboied mind: cognitive science and human experience. Cambridge: MIT Press; 1991.
  • 17
    Rose G. Estratégias da medicina preventiva. Porto Alegre: Artmed; 2010.
  • 18
    Helman CG. Cultura saúde e doença. 5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2009.
  • 19
    Contatore OA, Malfitano APS, Barros NF. Por uma sociologia do cuidado: reflexões para além do campo da saúde. Trab Educ Saude. 2019; 17(1):1-23.
  • 20
    Silva LF, Alves F. Compreender as racionalidades leigas sobre saúde e doença. Physis. 2011; 21(4):1207-29.
  • 21
    Andrade APM, Maluf SW. Loucos/as, pacientes, usuários/as, experientes: o estatuto dos sujeitos no contexto da reforma psiquiátrica brasileira. Saude Debate. 2017; 41(112):273-84.
  • 22
    Lopes NM. Automedicação, saberes e racionalidades leigas em mudança. Rev Crit Cienc Sociais. 2007; 78:119-38.
  • 23
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção À Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. 4a ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2007.
  • 24
    Souza EFAA. Nutrindo a vitalidade: questões contemporâneas sobre a Racionalidade Médica Chinesa e seu desenvolvimento histórico cultural [tese]. Rio de Janeiro: Instituto de Medicina Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro; 2008.
  • 25
    Cintra MER, Figueiredo R. Acupuntura e promoção de saúde: possibilidades no serviço público de saúde. Interface (Botucatu). 2010; 14(32):139-54. Doi: https://doi.org/10.1590/S1414-32832010000100012.
    » https://doi.org/10.1590/S1414-32832010000100012
  • 26
    Freire Jr MB. Conhece-te a ti mesmo: uma proposta de educação popular para a saúde. Saude Debate. 1993; 41:4-8.
  • 27
    Camargo TCA, Telles SCC, Souza CTV. A (re) invenção do cotidiano no envelhecimento pelas práticas corporais e integrativas: escolhas possíveis, responsabilização e autocuidado. Cad Bras Ter Ocup. 26(2):367-80. Doi: https://doi.org/10.4322/2526-8910.ctoao1238.
    » https://doi.org/10.4322/2526-8910.ctoao1238
  • 28
    Tesser CD, Dallegrave D. Práticas integrativas e complementares e medicalização social: indefinições, riscos e potências na atenção primária à saúde. Cad Saude Publica. 2020; 36(9):e00231519. Doi: https://doi.org/10.1590/0102-311x00231519.
    » https://doi.org/10.1590/0102-311x00231519
  • 29
    Luz MT, Barros NF. Racionalidades médicas e práticas integrativas em saúde: estudos teóricos e empíricos. Rio de Janeiro: Cepesc, IMS, UERJ, Abrasco; 2012.
  • 30
    Contatore OA, Barros NF, Durval MR, Barrio PCCC, Coutinho BD, Santos JA, et al. Uso, cuidado e política das práticas integrativas e complementares na Atenção Primária à Saúde. Cienc Saude Colet. 2015; 20(10):3263-73.
  • 31
    Lin CA, Hsing WT, Pai HJ. Acupuntura: prática baseada em evidências. Rev Med (São Paulo). 2008; 87(3):162-5.
  • 32
    Santos BS. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. 2a ed. São Paulo: Cortez; 2000.
  • 33
    Coutinho BD, Dulcetti PGS. O movimento Y+n e Yáng na cosmologia da medicina chinesa. Hist Cienc Saude Manguinhos. 2015; 22(3):797-811.
  • 34
    Merton T. A via de Chuang Tzu. Petrópolis: Vozes; 2002.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Abr 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    07 Jul 2020
  • Aceito
    08 Dez 2020
UNESP Botucatu - SP - Brazil
E-mail: intface@fmb.unesp.br