O médico que eu quero ser: autoimagem profissional no Brasil e em Portugal

El médico que quiero ser: autoimagen profesional en Brasil y en Portugal

Silvia de Melo Cunha Ana Maria Fontenelle Catrib Aline Veras Morais Brilhante Christina Cesar Praça Brasil Elaine Saraiva Feitosa Maria Amélia Duarte Ferreira Sobre os autores

Resumos

Este estudo qualitativo avaliou a percepção de acadêmicos sobre sua autoimagem como futuros médicos e os fatores que influenciaram a construção da sua identidade profissional. Foram entrevistados 32 estudantes do sexto ano de Medicina no Brasil e em Portugal. Utilizou-se a análise de conteúdo na modalidade temática e a dramaturgia de Goffman para análise e interpretação dos dados. A autoimagem idealizada revelou-se em duas temáticas: o médico centrado em si e aquele que valoriza a relação interpessoal. Uma terceira temática mostrou a influência da universidade e de elementos trazidos a priori na identidade do médico. Os resultados indicam a influência do currículo oculto na construção da identidade profissional e reforçam a importância dos aspectos sociais e humanísticos na formação médica.

Palavras-chave
Profissionalismo; Educação médica; Relações sociais


Este estudio cualitativo evaluó la percepción de académicos sobre su autoimagen como futuros médicos y los factores que influyeron en la construcción de su identidad profesional. Se entrevistaron 32 estudiantes del sexto año de medicina en Brasil y en Portugal. Se utilizó el análisis de contenido en la modalidad temática y la dramaturgia de Goffman para análisis e interpretación de los datos. La autoimagen idealizada se reveló en dos temáticas: el médico centrado en sí mismo y aquel que valora la relación interpersonal. Una tercera temática mostró la influencia de la Universidad y de elementos traídos a priori en la identidad del médico. Los resultados indican la influencia del currículo oculto en la construcción de la identidad profesional y refuerzan la importancia de los aspectos sociales y humanísticos en la formación médica.

Palabras clave
Profesionalismo; Educación médica; Relaciones sociales


Introdução

O século XX foi marcado por três gerações de reformas educacionais com grande impacto na formação médica: aprendizagem baseada em ciência, que promoveu a integração da ciência com os currículos universitários e contribuiu para a evolução tecnológica da medicina; aprendizagem baseada em problemas e currículos integrados, que fortaleceu a relação médico-paciente e a multidisciplinaridade; e a aprendizagem baseada em sistemas de saúde, que enfatizou o currículo por competências, a educação interprofissional e a aprendizagem com respaldo nas tecnologias de informação e nas habilidades de liderança e gestão11 Frenk J, Chen L, Bhutta ZA, Cohen J, Crisp N, Evans T, et al. Health professionals for a new century: transforming education to strengthen health systems in an interdependent world. Lancet. 2010; 376(9756):1923-58..

Para além da aquisição de conhecimentos e habilidades, a formação em Medicina é uma experiência de socialização profissional que envolve o desenvolvimento de valores, atitudes e comportamentos que definem a identidade profissional, que corresponde ao jeito de ser do futuro médico22 Passi V, Doug M, Peile E, Thistlethwaite J, Johnson N. Developing medical professionalism in future doctors: a systematic review. Int J Med Educ. 2010; 1:19-29.

3 Goldie J. The formation of professional identity in medical students: considerations for educators. Med Teach. 2012; 34(9):641-8.

4 Moreto G, Federici VP, Silva VR, Pacheco FM, Blasco PG. O profissionalismo e a formação médica de excelência: desafios encontrados na academia e na prática clínica. Arch Med Fam. 2018; 20(4):183-9.
-55 Sassi AP, Seminotti EP, Paredes EAP, Vieira MB. O ideal profissional na formação médica. Rev Bras Educ Med. 2020; 44(1):e044..

A construção da identidade profissional tem sua essência na interação social. Entretanto, a influência dos aspectos sociais não está explícita no currículo formal, compondo o que a literatura apresenta como currículo informal ou oculto66 Benedetto MAC, Gallian DMC. Narrativas de estudantes de medicina e enfermagem: currículo oculto e desumanização em saúde. Interface (Botucatu). 2018; 22(67):1197-207. doi: https://doi.org/10.1590/1807-57622017.0218.
https://doi.org/10.1590/1807-57622017.02...
,77 Mahood SC. Medical education: beware the hidden curriculum. Can Fam Physician. 2011; 57(9):983-5.. Cruess et al.88 Cruess RL, Cruess SR, Boudreau JD, Snell L, Steinert Y. Reframing medical education to support professional identity formation. Acad Med. 2014; 89(11):1446-54. sugeriram incluí-la nos objetivos explícitos dos currículos, de modo a conscientizar estudantes e professores sobre os conceitos de identidade, profissionalismo e socialização e favorecer o desenvolvimento das características de um bom profissional.

A literatura científica está repleta de estudos sobre o perfil do “bom” médico55 Sassi AP, Seminotti EP, Paredes EAP, Vieira MB. O ideal profissional na formação médica. Rev Bras Educ Med. 2020; 44(1):e044.,99 Feitosa ES, Brilhante AVM, Cunha SM, Sá RB, Nunes RR, Carneiro MA, et al. Professionalism in the training of medical specialists: an integrative literature review. Rev Bras Educ Med. 2019; 43 Supl 1:692-9.

10 Cuesta-Briand B, Auret K, Johnson P, Playford D. ‘A world of difference’: qualitative study of medical students’ views on professionalism and the ‘good doctor’. BMC Med Educ. 2014; 14:77.

11 Iliescu ML, Carauleanu A. The portrait of a good doctor: conclusions from a patients and medical students survey. Rev Cercet Interv Soc. 2014; 47:261-71.

12 Steiner-Hofbauer V, Schrank B, Holzinger A. What is a good doctor? Wien Med Wochenschr. 2018; 168(15-16):398-405.
-1313 Ponte J. O que é um bom médico? Acta Med Port. 2019; 32(9):565-7., que une valores e atitudes às competências clínicas e aos conhecimentos teóricos. Nesse sentido, justifica-se pesquisar, do ponto de vista do investigado, o perfil profissional idealizado para si.

O estudo teve como objetivo avaliar a percepção de acadêmicos sobre sua autoimagem ideal como médico e os fatores que influenciam a sua construção ao longo do curso. Esse conhecimento trará contribuições importantes para os currículos, no sentido de propor estratégias que favoreçam o desenvolvimento do estudante nos aspectos sociais e humanísticos, com foco na identidade profissional.

Percurso metodológico

Considerando que o objeto desta pesquisa trata da interpretação do sentido que estudantes atribuem à imagem que idealizam de si enquanto futuros médicos44 Moreto G, Federici VP, Silva VR, Pacheco FM, Blasco PG. O profissionalismo e a formação médica de excelência: desafios encontrados na academia e na prática clínica. Arch Med Fam. 2018; 20(4):183-9., o estudo foi qualitativo.

Selecionaram-se 32 participantes, no universo de alunos de duas universidades, uma brasileira e outra portuguesa. A definição das instituições considerou a proximidade cultural entre os países, a migração frequente de médicos brasileiros para Portugal e o interesse na realização do estudo pelas gestoras dos cursos de Medicina.

Tomou-se como critério de inclusão estar no último ano do curso de Medicina; e de exclusão, ter idade superior a 25 anos, garantindo amostra de concludentes que ingressaram adolescentes, consoante ao perfil de ingressantes, comparados com este grupo, em outros recortes deste estudo.

Não houve definição prévia do número de participantes, utilizando-se o critério de saturação das respostas para interrupção da coleta quando foi observada a repetição frequente das falas. A amostra foi selecionada por conveniência, consultando-se os concludentes sobre o interesse em participar da pesquisa e incluindo-os após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Os participantes estão caracterizados na tabela 1.

Tabela 1
Caracterização dos participantes entrevistados no Brasil e em Portugal

A começar pela natureza administrativa das instituições, os cursos incluídos no estudo, privado no Brasil e público em Portugal, apresentam importantes diferenças entre si.

No Brasil, o curso de Medicina da Universidade de Fortaleza (Unifor) implantado em 2006 tem currículo modular que integra teoria e prática desde o primeiro ano. A inserção nos cenários de assistência à saúde acontece no primeiro semestre e nos dois últimos anos, os estudantes desenvolvem autonomia no atendimento ao paciente em enfermarias, ambulatórios e serviços de urgência e emergência em rodízios de estágio supervisionado.

Em Portugal, a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) é centenária e tem currículo disciplinar, atualizado em 2013, que integra áreas disciplinares nos três anos teóricos iniciais e áreas transversais nos últimos três anos, que constituem o ciclo clínico. Neste, as atividades práticas são precedidas por atividades teóricas e a participação dos alunos nos serviços de saúde se dá principalmente por meio da observação dos atendimentos médicos.

As duas escolas médicas apresentam em comum uma excelente avaliação externa e formação humanística nos seus projetos pedagógicos. Como principal diferença, destaca-se o modelo de ensino. Na FMUP (Portugal), prevalece a aprendizagem baseada em ciência, com foco no conteúdo. Na Unifor (Brasil), a aprendizagem é baseada em problemas e o currículo integrado é centrado no estudante, focado na aquisição de competências.

A coleta de dados ocorreu por meio de entrevistas semiestruturadas. Inicialmente, o participante foi convidado a se imaginar como médico e desenvolver um desenho que representasse o médico que ele quer ser, imaginando todos os envolvidos nesta performance: cenário de atuação; público atendido; e relação com esse público e com a equipe de saúde.

Os participantes demonstraram timidez em compartilhar seus desenhos; mas todos concordaram em participar após serem informados de que estes não seriam analisados ou publicados.

O objetivo do desenho foi permitir que os estudantes olhassem para si e para as relações estabelecidas durante o curso e facilitar a reflexão sobre a imagem ou performance ideal do médico que pretendem ser. A utilização de desenhos em pesquisas pode estimular as dimensões emocionais e psicológicas, pouco enfatizadas por métodos de cunho racional1414 Marques MRC. Emocional’minto - mostro ou escondo o que sinto? Demonstração das emoções através do desenho [dissertação]. Lisboa: Universidade de Lisboa; 2019.,1515 Grubits S, Oliveira EA. Rabiscos e emoções: nova perspectiva sobre o desenvolvimento do desenho. Aval Psicol. 2020; 19(2):213-2.. As entrevistas contemplam uma maior profundidade quando se almejam informações subjetivas advindas da reflexão do sujeito sobre sua realidade1616 Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14a ed. São Paulo: Editora Hucitec; 2014..

Concluído o desenho, os participantes foram convidados a explicá-lo, partindo da seguinte solicitação disparadora: “Me descreva esse desenho, demonstrando em que cenário estará atuando, o público que estará atendendo, a sua relação com esse público e com a equipe de saúde”. Em seguida, responderam às seguintes perguntas: “Nesse contexto, qual o elemento mais importante para sua atuação profissional?”; “Quando você ingressou no curso, você tinha essa mesma percepção, ou ela mudou no decorrer do tempo?”; “O que mudou?”; “O que permaneceu?”; “A quais fatores você atribui as mudanças e as persistências?”; e “Como a universidade e os ambientes de prática interferiram para que suas percepções mudassem ou permanecessem?”

Como as pesquisadoras brasileiras eram professoras e gestora do curso de Medicina no período da coleta de dados, no Brasil, esta foi realizada por alunos do Programa de Iniciação à Pesquisa de abril a maio de 2018 e, em Portugal, pelas pesquisadoras brasileiras em abril de 2019. As entrevistas ocorreram na universidade, em salas reservadas, sendo garantidos o conforto e a privacidade necessários para a coleta de dados.

As entrevistas, após o desenho, tiveram duração média de 11 minutos e foram gravadas e transcritas, de modo a contemplarem a opinião dos entrevistados e os desenhos guardados, respeitando-se sua integridade.

Com o objetivo de proteger as identidades dos participantes, adotaram-se a letra “C” (concludentes), a letra “B” (Brasil) ou “P” (Portugal) e algarismos que enumeram os participantes após cada fala transcrita.

A análise de conteúdo na modalidade temática1717 Minayo MCS, Deslandes SF, Gomes R. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 30a ed. Petrópolis: Vozes; 2015.,1818 Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2011. iniciou-se com a leitura em profundidade dos depoimentos, buscando os sentidos manifestados, relacionando as estruturas semânticas (significantes) com as estruturas sociológicas (significados) emergentes do material e extraindo as ideias associadas que confluíram para seis núcleos de sentido e três categorias temáticas.

As temáticas foram interpretadas à luz da dramaturgia de Goffman, abordagem que utiliza conceitos do teatro para explicar a forma como os indivíduos se apresentam e interagem, fazendo uma representação de si mesmos, divididos em dois papéis fundamentais: ator e personagem. Nessa concepção, o mundo é um palco e a interação entre as pessoas ocorre sob a influência recíproca dos indivíduos sobre suas ações quando estão diante um do outro fisicamente1919 Volpato AN, Gomes AC, Yadomi S. Metáfora do palco: papéis e atores na cena organizacional midiatizada. Inmediac Comun. 2020; 15(2):139-56.,2020 Goffman E. A representação do eu na vida cotidiana. 20a ed. Petrópolis: Vozes; 2014..

A percepção da autoimagem e a idealização da performance profissional estão intimamente relacionadas ao modelo de atuação profissional e das interações sociais que um determinado aluno terá ao se tornar médico, justificando a escolha desse referencial teórico para a análise dos resultados neste estudo.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Fortaleza (parecer n. 3.954.616) e pela Comissão de Ética do Complexo Hospitalar Universitário de São João/Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

Resultados e discussão

A partir das percepções dos concludentes entrevistados, emergiram três temáticas centrais, interpretadas à luz da Dramaturgia de Goffman: monólogo, teatro interativo e bastidores2020 Goffman E. A representação do eu na vida cotidiana. 20a ed. Petrópolis: Vozes; 2014., expressas na tabela 2.

Tabela 2
Rede interpretativa da análise por temas centrais e núcleos de sentido

Em analogia com a representação teatral2020 Goffman E. A representação do eu na vida cotidiana. 20a ed. Petrópolis: Vozes; 2014., o palco é o cenário no qual o concludente se imagina atuando, o ator é o estudante, o personagem é o médico que ele pretende ser e os atributos demonstrados na encenação são os elementos importantes na construção do personagem na percepção dos atores. Os bastidores são elementos que contribuem para a atuação do personagem. O paciente é representado pelo público, e os membros da equipe participam do elenco de atores.

Monólogo: o personagem centrado em si

De origem grega, monólogo significa “que fala sozinho”. No teatro, monólogo é a representação feita somente por um ator ou atriz que se reporta a si mesmo2121 Santana AL. Monólogo [Internet]. Palhoça: Infoescola; 2021 [citado 21 Abr 2021]. Disponível em: https://www.infoescola.com/artes-cenicas/monologo/
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. Neste estudo, classificaram-se como monólogos os núcleos de sentido que remetem ao cenário e personagem centrados em si: o especialista como cenário e a priorização do conhecimento sobre as relações interpessoais.

Este eixo temático, presente somente nas narrativas dos portugueses, pode estar associado ao modelo tradicional de ensino focado no conteúdo, composto por uma carga horária predominantemente teórica, e ao papel de observadores nas atividades práticas.

O especialista como cenário

Apesar de terem sido estimulados a incluir no cenário o público atendido e a relação com público e equipe de saúde, quatro acadêmicos portugueses idealizaram seu cenário voltados para si, sem considerar paciente ou equipe.

Eu me vejo nos hospitais, num internamento, em que estou com as pessoas quando elas estão doentes e, depois, nunca mais as vejo. (CP9)

Outro resultado perceptível neste grupo é a predileção pelo hospital, que pode estar associada à formação centrada na doença, com atividades práticas mais frequentes em ambientes hospitalares. O curso de Medicina português, incluído no estudo, está inserido em um complexo hospitalar e somente alguns estudantes vivenciam atividades práticas nos centros de saúde, o que é contraditório com o avanço obtido pela Atenção Primária à Saúde (APS) em Portugal desde a sua reforma iniciada em 20052222 Lapão LV, Pisco L. A reforma da atenção primária à saúde em Portugal, 2005-2018: o futuro e os desafios da maturidade. Cad Saude Publica. 2019; 35 Supl 2:e00042418. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311X00042418.
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.

O nosso dia a dia é sobretudo no hospital e, por isso, acho que nós nos vemos mais no hospital do que fora.

(CP7)

A Medicina é uma ciência pautada nas interações sociais. Contudo, o avanço da tecnologia e a superespecialização da prática médica ao longo do tempo contribuíram para o comprometimento desse aspecto2323 Flexner A. Apêndice. In: Ordine N. La utilidad de lo inutil: manifiesto. Barcelona: Acandilado; 2013. p. 153-76.,2424 González MAS. El humanismo y la enseñanza de las humanidades médicas. Educ Med. 2017; 18(3):212-8., levando à visão do médico centrado em si.

A ausência da relação interpessoal na representação do cenário deste grupo de concludentes leva à reflexão sobre a imagem do médico idealizado, discordante de outros estudos55 Sassi AP, Seminotti EP, Paredes EAP, Vieira MB. O ideal profissional na formação médica. Rev Bras Educ Med. 2020; 44(1):e044.,1010 Cuesta-Briand B, Auret K, Johnson P, Playford D. ‘A world of difference’: qualitative study of medical students’ views on professionalism and the ‘good doctor’. BMC Med Educ. 2014; 14:77.

11 Iliescu ML, Carauleanu A. The portrait of a good doctor: conclusions from a patients and medical students survey. Rev Cercet Interv Soc. 2014; 47:261-71.

12 Steiner-Hofbauer V, Schrank B, Holzinger A. What is a good doctor? Wien Med Wochenschr. 2018; 168(15-16):398-405.
-1313 Ponte J. O que é um bom médico? Acta Med Port. 2019; 32(9):565-7., que demonstraram a associação entre as competências técnicas e sociais e é incompatível com o perfil do egresso esperado para o século XXI, descrito a partir de princípios e compromissos necessários para construir relações pautadas pela integridade, ética, justiça social e trabalho em equipe, visando à excelência no exercício profissional44 Moreto G, Federici VP, Silva VR, Pacheco FM, Blasco PG. O profissionalismo e a formação médica de excelência: desafios encontrados na academia e na prática clínica. Arch Med Fam. 2018; 20(4):183-9..

A priorização do conhecimento sobre as relações interpessoais

Quando questionados sobre o elemento mais importante para a sua atuação profissional, cinco portugueses apontaram conhecimento, experiência e autocontrole, sem mencionar competências sociais ou atributos do profissionalismo, valorizados nas publicações de educação médica44 Moreto G, Federici VP, Silva VR, Pacheco FM, Blasco PG. O profissionalismo e a formação médica de excelência: desafios encontrados na academia e na prática clínica. Arch Med Fam. 2018; 20(4):183-9.,2525 Salloch S. Same but different: why we should care about the distinction between professionalism and ethics. BMC Med Ethics. 2016; 17(1):44.,2626 Park S-Y, Shon C, Kwon OY, Yoon TY, Kwon I. A qualitative thematic content analysis of medical students’ essays on professionalism. BMC Med Educ. 2017; 17(1):79..

Versatilidade, integração do conhecimento e do trabalho e atenção ao detalhe.

(CP9)

Ter boa formação, bons conhecimentos teóricos e muita experiência.

(CP10)

A importância da aquisição de conhecimentos para o médico é indiscutível. A principal característica da Medicina, descrita por Freidson em seu estudo sociológico sobre a profissão médica, é a preeminência, justificada pelo prestígio social associado ao domínio do conhecimento médico2727 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora Unesp; 2009.. Entretanto, surpreende o conhecimento e a experiência como únicos atributos na representação de um quarto dos concludentes portugueses e a ausência desses elementos que caracterizam competência técnica na quase totalidade dos concludentes brasileiros.

O conhecimento é essencial, mas o verdadeiro desafio do médico é ser capaz de entender o ser humano e aproximar-se de seus pacientes, oferecendo compreensão e ajuda44 Moreto G, Federici VP, Silva VR, Pacheco FM, Blasco PG. O profissionalismo e a formação médica de excelência: desafios encontrados na academia e na prática clínica. Arch Med Fam. 2018; 20(4):183-9.,2828 Blasco PG, Moreto G. Teaching empathy through movies: reaching learners’ affective domain in medical education. J Educ Learn. 2012; 1(1):22-34.. Estudo recente sobre a imagem profissional na percepção de acadêmicos de Medicina no Nordeste do Brasil descreveu o “bom médico” como um profissional que mantém em equilíbrio o “lado humano” e a “competência técnica”55 Sassi AP, Seminotti EP, Paredes EAP, Vieira MB. O ideal profissional na formação médica. Rev Bras Educ Med. 2020; 44(1):e044..

A constante evolução do conhecimento torna mais relevante, para os futuros profissionais, aprenderem a aprender, reconhecendo a importância das melhores evidências científicas para a solução dos problemas em saúde. Estudos têm demonstrado a importância do desenvolvimento pessoal e profissional na formação, incluindo a aquisição de valores, comportamentos e atitudes que compõem o construto do profissionalismo médico11 Frenk J, Chen L, Bhutta ZA, Cohen J, Crisp N, Evans T, et al. Health professionals for a new century: transforming education to strengthen health systems in an interdependent world. Lancet. 2010; 376(9756):1923-58.

2 Passi V, Doug M, Peile E, Thistlethwaite J, Johnson N. Developing medical professionalism in future doctors: a systematic review. Int J Med Educ. 2010; 1:19-29.

3 Goldie J. The formation of professional identity in medical students: considerations for educators. Med Teach. 2012; 34(9):641-8.
-44 Moreto G, Federici VP, Silva VR, Pacheco FM, Blasco PG. O profissionalismo e a formação médica de excelência: desafios encontrados na academia e na prática clínica. Arch Med Fam. 2018; 20(4):183-9.,88 Cruess RL, Cruess SR, Boudreau JD, Snell L, Steinert Y. Reframing medical education to support professional identity formation. Acad Med. 2014; 89(11):1446-54.,1212 Steiner-Hofbauer V, Schrank B, Holzinger A. What is a good doctor? Wien Med Wochenschr. 2018; 168(15-16):398-405.,2323 Flexner A. Apêndice. In: Ordine N. La utilidad de lo inutil: manifiesto. Barcelona: Acandilado; 2013. p. 153-76.,. Existe, contudo, um descompasso nesse percurso de transformação da educação médica, pois muitas escolas ainda focam o conteúdo e priorizam a avaliação do conhecimento.

Teatro interativo: valorizando a interação em cena

O teatro interativo é a representação na qual o público é incluído na narrativa com o objetivo de compartilhar ideias, sendo o espetáculo apenas pretexto para uma experiência pessoal2929 Pavis P. Para repensar o trabalho do ator: algumas considerações improvisadas e provisórias sobre a atuação hoje. Rev Bras Estud Presença. 2016; 6(1):173-82..

Neste estudo, o teatro interativo é representado por dois núcleos de sentido: a centralidade das relações na descrição do cenário e a construção do personagem centrada no público assistido.

A centralidade das relações na descrição do cenário

O cenário é tudo o que se coloca para dialogar com os atores na construção da cena. Cerca de 80% dos concludentes portugueses e todos os brasileiros trouxeram as relações com pacientes, familiares e equipe para a descrição do seu cenário ideal, demonstrando valorizar a proximidade e a construção de um vínculo com o paciente.

Eu me imagino numa especialidade de contato com as pessoas, no centro de saúde talvez, porque há um acompanhamento mais próximo do doente.

(CP8)

Mesmo quando a especialidade médica e a unidade de saúde foram mencionadas, manteve-se a relação interpessoal harmônica e empática no centro da descrição do cenário de atuação.

Equipe de saúde de mãos dadas com família e paciente, porque todos têm que trabalhar juntos.

(CB1)

Quero ser dermatologista e sentir que faço parte da comunidade, sentir que posso ter uma relação mais humana.

(CP4)

Ser médico exige relação interpessoal e, muitas vezes, em situação de desgaste físico e estresse emocional. Ser capaz de manter a calma sob pressão e estabelecer uma boa relação com pacientes, familiares e equipe, demonstrando reconhecer e acolher a dor do outro, são atitudes fundamentais para o exercício da Medicina1010 Cuesta-Briand B, Auret K, Johnson P, Playford D. ‘A world of difference’: qualitative study of medical students’ views on professionalism and the ‘good doctor’. BMC Med Educ. 2014; 14:77.,1212 Steiner-Hofbauer V, Schrank B, Holzinger A. What is a good doctor? Wien Med Wochenschr. 2018; 168(15-16):398-405.,2626 Park S-Y, Shon C, Kwon OY, Yoon TY, Kwon I. A qualitative thematic content analysis of medical students’ essays on professionalism. BMC Med Educ. 2017; 17(1):79..

A formação da identidade profissional acontece a partir das inúmeras interações vivenciadas ao longo da vida, marcadamente, aquelas estabelecidas durante a formação e o exercício profissional55 Sassi AP, Seminotti EP, Paredes EAP, Vieira MB. O ideal profissional na formação médica. Rev Bras Educ Med. 2020; 44(1):e044.. A liderança e o trabalho em equipe, competências essenciais e valorizadas por instituições internacionais responsáveis pela certificação de escolas médicas em diferentes países3030 Rosa GFC, Rosa MH, Barros MCV, Hattori WT, Paulino DB, Raimondi GA. O MBTI na educação médica: uma estratégia potente para aprimorar o trabalho em equipe. Rev Bras Educ Med. 2019; 43(4):15-25.

31 General Medical Council. Outcomes for graduates [Internet]. London: General Medical Council; 2020 [citado 18 Dez 2021]. Disponível em: https://tinyurl.com/bpr37tyj
https://tinyurl.com/bpr37tyj...

32 Royal College of Physicians and Surgeons of Canada. CanMEDS: better standards, better physicians, better care. Ottawa: Royal College; 2015 [citado 18 Dez 2021]. Disponível em: https://www.royalcollege.ca/rcsite/canmeds/canmeds-framework-e
https://www.royalcollege.ca/rcsite/canme...
-3333 Australian Medical Council. Accreditation standards and procedures [Internet]. Canberra: Australian Medical Council; 2021 [citado 5 Mar 2021]. Disponível em: https://www.amc.org.au/accreditation-and-recognition/accreditation-standards-and-procedure
https://www.amc.org.au/accreditation-and...
, estão presentes também nas Diretrizes Nacionais para a Graduação em Medicina no Brasil3434 Brasil. Resolução nº 3, de 20 de Junho de 2014. Institui diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em medicina e dá outras providências. Diário Oficial da União. 20 Jun 2014..

O médico não trabalha sozinho, a relação com a equipe tem que ser a melhor possível para que o beneficiado seja o paciente.

(CB7)

Trabalho em equipe é transversal a todas as situações, respeito e consideração pelo trabalho de cada um que é diferente, mas que não é mais ou menos importante, é fundamental.

(CP13)

Em consonância com a literatura científica sobre o trabalho em equipe nos serviços de saúde, observou-se a valorização das relações interpessoais na descrição do cenário ideal pela maioria dos concludentes entrevistados. A preocupação com uma relação pautada pelo respeito mútuo foi uma constante nas narrativas que, frequentemente, ressaltaram a importância do trabalho de cada membro da equipe para o bom desempenho do médico e melhores resultados para os pacientes.

A construção do personagem centrada no público assistido

Cuidado, empatia, comunicação, respeito, responsabilidade, compaixão, relação médico-paciente, relação interpessoal e trabalho em equipe emergiram como elementos importantes para a atuação profissional na percepção dos concludentes entrevistados nos dois países.

Saber escutar, ser compreensivo e tentar perceber todas as nuances do pensamento humano.

(CP1)

Ser empático, ter capacidades sociais e comunicativas e trabalhar em equipe.

(CP13)

A vontade de fazer a diferença, de realmente tá ali do lado, cuidar e fazer o meu melhor.

(CB4)

O respeito com os profissionais, os familiares e o próprio paciente.

(CB9)

Embora não exista um conceito universalmente aceito de profissionalismo, observa-se, na literatura científica, a ênfase na orientação dos profissionais para atender às necessidades do público assistido. Os elementos presentes nas narrativas analisadas coincidem com a descrição, em diferentes estudos, de atributos desse complexo construto55 Sassi AP, Seminotti EP, Paredes EAP, Vieira MB. O ideal profissional na formação médica. Rev Bras Educ Med. 2020; 44(1):e044.,1010 Cuesta-Briand B, Auret K, Johnson P, Playford D. ‘A world of difference’: qualitative study of medical students’ views on professionalism and the ‘good doctor’. BMC Med Educ. 2014; 14:77.,2525 Salloch S. Same but different: why we should care about the distinction between professionalism and ethics. BMC Med Ethics. 2016; 17(1):44.,2626 Park S-Y, Shon C, Kwon OY, Yoon TY, Kwon I. A qualitative thematic content analysis of medical students’ essays on professionalism. BMC Med Educ. 2017; 17(1):79.,3535 Birden H, Glass N, Wilson I, Harrison M, Usherwood T, Nass D. Defining professionalism in medical education: a systematic review. Med Teach. 2014; 36(1):47-61.

36 Langendyk V, Mason G, Wang S. How do medical educators design a curriculum that facilitates student learning about professionalism? Int J Med Educ. 2015; 7:32-43.

37 Hodges BD, Ginsburg S, Cruess R, Cruess S, Delport R, Hafferty F, et al. Assessment of professionalism: recommendations from the Ottawa 2010 Conference. Med Teach. 2011; 33(5):354-63.
-3838 Randall VF, Foster CW, Olsen CH, Warwick AB, Fernandez KA, Crouch G. Defining medical professionalism across the years of training and experience at the uniformed services university of the health sciences. Mil Med. 2016; 181(10):1294-9. e remetem à construção do personagem com foco no público e na humanização do cuidado.

Treze concludentes portugueses e uma brasileira incluíram a necessidade de capacitação técnica, mas mantiveram o paciente no centro da atenção, associando cuidado, empatia, habilidade de comunicação e trabalho em equipe à importância da aquisição de conhecimento e experiência.

Tenho que ter uma boa formação a nível da comunicação, um certo trabalho da parte humana e não só da parte médica e científica em si.

(CP20)

Capacidades de comunicação para perceber tudo que o doente tem e conhecimento também, mas isso está implícito.

(CP11)

Embora existam similaridades nas narrativas, a avaliação da frequência de citação dos atributos evidencia diferença na percepção do elemento mais importante para a atuação profissional no contexto idealizado. O grupo de portugueses priorizou o conhecimento, a habilidade de comunicação e a empatia, enquanto os brasileiros valorizaram o trabalho em equipe, a relação médico-paciente e a relação interpessoal, citada com a mesma frequência de cuidado e empatia.

Esse resultado pode estar relacionado às diferenças curriculares, com a priorização de atividades teóricas em Portugal e maiores oportunidades de vivências práticas no Brasil, oportunizando aos estudantes brasileiros entrevistados maior interação com pacientes e equipes nos serviços de saúde, prioritariamente na APS, favorecendo a construção da identidade profissional com o foco nas interações sociais e a possível influência do legado das políticas públicas de saúde desenvolvidas nas duas últimas décadas no Brasil.

Bastidores: a influência por trás da cena

Os bastidores no teatro representam o lugar no qual ficam os elementos que contribuem para a construção da cena, invisíveis para o público, mas essenciais para o sucesso da representação.

Os elementos trazidos a priori e a influência da universidade são os núcleos de sentido dessa temática, que emergiu da análise das respostas sobre os fatores que influenciaram na construção da autoimagem profissional ideal.

Elementos trazidos a priori

Cinco concludentes portugueses e um brasileiro acreditam que a universidade contribuiu apenas para a formação técnica e que os elementos valorizados por eles, relacionados ao papel social e aos atributos do profissionalismo – como empatia, cuidado, respeito e trabalho em equipe –, foram trazidos a priori.

Acho que vem da minha personalidade, porque desde criança tenho este sentido social um bocado desenvolvido.

(CP13)

O profissionalismo tem sido descrito como um conjunto de características de personalidade por autores que acreditam que esses traços são preditores de sucesso acadêmico3737 Hodges BD, Ginsburg S, Cruess R, Cruess S, Delport R, Hafferty F, et al. Assessment of professionalism: recommendations from the Ottawa 2010 Conference. Med Teach. 2011; 33(5):354-63.,3939 Silva JM. Educação médica e profissionalismo. Acta Med Port. 2013; 26(4):420-7.

40 Vieira MB, Godinho P, Gaibino N, Dias R, Sousa A, Madanelo I, et al. Satisfação com o Internato Médico em Portugal. Acta Med Port. 2016; 29(12):839-53.
-4141 Ribeiro JC, Donato H, Massano J, Marinho RT. Educação médica em Portugal. Acta Med Port. 2016; 29(12):786-7.. Estudo com alunos de Medicina na Irlanda mostrou que fatores da personalidade podem influenciar no comportamento profissional futuro4242 O’Tuathaigh CMP, Idris AN, Duggan E, Costa P, Costa MJ. Medical students’ empathy and attitudes towards professionalism: relationship with personality, specialty preference and medical programme. PLoS One. 2019; 14(5):e0215675..

A educação recebida dos pais, vivências pessoais e atividades realizadas na infância e na adolescência foram os outros elementos trazidos a priori na percepção dos participantes deste estudo.

Acho que tem muita influência a forma como fui criado e o fato de ter ingressado no escotismo me deu uma visão sobre ação humanitária.

(CP2)

Segundo o sociólogo francês Pierre Bourdieu, existem elementos constitutivos do acúmulo cultural, transmitido pela educação informal, especialmente familiar, que contribuem para definir as atitudes face ao capital cultural e à instituição escolar, provocando uma forte relação entre desempenho na escola e origem socioeconômica e cultural dos estudantes4343 Stephenson A, Higgs R, Sugarman J. Teaching professional development in medical schools. Lancet. 2001; 357(9259):867-70..

A influência do contexto familiar na estruturação do comportamento tem sido demonstrada por diversos estudos. Ao observar as atitudes da família, a criança inconscientemente desenvolve um modelo mental de ação e de regulação de emoções que guiará suas relações interpessoais no futuro4444 Moreto G, González-Blasco P, Craice-de-Benedetto MA. Reflexiones sobre la ensenãnza de la empatía y la educación médica. Aten Fam. 2014; 21(3):94-7.,4545 Hojat M, Vergare MJ, Maxwell K, Brainard G, Herrine SK, Isenberg GA, et al. The devil is in the third year: a longitudinal study of erosion of empathy in medical school. Acad Med. 2009; 84(9):1182-91..

Observa-se que os elementos mencionados como “trazidos a priori” estão intimamente relacionados à motivação que os influenciou na escolha profissional e que foi mantida ao longo do curso na imagem idealizada do “ser médico”.

Influência da universidade

A influência da universidade na formação do “médico que eu quero ser” esteve presente nas falas da maioria dos entrevistados, representada por três aspectos interligados entre si: o papel das unidades curriculares, a importância das atividades práticas e a influência das pessoas.

O papel das unidades curriculares

O papel das unidades curriculares, mais citado pelos portugueses, apontaram Humanidades em Medicina e Psicologia Médica, disciplinas teóricas e obrigatórias cursadas no início do curso, quando “ainda não percebiam a sua utilidade”.

Algumas cadeiras de humanidades ajudam a dar essa perspectiva mais humana da Medicina.

(CP20)

Disciplinas que a pessoa diz, isto não é tão relacionado com Medicina e não gosto tanto, e que começam a fazer sentido quando estamos a acabar o curso.

(CP6)

No Brasil, foram citadas Ações Integradas em Saúde (AIS) e Laboratórios de Habilidades Médicas (LH), módulos teórico-práticos, presentes no currículo do primeiro ao quarto ano, que abordam a relação médico-paciente em diferentes cenários, incluindo ambientes de simulação realística, centros de saúde, ambulatórios especializados e hospitais.

No AIS aprendemos a importância de tratar não só a saúde, mas tratar a pessoa e o seu vínculo social.

(CB9)

O papel da empatia e da relação médico-paciente é muito valorizada no LH, inclusive nas provas, e é desenvolvido durante todo o curso.

(CB5).

A Medicina científica do século XX alcançou seu ápice na década de 1960, quando começou a ser criticada por sua desumanização. Objetivando uma prática médica mais humana, foi criado um conjunto de disciplinas chamadas de “humanidades médicas”, que integram disciplinas clássicas – como História, Filosofia, Ética e Religião – com ciências sociais contemporâneas – como Antropologia, Psicologia e Sociologia – e artes, como Literatura, Teatro e Cinema66 Benedetto MAC, Gallian DMC. Narrativas de estudantes de medicina e enfermagem: currículo oculto e desumanização em saúde. Interface (Botucatu). 2018; 22(67):1197-207. doi: https://doi.org/10.1590/1807-57622017.0218.
https://doi.org/10.1590/1807-57622017.02...
,2424 González MAS. El humanismo y la enseñanza de las humanidades médicas. Educ Med. 2017; 18(3):212-8..

Percebe-se, na análise comparativa entre os dois países, que, na percepção dos portugueses, a influência das unidades citadas é pontual, em disciplinas teóricas, cursadas muito antes da prática na assistência, e os conhecimentos adquiridos podem ser resgatados nos últimos anos, quando inicia-se a vivência clínica com pacientes. Já no Brasil, os módulos apontados são longitudinais, do primeiro ao quarto ano, e aliam teoria e prática na assistência aos pacientes, na qual o “lado humano” da Medicina é vivenciado nas interações diárias nos serviços de saúde. Essas interações são possíveis práticas e processos desumanizantes, entretanto, possibilitam ao estudante refletir sobre o que vê, escuta e sente, oportunizando uma aprendizagem mais significativa.

A importância das atividades práticas

Na percepção dos entrevistados, são as atividades práticas e as pessoas que exercem a maior influência na formação do médico. Essa influência é percebida como uma oportunidade de vivenciar as especialidades médicas e fazer escolhas.

Os estágios clínicos, onde temos uma noção do que é ser aquele especialista, influenciou-me na percepção das especialidades.

(CP12)

O contato com os pacientes é essencial, a gente não tem como aprender sobre o que é Medicina e o que é ser médico sem o paciente.

(CB8)

Embora as atividades práticas tenham sido citadas em ambos os países, percebe-se, nas entrelinhas, a diferença no papel dos estudantes, que, no Brasil, assumem o protagonismo e, em Portugal, são observadores na assistência aos pacientes.

Você só entende mesmo quando está vivendo aquilo, quando você tem a responsabilidade do “meu” paciente, eu que tenho que fazer.

(CB10).

Enquanto estamos à espera que algum médico nos deixe assistir uma consulta, conseguimos ver a dinâmica entre médicos e doentes, e o que as pessoas fazem bem e o que fazem mal, e isso nos ajuda a criar uma situação ideal.

(CP20)

A necessidade de incluir o ensino de valores e a avaliação de atitudes no currículo formal da graduação em Medicina vem sendo apontada há algumas décadas. Entretanto, em grande parte das escolas médicas, essa inclusão não tem sido aplicada consistentemente e predominam as conferências e sessões em pequenos grupos nos anos pré-clínicos da formação4646 Bertolin J, Amaral A, Almeida L. Os cursos de graduação podem compensar a falta de capital cultural e background de estudantes? Educ Pesqui. 2019; 45:e185453.,4747 Byszewski A, Gill JS, Lochnan H. Socialization to professionalism in medical schools: a Canadian experience. BMC Med Educ. 2015; 15:204..

Nos cenários de prática, as oportunidades de aprendizado permitem aos estudantes uma visão da rotina do trabalho médico, da importância do trabalho em equipe e das relações interpessoais; e tem papel importante no ensino de valores, comportamentos e atitudes. Entretanto, ressalta-se a necessidade de um espaço para reflexão das interações vivenciadas e discussão sobre os papéis a serem desempenhados no futuro profissional.

A frequente inexistência de vínculo de profissionais que atuam nos cenários clínicos com as universidades torna imprevisível a influência dessas interações na construção da identidade profissional, necessitando um acompanhamento atento, nem sempre presente, por quem faz a gestão da aprendizagem nas instituições de ensino.

A influência das pessoas

Para além da influência nos cenários de prática, o convívio com professores e pares durante todo o curso revelou-se uma fonte de influência e de aprendizado na percepção dos participantes deste estudo.

Com os colegas, vamos partilhando opiniões e isso acaba por mudar a nossa visão das coisas. (CP6)

A ideia geral do que eu quero ser como médico é um balanço do que ouvimos, do que nos contam e do que vemos fazer, às vezes, contrário ao que nos dizem. (CP17)

A influência do professor no processo de formação da identidade profissional é reconhecida na percepção de estudantes de Medicina em diferentes estudos. O estudante, durante sua formação, aprende, além das competências técnicas, a forma de ser e de atuar como médico, espelhando-se na atuação dos profissionais com quem interage ao longo do curso44 Moreto G, Federici VP, Silva VR, Pacheco FM, Blasco PG. O profissionalismo e a formação médica de excelência: desafios encontrados na academia e na prática clínica. Arch Med Fam. 2018; 20(4):183-9.,55 Sassi AP, Seminotti EP, Paredes EAP, Vieira MB. O ideal profissional na formação médica. Rev Bras Educ Med. 2020; 44(1):e044.,4848 Cruess RL, Cruess SR, Steiner Y. Amending Miller’s Pyramid to include professional identity formation. Acad Med. 2016; 91(2):180-5..

Eu acho que é mais na parte humana que nós vamos percebendo como é que queremos lidar com o paciente e com a equipe.

(CP3)

Compatível com o que é descrito na literatura55 Sassi AP, Seminotti EP, Paredes EAP, Vieira MB. O ideal profissional na formação médica. Rev Bras Educ Med. 2020; 44(1):e044.,1010 Cuesta-Briand B, Auret K, Johnson P, Playford D. ‘A world of difference’: qualitative study of medical students’ views on professionalism and the ‘good doctor’. BMC Med Educ. 2014; 14:77., observa-se nas narrativas analisadas a admiração dos concludentes pelos professores e médicos que possuem uma boa relação interpessoal e demonstram atitude coerente com o que ensinam. Por outro lado, percebe-se que os estudantes reconhecem a existência de bons e maus exemplos na universidade.

Às vezes o mesmo professor com quem convivi durante o básico, vi no hospital fazendo o que ele dizia na aula, e isso é muito legal.

(CB9)

Eu tive exemplos tanto de como eu queria quanto como eu não queria ser.

(CB3)

Cada pessoa, a impressão que nos dá, boa ou má, de alguma maneira contribui.

(CP17)

Estudo realizado nos EUA revelou que mais da metade dos concludentes de Medicina de 2016 perceberam uma desconexão entre o que aprenderam e o que viram ser demonstrado na atitude dos professores4949 Lehmann LS, Sulmasy LS, Desai S, ACP Ethics, Professionalism and Human Rights Committee. Hidden curricula, ethics and professionalism: optimizing clinical learning environments in becoming and being a phisycian: a position paper of the American College of Physicians. Ann Intern Med. 2018; 168(7):506-8.. No Brasil, estudo com médicos recém-formados em diferentes regiões do país descreveu que a grande maioria dos participantes – cerca de 85% – vivenciou ou assistiu no curso alguma conduta ética que julgou inadequada, sobretudo na relação com pacientes em cenários de prática5050 Scheffer M. Demografia médica no Brasil 2018. São Paulo: USP, CFM; 2018..

Professores e médicos que acompanham estudantes na prática clínica precisam ser conscientizados do seu papel na modelagem da imagem profissional do futuro médico e da necessidade de seguir os princípios éticos e os valores fundamentais da profissão, valorizando os momentos de interação como oportunidade de formação profissional, além de técnica.

Considerações finais

Ao serem questionados sobre a imagem ideal do “médico que eu quero ser”, os participantes deste estudo refletiram sobre suas trajetórias de formação e foram confrontados com a sua autoimagem profissional, priorizando as relações interpessoais nos cenários de atuação e a construção da identidade profissional centrada nas necessidades do paciente.

Percebe-se que, mesmo diante do reconhecimento da importância da aquisição de valores, atitudes e comportamentos na formação do médico, grande parte da construção da identidade profissional está a cargo do currículo informal e dependente da modelagem não controlada pelas escolas médicas.

Os resultados deste estudo reforçam a importância de trabalhar os aspectos sociais e humanísticos e a necessidade de atenção para a modelagem nos cenários de prática com foco no desenvolvimento da identidade profissional.

Investir na autopercepção dos acadêmicos e na construção da sua autoimagem como médico, desde o início do curso, conscientizando professores e estudantes da influência do currículo oculto, poderá contribuir para nortear o percurso acadêmico e a futura trajetória profissional do médico.

Algumas limitações do estudo podem estar relacionadas ao fato de que os participantes foram autosselecionados, não sendo possível descartar a possibilidade da amostra ter sido composta por alunos com maior interesse nas questões relacionadas ao estudo. Importante notar também que, em estudos qualitativos, algumas das opiniões dos participantes podem ser influenciadas pelo viés da desejabilidade social, em que algumas respostas estão de acordo com o que as pesquisadoras gostariam de ouvir.

Este estudo abre possibilidades para novas investigações, como a relação entre a modelagem na formação das práticas e o modelo de atuação profissional do futuro médico; e o desenvolvimento da identidade profissional nos demais cursos de graduação da área da Saúde.

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  • Financiamento

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    10 Ago 2022
  • Aceito
    15 Set 2022
UNESP Botucatu - SP - Brazil
E-mail: intface@fmb.unesp.br