Competências para a produção do cuidado integral: análise dos processos avaliativos no internato de Medicina da Universidade Federal Fluminense

Competencias para la producción de cuidados integrales: análisis de los procesos de evaluación en el internado de Medicina de la Universidad Federal Fluminense

Monique de Oliveira e Silva Aluisio Gomes da Silva Junior Lilian Koifman Sobre os autores

Resumos

O objetivo deste estudo foi analisar a priorização e valorização de competências para a produção do cuidado integral no internato obrigatório (IO) da faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense. O percurso metodológico contou com análise documental das competências para o IO e suas formas de avaliação, seguido de entrevistas remotas com docentes. A análise de conteúdo categorizou unidades temáticas de acordo com o momento da produção do cuidado integral no encontro com o paciente e nos demais encontros ocorridos para além deste. Foram evidenciadas priorização e valorização da integração de habilidades de comunicação e de técnicas semióticas; e raciocínio clínico com atitudes éticas e humanísticas e de competências relacionadas ao trabalho em equipe; participação em espaços coletivos de discussão; gestão do cuidado; abordagem comunitária; e processo de produção do conhecimento baseado nos signos do “ser médico(a)”.

Palavras-chave
Cuidados integrais de saúde; Competência clínica; Internato de Medicina


El objetivo de este estudio es analizar la priorización y valorización de las competencias para la producción de cuidados integrales en el Internado Obligatorio de la Facultad de Medicina de la Universidad Federal Fluminense. La metodologia incluye análisis documental y entrevistas con profesores. El análisis de contenido fue categorizado en unidades temáticas según el momento de producción de la atención integral: en el encuentro y en los encuentros necessários a partir de este encuentro com el paciente. Em el encuentro, se priorizó la integración de habilidades comunicativas y técnicas semióticas y de razonamiento clínico con actitudes éticas y humanísticas, y en los demás encuentros, las habilidades relacionadas con el trabajo en equipo, participación en espacios colectivos de discusión, gestión del cuidado, enfoque comunitario, además del propio proceso de producción de conocimiento, todos basado en la idea de lo que significa ser médico.

Palabras clave
Atención integral de salud; Competencia clínica; Internado de Medicina


Introdução

O cuidado é um conceito polissêmico por ter uma construção social no sentido atribuído a ele. No entanto, temos nele a essência do que significa ser humano, seu modo de ser essencial, pois sem o cuidado que recebe desde seu nascimento à morte, não sobreviveria (e, portanto, não existiria). O ser humano é, portanto, um ser de cuidado11 Anéas TV, Ayres JRCM. Significados e sentidos das práticas de saúde: ontologia fundamental e a reconstrução do cuidado em saúde. Interface (Botucatu). 2011; 15(38):651-62. doi: 10.1590/S1414-32832011000300003.
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2 Boff L. Saber cuidar: ética do humano compaixão pela terra. Petrópolis: Vozes; 1999.

3 Silva Junior AG, Pontes ALM, Henriques RLM. O cuidado como categoria analítica no ensino baseado na integralidade. In: Pinheiro R, Ceccim RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de janeiro: IMS/UERJ, CEPESQ, Abrasco; 2006. p. 93-110.
-44 Ayres JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saude Soc. 2004; 13(3):16-29. .

Ademais, o cuidado em si não se atém ao momento de zelo e atenção, mas àquilo que representa na sua relação com o outro, na preocupação, na responsabilização e no envolvimento afetivo22 Boff L. Saber cuidar: ética do humano compaixão pela terra. Petrópolis: Vozes; 1999.. Atualizando esse conceito no âmbito da saúde, temos o cuidado enquanto prática social inerente a todos os profissionais, por ser meio e fim de todas as suas ações, como um fio condutor da construção da atenção à saúde33 Silva Junior AG, Pontes ALM, Henriques RLM. O cuidado como categoria analítica no ensino baseado na integralidade. In: Pinheiro R, Ceccim RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de janeiro: IMS/UERJ, CEPESQ, Abrasco; 2006. p. 93-110..

Ainda que justificado ou promovido por um êxito técnico (no sentido biomédico ou patológico), apenas assumindo uma conformação humanizada teremos a produção do cuidado neste encontro paciente-profissionais-serviço44 Ayres JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saude Soc. 2004; 13(3):16-29. . Portanto, é imprescindível a centralidade no uso de tecnologias leves55 Merhy EE. Um ensaio sobre o médico e suas valises tecnológicas: contribuições para compreender as reestruturações produtivas do setor saúde. Interface (Botucatu). 2000; 4(6):109-16. doi: 10.1590/S1414-32832000000100009.
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, reconhecendo as subjetividades ali presentes em uma dimensão dialógica de um ouvir-se e ouvir o outro, com suas singularidades, formas de viver, desejos, necessidades, expectativas e saberes, sendo essa a própria riqueza do encontro, a partir do qual, juntos, constroem estratégias cuidadoras11 Anéas TV, Ayres JRCM. Significados e sentidos das práticas de saúde: ontologia fundamental e a reconstrução do cuidado em saúde. Interface (Botucatu). 2011; 15(38):651-62. doi: 10.1590/S1414-32832011000300003.
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,33 Silva Junior AG, Pontes ALM, Henriques RLM. O cuidado como categoria analítica no ensino baseado na integralidade. In: Pinheiro R, Ceccim RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de janeiro: IMS/UERJ, CEPESQ, Abrasco; 2006. p. 93-110.,44 Ayres JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saude Soc. 2004; 13(3):16-29. ,66 Seixas CT, Merhy EE, Baduy RS, Slomp Junior H. La integralidad desde la perspectiva del cuidado en salud: una experiencia del sistema único de salud en Brasil. Salud Colect. 2016; 12(1):113-23.. Estas, portanto, possibilitam a condução de atitudes terapêuticas que dialoguem com o projeto de felicidade de cada um e atualização de seu sentido existencial a cada encontro44 Ayres JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saude Soc. 2004; 13(3):16-29. .

No âmbito da formação em Saúde, para que essas mudanças de paradigma aconteçam, as instituições formadoras necessitam aprimorar suas metodologias relacionadas ao cuidado77 Damas KCA, Munari DB, Siqueira KM. Cuidando do cuidador: reflexões sobre o aprendizado dessa habilidade. Revista eletrônica de enfermagem. 2006; 6(2):272-8. doi: 10.5216/ree.v6i2.811.
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e ter a integralidade como princípio de ensino33 Silva Junior AG, Pontes ALM, Henriques RLM. O cuidado como categoria analítica no ensino baseado na integralidade. In: Pinheiro R, Ceccim RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de janeiro: IMS/UERJ, CEPESQ, Abrasco; 2006. p. 93-110.,88 Makuch DMV, Zagonel IPS. A integralidade do cuidado no ensino na área da saúde: uma revisão sistemática. Rev Bras Educ Med. 2017; 41(4):515-24. doi: 10.1590/1981-52712015v41n4RB20170031.
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,99 Pinheiro R, Ceccim RB. Experienciação, formação, cuidado e conhecimento em saúde: articulando concepções, percepções e sensações para efetivar o ensino da integralidade. In: Pinheiro R, Ceccim RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de janeiro: IMS/UERJ, CEPESQ, Abrasco; 2006. p. 13-35.. Nesse sentido, ressalta-se a vivência e observação de todas as ações e relações construídas entre discentes, docentes, pacientes, serviços e universidade, que se conecta ao protagonismo do aluno em seu processo de formação33 Silva Junior AG, Pontes ALM, Henriques RLM. O cuidado como categoria analítica no ensino baseado na integralidade. In: Pinheiro R, Ceccim RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de janeiro: IMS/UERJ, CEPESQ, Abrasco; 2006. p. 93-110.,88 Makuch DMV, Zagonel IPS. A integralidade do cuidado no ensino na área da saúde: uma revisão sistemática. Rev Bras Educ Med. 2017; 41(4):515-24. doi: 10.1590/1981-52712015v41n4RB20170031.
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9 Pinheiro R, Ceccim RB. Experienciação, formação, cuidado e conhecimento em saúde: articulando concepções, percepções e sensações para efetivar o ensino da integralidade. In: Pinheiro R, Ceccim RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de janeiro: IMS/UERJ, CEPESQ, Abrasco; 2006. p. 13-35.
-1010 Grosseman S, Patrício ZMA. Relação médico-paciente e o cuidado humano: subsídios para promoção da educação médica. Rev Bras Educ Med. 2004; 28(2):99-105. doi: 10.1590/1981-5271v28.2-014.
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Além disso, temos a interdisciplinaridade (com tendência à transdisciplinaridade), essencial à produção do cuidado integral e à importância da integração ensino-serviço33 Silva Junior AG, Pontes ALM, Henriques RLM. O cuidado como categoria analítica no ensino baseado na integralidade. In: Pinheiro R, Ceccim RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de janeiro: IMS/UERJ, CEPESQ, Abrasco; 2006. p. 93-110.. Ainda, há o caráter indissociável da integralidade com os demais princípios da equidade e universalidade; e a importância do controle social a partir dos mecanismos de participação social no Sistema Único de Saúde (SUS)1111 Pinheiro R, Ferla A, Silva Júnior AG. Integrality in the population’s health care programs. Cienc Saude Colet. 2007; 12(2):343-9..

Poderia soar redundante a expressão “cuidado integral”, mas essa escolha objetiva a atenção para a importância da prática da integralidade viabilizando a produção do cuidado por meio da organização dos processos de trabalho das equipes, gestão do cuidado, integração das redes de saúde, interdisciplinaridade e intersetorialidade, no planejamento e na implementação de políticas públicas1212 Mattos RA. A integralidade na prática (ou sobre a prática da integralidade). Cad Saude Publica. 2004; 20(5):1411-6..

Além da análise das organizações curriculares, precisamos nos atentar às constantes tensões entre as linhas de forças que atravessam as atividades acadêmicas durante a formação médica. É necessário problematizar conteúdos e metodologias de ensino e avaliação enquanto questões não apenas educacionais, mas também políticas e ideológicas, refletindo sobre a quem ou a que grupo servem a abordagem ou não de determinados temas99 Pinheiro R, Ceccim RB. Experienciação, formação, cuidado e conhecimento em saúde: articulando concepções, percepções e sensações para efetivar o ensino da integralidade. In: Pinheiro R, Ceccim RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de janeiro: IMS/UERJ, CEPESQ, Abrasco; 2006. p. 13-35..

O conceito de competências no contexto da formação médica

As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) trouxeram para a formação médica o modelo curricular baseado no conceito de competências, porém, com uma diversidade de entendimentos sobre o tema. Compreendendo competências como a capacidade de mobilização de saberes em ato1313 Perrenoud P. Construir competências desde a escola. Porto alegre: Artmed; 1999. e das infinitas possiblidades a partir dos encontros para a produção do cuidado integral11 Anéas TV, Ayres JRCM. Significados e sentidos das práticas de saúde: ontologia fundamental e a reconstrução do cuidado em saúde. Interface (Botucatu). 2011; 15(38):651-62. doi: 10.1590/S1414-32832011000300003.
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2 Boff L. Saber cuidar: ética do humano compaixão pela terra. Petrópolis: Vozes; 1999.

3 Silva Junior AG, Pontes ALM, Henriques RLM. O cuidado como categoria analítica no ensino baseado na integralidade. In: Pinheiro R, Ceccim RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de janeiro: IMS/UERJ, CEPESQ, Abrasco; 2006. p. 93-110.

4 Ayres JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saude Soc. 2004; 13(3):16-29.

5 Merhy EE. Um ensaio sobre o médico e suas valises tecnológicas: contribuições para compreender as reestruturações produtivas do setor saúde. Interface (Botucatu). 2000; 4(6):109-16. doi: 10.1590/S1414-32832000000100009.
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-66 Seixas CT, Merhy EE, Baduy RS, Slomp Junior H. La integralidad desde la perspectiva del cuidado en salud: una experiencia del sistema único de salud en Brasil. Salud Colect. 2016; 12(1):113-23., temos aqui a interseção entre esses dois conceitos na formação em Saúde.

Perrenoud1313 Perrenoud P. Construir competências desde a escola. Porto alegre: Artmed; 1999.,1414 Perrenoud P. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens - entre duas lógicas. Porto alegre: Artmed; 1999. nos atenta ao desafio de se desenvolver e ao mesmo tempo avaliar competências, principalmente pela dificuldade na padronização de situações a serem vividas, não sendo possível reproduzir ou planejá-las integralmente, tal como ocorre na produção do cuidado integral.

Ainda, enfatiza a importância das avaliações formativas no desenvolvimento das competências, de modo a servirem mais à regulação das aprendizagens e menos a uma classificação de alunos dentro de sua turma ou grupo. Assim, tais avaliações devem se basear em critérios e objetivos de domínio integrados às inovações didáticas e pedagógicas, o que, por muitas vezes, é impedido ou atrasado pela manutenção das avaliações tradicionais1414 Perrenoud P. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens - entre duas lógicas. Porto alegre: Artmed; 1999..

Apesar de considerar a possibilidade de o(a) avaliador(a) dispor de um modelo ou uma grade de aspectos observáveis, o autor nos atenta ao fato de que a avaliação de competências jamais se aterá a uma lista fechada de tarefas a serem cumpridas e pontos atribuídos a elas. São necessárias uma autoavaliação dos alunos nesse processo e a inclusão da observação qualitativa de gestos, raciocínios, hesitações e atitudes sobre o que está sendo avaliado1414 Perrenoud P. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens - entre duas lógicas. Porto alegre: Artmed; 1999..

Utilizamos a concepção de “excelência escolar” trazida por Perrenoud1515 Koifman L. O modelo biomédico e a reformulação do currículo médico da Universidade Federal Fluminense. Hist Cienc Saude Manguinhos. 2001; 8(1):49-69. doi: 10.1590/S0104-59702001000200003.
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como base para este estudo. O autor considera a própria competência enquanto uma “excelência virtual”, ou seja, uma capacidade latente de cada aluno que torna possível seu desempenho. A excelência escolar, portanto, é apenas a face observável de suas competências, e não a competência em si1414 Perrenoud P. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens - entre duas lógicas. Porto alegre: Artmed; 1999..

Logo, a produção do cuidado integral seria o desempenho esperado pelos internos, e a capacidade de mobilização de saberes prévios (tanto na perspectiva de um saber, de um saber-fazer ou de um saber-ser que representam, respectivamente, conhecimentos, habilidades e atitudes), as competências priorizadas e valorizadas em seus processos avaliativos, como ilustrado na Figura 1.

Figura 1
Avaliação de competências para o cuidado integral.

O internato obrigatório da faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense

As unidades acadêmicas envolvidas no curso de Medicina da Universidade Federal Fluminense (UFF) realizavam discussões sobre seu currículo desde a década de 1970. A proposta do novo currículo foi implantada em 1994 e teve como objetivo uma formação mais ética, humanística e com compromisso social1515 Koifman L. O modelo biomédico e a reformulação do currículo médico da Universidade Federal Fluminense. Hist Cienc Saude Manguinhos. 2001; 8(1):49-69. doi: 10.1590/S0104-59702001000200003.
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,1616 Universidade Federal Fluminense. Proposta de Currículo Pleno. Niterói: Fluminense Faculdade de Medicina/Centro de Ciências da Saúde/UFF; 1992..

A reforma curricular promoveu mudanças importantes visando ao contato com a população e à análise de determinantes históricos, sociais e ideológicos do processo de saúde-doença desde o primeiro período, em atividades de campo1616 Universidade Federal Fluminense. Proposta de Currículo Pleno. Niterói: Fluminense Faculdade de Medicina/Centro de Ciências da Saúde/UFF; 1992.. O currículo, ilustrado na Figura 2, foi estruturado por quatro programas: Programa Teórico-Demonstrativo (PTD), Programa Prático-Conceitual (PPC), Programa de Iniciação Científica (PIC) e o Programa de Internato (PI), desenvolvidos em seis etapas, sendo as quatro primeiras comuns ao PTD e PPC, e as duas últimas etapas, ao PI. O PIC ocorre paralelamente aos demais e irá culminar no Trabalho de Conclusão de Curso, integrado ao PI1717 Santos WS. Organização curricular baseada em competência na educação médica. Rev Bras Educ Med. 2011; 35(1):86-92..

Figura 2
Modelo curricular do curso de Medicina da UFF.

O PTD tem como objetivo demonstrar conteúdos pertinentes a uma discussão teórica com integração entre as dimensões biológicas; psíquicas; físicas; químicas; e as relacionadas a desenvolvimento emocional e a interpretação de sinais, sintomas e exames. Já no PPC, há atividades práticas em diversos cenários de produção do cuidado, em nível comunitário, e rede atenção à saúde de Niterói, com a observação, descrição e análise da realidade de vida e dos serviços e consequentes linhas de intervenção1616 Universidade Federal Fluminense. Proposta de Currículo Pleno. Niterói: Fluminense Faculdade de Medicina/Centro de Ciências da Saúde/UFF; 1992..

O PI tem como objetivo executar ações de saúde em todos os níveis de atenção, com a realização de estágios curriculares em hospitais e postos de saúde, majoritariamente da instituição, divididos em duas fases: o internato obrigatório (IO) e o eletivo. O último ocorre em especialidades ou áreas da Medicina a critério dos alunos, enquanto aquele é dividido nas disciplinas obrigatórias de Pediatria, Tocoginecologia, Cirurgia Geral, Clínica Médica, Atenção Básica em Saúde e Saúde Mental1616 Universidade Federal Fluminense. Proposta de Currículo Pleno. Niterói: Fluminense Faculdade de Medicina/Centro de Ciências da Saúde/UFF; 1992..

Vale destacar que, pela proximidade com a formatura, esta fase é comumente marcada pela prática de estágios extracurriculares e preparação para provas de residência médica. Este fato promove uma sobrecarga de atividades e estudos que levam os internos a concentrar sua aprendizagem em competências contidas nos processos avaliativos, reforçando a importante mensagem que contêm sobre o que a instituição valoriza e/ou considera prioritário na sua atuação profissional1717 Santos WS. Organização curricular baseada em competência na educação médica. Rev Bras Educ Med. 2011; 35(1):86-92..

Portanto, o objetivo deste estudo foi analisar a priorização e valorização de competências para a produção do cuidado integral no processo de formação médica durante o IO da faculdade de Medicina da UFF, tendo como objeto os processos avaliativos dos internos. A escolha da expressão “processos avaliativos” se dá por englobar todas as formas de avaliação, incluindo aquelas que acontecem nas entrelinhas das aprovações e reprovações cotidianas das atividades do IO. Isso nos permite analisar as concepções e valores éticos, morais e profissionais dos docentes e da instituição, bem como a própria relação de cuidado presente nesses processos.

Metodologia

Este artigo é parte de uma pesquisa qualitativa, de natureza descritiva, realizada durante o mestrado acadêmico em Saúde Coletiva, que teve como metodologia de escolha o estudo de caso.

Na primeira etapa da pesquisa, foram realizadas busca e análise de documentos relacionados ao currículo da faculdade de Medicina da UFF, tendo como critério de inclusão aqueles que continham as competências e/ou suas formas de avaliação para o IO. Essa etapa teve como objetivo principal responder às seguintes questões: Quais são as competências para a produção do cuidado integral no processo de formação do IO de Medicina da UFF? Quais os processos de avaliação dessas competências estabelecidos para o período do internato?

Na segunda etapa, foram realizadas entrevistas em profundidade, por meio de videochamadas gravadas, entre outubro de 2021 e janeiro de 2022. Destacamos que este estudo ocorreu ainda no contexto da pandemia da Covid-19, utilizada como potencializador para um aprofundamento nas abordagens, questões e reflexões a partir de vivências tanto profissionais quanto pessoais sobre o tema estudado.

Os critérios de inclusão dos participantes inicialmente foram: docentes efetivos que atuem nas atividades práticas do IO, priorizando docentes coordenadores de cada disciplina e que atuem diretamente nos processos avaliativos dos alunos. Já nos achados iniciais, notamos um importante protagonismo e autonomia de servidores médicos nos processos avaliativos dos internos, necessitando incluí-los nos critérios de participação do estudo para que os objetivos pudessem ser alcançados. A lista de contato foi fornecida pela coordenação do internato, seguida das indicações dos docentes após esclarecidos os critérios de inclusão e objetivos do estudo, caracterizando o processo de amostragem por conveniência.

Todas as entrevistas foram realizadas e transcritas pela mesma pesquisadora e, após as entrevistas e os processos de transcrição, foram produzidas anotações sobre percepções e reflexões surgidas nesses processos, constituindo diários de campo, que foram acrescentados ao corpus do estudo.

A última etapa consistiu na análise de conteúdo do material produzido, que incluiu os documentos obtidos na primeira etapa, a transcrição das entrevistas e os diários de campo das entrevistas e transcrições. Como sugere Bardin1818 Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 1977. , inicialmente houve leitura flutuante do material, que, em diálogo com as referências utilizadas no estudo, levou à formulação de hipóteses e elaboração de indicadores. A partir destes, foram delimitadas e extraídas do material as unidades de registro e de contexto, com sua posterior categorização em unidades temáticas.

Por envolver a participação de seres humanos, houve apreciação e aprovação prévia pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), com Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) n. 46148921.3.0000.5243.

Resultados e discussão

O primeiro achado da pesquisa foi uma esperada escassez de indicações de competências nos documentos encontrados, visto que a implementação do currículo ocorreu antes das DCN e, portanto, desta lógica na elaboração e organização dos currículos médicos brasileiros. Este fato aumentou a importância da etapa de entrevistas na obtenção dessas informações.

Trinta representantes das seis disciplinas obrigatórias foram convidados a participar da pesquisa e, a partir desses convites, foram obtidas 24 respostas, com duas recusas e dez entrevistas realizadas. A média de tempo das entrevistas foi de 52 minutos, variando entre 25 e noventa minutos.

O grupo de participantes foi composto por sete mulheres e três homens, todos com titulação mínima de residência médica e mestrado e máxima de pós-doutorado. A graduação em Medicina de todos os participantes ocorreu em universidades públicas da região sudeste do Brasil, sendo sete dos dez participantes na faculdade de Medicina da UFF e, dentre estes, tanto formados antes quanto depois da reforma curricular.

Também houve representatividade quanto ao tempo total de docência (entre um ano e nove meses e 42 anos); ao local de trabalho (ou seja, com a função laboral sendo exercida estrita ou majoritariamente na UFF ou em outras faculdades); às fases de graduação (no IO e/ou outras fases); à participação direta ou indireta nos processos avaliativos dos internos; a funções pedagógicas (assistencial, de supervisão e de coordenação); e a vínculos institucionais (docentes, servidores ou ambos, incluindo cargo de chefia).

As unidades temáticas foram categorizadas de acordo com o momento em que essas competências são mobilizadas durante a produção do cuidado e foram classificadas em “No encontro” – classificação que inclui competências avaliadas no momento do(s) encontro(s) aluno-paciente – e “Nos encontros para além do encontro” – classificação relacionada às competências avaliadas nos demais encontros não estritos àquele com pacientes, essenciais para que o cuidado integral seja produzido.

No encontro

Essas competências foram organizadas segundo uma ordem cronológica, à medida que foram mobilizadas ao longo do encontro.

Iniciando pelas competências relacionadas à comunicação verbal e não verbal, temos as atitudes desde a abordagem inicial do paciente no primeiro contato, a exemplo do que ocorre, em contexto ambulatorial, com a ida do profissional de saúde ao encontro do paciente na sala de espera, e não somente aguardar passivamente sua chegada ao consultório, tal qual a maneira como o faz (considerando se e como se identifica ou como se dirige a ele). Outro aspecto priorizado foi a postura corporal dos alunos, como evidenciamos nos trechos:

Sentado direito sem tá deitado na cadeira, sem tá com chiclete na mão, sem mexer no celular [...] conversar direcionado pra a paciente.

(Entrevista A)

Se eles olham para a pessoa ou ficam escrevendo enquanto a pessoa fala.

(Entrevista E)

Ainda como componente da comunicação não verbal, somam-se a essas competências as relacionadas ao asseio do aluno, integrando uma rigorosa avaliação do uso correto dos equipamentos de proteção individual (EPIs), o que reforça a indissociabilidade entre a produção do cuidado no âmbito individual e coletivo1919 Boff L. Covid-19: a mãe terra contra-ataca a humanidade: advertências da pandemia. Petrópolis: Editora vozes; 2020..

As competências relacionadas à comunicação também apareceram relacionadas à ideia de empatia dos alunos com os pacientes:

[...] a maneira como você se coloca, você demonstrar empatia pelo paciente, pelo problema que ele tá vivendo, você ouvir a queixa, né, eu acho que isso... isso é importante... a maneira como você fala, você ser gentil na maneira do trato.

(Entrevista F)

Essa fala chama a atenção para o fato de que atitudes gentis isoladas não são suficientes para a produção do cuidado, devendo ser associadas a uma escuta qualificada e um genuíno interesse nos desejos, expectativas, sentimentos e experiências de doença de cada um, o que pode servir de base para atitudes terapêuticas cuidadoras33 Silva Junior AG, Pontes ALM, Henriques RLM. O cuidado como categoria analítica no ensino baseado na integralidade. In: Pinheiro R, Ceccim RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de janeiro: IMS/UERJ, CEPESQ, Abrasco; 2006. p. 93-110.,44 Ayres JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saude Soc. 2004; 13(3):16-29. ,99 Pinheiro R, Ceccim RB. Experienciação, formação, cuidado e conhecimento em saúde: articulando concepções, percepções e sensações para efetivar o ensino da integralidade. In: Pinheiro R, Ceccim RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de janeiro: IMS/UERJ, CEPESQ, Abrasco; 2006. p. 13-35.. Para tanto, o interno precisa estar presente, entregue, atento e aberto aos encontros44 Ayres JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saude Soc. 2004; 13(3):16-29. e, nesse contexto, há uma priorização da relação de respeito e cuidado na relação docente-discente, de forma a manter um ambiente de confiança e abertura aos encontros, concomitantemente ao próprio aprendizado da produção de cuidado dentro de processos avaliativos.

Quanto às habilidades de comunicação verbal, há grande valorização da competência cultural (apesar de esta expressão exatamente não ter sido utilizada):

Se eles usam palavras de fácil entendimento ou se eles ficam usando “mediquês”.

(Entrevista E)

Você não conseguiu traduzir para a língua dessa mãe esses problemas.

(Participante do IO de Pediatria)

Associada a essa competência, houve o uso da expressão “anamnese completa” para expressar a execução de todos os componentes da anamnese médica, no intuito de compreender a história clínica ao considerá-la essencial para o exercício da profissão. Precisamos analisar se essa priorização da execução de uma “anamnese completa” no período do internato pode contribuir ou limitar a produção do cuidado integral nessa fase. Se, por um lado, essa priorização pode restringir o encontro à execução de protocolos preestabelecidos, limitando a percepção das subjetividades, fluidez no diálogo (com diversas interrupções para o direcionamento dos relatos) e presença das agendas dos pacientes nesses encontros2020 Ospina NS, Phillips KD, Rodriguez-Gutierrez R, Castaneda-Guarderas A, Gionfriddo MR, Branda ME, et al. Eliciting the patient’s agenda-secondary analysis of recorded clinical encounters. J Gen Intern Med. 2018; 34(1):36-40. , por outro lado, evidencia a integração da avaliação de competências para execução de anamneses específicas de especialidades àquelas que envolvem a permeabilidade do técnico ao não técnico44 Ayres JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saude Soc. 2004; 13(3):16-29. , destacado no trecho:

Esquecer um pouco o prontuário. [...] fazer uma anamnese direcionada para a ginecologia, mais do que isso para a saúde da mulher, um organismo como um todo. Por exemplo, eu conto a parte emocional, psicológica também pode interferir nessas coisas. Qual a consequência da endometriose pro intestino, pra urina, pra a dor, pra a vida, pra ficar buscando médico. [...] Isso é vivência, isso é observação, não tá no livro.

(Participante do IO de Ginecologia e Obstetrícia)

Seguindo ao momento do exame físico, extremamente valorizado pelos docentes nas entrevistas, há uma priorização de sua execução em todos os atendimentos independentemente do cenário em que atuam. Maior ênfase foi dada às atitudes de respeito e empatia, relacionadas tanto ao conforto dos pacientes – sobretudo ao toque de regiões íntimas ou que envolvam pudor (como exame especular ou toque retal) – quanto à comunicação verbal e não verbal nesse momento:

[...] Se ele pedia inclusive para a paciente urinar [...] urinar antes de fazer exame físico, informar como colocar o roupão, orientar deitar na maca, orientar posicionamento, ir explicando o que ia fazendo no exame físico o tempo inteiro. “Vou examinar a mama... [...] “vou examinar o abdômen... [...] “vou examinar vulva, vagina, vou colocar espéculo” [...].

(Participante do IO de Ginecologia e Obstetrícia)

Além disso, outra convergência nos relatos foi uma destacada priorização da qualidade técnica do exame físico integrada às atitudes éticas durante todo o encontro. Isso nos remete a uma indissociabilidade do saber-fazer técnico, ético e humanístico para a produção do cuidado integral, como exemplificado no seguinte trecho:

Então a gente vai avaliar desde o paciente entrando na sala, como esse aluno recebeu, como ele se portou, a questão ética, a postura desse aluno. [...] ele fez exame físico, ele aferiu a pressão, ele lavou as mãos antes de avaliar, ele fez uma antropometria adequada, ele examinou o paciente do lado direito. [...] até ele abrir a porta para [...] ir embora.

(Entrevista H)

As competências relacionadas à ética estiveram presentes em quase todas as entrevistas de diferentes formas. Quando solicitados que explicassem sobre como ou que avaliavam, os participantes utilizaram expressões como “respeito”, “postura” e “postura ética”, à exceção de um dos entrevistados, que buscou o conceito como uma busca do aluno por fazer o melhor possível, valorizando tanto o âmbito individual quanto coletivo, e ressaltou a importância da perspectiva do paciente incluindo seus valores, crenças e desejos na produção do cuidado.

A seguir, temos as competências relacionadas ao raciocínio clínico, evidenciado como base para condutas terapêuticas e ações produzidas a cada encontro. Exemplos frequentes nas entrevistas se concentraram na solicitação assertiva de exames complementares, seja de rastreios ou de investigação diagnóstica.

O raciocínio que ele fez em cima daquilo. Se ele soube pedir os exames ou não. [...] A forma como ele conduziu o raciocínio clínico [...] se ele pedia os exames, se pedia corretamente ou não. Se direcionava bem ou não a solicitação de preventivo, mamografia, principalmente esses rastreios.

(Participante do IO de Ginecologia e Obstetrícia)

Com um constante desenvolvimento de novas tecnologias duras, os processos de captura não apenas ocorrem com profissionais, mas também versam sobre desejos e expectativas de pacientes e familiares que venham a gerar tentativas de persuasão por prescrições e solicitações de exames desnecessários e, assim, produzir iatrogenias “disfarçadas” de cuidado66 Seixas CT, Merhy EE, Baduy RS, Slomp Junior H. La integralidad desde la perspectiva del cuidado en salud: una experiencia del sistema único de salud en Brasil. Salud Colect. 2016; 12(1):113-23.. Nesse contexto, evidenciamos a valorização da centralidade do uso de tecnologias leves integradas ao domínio de tecnologias leve-duras e duras55 Merhy EE. Um ensaio sobre o médico e suas valises tecnológicas: contribuições para compreender as reestruturações produtivas do setor saúde. Interface (Botucatu). 2000; 4(6):109-16. doi: 10.1590/S1414-32832000000100009.
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como forma de prevenção quaternária na produção do cuidado integral, como destacado a seguir:

Essa conduta, na verdade, às vezes não vai redundar numa prescrição [...]. Então quando eu tô falando em conduta, não é qual antibiótico, [...] qual exame que eu vou fazer [...]. É: “Ah, é um sopro inocente”, então a minha conduta vai ser orientação à mãe. Ele não tem nenhum comemorativo que ele pense que seja um sopro patológico [...]. A conduta que eu vou avaliar do aluno é se ele foi capaz de tranquilizar, de passar essa notícia pra essa mãe, de tranquilizar essa mãe.

(Participante do IO de Pediatria)

Ainda, foram ressaltadas a importância da reflexão em ato sobre os impactos positivos ou negativos do cuidado produzido na vida de cada indivíduo de forma integrada à reflexão sobre custos em saúde gerados por uma medicalização excessiva:

Eu tenho que ter um objetivo naquilo ali que eu peço. [...] Exame tem um custo, você não pode pedir todos os exames pra todo mundo e à toa, né? [...] é pra ajudar a raciocinar num diagnóstico ou é pra ajudar a definir um tratamento, então essa é uma das questões: o que que eu peço e por quê que eu peço.

(Entrevista F)

Essa mesma lógica surge integrada à grande valorização de condutas que não são restritas à profissão médica, como orientações e ações de promoção e prevenção em saúde:

Mas o que que é essa conduta adequada? Eu orientei o aleitamento materno exclusivo, eu orientei a atualização vacinal, eu orientei uma dieta adequada pra mãe, eu orientei a questão do exercício, a questão da higiene do sono, então, quando a gente fala uma conduta, é o global, não é uma conduta de remédio. É uma conduta no sentido de melhorar a qualidade de vida daquela paciente.

(Participante do IO de Pediatria)

Além disso, outra convergência esteve na valorização da identificação do contexto familiar, cultural, comunitário, espiritual e social. Contudo, vale destacar em algumas falas a priorização de entender não apenas esses contextos, desejos e expectativas, mas também o quanto a sua compreensão dialoga com as ações produzidas nesses encontros e atualiza o sentido existencial e o projeto de felicidade de cada um44 Ayres JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saude Soc. 2004; 13(3):16-29. . Para tanto, os alunos necessitam de uma capacidade de mobilização de saberes nos demais encontros com outros atores dessa produção de cuidado, que influenciam e são influenciados por ele, e essas competências serão discutidas na seção seguinte.

Nos encontros para além do encontro

As competências encontradas nesta seção foram evidenciadas em situações a partir ou para além do encontro com cada paciente e consideradas essenciais para produzir um cuidado integral. Além disso, tiveram como base as ideias e os signos sobre “ser médico(a)”, como ilustra a figura 3.

Figura 3
Competências priorizadas e valorizadas nos encontros para além do encontro.

A primeira competência a ser destacada refere-se a como os internos se relacionam com seus colegas, equipe, servidores e residentes dos serviços em que estão inseridos. Destacamos que a valorização dessa competência foi evidenciada frente ao contexto de alta competitividade entre alunos nos cursos de Medicina e ressaltada em relações de respeito e cooperatividade, que constituem-se, inclusive, em critérios para atribuição das notas finais dos internos.

Ainda, entre os objetivos dessa cooperação está o estímulo para que os profissionais de saúde participem ativamente da produção do cuidado de seus pacientes, exemplificada na busca de resolução de pendências dos pacientes em contextos de enfermaria e Atenção Primária à Saúde (APS). Para tanto, é necessário que os internos estejam inseridos nos processos de trabalho das equipes e, assim, que seja ressaltada nesses contextos valorização do reconhecimento da potência do trabalho em equipe multidisciplinar, compreendendo o papel de cada profissional e as limitações da profissão médica na produção do cuidado.

Dessa forma, foram relatadas a avaliação das relações com os demais profissionais, integrada aos comentários de pacientes sobre o atendimento realizado por eles, como sugerida em parte da avaliação em 360° ou com múltiplas fontes2121 Castro-Rebolledo R. Evaluación de competencias clínicas en los contextos médicos curriculares actuales. Rev Salud Bosque. 2018; 8(1):65-84. doi: 10.18270/rsb.v8i1.2375.
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.

Porque a gente precisa entender que ele entendeu e conseguiu se integrar na equipe da APS. Então, por exemplo, quando eu vejo um interno brincando com a ACS [agente comunitária de saúde], [...] com a enfermeira, quando eu vejo um paciente sair da consulta e falar “Nossa, adorei sua consulta, você vai ser um ótimo médico”, eu sei que foi bom, entendeu?

(Participante do IO de Atenção Básica)

Vale destacar que a satisfação sobre o atendimento em saúde tem o potencial de avaliar indiretamente o estabelecimento de vínculo e relação de confiança. Porém, a depender dos processos de captura que agenciaram esse encontro, não considerando o protagonismo da(o) paciente sobre sua vida ou seus desejos e crenças, os profissionais podem adotar condutas doutrinárias e/ou patologizantes “disfarçadas” de cuidado66 Seixas CT, Merhy EE, Baduy RS, Slomp Junior H. La integralidad desde la perspectiva del cuidado en salud: una experiencia del sistema único de salud en Brasil. Salud Colect. 2016; 12(1):113-23..

Ainda, é ressaltado pelo docente do IO de Atenção Básica como uma potencialidade desse cenário a proximidade com a comunidade e o contexto de vida dos pacientes. Desse modo, há uma valorização de competências relacionadas ao diálogo e articulação com redes de apoio, equipamentos do território e lideranças locais que influenciam a produção do cuidado no âmbito tanto individual quanto coletivo:

Porque senão você passa um tratamento, aí o pastor diz que é uma coisa... essa senhora [...] ganha 300 reais por mês, [...] tem 50 anos de idade, não consegue nenhuma aposentadoria, né? [...] E aí ela falou “Ah, mas aí aqui no centro espírita eles tavam me doando a cesta [básica], mas aí a minha filha disse que não ia mais na minha casa se eu pegasse alimento contaminado porque a gente é evangélica.” Então, assim [...] ela tem o direito de pensar diferente. Então, como é que eu faço pra ela negociar com o pastor? [...] Ou a igreja assumir isso, ou de que forma ele poderia abençoar esse alimento [...] então, é uma outra linguagem, né?

(Participante do IO de AB)

Essa fala destaca que as competências mobilizadas nesses encontros requerem uma capacidade criadora de quem produz o cuidado e dialogam com a ideia de que o cuidado é o suporte real da criatividade, liberdade e inteligência do ser humano, a partir do qual identificamos “seus princípios, valores e atitudes que fazem da vida um bem-viver e das ações, um reto agir.”22 Boff L. Saber cuidar: ética do humano compaixão pela terra. Petrópolis: Vozes; 1999. (p. 9).

Outra importante convergência ocorreu na valorização de competências para a gestão do cuidado. Na APS, temos a característica da longitudinalidade do cuidado, e nela são priorizadas competências relacionadas à coordenação do cuidado e ao acompanhamento das necessidades dos pacientes de seu território. Tais competências necessitam de uma capacidade de diálogo e articulação com os diferentes níveis de atenção à saúde, de gestão e intersetorial, a fim de garantir o acesso e a integração entre eles para a produção do cuidado dos pacientes que habitam em seu território de atuação.

Essas competências também estiveram presentes em contextos hospitalares pelo sistema de pareceres das enfermarias, que ocorrem da solicitação da avaliação de profissionais de outras especialidades sobre os pacientes internados. Assim, há uma troca de saberes e opiniões sobre a condição clínica e discussão de condutas a serem adotadas pelo profissional ou equipe.

Na participação dos internos nessas discussões, foram destacadas competências relacionadas a saber a história (clínica, pessoal, familiar, social, cultural) dos pacientes que acompanham, incluindo seus desejos, expectativas e valores, e a capacidade de incluí-los nessas discussões, sobretudo nas condutas terapêuticas. Dessa forma, são avaliadas habilidades de comunicação e atitudes que demonstrem interesse, segurança e responsabilização sobre essas condutas (sobretudo em momentos de divergência de opinião entre diferentes profissionais, equipes e paciente), oportunizando o desenvolvimento de competências relacionadas a outros setores e especialidades presentes nas discussões.

De forma semelhante, essas competências são avaliadas na participação em discussões e sessões clínicas dos serviços que estão inseridos, atividades obrigatórias de algumas especialidades, inclusive como critério na nota final. Neles, também são avaliadas capacidade de organização de ideias; responsabilidade e interesse em trazer as informações relevantes da história de cada paciente para a discussão; raciocínio clínico; construção de hipóteses diagnósticas; e proposição dos projetos terapêuticos, conforme discutido na seção anterior, mas aqui com uma lógica de produção coletiva do cuidado.

O raciocínio clínico e as condutas propostas foram evidenciadas como indissociáveis às competências relacionadas à construção e produção do conhecimento de cada aluno(a). De forma transversal, temos no IO uma grande priorização e valorização da busca constante de atualização do conhecimento adquirido sobre o que estão vivenciando na prática, por meio da frequente busca e análise crítica e reflexiva de estudos e artigos científicos a partir de fontes confiáveis (incluindo metodologia de busca e análise dessa confiabilidade). Cabe destacar que estão associados tanto como demonstração de interesse e responsabilidade com os pacientes quanto com seu próprio processo de formação, a partir da ideia de uma caracterização de sua identidade profissional, ou seja, do que consideram como “ser” médico(a).

Ainda sobre esses signos do “ser médico(a)”, é destacada a importância de sua participação em espaços de discussão e construção de projetos e ações coletivas a partir de sua perspectiva e vivência profissionais associadas ao prestígio social da profissão enquanto formadora de opinião, como destacado neste trecho:

Você começa a atender gente no CTI [centro de terapia intensiva] morrendo por causas evitáveis, e você fala: “Cara, que horas eu vou parar com isso, né?”. Então, a gente tem que se envolver sim, [...] tem que ir pra reunião de conselhos, tem que se envolver com as lideranças.

(Entrevista E)

Temos ainda as competências relacionadas à organização e ao desenvolvimento de ações de prevenção, promoção, proteção e reabilitação da saúde em nível individual e coletivo. Para isso, essas competências precisam ser norteadas pelo que nos aponta a(o) participante E: “É, na verdade, você se aproximar de uma realidade e tentar ajudar aquele lugar a ter uma melhor qualidade de vida possível”, atualizando o conceito de cuidado integral do âmbito individual para o coletivo.

Outro aspecto “para além do encontro” na produção de cuidado está relacionado à produção do “cuidar de si”. Ainda que não ressaltados nesse sentido nas falas dos participantes, que pode representar, dentro dos limites deste estudo, uma não priorização dentro dos processos avaliativos, foram evidenciadas em todas as entrevistas preocupações com as questões de saúde mental dos alunos e as interferências no processo de formação médica.

No entanto, destacamos uma organização interna no IO de Pediatria de forma que todos os alunos possuam um docente de referência não só para questões pedagógicas – como dificuldades de aprendizagem – mas também para questões pessoais, de saúde e burocráticas. Há, inclusive, um fluxo interno, que ocorre de acordo com as necessidades do discente que envolve o grupo de docentes e coordenação, que podem ser caracterizados como um sinal, como conceituado por Yazdani2222 Yazdani S, Momeni S, Afshar L, Abdolmaleki MR. A comprehensive model of hidden curriculum management in medical education. J Adv Med Educ Prof. 2019; 7(3):123-30. doi: 10.30476/JAMP.2019.45010.
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, na organização institucional de valorização da produção do cuidado ao aluno no seu processo de formação.

Considerações finais

A partir dos achados e das reflexões deste estudo, fica evidenciada a importância do reconhecimento daquele que produz o cuidado – tanto enquanto um ser que afeta quanto que por ele é afetado – e, de acordo com as sucessivas afecções que se expõe e é exposto, constrói a sua ideia do “ser” médico, ou seja, a sua identidade profissional.

Todos os saberes (incluindo-se o saber-fazer e o saber-ser) a serem desenvolvidos no processo de formação médica serão ao menos componentes a serem mobilizados na produção do cuidado por estes futuros profissionais. Assim, avaliar as competências para a produção de um cuidado integral dependerá mais da centralidade das tecnologias em saúde utilizadas nos encontros e da permeabilidade do técnico ao não técnico do que de um formato específico ou um conjunto de competências específicas de um contexto ou especialidade.

Nesse sentido, outra questão surgida a partir dos resultados deste estudo foi: para produzir o cuidado – e, assim, avaliarmos suas competências –, necessitamos que haja a permeabilidade do técnico ao não técnico em cada encontro interno-paciente; contudo, os processos avaliativos baseados em desempenhos esperados, protocolares ou padronizados se mostram extremamente limitados para este fim. Estes, no entanto, apresentam um potencial em avaliar conhecimentos, habilidades e/ou atitudes que possam vir a ser mobilizados em situações reais de produção do cuidado integral.

Vale ressaltar a importante participação dos servidores médicos nos processos avaliativos dos internos nos diversos cenários nos quais estão inseridos. No entanto, não foram evidenciadas participações diretas de outras categorias profissionais nos processos avaliativos desses alunos.

Ademais, é preciso destacar que são imprescindíveis na organização do internato a priorização de vivências e experiências em situações reais, que, para tanto, necessitam de sua inserção nos processos de trabalho dos serviços. Essas questões nos levam à reflexão sobre os obstáculos ainda enfrentados na integração ensino-serviço e da interdisciplinaridade na formação médica, que ainda se atém a uma discussão sobre integração de disciplinas do currículo formal.

Além disso, temos, na vivência das relações de cuidado entre aluno, docente, serviço e instituição, o aprendizado dessas competências e a internalização de valores e comportamentos desejáveis. Assim, ressaltamos esses processos desde a organização institucional e inserção nos processos avaliativos até as relações entre os atores envolvidos na prática cotidiana universitária.

Evidenciamos, ainda, a indissociabilidade de competências relacionadas ao cuidar de si com aquelas para produção do cuidado no âmbito individual e coletivo. Tal qual a produção do cuidado integral de nossos pacientes, é imprescindível conhecermos e valorizarmos os processos individuais e coletivos dos alunos; o contexto em que vivem – seja comunitário, familiar e relacionados a ciclos de vida; e suas expectativas, ideias e desejos, a fim de reconhecermos suas influências sobre o cuidado produzido por eles. Essas competências, por sua vez, requerem uma capacidade criativa e inteligência, além de atitudes éticas.

Por fim, o internato é uma fase significativa na construção da identidade profissional do aluno, tendo o potencial de serem alinhados seus projetos de felicidade às suas escolhas profissionais (como de especialidades, serviços ou níveis de atenção que almejam atuar). Para tanto, é importante que os processos avaliativos sejam elaborados de modo a servir mais a identificar suas potencialidades para atuação profissional e menos aos processos de captura de um modelo hegemônico que muitas vezes dificulta a produção de cuidado. Dessa forma, os processos avaliativos, sobretudo aqueles com caráter formativo, de competências técnicas e científicas integradas a atitudes éticas e humanísticas se mostraram centrais para avaliação de competências para a produção do cuidado integral no período do internato.

Agradecimentos

Agradecemos a todos os docentes e coordenadores que atuam no internato obrigatório da faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense que, com suas contribuições e participação, tornaram possível este estudo; e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior e ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal Fluminense, pela concessão da bolsa de mestrado e apoio durante todo o processo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    13 Mar 2023
  • Aceito
    27 Set 2023
UNESP Botucatu - SP - Brazil
E-mail: intface@fmb.unesp.br