Tuberculose e diabetes: associação com características sociodemográficas e de diagnóstico e tratamento. Brasil, 2007-2011

Ricardo Gadelha de Abreu Lúcia Rolim Santana de Freitas Artur Iuri Alves de Sousa Maria Regina Fernandes de Oliveira Sobre os autores

RESUMO:

Introdução:

A comorbidade tuberculose e diabetes ainda continua um desafio para a saúde pública mundial.

Objetivo:

Analisar o perfil sociodemográfico e as características do diagnóstico e tratamento dos casos de tuberculose com e sem diabetes no Brasil.

Métodos:

Estudo transversal, com dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação e do Sistema de Gestão Clínica de Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus da Atenção Básica, no período de 2007 a 2011. Modelo de regressão de Poisson com variância robusta foi utilizado para estimar a razão de prevalência (RP) e seus respectivos intervalos de confiança.

Resultados:

A comorbidade estudada foi encontrada em 7,2% dos casos. Modelo hierárquico mostrou maior RP entre indivíduos do sexo feminino (RP = 1,31; intervalo de confiança de 95% - IC95% 1,27 - 1,35); maior associação nas faixas etárias 40-59 anos e ≥ 60 anos (RP = 11,70; IC95% 10,21 - 13,39 e RP = 17,49; IC95% 15,26-20,05) e com resultado positivo da baciloscopia - primeira amostra (RP = 1,40; IC95% 1,35 - 1,47). Reingresso após abandono e abandono foram inversamente associados na comorbidade (RP = 0,66; IC95% 0,57 - 0,76 e RP = 0,79; IC95% 0,72 - 0,87).

Conclusão:

Os achados, como a relação inversa do abandono ao tratamento da tuberculose no grupo das pessoas com comorbidade, reforçam a importância de ações integradas nos serviços para mudar o cenário dessa desafiadora comorbidade.

Palavras-chave:
Tuberculose; Diabetes Mellitus; Comorbidade; Gestão da Informação; Análise de Regressão

INTRODUÇÃO

No início do século XX, foram descritas associações entre a diabetes mellitus (DM) e a tuberculose (TB). Essa comorbidade requer atenção e cuidados mais complexos, uma vez que a diabetes pode interferir no metabolismo dos fármacos antituberculose, e o risco de uma pessoa com diabetes desenvolver a tuberculose pode variar de 2,44 a 8,33 vezes mais, quando comparada com uma pessoa sem diabetes11. Jeon CY, Murray MB. Diabetes mellitus increases the risk of active tuberculosis: a systematic review of 13 observational studies. PLoS Med 2008; 5(7): e152. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.0050152
https://doi.org/https://doi.org/10.1371/...
,22. Dooley KE, Chaisson RE. Tuberculosis and diabetes mellitus: convergence of two epidemics. Lancet Infect Dis 2009; 9(12): 737-46. https://dx.doi.org/10.1016%2FS1473-3099(09)70282-8
https://doi.org/https://dx.doi.org/10.10...
,33. Harries AD, Billo N, Kapur A. Links between diabetes mellitus and tuberculosis: should we integrate screening and care? Trans R Soc Trop Med Hyg 2008; 103(1): 1-2. https://doi.org/10.1016/j.trstmh.2008.08.008
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
,44. Pablos-Méndez A, Blustein J, Knirsch CA. The Role of Diabetes Mellitus in the Higher Prevalence of Tuberculosis among Hispanics. Am J Public Health 1997; 87(4): 574-9. https://dx.doi.org/10.2105%2Fajph.87.4.574
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.

As dúvidas permanecem em razão das observações de que a TB induz hiperglicemia temporária, resolvida com o tratamento desta doença55. Oluboyo PO, Erasmus RT. The significance of glucose intolerance in pulmonary tuberculosis. Tubercle 1990; 71(2): 135-8. https://doi.org/10.1016/0041-3879(90)90010-6
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,66. Basoglu OK, Bacakoglu F, Cok G, Sayiner A, Ates M. The oral glucose tolerance test in patients with respiratory infections. Monaldi Arch Chest Dis 1999; 54(4): 307-10., e de que a diabetes não controlada está associada a inúmeras complicações, como doenças vasculares, neuropatias e aumento da susceptibilidade às infecções22. Dooley KE, Chaisson RE. Tuberculosis and diabetes mellitus: convergence of two epidemics. Lancet Infect Dis 2009; 9(12): 737-46. https://dx.doi.org/10.1016%2FS1473-3099(09)70282-8
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.

No Brasil, estudo que comparou as informações obtidas pelo Suplemento Saúde da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), em 1998, e as estimadas pelo estudo Projeto Carga Global de Doença no Brasil, sobre as prevalências de cinco doenças crônicas - cirrose, depressão, diabetes, insuficiência renal crônica e tuberculose - apontou prevalências elevadas dessas enfermidades no país77. Leite IDC, Schramm JMDA, Gadelha AMJ, Valente JG, Campos MR, Portela MC, et al. Comparação das informações sobre as prevalências de doenças crônicas obtidas pelo suplemento saúde da PNAD/98 e as estimadas pelo estudo Carga de Doença no Brasil. Ciênc Saúde Coletiva 2002; 7(4): 733-41. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232002000400010
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.159...
.

Estimativas da Federação Internacional de Diabetes (IDF) indicavam, em 2015, a existência de 415 milhões de adultos com idades entre 20 e 79 com diabetes em todo o mundo. Incluindo-se os 193 milhões que não são diagnosticados, pode-se chegar a 642 milhões de pessoas vivendo com a doença em 2040. É possível que em áreas de alta prevalência de diabetes o impacto dessa doença sobre a tuberculose possa ser tão elevado quanto o do vírus da imunodeficiência humana (HIV)88. Rawat J, Sindhwani G, Biswas D. Effect of age on presentation with diabetes: Comparison of non diabetic patients with new smear-positive pulmonary tuberculosis patients. Lung 2011; 28(3): 187-90. https://doi.org/10.4103/0970-2113.83975
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,99. International Diabetes Federation. IDF Diabetes Atlas. 7ª ed. Bruxelas: International Diabetes Federation; 2015..

Nas 27 capitais do Brasil, segundo dados da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), de 2016, das 53.210 entrevistas completadas, a frequência de adultos que referiram diagnóstico médico prévio de diabetes variou entre 5,3% em Boa Vista e 10,4% no Rio de Janeiro. No conjunto dessas cidades, a frequência foi de 8,9%, sendo de 7,8% entre homens e de 9,9% entre mulheres. Em ambos os sexos, o diagnóstico da doença tornou-se mais comum com o avanço da idade, particularmente após os 45 anos. Mais de um quarto dos indivíduos com 65 anos de idade ou mais relataram diagnóstico médico de diabetes. Para ambos os sexos, a frequência de diabetes foi particularmente elevada em indivíduos com até oito anos de estudo1010. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigilância de fatores de risco e proteção para as doenças crônicas por inquérito telefônico: VIGITEL 2016. Brasília: Ministério da Saúde; 2017..

Com relação à tuberculose, em 2017, globalmente, estimou-se que 10 milhões de pessoas desenvolveram a doença, sendo 5,8 milhões de homens, 3,2 milhões de mulheres e 1 milhão de crianças1111. World Health Organization. Global tuberculosis report 2018. Genebra: World Health Organization; 2018..

No Brasil, em 2017, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), o coeficiente de incidência foi de 44 casos para cada 100 mil habitantes, ficando na 30ª posição entre os 30 países com altas cargas de tuberculose no mundo. Em 2015, o percentual de detecção da tuberculose no país, conforme a OMS, foi de 87%1111. World Health Organization. Global tuberculosis report 2018. Genebra: World Health Organization; 2018..

Nesse contexto, este estudo objetivou conhecer, descrever e analisar a associação do perfil sociodemográfico e das características do diagnóstico, acompanhamento e tratamento dos casos de tuberculose com e sem diabetes, no período de 2007 a 2011, após relacionamento probabilístico de bases de dados dos sistemas de informação de tuberculose e do de diabetes do Sistema Único de Saúde (SUS). As informações geradas ampliarão o conhecimento quanto à magnitude do problema e poderão contribuir para as discussões do tema, subsidiando as tomadas de decisão no âmbito das três esferas de gestão para o aperfeiçoamento ou implantação de novas políticas públicas de prevenção e controle dessas doenças.

MÉTODOS

TIPO DE ESTUDO

Realizou-se um estudo epidemiológico analítico transversal.

FONTES DE DADOS

Os dados do estudo foram retirados da base nacional do Sistema de Informação de Agravos de Notificação da tuberculose (Sinan-tuberculose) e do Sistema de Gestão Clínica de Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus da Atenção Básica (Hiperdia).

O Sinan é o sistema oficial de notificação compulsória no Brasil, e a tuberculose consiste em uma dessas doenças1212. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 204, de 17 de fevereiro de 2016. Define a Lista Nacional de Notificação Compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde pública nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território nacional, nos termos do anexo, e dá outras providências. Diário Oficial da União 2016; Seção 1:23.. O Hiperdia, até o ano de 2013, foi o sistema oficial utilizado para o registro de diabetes, gerando informações do desempenho e dos resultados clínicos durante o acompanhamento. Esse sistema destinava-se ao cadastramento e acompanhamento de portadores de hipertensão e/ou DM atendidos na rede ambulatorial do SUS, permitindo gerar informação para aquisição, dispensação e distribuição de medicamentos de forma regular e sistemática a todos os pacientes cadastrados1313. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria Conjunta n.º 02/SPS/SE, de 5 de março de 2002. Disponibiliza, no âmbito da atenção básica, instrumento de cadastro e acompanhamento dos portadores de Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus, Sishiperdia, para utilização pelos municípios. Diário Oficial da União 2002a; Seção 1:38..

POPULAÇÃO DE ESTUDO

As populações do estudo foram compostas de dados dos indivíduos com tuberculose e sem diabetes notificados nas bases nacionais do Sinan-tuberculose e de dados das pessoas com tuberculose e diabetes provenientes das bases nacionais do Sinan e do banco associado, após relacionamento probabilístico desses bancos de dados do Sinan com os casos de diabetes registrados no Hiperdia.

RELACIONAMENTO DAS BASES DE DADOS

No relacionamento dos bancos, para a padronização dos campos comuns, foram utilizados:

  1. comparação de nome da pessoa, nome da mãe e data de nascimento, aplicação de algoritmos para comparação aproximada de cadeias de caracteres;

  2. blocagem, com divisão das bases em blocos mutuamente exclusivos, com comparações restritas aos registros de um mesmo bloco e otimização da comparação entre registros;

  3. cálculo de escores;

  4. definição de limiares para classificação dos pares de registros e sua identificação como verdadeiros ou não pares.

Para o relacionamento probabilístico e a verificação dos possíveis casos da comorbidade que não estavam notificados no Sinan-tuberculose, a base de dados do Sinan-tuberculose considerou os casos notificados de 1º de janeiro de 2001 até 31 de dezembro de 2012, e a base de dados do Hiperdia, de 1º de janeiro de 2007 a 31 de dezembro de 2011. Os períodos são diferentes, pela tentativa de captar maior número de comorbidade. Para o banco final, foram incluídos no estudo os casos de tuberculose sem a comorbidade tuberculose e diabetes notificados no Sinan de 1º de janeiro de 2007 até 30 de junho de 2011 e os casos com comorbidade tuberculose e diabetes - aqueles notificados no Sinan-tuberculose com a informação da associação com a diabetes e os casos recuperados após o relacionamento desses bancos. Foram excluídos os casos de tuberculose registrados no Sinan após junho de 2011, pois os casos diagnosticados após aquela data deveriam ter encerrado o tratamento recomendado de seis meses1414. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília: Ministério da Saúde ; 2011. somente em 2012 (fora do período do estudo e sem informações dos registros de diabetes no Hiperdia).

Para se chegar à base conjunta com os casos de TB e DM, foram utilizados procedimentos probabilísticos com o aplicativo Reclink, versão 3.0, com campos comuns com o objetivo de identificar, com probabilidades estabelecidas, se os registros pareados pertenciam ao mesmo indivíduo. Essa base final formatada considerou os casos que foram pares, presentes em ambas as bases, e os que estavam somente no Sinan-TB (não pareados com o registro do Hiperdia). No banco com somente casos de TB, foram considerados sem comorbidade os casos de tuberculose notificados sem diabetes associado, ou seja, casos de TB cuja variável doenças e agravos associados - diabetes da ficha do Sinan tivesse código 2 (Não). Foram excluídos aqueles com código 9 (ignorado) ou sem preenchimento (em branco) para a mesma variável. A outra parte do banco com os casos pareados da comorbidade levou em conta: caso de tuberculose notificado no Sinan com a variável doenças e agravos associados - diabetes com código 1 (Sim); caso de diabetes registrado no Hiperdia antes do caso de tuberculose notificado no Sinan; e casos de diabetes e tuberculose registrados e notificados no mesmo ano em ambos os sistemas - Hiperdia e Sinan.

VARIÁVEIS DE INTERESSE

Neste estudo, a presença e a ausência de comorbidade TB e DM foram consideradas como variáveis dependentes. Os dois grupos foram comparados tendo como variáveis independentes as características sociodemográficas: sexo, faixa etária, raça/cor da pele, anos de estudo e uso regular de álcool; e características de diagnóstico e tratamento da tuberculose como: sorologia para o HIV, baciloscopia com a primeira amostra de escarro, cultura de escarro, baciloscopia após o sexto mês de tratamento, raio X de tórax, realização de tratamento supervisionado, tipo de entrada para o tratamento e situação no encerramento do tratamento.

PROCESSAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS

Antes do processamento e da análise dos dados no banco final, foram realizadas a limpeza e adequações das variáveis a serem utilizadas, sendo excluídos os campos em branco e com preenchimento com código ignorado (9) das características sociodemográficas (sexo, raça/cor de pele, uso regular de álcool) e das características de diagnóstico e tratamento da tuberculose (sorologia para o vírus da imunodeficiência humana, baciloscopia com a primeira amostra de escarro, cultura de escarro, baciloscopia após o sexto mês de tratamento, raio X de tórax, realização de tratamento supervisionado). Além disso, foram feitos ajustes nas variáveis, categorizando-se em estratos pela data de nascimento, pela raça/cor de pele e pelos anos de estudo. Além disso, para as características de diagnóstico e tratamento da tuberculose, optou-se em considerar somente os exames realizados e com resultado positivo ou negativo, ou ainda os exames de raio X realizados e com resultado normal ou suspeito e a exclusão de alguns campos.

Após a organização do banco, realizou-se análise bivariada para estimar as diferenças entre as proporções das variáveis nos grupos com e sem comorbidade. Os dados foram processados no software Microsoft Excel® e no programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 20, com aplicação do teste χ2 de Pearson, considerando-se o nível de significância estatística de 5%.

Posteriormente à análise bivariada, na etapa analítica, foi aplicado o modelo de regressão de Poisson com variância robusta, orientado pelo modelo hierárquico mostrado no Quadro 1, empregando a razão de prevalência (RP) como medida de associação. O critério de Akaike foi utilizado na seleção dos modelos. Usou-se o método backward em cada um dos níveis hierárquicos para seleção das variáveis independentes. Variáveis que apresentaram associação com p ≤ 0,05 foram mantidas no modelo, com o objetivo de controlar fatores de confusão. Calcularam-se intervalos de 95% de confiança (IC95%). Para avaliar a qualidade do ajuste do modelo, foram empregados os resíduos padronizados para investigar se as suposições do modelo, tais como homocedasticidade e erros normalmente distribuídos, foram violadas. As análises foram feitas com auxílio do software STATA 12 (StataCorp, 2011).

Quadro 1.
Níveis hierárquicos da análise ajustada: modelo Poisson robusto.

ASPECTOS ÉTICOS

As bases de dados nominais do Sinan e do Hiperdia foram disponibilizadas pelo Ministério da Saúde, por meio do Programa Nacional de Controle da Tuberculose e do Departamento de Informática do SUS (Datasus), mediante assinatura de Termo de Responsabilidade pelo pesquisador. O projeto da pesquisa foi aprovado em 11 de março de 2014, com número de parecer 552.561, pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília.

RESULTADOS

No banco final foram consideradas 24.443 pessoas com a comorbidade TB e diabetes, com base nos bancos do Sinan-tuberculose e do banco relacionado, e 314.382 pessoas com TB e sem diabetes, pelo banco do Sinan-tuberculose.

Na análise bivariada, no período de 2007 a 2011, foram analisados 338.825 registros de pessoas com TB. Desse total, 7,2% tinham TB e diabetes e 92,8% tinham somente TB. Entre os casos com comorbidade, em relação ao sexo, 6,8% (224.661) foram do sexo masculino, e 8,1% (108.144), do sexo feminino; a faixa etária de maiores de 60 anos de idade foi a que apresentou a maior proporção, 17,6%; e a proporção da raça/cor da pele branca também foi a mais frequente, 7,5%, diferentemente das pessoas somente com TB, em que outras raças/cores da pele foram mais prevalentes, 94,2%; indivíduos com menos ou com até quatro anos de estudo apresentaram a maior proporção nesse grupo. No grupo sem comorbidade, a proporção maior foi de 95,3% nos com mais de oito anos de estudo. Todas as análises foram estatisticamente significativas, com p < 0,001. O uso do álcool foi a única variável não estatisticamente significativa, com p = 0,735, com proporções semelhantes dentro de cada grupo (Tabela 1).

Tabela 1.
Distribuição dos casos de tuberculose com e sem diabetes, segundo características sociodemográficas. Brasil, 2007-2011.

Ainda no grupo com a comorbidade, no tocante aos exames de diagnóstico, acompanhamento e tratamento da TB, observou-se que o resultado positivo da sorologia para o HIV foi de 2,9% e o resultado negativo foi de 7,2%; 6,4% dos casos apresentaram baciloscopia da primeira amostra de escarro com resultado negativo e 8,1% resultado positivo; exame de raio X de tórax suspeito teve proporção de 7,6%; e o resultado do raio X foi normal em 5,1% desses indivíduos. No que se refere ao tipo de entrada, 7,4% foram casos novos; 7,2% tiveram recidiva de tuberculose; e 4,0% foram casos de reingresso após abandono. Na análise da situação de encerramento, considerando cura, abandono e óbito por TB, as proporções foram de 7,4, 4,1 e 10,2%, respectivamente. Todas essas variáveis foram estatisticamente significativas, exceto a realização de tratamento supervisionado, com p = 0,682 (Tabela 2).

Tabela 2.
Distribuição dos casos de tuberculose com e sem diabetes, segundo características de diagnóstico e tratamento. Brasil, 2007-2011.

A Tabela 3 apresenta a análise ajustada por meio do modelo hierárquico Poisson com variância robusta da associação entre a comorbidade TB e diabetes e as variáveis independentes. A prevalência da comorbidade foi maior no sexo feminino (RP = 1,31; IC95% 1,27 - 1,35) quando comparada à do sexo masculino. O modelo hierárquico mostrou ainda que indivíduos das faixas etárias 40-59 anos e ≥ 60 anos apresentaram maior associação com a comorbidade, RP = 11,70; IC95% 10,21 - 13,39 e RP = 17,49; IC95% 15,26 - 20,05, respectivamente. Da mesma forma ocorreu com aqueles com resultado positivo da baciloscopia - primeira amostra (RP = 1,40; IC95% 1,35 - 1,47). Ademais, indivíduos que apresentaram resultado suspeito do exame de raio X do tórax também tiveram maior associação com a comorbidade (RP = 1,22; IC95% 1,09 - 1,37), se comparados aos indivíduos que exibiram resultado normal no exame. Por sua vez, indivíduos com resultado positivo para o HIV foram menos associados à comorbidade (RP = 0,53; IC95% 0,49 - 0,58). Os casos de reingresso após abandono e abandono também foram inversamente associados nas pessoas com comorbidade, RP = 0,66; IC95% 0,57 - 0,76 e RP = 0,79; IC95% 0,72 - 0,87, respectivamente.

Tabela 3.
Análise multivariada hierárquica da associação entre a comorbidade tuberculose e diabetes e características sociodemográficas, de diagnóstico e tratamento no Brasil, 2007 a 2011.

DISCUSSÃO

No mundo, a diabetes está entre os principais fatores que dificultam a queda da TB. Como a prevalência de diabetes está aumentando globalmente, sobretudo em países de baixa renda e de renda média, onde a TB é um problema de saúde pública, esse crescimento cria obstáculos adicionais para a prevenção e o controle da TB1515. Odone A, Houben RMGJ, White RG, Lönnroth K. The effect of diabetes and undernutrition trends on reaching 2035 global tuberculosis targets. Lancet Diabetes Endocrinol 2014; 2(9): 754-64. https://doi.org/10.1016/S2213-8587(14)70164-0
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
,1616. Lönnroth K, Roglic G, Harries AD. Improving tuberculosis prevention and care through addressing the global diabetes epidemic: from evidence to policy and practice. Lancet Diabetes Endocrinol 2014; 2(9): 730-9. https://doi.org/10.1016/S2213-8587(14)70109-3
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
.

Independentemente da região onde estudos foram realizados, há um risco aumentado de TB entre as pessoas com diabetes. Estudo realizado na Índia sugeriu que 14,8% dos casos de TB podem ser atribuíveis a diabetes1717. Stevenson CR, Forouhi NG, Roglic G, Williams BG, Lauer JA, Dye C, et al. Diabetes and tuberculosis: the impact of the DM epidemic on tuberculosis incidence. BMC Public Health 2007; 7: 234. https://doi.org/10.1186/1471-2458-7-234
https://doi.org/https://doi.org/10.1186/...
. Nos Estados Unidos, em 1991, estudo revelou que o risco de TB associado a DM entre os hispânicos de meia-idade foi de 25,2%44. Pablos-Méndez A, Blustein J, Knirsch CA. The Role of Diabetes Mellitus in the Higher Prevalence of Tuberculosis among Hispanics. Am J Public Health 1997; 87(4): 574-9. https://dx.doi.org/10.2105%2Fajph.87.4.574
https://doi.org/https://dx.doi.org/10.21...
. Entre os casos de TB notificados em 2009 no Sinan, Reis-Santos et al. encontraram prevalência de diabetes de 5,4%, abaixo dos achados neste estudo, de 7,2%, para o período1818. Reis-Santos B, Locatelli R, Horta BL, Faerstein E, Sanchez MN, Riley LW, et al. Socio-Demographic and Clinical Differences in Subjects with Tuberculosis with and without Diabetes Mellitus in Brazil - A Multivariate Analysis. PLoS One 2013; 8(4): e62604. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0062604
https://doi.org/https://doi.org/10.1371/...
. Em outro estudo no Texas, nas fronteiras com o México, pessoas com diabetes tinham quase duas vezes a probabilidade de ter TB, em comparação às que não tinham diabetes1919. Pérez A, Brown HS, Restrepo BI. Association between tuberculosis and diabetes in the Mexican border and non-border regions of Texas. Am J Trop Med Hyg 2006; 74(4): 604-11..

Diferentemente de outros achados que mostraram não existir diferença nas frequências entre sexo quando comparados os grupos com e sem a comorbidade ou apontaram maior proporção do sexo masculino entre aqueles indivíduos com comorbidade2020. Ruslami R, Aarnouttse RE, Alisjahbana B, Van Der Vem AJ, Van Crevel R. Implications of the global increase of diabetes for tuberculosis control and patient care. Trop Med Int Health 2010; 15(11): 1289-99. https://doi.org/10.1111/j.1365-3156.2010.02625.x
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
,2121. Singla R, Khan N, Al-Sharif N, Ai-Sayegh MO, Shaikh MA, Osman MM. Influence of diabetes on manifestations and treatment outcome of pulmonary TB patients. Int J Tuberc Lung Dis 2006; 10(1): 74-9.,2222. Ponce-De-Leon A, Garcia-Garcia ML, Garcia-Sancho MC, Gomez-Perez FJ, Valdespino-Gomez JL, Olaiz-Fernandez G, et al. Tuberculosis and Diabetes in Southern Mexico. Diabetes Care 2004; 27(7): 1584-90. https://doi.org/10.2337/diacare.27.7.1584
https://doi.org/https://doi.org/10.2337/...
, aqui houve a predominância do sexo feminino, provavelmente pelo maior percentual de mulheres relatar o diagnóstico de diabetes nas Unidades Básicas de Saúde do SUS e procurar com maior frequência os serviços de saúde, ao contrário do sexo masculino. Resultado semelhante encontrado no Vigitel 2014 em relação ao percentual de mulheres que relataram diabetes1010. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigilância de fatores de risco e proteção para as doenças crônicas por inquérito telefônico: VIGITEL 2016. Brasília: Ministério da Saúde; 2017.,2323. Brasil. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Percepção do estado de saúde, estilos de vida e doenças crônicas. Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; 2014.,2424. Silva ZP, Ribeiro MCSA, Barata RB, Almeida MF. Perfil sociodemográfico e padrão de utilização dos serviços de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS), 2003-2008. Ciênc Saúde Coletiva 2011; 16(9): 3807-16..

Na Índia, na Indonésia, na Malásia, na Arábia Saudita, em Taiwan e no México, estudos demonstraram a predominância da comorbidade com o avanço da idade. Resultado semelhante foi encontrado neste estudo, possivelmente por causa da associação entre DM tipo 2 com idade mais avançada2121. Singla R, Khan N, Al-Sharif N, Ai-Sayegh MO, Shaikh MA, Osman MM. Influence of diabetes on manifestations and treatment outcome of pulmonary TB patients. Int J Tuberc Lung Dis 2006; 10(1): 74-9.,2222. Ponce-De-Leon A, Garcia-Garcia ML, Garcia-Sancho MC, Gomez-Perez FJ, Valdespino-Gomez JL, Olaiz-Fernandez G, et al. Tuberculosis and Diabetes in Southern Mexico. Diabetes Care 2004; 27(7): 1584-90. https://doi.org/10.2337/diacare.27.7.1584
https://doi.org/https://doi.org/10.2337/...
,2525. Jain MK, Baghel PK, Agrawal R. Study of impaired glucose tolerance in pulmonary tuberculosis. Indian J Community Med 2006; 31(3): 137-9.,2626. Alisjahbana B, Sahiratmadja E, Nelwan EJ, Purwa AM, Ahmad Y, Ottenhoff TH, et al. The effect of type 2 diabetes mellitus on the presentation and treatment response of pulmonary tuberculosis. Clin Infect Dis 2007; 45(4): 428-35. https://doi.org/10.1086/519841
https://doi.org/https://doi.org/10.1086/...
,2727. Chang JT, Dou HY, Yen CL, Wu YH, Huang RM, Lin HJ, et al. Effect of type 2 diabetes mellitus on clinical severity and treatment outcome in patients with pulmonary tuberculosis: A potential role in the emergence of multi-drug resistance. J Formos Med Assoc 2011; 110(6): 372-81. https://doi.org/10.1016/S0929-6646(11)60055-7
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
,2828. Guptan A, Shah A. Tuberculosis and Diabetes: An Appraisal. Ind J Tub 2000; 47: 3.,2929. Deshmukh PA, Shaw T. Pulmonary tuberculosis and diabetes mellitus. Ind J Tuberc 1984; 31: 114-7.,3030. Tripathy SR, Kar KP, Chakraborty DC, Mazumdar AK. Diabetes mellitus and pulmonary tuberculosis - a prospective study. Ind J Tuberc 1984; 31(3): 122-5..

Analisando a escolaridade entre as pessoas com comorbidade, observou-se neste estudo que indivíduos com quatro anos ou menos de escolaridade apresentaram a maior proporção. No grupo sem comorbidade, as pessoas com mais de oito anos de estudo tiveram maior proporção. Ainda no grupo com comorbidade, as pessoas com raça/cor da pele branca foram mais prevalentes, achados semelhantes no estudo de Reis-Santos1818. Reis-Santos B, Locatelli R, Horta BL, Faerstein E, Sanchez MN, Riley LW, et al. Socio-Demographic and Clinical Differences in Subjects with Tuberculosis with and without Diabetes Mellitus in Brazil - A Multivariate Analysis. PLoS One 2013; 8(4): e62604. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0062604
https://doi.org/https://doi.org/10.1371/...
.

Tratando-se dos exames radiológicos, alguns estudos não encontraram diferenças nos padrões de raio X suspeitos de tuberculose pulmonar em pessoas com e sem diabetes3131. Abreu RG, Sousa AIA, Oliveira MRF, Sanchez MN. Tuberculose e diabetes: relacionamento probabilístico de bases de dados para o estudo da associação entre ambas doenças. Epidemiol Serv Saúde 2017; 26(2): 359-68. http://dx.doi.org/10.5123/s1679-49742017000200013
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.512...
,3232. Raghuraman S, Vasudevan KP, Govindarajan S, Chinnakali P, Panigrahi KC. Prevalence of Diabetes Mellitus among Tuberculosis. N Am J Med Sci 2014; 6(1): 30-4. https://doi.org/10.4103/1947-2714.125863
https://doi.org/https://doi.org/10.4103/...
, diferentemente de outras investigações, cujos achados demonstraram características radiográficas atípicas nos indivíduos com a comorbidade88. Rawat J, Sindhwani G, Biswas D. Effect of age on presentation with diabetes: Comparison of non diabetic patients with new smear-positive pulmonary tuberculosis patients. Lung 2011; 28(3): 187-90. https://doi.org/10.4103/0970-2113.83975
https://doi.org/https://doi.org/10.4103/...
,3333. Morris JT, Seaworth BJ, McAllister CK. Pulmonary tuberculosis in diabetics. Chest 1992; 102(2): 539-41. https://doi.org/10.1378/chest.102.2.539
https://doi.org/https://doi.org/10.1378/...
,3434. Bukhary ZA. Rediscovering the Association Between Tuberculosis and Diabetes Mellitus: A Perspective. J T U Med Sc 2008; 3(1): 1-6. https://doi.org/10.1016/S1658-3612(08)70047-7
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
,3535. Kishan J, Garg K. Tuberculosis and diabetes mellitus: a Case Series of 100 Patients. SAARC J Tuber Lung Dis HIV/Aids 2010; 7(2): 34-8. https://doi.org/10.3126/saarctb.v7i2.4404
https://doi.org/https://doi.org/10.3126/...
. Aqui, os indivíduos com resultado suspeito do exame de raio X do tórax tiveram maior associação com a comorbidade, quando comparados aos indivíduos com resultado normal no exame.

Provavelmente pelo número maior de exames realizados no grupo com a comorbidade, este estudo revelou que a baciloscopia da primeira amostra de escarro apresentou maior frequência de resultado positivo no grupo com comorbidade, concordando com outros achados1818. Reis-Santos B, Locatelli R, Horta BL, Faerstein E, Sanchez MN, Riley LW, et al. Socio-Demographic and Clinical Differences in Subjects with Tuberculosis with and without Diabetes Mellitus in Brazil - A Multivariate Analysis. PLoS One 2013; 8(4): e62604. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0062604
https://doi.org/https://doi.org/10.1371/...
,2626. Alisjahbana B, Sahiratmadja E, Nelwan EJ, Purwa AM, Ahmad Y, Ottenhoff TH, et al. The effect of type 2 diabetes mellitus on the presentation and treatment response of pulmonary tuberculosis. Clin Infect Dis 2007; 45(4): 428-35. https://doi.org/10.1086/519841
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,3131. Abreu RG, Sousa AIA, Oliveira MRF, Sanchez MN. Tuberculose e diabetes: relacionamento probabilístico de bases de dados para o estudo da associação entre ambas doenças. Epidemiol Serv Saúde 2017; 26(2): 359-68. http://dx.doi.org/10.5123/s1679-49742017000200013
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.512...
,3636. Pereira e Silva, Araujo Neto CA, Ramos EAG. Tuberculose pulmonar de apresentação atípica e diabetes mellitus. J Bras Pneumol 1985; 11(3): 164.,3737. Restrepo BI, Fisher-Hock SP, Crespo JG, Whitney E, Perez A, Smith B, et al. Type 2 diabetes and tuberculosis in a dynamic bi-national border population. Epidemiol Infect 2007; 135(3): 483-91. https://doi.org/10.1017/S0950268806006935
https://doi.org/https://doi.org/10.1017/...
,3838. Güler M, Unsal E, Dursun B, Aydln O, Capan N. Factors influencing sputum smear and culture conversion time among patients with new case pulmonary tuberculosis. Int J Clin Pract 2007; 61(2): 231-5. https://doi.org/10.1111/j.1742-1241.2006.01131.x
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
. Além disso, a DM pode afetar negativamente o resultado do tratamento da TB2222. Ponce-De-Leon A, Garcia-Garcia ML, Garcia-Sancho MC, Gomez-Perez FJ, Valdespino-Gomez JL, Olaiz-Fernandez G, et al. Tuberculosis and Diabetes in Southern Mexico. Diabetes Care 2004; 27(7): 1584-90. https://doi.org/10.2337/diacare.27.7.1584
https://doi.org/https://doi.org/10.2337/...
,3333. Morris JT, Seaworth BJ, McAllister CK. Pulmonary tuberculosis in diabetics. Chest 1992; 102(2): 539-41. https://doi.org/10.1378/chest.102.2.539
https://doi.org/https://doi.org/10.1378/...
,3939. Araújo LMB, Costa MS, Barcia T, Pinheiro E, Cruz Filho A, Silva IS, et al. Tuberculose e diabete melito. J Bras Pneumol 1990; 16(4): 193-6.,4040. Mboussa J, Monabeka H, Kombo M, Yokolo D, Yoka-Mbio A, Yala F. Course of pulmonary tuberculosis in diabetics. Rev Pneumol Clin 2003; 59(1): 39-44..

Em relação à recidiva da TB em pessoas com diabetes, os achados têm sido variados. Alguns relataram maior recidiva em indivíduos com diabetes3939. Araújo LMB, Costa MS, Barcia T, Pinheiro E, Cruz Filho A, Silva IS, et al. Tuberculose e diabete melito. J Bras Pneumol 1990; 16(4): 193-6.,4010. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigilância de fatores de risco e proteção para as doenças crônicas por inquérito telefônico: VIGITEL 2016. Brasília: Ministério da Saúde; 2017. e outros afirmaram não existir diferença2121. Singla R, Khan N, Al-Sharif N, Ai-Sayegh MO, Shaikh MA, Osman MM. Influence of diabetes on manifestations and treatment outcome of pulmonary TB patients. Int J Tuberc Lung Dis 2006; 10(1): 74-9.,4141. Morsy AM, Zaher HH, Hassan MH, Shouman A. Predictors of treatment failure among tuberculosis patients under DOTS strategy in Egypt. East Mediterr Health J 2003; 9(4): 689-701.,4242. Kameda K, Kawabata S, Masuda N. Follow-up study of short course chemotherapy of pulmonary tuberculosis complicated with diabetes mellitus. Kekkaku 1990; 65(12): 791-803.. Este estudo encontrou que o grupo com TB e diabetes teve menor prevalência de recidiva.

Semelhantemente aos achados do estudo de Reis-Santos1818. Reis-Santos B, Locatelli R, Horta BL, Faerstein E, Sanchez MN, Riley LW, et al. Socio-Demographic and Clinical Differences in Subjects with Tuberculosis with and without Diabetes Mellitus in Brazil - A Multivariate Analysis. PLoS One 2013; 8(4): e62604. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0062604
https://doi.org/https://doi.org/10.1371/...
em 2009, este estudo também encontrou que indivíduos com a comorbidade com menor frequência tiveram reingresso após o abandono do tratamento da TB, possivelmente porque também abandonam menos o tratamento, talvez porque as pessoas com diabetes têm maior vínculo com as Unidades Básicas de Saúde. Nos anos 2000, o Plano de Reorganização da Atenção à Hipertensão Arterial e ao Diabetes Mellitus, do Ministério da Saúde, propôs a atualização dos profissionais da rede básica, com garantia de diagnóstico e ações para ampliar a adesão das pessoas com diabetes nas unidades de saúde para tratamento e acompanhamento4343. Zhang Q, Xiao H, Sugawara I. Tuberculosis complicated by diabetes mellitus at Shanghai pulmonary hospital, China. Jpn J Infect Dis 2009; 62(5): 390-1.,4444. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Plano de Reorganização da Atenção à Hipertensão Arterial e ao Diabetes Mellitus. Manual de Hipertensão arterial e Diabetes mellitus. Brasília: Ministério da Saúde ; 2002..

Como limitações deste estudo, uma vez que na ficha do Sinan o campo agravo associado à tuberculose não é de preenchimento obrigatório, pode-se citar o grande percentual em branco desse registro, tendo como consequência o aumento da subnotificação na medida de frequência da comorbidade TB e diabetes e como resultado o tratamento não adequado das pessoas. Ressalta-se que o registro do referido campo é de extrema importância, pois o aumento da comorbidade diabetes e TB vem crescendo, e as condutas clínicas e o monitoramento dos casos tornam-se cada dia mais necessários. Destacam-se ainda como limitação a não completude de variáveis utilizadas para o relacionamento, o uso de dados secundários e, consequentemente, a possibilidade de subnotificações dos casos de diabetes registrados no Sinan-tuberculose no período do estudo - que pode ter sido amenizado após o relacionamento dos bancos - , bem como o elevado número de exames de baciloscopia da primeira amostra de escarro, cultura e raio X do tórax não realizados ou não registrados. Além disso, houve casos de tuberculose sem registro da situação de encerramento e a possibilidade de casos de diabetes não registrados no Hiperdia. Assim, não se pode afirmar que o universo de pessoas com as duas doenças esteja representado na base única de dados.

Ademais, o relacionamento das bases, como método aplicado, não substitui a coleta de dados primários, podendo limitar a análise.

CONCLUSÃO

Apesar de muito já ter sido feito, existe ainda a necessidade de investimentos em estudos e da adoção de ações de prevenção da comorbidade TB e diabetes, incluindo atividades de promoção à saúde, busca ativa de casos, tratamento e prevenção, melhor monitoramento das pessoas doentes e, consequentemente, maior sucesso na terapêutica adotada.

Este estudo permitiu conhecer o perfil epidemiológico dos casos notificados de TB e da comorbidade TB e diabetes, descrevendo a associação entre os principais indicadores de interesse, reforçando a importância de ações integradas de cuidado nos serviços de saúde para evitar futuros casos e mudar o cenário dessa desafiadora comorbidade.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos a importante colaboração do Professor Doutor Mauro Sanchez, da Universidade de Brasília.

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  • ERRATA

    10.1590/1980-549720200009erratum
    No artigo “Tuberculose e diabetes: associação com características sociodemográficas e de diagnóstico e tratamento. Brasil, 2007-2011”, DOI: https://doi.org/10.1590/1980-549720200009, publicado no periódico Rev Bras Epidemiol. 2020; 23: E200009:
    Onde se lê:
    Lúcia Santana Rolim
    Leia-se:
    Lúcia Rolim Santana de Freitas

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Fev 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    19 Set 2018
  • Revisado
    05 Nov 2018
  • Aceito
    12 Nov 2018
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