Preenchimento da notificação compulsória em serviços de saúde que atendem mulheres que sofrem violência sexual

Maria Helena de Sousa Silvana Ferreira Bento Maria José Duarte Osis Meire de Paula Ribeiro Anibal Faúndes Sobre os autores

Resumos

OBJETIVO:

Avaliar a proporção de serviços de saúde (SSs) que preenchem a notificação compulsória e quais os principais obstáculos para o preenchimento de tal documento.

MÉTODOS:

Realizou-se um estudo com abordagem mista. Para a abordagem quantitativa, foi realizado um estudo de corte transversal, com coleta de dados por telefone. Foram identificados 291 SSs no Estado de São Paulo que referiam dar atendimento a mulheres que sofrem violência sexual. A amostra foi composta por 172 serviços que referiram prestar atendimento de emergência às mulheres. Na abordagem qualitativa realizaram-se estudos de casos, com amostra intencional e de conveniência. Foram escolhidos seis municípios, nos quais foram entrevistados profissionais de dois SSs. Realizaram-se 45 entrevistas semiestruturadas. Para os dados quantitativos, realizou-se uma análise descritiva simples. Para os dados qualitativos, realizou-se análise temática do conteúdo das entrevistas.

RESULTADOS:

A proporção de serviços que referiram sempre preencher a ficha de notificação em casos de violência sexual foi de 79,1%. Mais da metade (53,5%) referiu dificuldades relativas às mulheres atendidas, um terço referiu motivos referentes à ficha e 29,7% reportaram dificuldades relacionadas aos profissionais. Na etapa qualitativa, as dificuldades mais referidas foram o tamanho da ficha, os problemas para se obter as informações da mulher e a dificuldade do profissional em obter essas informações.

CONCLUSÃO:

Embora a maior parte dos SSs tenha referido preencher a ficha de notificação compulsória, mencionou também várias dificuldades para fazê-lo, especialmente relacionadas à sobrecarga de trabalho dos profissionais e à incompreensão acerca da importância dessa notificação no contexto da atenção integral às mulheres que sofrem violência sexual.

Violência sexual; Mulheres; Serviços de saúde; Atendimento de emergência; Notificação de doenças; Violência contra a mulher


OBJECTIVE:

To evaluate the proportion of health services that fill out the compulsory notification and what the main difficulties to fill it out are.

METHODS:

A study was carried out with two different approaches. For the quantitative approach, a cross sectional study was performed, with telephone data collection. In the state of São Paulo, 291 health services that had reported providing care to women who suffer from sexual violence were identified. The sample was composed of 172 services that reported providing emergency care to women. In the qualitative approach, case studies were conducted. Six cities were chosen by intention and convenience. For each of them, professionals from two health services were invited to participate. Forty-five semi-structured interviews were conducted. For quantitative data, a descriptive analysis was carried out. For qualitative data, a thematic analysis of content was performed.

RESULTS:

The proportion of health services which reported always filling out the notification in cases of sexual violence was 79.1%. More than half (53.5%) reported difficulties concerning the assisted women, one third reported reasons related to the form, and 29.7%, to the professionals. In the qualitative approach, the main difficulties were the size of the form, the problems to obtain the information about the woman and the difficulty for the professional to obtain this information.

CONCLUSION:

Although most health services claimed to fill out the compulsory notification, they also mentioned several difficulties to do so, especially with regard to the workload of professionals and the misunderstanding about the importance of the notification in the context of comprehensive care to women who suffer from sexual violence.

Sexual Violence; Women; Health services; Emergency care; Disease notification; Violence against women


INTRODUÇÃO

A violência contra as mulheres é atualmente um dos temas mais relevantes no âmbito da Saúde Pública e dos direitos humanos, pois provoca sérios prejuízos à saúde e ao desenvolvimento psicossocial dessas mulheres11. Heise L. Gender-based abuse: The global epidemic. Cad Saúde Pública 1994; 10 (Suppl 1): 135-45.

2. Heise L, Pitanguy J, German A. Violence against women: the hidden health burden. Washington: The International Bank for Reconstruction and Development/The World Bank; 1994.
-33. Garcia-Moreno C, Jansen HA, Ellsberg M, Heise L, Watts CH; WHO Multi-country Study on Women's Health and Domestic Violence against Women Study Team. Prevalence of intimate partner violence: findings from the WHO multi-country study on women's health and domestic violence. Lancet 2006; 368(9543): 1260-9.. Dentre os tipos de violência contra as mulheres, a violência sexual, embora não seja a mais prevalente, em geral é vista como aquela que pode causar consequências tão ou mais impactantes do que os demais tipos44. Basile KC, Smith SG. Sexual violence victimization of women: prevalence, characteristics, and the role of public health. A J Lifestyle Med 2011; 5: 407-17..

A violência sexual contra as mulheres é praticada tanto por parceiros íntimos como por outros homens, conhecidos ou não das mulheres55. Guedes A, García-Moreno C, Bott S. Violencia contra las mujeres en Latinoamérica y el Caribe. Foreign Affairs Latinoamérica 2014; 14 (1): 41-8. Disponível em: www.fal.itam.mx3. (Acessado em 27 de maio de 2014).
www.fal.itam.mx3...
,66. Facuri CO, Fernandes AMS, Oliveira KD, Andrade TS, Azevedo RCS. Violência sexual: estudo descritivo sobre as vítimas e o atendimento em um serviço universitário de referência no Estado de São Paulo, Brasil. Cad Saúde Pública 2013; 29(5): 889-98..

No Brasil, nos últimos anos, vários estudos têm apontado a grande frequência com que as mulheres são agredidas, especialmente no ambiente doméstico e no âmbito das relações afetivas77. Faúndes A, Hardy E, Osis MJD, Duarte GA. Risco para queixas ginecológicas e disfunções sexuais segundo história de violência sexual. Rev Bras Ginecol Obstet 2000; 22(3): 153-7.

8. Reichenheim ME, Moraes CL, Szklo A, Hasselmann MH, Souza ER, Lozana JA, et al. The magnitude of intimate partner violence in Brazil: portraits from 15 capital cities and the Federal District. Cad Saúde Pública 2006; 22(2): 425-37.
-99. Schraiber LB, d'Oliveira AFPL, França-Júnior I, Diniz S, Portella AP, Ludermir AB, et al. Prevalência da violência contra a mulher por parceiro íntimo em regiões do Brasil. Rev Saúde Pública 2007; 41(5): 797-807.. Em recente revisão sistemática sobre a prevalência de violência sexual perpetrada por "não parceiros", chegou-se a uma estimativa mundial, para 2010, de 7,2%, e, para o Brasil, de 7,6%1010. Abrahams N, Devries K, Watts C, Pallitto C, Petzold M, Shamu S, et al. Worldwide prevalence of non-partner sexual violence: a systematic review. Lancet 2014; 383(9929): 1648-54.. Ao mesmo tempo, também se evidenciam muitas dificuldades para prover atenção integral às mulheres que sofrem violência, principalmente a violência sexual1111. Oliveira EM, Barbosa RM, Moura AAVM, Kossel K, Morelli K, Botelho LFF, et al. Atendimento às mulheres vítimas de violência sexual: um estudo qualitativo. Rev Saúde Pública 2005; 39(3): 376-82.

12. Bruschi A, Paula CS, Bordin IAS. Prevalência e procura de ajuda na violência conjugal física ao longo da vida. Rev Saúde Pública 2006; 40(2): 256-64.

13. Faúndes A, Hardy E, Osis MJD, Makuch MY, Duarte GA, Andalaft Neto J. Perfil do atendimento à violência sexual no Brasil. Relatório técnico apresentado ao Ministério da Saúde. Campinas: CEMICAMP; 2006.

14. Villela W, Lago T. Conquistas e desafios no atendimento às mulheres que sofreram violência sexual. Cad Saúde Pública 2007; 23(2): 471-5.
-1515. Osis MJD, Duarte GA, Faúndes A. Violência entre usuárias de unidades de saúde: prevalência, perspectiva e conduta de gestores e profissionais. Rev Saúde Pública 2012; 46(2): 351-8..

No âmbito das ações em saúde, têm-se proposto medidas para disponibilizar atendimento efetivo às mulheres que sofrem violência sexual1616. Ministério da Saúde. Guia Prático do Programa da Saúde da Família. Brasília: Ministério da Saúde; 2001.

17. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de saúde da Mulher. Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher. Brasília: Ministério da Saúde; 2004.

18. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de análise de Situação de Saúde. Instrutivo Notificação de violência doméstica, sexual e outras violências. Série G - Estatística e Informação em Saúde. Brasília: Ministério da Saúde. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/viva_instrutivo_not_viol_domestica_sexual_e_out.pdf. (Acessado em 24 de janeiro de 2013).
http://portal.saude.gov.br/portal/arquiv...
-1919. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Atenção integral para mulheres e adolescentes em situação de violência doméstica e sexual - Matriz pedagógica para formação de redes. Série B - Textos Básicos de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.. Desde 1999, o Ministério da Saúde estabeleceu a Norma Técnica "Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes", que define um protocolo de atendimento para as mulheres que sofrem violência sexual. Apesar disso, não são todos os serviços de emergência que atendem a esses casos de acordo com a norma. Pesquisa realizada em uma amostra representativa de municípios brasileiros identificou 1.395 serviços de saúde (SSs) que referiram atender a mulheres e crianças que sofrem violência sexual, porém apenas 8% tinham um protocolo de atendimento em conformidade com a referida norma do Ministério da Saúde2020. Andalaft Neto J, Faúndes A, Osis MJD, Pádua KS. Perfil do atendimento à violência sexual no Brasil. Femina 2012; 40(6): 301-6..

Outra preocupação expressa pelas políticas públicas em relação à violência contra as mulheres é a falta de registro dos casos por parte dos SSs, o que poderia auxiliar o planejamento e a execução de medidas para prevenir as ocorrências de violência, assim como para agilizar o atendimento às vítimas. No sentido de suprir essa falta e permitir traçar estratégias de prevenção, o Governo Federal estabeleceu a exigência de notificação compulsória em casos de violência contra a mulher. De acordo com a Lei no 10.778, de 24 de novembro de 2003a, todos os casos de violência contra a mulher - violência física, sexual e psicológica - atendidos em SSs públicos ou privados necessitam ser notificados por meio do preenchimento de uma ficha. Essa lei foi regulamentada pelo Ministério da Saúde em 03 de junho de 2004, por meio do Decreto no 5.099b. Em 2011, uma portaria do Ministério da Saúde incluiu as violências doméstica, sexual e/ou outras como parte da Lista de Notificação Compulsória (LNC)c.

Até o presente, porém, especificamente em relação à violência sexual, não se sabe em que medida a notificação compulsória da violência é realizada, nem como esse procedimento é visto pelos profissionais de saúde. Em vista do exposto, o presente estudo teve como objetivo verificar que proporção dos SSs que dão atendimento de emergência a mulheres que sofrem violência sexual preenche a notificação compulsória e quais são os principais obstáculos para o preenchimento de tal documento.

MÉTODOS

Realizou-se um estudo com abordagem mista, quantitativa e qualitativa com SSs do Estado de São Paulo que referiram prestar atendimento de emergência a mulheres que sofrem violência sexual. Para a abordagem quantitativa, foi desenvolvido um estudo descritivo, de corte transversal; para a qualitativa, foram realizados estudos de casos2424. Gomm R, Hammersley M, Foster P, eds. Case study methods. Thousand Oaks: Sage Publications; 2000.,2525. Patton MQ. Qualitative evaluation and research methods. 2nd ed. London: Sage; 1990..

Para a etapa quantitativa, considerou-se uma proporção de SSs que preenchem a notificação compulsória estimada em 50%, com uma probabilidade de erro tipo I de 5% e uma diferença absoluta aceitável entre a proporção amostral e a populacional de 7,6%, estabelecendo-se um número mínimo de 166 SSs2626. Kish L. Survey sampling. New York: John Wiley and Sons; 1965..

Foram incluídos na etapa quantitativa 172 SSs que referiram prestar atendimento de emergência em caso de violência sexual. Esses serviços foram identificados e selecionados da seguinte maneira: de todos os 240 SSs do Estado de São Paulo que fizeram parte da pesquisa "Perfil do atendimento à violência sexual no Brasil"1313. Faúndes A, Hardy E, Osis MJD, Makuch MY, Duarte GA, Andalaft Neto J. Perfil do atendimento à violência sexual no Brasil. Relatório técnico apresentado ao Ministério da Saúde. Campinas: CEMICAMP; 2006., foi convidado(a) a participar do estudo o(a) coordenador(a) ou a pessoa responsável pelo atendimento a mulheres que sofrem violência sexual. Além desses, foram contatados outros serviços indicados pelos primeiros; em casos de indicação de mais de um serviço, sorteou-se apenas um dentre os indicados. Um total de 291 SSs foi inicialmente abordado; 40 recusaram de imediato em participar do estudo e 5 foram considerados "perdidos" devido a muitas tentativas fracassadas de contato. Outros 25 serviços responderam não prestar atendimento de emergência a mulheres que sofrem violência em geral, 16 afirmaram não dar atendimento de emergência a mulheres que sofrem violência sexual, 32 não notificavam casos de violência em geral (qualquer tipo), e um serviço não soube informar.

Aplicou-se, por telefone, um questionário estruturado e pré-testado ao(à) coordenador(a) ou à pessoa responsável pelo atendimento a mulheres que sofrem violência sexual em cada serviço. As entrevistas foram gravadas mediante autorização prévia.

A ficha de notificação compulsória faz parte do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) e possui diversos campos a serem preenchidos; entre eles, os dados pessoais do paciente, dados complementares sobre a pessoa atendida, dados da ocorrência, tipologia da violência e alguns campos específicos caso a violência seja sexual. Também há dados do provável autor da agressão, e informações sobre evolução e encaminhamento.

As variáveis independentes consideradas neste estudo foram: tipo do SS (hospital; Centro de Referência em Saúde da Mulher; pronto-socorro/Unidade de Pronto Atendimento (UPA); Programa de Saúde da Família (PSF); Unidade Básica de Saúde (UBS); ambulatórios/Serviço de Atendimento Especializado (SAE)); e função do respondente (assistente social; enfermeiro(a); médico(a); psicólogo(a); outra função).

As variáveis dependentes foram:

1) Frequência de preenchimento da ficha de notificação em casos de violência sexual:

  1. Sempre;

  2. Na maioria das vezes;

  3. Às vezes;

  4. Nunca;

2) Conhecimento sobre a notificação ser compulsória:

  1. Sim;

  2. Não;

  3. Não sabe;

3) Órgão ao qual é feita a notificação de casos de violência:

  1. Polícia (Delegacia de Polícia/Delegacia da Mulher/Polícia Militar);

  2. Conselhos específicos (Conselho Tutelar/Vara da Infância e Juventude/Conselho da Mulher e Idoso);

  3. Órgãos gestores da Saúde (Ministério da Saúde; Secretaria Municipal de Saúde; Secretaria Estadual de Saúde);

  4. Sistemas de Vigilância/Informação (Vigilância Epidemiológica/Sistemas de Informações do Ministério da Saúde);

  5. Instituições que prestam atendimento a mulheres e adolescentes no município;

  6. Outro;

  7. Não sabe;

4) Razões referidas pelos SSs para o preenchimento ou não da ficha de notificação compulsória em casos de violência sexual:

a. Razões para preencher:

  1. Obrigatoriedade (Porque é obrigatório/Ministério da Saúde e/ou município exigem/Protocolo ou rotina da unidade);

  2. Informação ou estatísticas (Ajuda a identificar o número de casos/obter dados estatísticos);

  3. Saúde da mulher que sofre a violência (Para a mulher seguir o protocolo/fazer exames/tomar medicamentos);

  4. Programas de Saúde Pública (Ajuda a traçar estratégias para implantar programas de prevenção da violência sexual/políticas públicas);

  5. Para encaminhar a outra instituição;

b. Razões para não preencher:

  1. Razões que revelam desinformação do respondente (Nunca receberam informação/Nem sempre a mulher quer denunciar/Tem que partir dela fazer o boletim de ocorrência/Não é encaminhada para o setor interno que faz a notificação);

  2. Razões referentes ao despreparo dos profissionais do serviço (Nem todos os profissionais sabem preencher a ficha/Alguns acham que não é necessário/Falta sensibilização);

  3. Razões do funcionamento do serviço (Nem sempre conseguem todos os dados/Falta de tempo/Falta de profissional);

  4. Outras razões;

  5. Não sabe/Não informou.

Quanto às características dos SSs que preenchiam a ficha de notificação, foram avaliadas as seguintes variáveis dependentes:

1) Profissional que preenche a notificação: médico(a); enfermeiro(a); assistente social; psicólogo(a); técnico(a) ou auxiliar de enfermagem; outro;

2) Principais dificuldades enfrentadas durante o preenchimento da ficha de notificação compulsória:

  1. Razões referentes às mulheres (Dificuldade em obter informação com a paciente/Resistência e/ou medo das mulheres);

  2. Razões referentes às características da ficha (A ficha é difícil/complicada de preencher; A ficha é muito extensa; Demora no preenchimento; Fluxo para fazer a notificação está falho/falta sistematização);

  3. Razões dos profissionais (Falta de tempo/Esquecimento dos profissionais; Falta de vontade/má vontade dos profissionais);

  4. Razões das características do local (Falta de um lugar mais reservado para fazer o atendimento e as perguntas);

  5. Outra razão;

3) Opinião sobre a ficha de notificação trazer algum benefício para as mulheres:

  1. Sim;

  2. Não;

  3. Não sabe;

4) Opinião sobre quais benefícios pode trazer às mulheres:

  1. Informação ou estatísticas (Ajuda a identificar o número de casos de violência sexual/obter dados estatísticos);

  2. Programas de Saúde Pública (Ajuda a traçar estratégias para implantar programas de prevenção da violência);

  3. Saúde da mulher que sofre violência (Ajuda para posterior acompanhamento/tratamento adequado);

  4. Mulher pode falar sobre o assunto;

  5. Processo policial/judicial (Documentos para tomar providências/dar o devido encaminhamento; Forma de conter esse tipo de violência/amedrontar o agressor);

  6. Outra opinião;

  7. Não sabe informar;

5) Medidas tomadas para assegurar o sigilo das informações preenchidas na ficha de notificação:

  1. Cuidados no arquivamento das informações (Ficha arquivada em local específico/sala de arquivo; Ficha arquivada no prontuário da paciente; Fica em um arquivo/armário fechado; Arquivada em sala fechada/trancada);

  2. Limitação de quem tem acesso (Funcionários do serviço é que têm acesso à ficha/Apenas um funcionário tem acesso à ficha/Acesso apenas a pessoas com autorização por escrito do diretor, ou judicial);

  3. Encaminhamento a outras instituições/órgãos (Encaminhada para a Vigilância Epidemiológica; Encaminhada para outras instituições/órgãos; Encaminhada para outro serviço/órgão em envelope lacrado);

  4. Ficha arquivada no prontuário da paciente;

  5. O serviço não fica com cópia da ficha;

  6. Arquivada na recepção/no serviço.

Realizou-se análise descritiva simples2727. Altman DG. Practical statistics for medical research. Boca Raton: Champman & Hall/CRC; 1999. com o auxílio do pacote estatístico SPSS for Windows .

Para o componente qualitativo, a partir dos dados obtidos na etapa quantitativa, determinou-se uma amostra intencional2525. Patton MQ. Qualitative evaluation and research methods. 2nd ed. London: Sage; 1990. de seis municípios cuja seleção foi feita de acordo com: a distribuição geográfica no Estado de São Paulo dos municípios participantes na primeira etapa; o tamanho dos mesmos (< 100.000 habitantes e ≥ 100.000 habitantes); a existência de, ao menos, um SS que preenchia sempre a ficha de notificação compulsória em casos de violência sexual e, pelo menos, um SS que preenchia com outra frequência (na maioria das vezes, às vezes ou nunca). Selecionaram-se quatro municípios grandes (≥ 100.000 habitantes) e dois pequenos, com dois SSs em cada um.

Duas pesquisadoras visitaram cada SS selecionado para realizar entrevistas semiestruturadas com o coordenador ou com a pessoa responsável pelo atendimento a mulheres que sofrem violência sexual e outros profissionais envolvidos nesse atendimento. Ao todo, foram realizadas 45 entrevistas. A maioria das pessoas entrevistadas era do sexo feminino e trabalhava havia muitos anos nos serviços visitados; 31 eram profissionais que atendiam diretamente às mulheres (16 da área de enfermagem, 8 médicos, quatro assistentes sociais e 3 psicólogas); 14 eram gestores.

Para conduzir as entrevistas, utilizou-se um roteiro elaborado a partir dos resultados da primeira etapa do estudo, visando a aprofundar alguns aspectos, especialmente os relacionados às dificuldades para preencher a ficha de notificação. Esse roteiro foi composto de oito perguntas sobre os seguintes tópicos: como ocorria o atendimento de emergência às mulheres que sofrem violência sexual, conhecimento sobre a ficha de notificação compulsória para os casos de violência sexual, como era feito o preenchimento da ficha, as dificuldades enfrentadas durante o preenchimento e qual encaminhamento era dado à ficha preenchida. No caso de serviços que referiam não preencher a ficha ou preencher somente algumas vezes, era perguntado por que isso ocorria.

As entrevistas duraram em média 20 minutos, foram gravadas e depois transcritas. A análise temática de conteúdo foi realizada com o auxílio do programa NVivo. Os pesquisadores fizeram uma leitura flutuante28 28. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: Pesquisa qualitativa em saúde. 5ª ed. São Paulo: Hucitec-Abrasco; 1998.dos textos transcritos para identificar as unidades de significado relacionadas aos objetivos do estudo e aos resultados quantitativos. Essas unidades foram agrupadas e classificadas em categorias de análise que, ao serem articuladas, podiam dar resposta aos objetivos propostos2929. Ziebland S, McPherson A. Making sense of qualitative data analysis: an introduction with illustrations from DIPEx (personal experiences of health and illness). Med Educ 2006; 40(5): 405-14.. Neste artigo são apresentados resultados referentes às seguintes categorias de análise: conhecimento sobre a ficha de notificação compulsória para os casos de violência sexual, seu preenchimento, as dificuldades encontradas para preenchê-la, qual o encaminhamento dado às fichas preenchidas e sugestões para melhorar as condições de preenchimento.

O protocolo desta pesquisa foi aprovado sem restrições pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, sob o protocolo nº 144/2009. As diretrizes da Resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (sobre pesquisas envolvendo seres humanos3030. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 196/96 sobre pesquisa envolvendo seres humanos. Bioética 1996; 4: 15-25.) então vigentes foram respeitadas neste estudo. A participação dos sujeitos foi voluntária e suas identidades foram mantidas em sigilo. Para o componente quantitativo, um primeiro termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) foi lido para cada um dos possíveis entrevistados e eles foram questionados sobre a decisão de participar ou não do estudo; quando a pessoa concordou em participar, tal anuência foi gravada por telefone. Para a etapa qualitativa, antes da entrevista foi fornecido outro TCLE para que o profissional lesse e assinasse, caso concordasse em participar do estudo.

RESULTADOS

Dos 172 SSs que referiram prestar atendimento de emergência a mulheres que sofreram violência sexual, 46,5% eram hospitais, 23,3%, prontos-socorros ou UPAs, 16,9%, UBSs, 10,5%, ambulatórios/SAEs, 1,7%, PSFs, e 1,2%, Centros de Referência em Saúde da Mulher. Mais da metade (58,1%) dos participantes responsáveis pelo atendimento às mulheres que sofrem violência sexual era composta de enfermeiros(as), 19,2% eram médicos(as), 10,5%, assistentes sociais, 4,7%, psicólogos(as), e 7,6% referiram outra função. A maioria (79,1%) desses 172 serviços afirmou preencher sempre a ficha de notificação, 12,8% relataram que preenchiam na maioria das vezes, 5,2% referiram preencher às vezes, 1,2% afirmaram nunca preencher, e 1,7% não souberam informar.

Dos 167 SSs que notificavam casos de violência sexual, 95,2% referiram saber que a notificação é compulsória, excetuando-se um SS que não respondeu.

A maior parte desses 167 serviços que preenchiam com alguma frequência a ficha de notificação compulsória (excluindo-se um SS que não respondeu) referiu que a notificação de violência sexual era feita aos sistemas de vigilância ou de informações do Ministério da Saúde (65,7%), e 20,5% referiram órgãos gestores da Saúde.

As razões mais referidas, espontaneamente, para o preenchimento da ficha de notificação compulsória em casos de violência sexual foram a obrigatoriedade (60,9%) e a obtenção de informações ou estatísticas (27,8%). Dentre as razões para não se preencher a ficha, as mais referidas foram as que revelam desinformação do respondente (8,3%) e as referentes ao despreparo dos profissionais (6,5%).

Nos SSs que preenchiam com alguma frequência a ficha de notificação em casos de violência sexual (n = 167), os profissionais mais referidos como sendo os que faziam tal trabalho foram os enfermeiros(as) (78,4%), seguidos dos médicos(as) (46,1%) e dos assistentes sociais (24,0%) (Tabela 1). O preenchimento exclusivamente por enfermeiros(as) foi referido por 51 SSs (30,5%), enquanto tal atitude por parte de médicos(as) foi registrada em 14 SSs (8,4%). Em relação às dificuldades enfrentadas durante o preenchimento da ficha, 57 SSs (34,1%) responderam que não tinham nenhuma (dados não apresentados em tabela); dentre os 101 que indicaram alguma dificuldade, 53,5% disseram que a dificuldade era referente às mulheres; 33,7% referiram razões das características da ficha, e 29,7% citaram razões dos profissionais que deveriam preencher (Tabela 1). A grande maioria (86,2%) dos(as) respondentes opinou que a ficha de notificação pode trazer algum benefício às mulheres (dado não apresentado em tabela); desses, quase a metade (48,6%) referiu que a ficha pode trazer informações ou estatísticas e contribuir para a implementação de programas de Saúde Pública (38,2%) (Tabela 1).

Tabela 1.
Características dos serviços de saúde que preenchiam a ficha de notificação em casos de violência sexual sempre, na maioria das vezes ou às vezes.

Como medidas mais frequentemente utilizadas para assegurar o sigilo das informações da ficha de notificação dentro dos SSs foram citadas: cuidados no arquivamento das informações (67,1%); limitação em quem tem acesso à ficha (65,2%); encaminhamento a outras instituições/órgãos (60,9%).

Na etapa qualitativa, em todos os municípios (quatro deles grandes e dois pequenos) pelo menos um dos SSs referiu preencher sempre a ficha de notificação compulsória. Em um SS situado em município pequeno houve o relato de que, quando aparecia um caso de violência sexual, a Vigilância Epidemiológica do município (que ficava dentro do outro serviço estudado) era acionada para ir até o SS preencher a ficha e tomar as providências necessárias ao cuidado daquele caso.

A grande maioria dos profissionais que faziam o preenchimento era composta de enfermeiros(as). Alguns médicos(as) que aceitaram participar da pesquisa não sabiam da existência da ficha de notificação compulsória, nem quais profissionais eram responsáveis pelo seu preenchimento.

Em relação às dificuldades encontradas para o preenchimento da ficha de notificação compulsória, a mais referida foi sobre o tamanho da ficha ("longa"; "extensa"; "muitos detalhes"; "muita informação"). Uma segunda dificuldade foi o problema de se obter informações da mulher ("fragilizada"; "vulnerável"; "às vezes a mulher não fala que sofreu esse tipo de violência"; "receio"; "medo"; "vergonha"). Também houve o relato da dificuldade do profissional em obter as informações ("constrangimento"; "difícil conversar com a mulher nesse momento delicado"; entre outros). As duas últimas dificuldades foram algumas vezes relacionadas também ao fato de não existir um local ou sala no SS onde a mulher e o profissional do serviço pudessem conversar reservadamente.

Quase todos os SSs que preencheram a ficha afirmaram manter uma cópia da notificação no próprio serviço, porém poucos funcionários além da pessoa que preenchia tinham conhecimento sobre isso. Em relação ao encaminhamento dado à ficha preenchida, não houve consenso entre os participantes. Diversos referiram o encaminhamento à Vigilância Epidemiológica, mas alguns relataram o envio a outras instituições, entre elas delegacias; muitos não sabiam o destino dado à ficha de notificação.

As pessoas entrevistadas deram sugestões para melhorar as condições de preenchimento da ficha de notificação nos serviços, entre elas: treinamento dos profissionais, conscientização sobre a importância do preenchimento, envolvimento dos profissionais, diminuição da quantidade de informações na ficha, melhorar o atendimento à mulher, para que ela não tenha que repetir informações. Porém, a sugestão mais frequente foi a de se fazer treinamentos periódicos para os profissionais de cada SS, em especial devido à rotatividade dos mesmos.

DISCUSSÃO

Os resultados apresentados indicam que o preenchimento da ficha de notificação compulsória da violência sexual ainda não está totalmente incorporado às rotinas dos SSs que atendem a esses casos no Estado de São Paulo. Isso se torna mais preocupante quando consideramos que o Estado de São Paulo foi pioneiro no Brasil no estabelecimento de serviços de atendimento a mulheres que sofrem violência sexual. Além disso, também deve-se considerar que a grande maioria dos serviços que participaram do estudo era composta de hospitais ou prontos-socorros, em relação aos quais se poderia supor que tivessem maior familiaridade com a questão da notificação.

Embora a grande maioria das pessoas entrevistadas tenha manifestado a opinião de que o preenchimento da ficha pode trazer benefícios às mulheres, apenas pouco mais de um quarto dos serviços referiu como motivo para o preenchimento a possibilidade de obter dados estatísticos/informações sobre as ocorrências. Isso reforça a hipótese de que ainda não está clara para todos os profissionais a importância da notificação como instrumento de gestão para fornecer subsídios a políticas públicas. Por intermédio das notificações é possível mapear as ocorrências e as características da violência, o que possibilitaria traçar intervenções mais efetivas para prevenir e combater tal agressão3131. Saliba O, Garbin CAS, Garbin AJI, Dossi AP. Responsabilidade do profissional de saúde sobre a notificação de casos de violência doméstica. Rev Saúde Pública 2007; 41(3): 472-7..

Essa situação pode estar relacionada tanto à formação dos profissionais de saúde quanto à sua capacitação para desempenhar suas funções nos serviços públicos de saúde. Estudo realizado com professores de faculdades de medicina e de enfermagem3232. Souza ER, Ribeiro AP, Penna LHG, Ferreira AL, Santos NC, Tavares CMM. O tema violência intrafamiliar na concepção dos formadores dos profissionais de saúde. Ciênc Saúde Coletiva 2009; 14(5): 1709-19. apontou que, embora os docentes reconhecessem a violência como um problema de saúde, eles tinham dificuldades para inserir o tema em sua prática docente. Ao analisar os currículos dessas faculdades, verificou-se que o tema da violência foi explicitado ou apareceu na forma de outro termo correlato em 23% das disciplinas dos cursos de medicina e em 16,3% das disciplinas de enfermagem. Por outro lado, alguns estudos com profissionais de serviços públicos de saúde têm apontado que eles não se sentem capacitados a dar um atendimento integral às mulheres em situação de violência1515. Osis MJD, Duarte GA, Faúndes A. Violência entre usuárias de unidades de saúde: prevalência, perspectiva e conduta de gestores e profissionais. Rev Saúde Pública 2012; 46(2): 351-8.,3333. d'Oliveira AFPL, Schraiber LB, Hanada H, Durand J. Atenção integral à saúde de mulheres em situação de violência de gênero - uma alternativa para a atenção primária em saúde. Cienc Saúde Coletiva 2009; 14(4): 1037-50.,3434. Vieira EM, Perdona GCS, Almeida AM, Nakano MAS, Santos MA, Daltoso D, et al. Conhecimento e atitude dos profissionais de saúde em relação à violência de gênero. Rev Bras Epidemiol 2009; 12(4): 566-77., o que, por certo, também pode comprometer seu entendimento acerca da necessidade da notificação, inclusive da violência contra crianças e adolescentes3535. Gonçalves HS, Ferreira, AL. A notificação da violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes por profissionais de saúde. Cad Saúde Pública 2002; 18(1): 315-9.. Vale lembrar que a necessidade de capacitação periódica para esse tipo de atendimento é enfatizada pelo próprio Ministério da Saúde3636. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes. Série A - Normas e Manuais Técnicos, Série Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, Caderno n° 6. 3ª ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2011., e neste estudo apareceu como uma forte sugestão dos participantes. Contudo, também é preciso considerar que nessa referida dificuldade de preencher a notificação dos casos de violência pode estar implícita certa resistência dos profissionais de tratar essa questão como problema de Saúde Pública, e não como um problema de polícia.

Também é preciso considerar que, muitas vezes, a organização do trabalho nos SSs apresenta dificuldades de sobrecarga de alguns profissionais, e a exigência de preencher mais um formulário pode ser considerada excessiva, sobretudo quando não se percebe a razão e a importância dessa exigência. Nesta pesquisa, se observou nas duas etapas que, na maioria dos casos, os profissionais de enfermagem eram os encarregados do preenchimento da notificação. Isso é coerente com o modelo de trabalho que costumeiramente se observa nos serviços, no qual os profissionais de enfermagem costumam ser responsáveis pelo preenchimento de diversos formulários, tarefa que acumulam com a assistência propriamente dita. Sobretudo nos serviços de emergência, isso pode representar uma grande dificuldade a ser superada e uma atitude que pode, inclusive, resultar no não preenchimento ou no preenchimento incompleto da ficha de notificação. Além de ter sido claramente apontado na abordagem quantitativa, tal comportamento se evidenciou mais explicitamente na abordagem qualitativa, quando as pessoas se referiram à extensão da ficha e ao tempo necessário para o seu preenchimento.

Outro aspecto que se evidenciou neste estudo, nas duas etapas, foi a referência dos entrevistados à dificuldade de obter as informações necessárias para a notificação de mulheres que sofreram violência sexual. Isso é um fato já verificado em outros estudos não apenas com relação à violência sexual mas também a outros tipos de violência sofrida pelas mulheres1515. Osis MJD, Duarte GA, Faúndes A. Violência entre usuárias de unidades de saúde: prevalência, perspectiva e conduta de gestores e profissionais. Rev Saúde Pública 2012; 46(2): 351-8.,3737. Schraiber LB, d'Oliveira AFPL. Violence against women and Brazilian health care policies: a proposal for integrated care in primary care services. Int J Gynecol Obstet 2002; 78(Suppl. 1): S21-5.,3838. Schraiber LB, d'Oliveira AFPL, França-Júnior I, Pinho AA. Violência contra a mulher: estudo em uma unidade de atenção primária à saúde. Rev Saúde Pública 2002; 36(4): 470-7.. É preciso considerar que a mulher que sofreu violência sexual chega ao SS debaixo de forte impacto e, com frequência, desejando esconder-se e falar o menos possível. É necessário que os profissionais de saúde saibam como acolher a mulher que foi agredida, dar espaço às suas queixas e obter com precisão todas as informações necessárias, para evitar a necessidade de a mulher ficar repetindo narrativas, por certo, tão dolorosas1919. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Atenção integral para mulheres e adolescentes em situação de violência doméstica e sexual - Matriz pedagógica para formação de redes. Série B - Textos Básicos de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.. Destaca-se que a ficha de notificação não necessitaria ser preenchida de imediato, logo após a chegada da mulher ao serviço, justamente no momento em que muitas vezes ela está emocionalmente fragilizada. Se as informações de prontuário forem bem preenchidas por todos os profissionais de saúde que atendem às mulheres, ele será importante fonte complementar para o preenchimento posterior da ficha.

Não se pode deixar de mencionar também que o acolhimento das mulheres que sofrem violência, por parte dos profissionais dos serviços de emergência, depende também da perspectiva desses profissionais sobre o significado da violência contra a mulher e do impacto que essa violência também pode exercer sobre os próprios profissionais, que, por vezes, podem estar vivenciando ou já ter vivenciado situações desse tipo1111. Oliveira EM, Barbosa RM, Moura AAVM, Kossel K, Morelli K, Botelho LFF, et al. Atendimento às mulheres vítimas de violência sexual: um estudo qualitativo. Rev Saúde Pública 2005; 39(3): 376-82.,3939. Reis MJ, Lopes MHBM, Higa R, Turato ER, Chvatal VLS, Bedone AJ. Vivências de enfermeiros na assistência à mulher que sofre violência sexual. Rev Saúde Pública 2010; 44(2): 325-31..

Este estudo apresentou como principais limitações o fato de a amostra não ser probabilística, baseada inicialmente em estudo prévio feito entre 2005 - 2006 em SSs que referiam prestar atendimento de emergência a mulheres que sofriam violência sexual1313. Faúndes A, Hardy E, Osis MJD, Makuch MY, Duarte GA, Andalaft Neto J. Perfil do atendimento à violência sexual no Brasil. Relatório técnico apresentado ao Ministério da Saúde. Campinas: CEMICAMP; 2006., incluindo outros serviços indicados pelos primeiros. Dessa forma, os resultados não podem ser generalizados para o Estado de São Paulo. Além disso, outra limitação se refere ao fato de que não foi possível verificar a qualidade do preenchimento da ficha de notificação pelos serviços. Assim, não é possível afirmar se os SSs que referiram preencher sempre a ficha de notificação o faziam de maneira completa e adequada. Vale lembrar que na etapa qualitativa as pessoas entrevistadas enfatizaram que a extensão da ficha e a necessidade de incluir muitos detalhes sobre a violência sofrida pela mulher se constituíam em dificuldades para o preenchimento.

Em que pesem as limitações acima mencionadas, os resultados tornam evidente que o preenchimento da notificação compulsória dos casos de violência sexual contra as mulheres ainda necessita ser mais bem trabalhado com os SSs, tanto para que os profissionais saibam como fazê-lo quanto para que compreendam o seu valor como parte do esforço que toda a sociedade deve seguir fazendo para diminuir a violência contra a mulher. Entretanto, é preciso lembrar que, para que essa compreensão ocorra, os profissionais necessitam perceber a utilidade das informações coletadas em termos de sua prática cotidiana; caso contrário, a ficha de notificação tende a ser vista progressivamente como uma exigência inútil no que se refere a melhorar a atenção dada às mulheres que sofrem violência sexual.

CONCLUSÃO

Embora a maior parte dos SSs tenha referido preencher a ficha de notificação compulsória, mencionou também várias dificuldades para fazê-lo, especialmente relacionadas à sobrecarga de trabalho dos profissionais e à incompreensão acerca da importância dessa notificação no contexto da atenção integral às mulheres que sofrem violência sexual. Percebe-se a necessidade de estratégias que melhorem a formação continuada dos profissionais, para que incorporem a ficha de notificação como parte do atendimento às mulheres, bem como a devida valorização desse atendimento dentre as várias atribuições dos SS.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), que financiou totalmente esta pesquisa (processo no 2010/50345-6).

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    Regulamenta a Lei no. 10.778, de 24 de novembro de 2003, e institui os serviços de referência sentinela22.
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    Define as terminologias adotadas em legislação nacional, conforme o disposto no Regulamento Sanitário Internacional 2005 (RSI 2005), a relação de doenças, agravos e eventos em saúde pública de notificação compulsória em todo o território nacional e estabelece fluxo, critérios, responsabilidades e atribuições aos profissionais e serviços de saúde23.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2015

Histórico

  • Recebido
    16 Set 2013
  • Revisado
    03 Jun 2014
  • Aceito
    08 Ago 2014
Associação Brasileira de Pós -Graduação em Saúde Coletiva São Paulo - SP - Brazil
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