Magnitude das doenças de notificação compulsória e avaliação dos indicadores de vigilância epidemiológica em municípios da linha de fronteira do Brasil, 2007 a 2009** Parte integrante da dissertação de Mestrado de Matheus de Paula Cerroni, intitulada 'Magnitude das doenças de notificação compulsória e qualidade das ações de vigilância epidemiológica na região de fronteira do Brasil, 2007-2009', defendida junto à Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca/Fundação Instituto Oswaldo Cruz (ENSP/Fiocruz), Rio de Janeiro-RJ, Brasil, em setembro de 2012.

Magnitud de las enfermedades de declaración obligatoria y evaluación de los indicadores de vigilancia epidemiológica en municipios de línea de frontera en Brasil, 2007 a 2009

Matheus de Paula Cerroni Eduardo Hage Carmo Sobre os autores

Resumos

OBJETIVO:

descrever a magnitude das doenças de notificação compulsória (DNC) e avaliar indicadores de vigilância epidemiológica nos 121 municípios da linha de fronteira (MLF) do Brasil.

MÉTODOS:

estudo descritivo, com dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) referentes ao período de 2007 a 2009, sobre 45 doenças/agravos constantes da lista das DNC e de avaliação normativa de indicadores selecionados de vigilância epidemiológica.

RESULTADOS:

foram registradas 405.484 notificações, relacionadas a 36 DNC; observaram-se diferenças na magnitude e distribuição de DNC entre os MLF e demais municípios do país, com desempenho heterogêneo dos indicadores de vigilância epidemiológica; no conjunto dos MLF, detectou-se baixa oportunidade de notificação e de encerramento de DNC.

CONCLUSÃO:

a região de fronteira do país não é uniforme. Do ponto de vista epidemiológico; destacam-se fragilidades nas capacidades das vigilâncias municipais, em especial na detecção e notificação oportuna de doenças com potencial epidêmico e ainda na capacidade de resposta às emergências de Saúde Pública.

Áreas de Fronteira; Doenças de Notificação Compulsória; Vigilância Epidemiológica; Indicadores; Epidemiologia Descritiva


OBJETIVO:

describir la magnitud de las enfermedades de notificación obligatoria (DNC) y evaluar los indicadores de vigilancia epidemiológica (VE) en 121 municipios de la línea fronteriza (MLF) de Brasil.

MÉTODOS:

estudio descriptivo con datos del Sistema de Información de Enfermedades de Declaración Obligatoria (Sinan) referentes a los años 2007-2009, sobre 45 enfermedades que figuran en la lista de DNC y de evaluación normativa de los indicadores de vigilancia epidemiológica.

RESULTADOS:

se registraron 405.484 notificaciones referentes a 36 DNC; se observaron diferencias en la magnitud y distribución de las DNC, entre los MLF e demás municipios del país, con un desempeño heterogéneo de indicadores de VE entre los MLF; detectamos baja oportunidad de notificación y cierre de DNC.

CONCLUSIÓN:

a región fronteriza no es uniforme.Del punto de vista epidemiológico; encontramos debilidades en las capacidades de vigilancia municipal, en especial en cuanto a la detección e notificación oportuna de enfermedades con potencial epidémico y en lacapacidad de respuesta oportuna a emergencias de salud pública.

Áreas Fronterizas; Notificación de Enfermedad; Vigilancia Epidemiológica; Indicadores; Epidemiología Descriptiva


Introdução

As fronteiras, além de constituírem um espaço geográfico de interação cultural e apresentarem grandes diferenças sociais, econômicas e culturais, são, em alguns locais, caracterizadas por conflitos armados, narcotráfico, contrabando, degradação do espaço geográfico, desemprego e baixo desenvolvimento humano.11. Albuquerque JLC. A dinâmica das fronteiras: deslocamento e circulação dos "brasiguaios" entre os limites nacionais. Horiz Antropol. 2009 jan-jun;15(31):137-66.,22. Rodrigues-Júnior AL, Castilho EA. AIDS e doenças oportunistas transmissíveis na faixa de fronteira Brasileira. Rev Soc Bras Med Trop. 2010 out;43(5):542-7

Com a integração entre as nações do subcontinente sul-americano e a atual prioridade política conferida às relações entre os países da região, passou-se a reforçar a estratégia de integração regional para o fortalecimento político e econômico comum.33. Buss PM, Ferreira JR. Cooperação e integração regional em saúde na América do Sul: a contribuição da Unasul-Saúde. Cienc Saude Colet. 2011 jun;16(6): 2699-711. Diante dessa percepção, a região de fronteira, como ponto crítico desse processo de integração, deixou de se associar a uma agenda negativa, e passou a configurar uma área estratégica para a integração entre os países, tendo seu desenvolvimento progressivamente priorizado pelas políticas nacionais.44. Gadelha CAG, Costa L. Integração de fronteiras: a saúde no contexto de uma política nacional de desenvolvimento. Cad Saude Publica. 2007;23 supl 2:S214-26. No Brasil, a integração regional adquire elevada importância frente à extensa faixa fronteiriça, além de conviver com fenômenos decorrentes da intensificação do livre comércio que já apresentam reflexos sobre o setor Saúde na região de fronteira.55. Giovanella L, Guimarães L, Nogueira VMR, Lobato LVC, Damacena GN. Saúde nas fronteiras: acesso e demandas de estrangeiros e brasileiros não residentes ao SUS nas cidades de fronteira com países do MERCOSUL na perspectiva dos secretários municipais de saúde. Cad Saude Publica. 2007;23(2):S251-66.

Os desenhos dos sistemas e das políticas de saúde dos países sul-americanos, aliados às variedades dos perfis das cidades fronteiriças, aprofundam as dificuldades encontradas pelos sistemas de saúde nesses territórios, revelando-se mais complexos os impactos inesperados do processo de integração regional nos serviços de saúde.66. Machado LO. Estado, territorialidade, redes. Cidades-gêmeas na zona de fronteira sul-americana. In: Silveira ML, organizador. Continente em chamas. Globalização e território na América Latina. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 2005. p. 243-84. No Brasil, país de realidades diversas e dimensões continentais, os desafios da integração regional estão relacionados à necessária manutenção, no atendimento à saúde, dos princípios constitucionais do Sistema Único de Saúde (SUS).77. Basso M. Integração econômica e institucionalização: as experiências do Mercosul e da União Européia. Revista CEJ. 1998 jan-abr;2(4):72-83.

A faixa de fronteira do Brasil, composta por 588 municípios, corresponde à faixa geográfica oficial de fronteira delimitada pela Constituição Brasileira: 150 km a partir do limite internacional. Esta faixa é dividida em três macrorregiões, denominadas por Arcos: Norte (98 municípios), Central (72 municípios) e Sul (418 municípios).88. Peiter PC. A geografia da saúde na faixa de fronteira continental do Brasil na passagem do milênio [tese]. Rio de Janeiro (RJ): Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Geociências; 2005.,99. Ministério da Integração Nacional (BR). Secretaria de Programas Regionais. Faixa de fronteira: Programa de Promoção do Desenvolvimento da Faixa de Fronteira: PDFF [Internet]. Brasília: Ministério da Integração Nacional ; 2009 [citado 2012 set 23]. Disponível em: Disponível em: http://www.integracao.gov.br/pt/c/document_library/get_file?uuid=cd8c9e6a-a096-449b-826e-6ecb49744364&groupId=10157
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Já os municípios da linha de fronteira, limítrofes com os municípios dos países vizinhos, representam um total de 121, distribuídos entre os Arcos Norte (39 municípios), Central (25 municípios) e Sul (57 municípios).88. Peiter PC. A geografia da saúde na faixa de fronteira continental do Brasil na passagem do milênio [tese]. Rio de Janeiro (RJ): Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Geociências; 2005.,99. Ministério da Integração Nacional (BR). Secretaria de Programas Regionais. Faixa de fronteira: Programa de Promoção do Desenvolvimento da Faixa de Fronteira: PDFF [Internet]. Brasília: Ministério da Integração Nacional ; 2009 [citado 2012 set 23]. Disponível em: Disponível em: http://www.integracao.gov.br/pt/c/document_library/get_file?uuid=cd8c9e6a-a096-449b-826e-6ecb49744364&groupId=10157
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Nas últimas duas décadas, uma aceleração da circulação mundial nos fluxos materiais e humanos (produtos/mercadorias, serviços/pessoas), intensificada pelos processos de integração regional entre países, acarretou novos desafios ao sistema de saúde brasileiro, especialmente nas regiões fronteiriças, tendo em vista o despreparo e/ou fragilidade dos serviços de saúde locais para responder à intensificação dos riscos de disseminação de doenças nessas regiões.1010. Carmo EH, Penna G, Oliveira WK. Emergências de saúde pública: conceito, caracterização, preparação e resposta. Estud Av. 2008 dez;22(64):19-32. O tema foi objeto de definição de normas internacionais estabelecidas no Regulamento Sanitário Internacional (RSI 2005) e discutido em artigos que tratam do risco de disseminação de doenças em áreas de fronteira e/ou por meios de transporte transnacionais.1111. World Health Organization. International Health Regulations (2005). 2nd ed. Geneva: WHO; 2008.

Entretanto, não foram encontrados estudos que oferecessem uma caracterização epidemiológica própria dos municípios da faixa e da linha de fronteira, ou que avaliassem aspectos operacionais da vigilância epidemiológica nos municípios brasileiros fronteiriços.

Como propósito de contribuir para o fortalecimento da organização das ações de vigilância nessas áreas, este trabalho teve como objetivo descrever a magnitude das doenças de notificação compulsória (DNC) e avaliar indicadores selecionados de vigilância epidemiológica nos 121 municípios da linha de fronteira (MLF) do Brasil.

Métodos

O estudo apresenta duas etapas: a primeira consiste em um estudo descritivo das DNC nos 121 MLF do país, relativamente ao período 2007-2009; e a segunda, em uma avaliação normativa de indicadores de notificação e investigação, prevenção e controle dessas DNC em 2009.

Na etapa descritiva, considerou-se a lista nacional de DNC definida pela Portaria No 104, de 25 de janeiro de 2011.1212. Ministério da Saúde (BR). Portaria no 201/GM de 03 de novembro de 2010. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, (DF), 2010 nov 4; Seção 1:88. Comparou-se a média do número de casos para cada doença ou agravo e selecionou-se as dez DNC com maior média de casos confirmados para o conjunto de MLF de cada Arco (Norte, Central e Sul). Em seguida, calculou-se o coeficiente incidência média (IM) (casos novos/100 mil habitantes) ou de detecção (mesmo cálculo da IM, utilizado especificamente para hanseníase) para cada Arco, igualmente, o que possibilitou comparar características epidemiológicas entre os municípios da linha dos Arcos e identificar as doenças de maior impacto nos serviços de saúde da região. Decidiu-se pela avaliação de casos notificados no período dos três anos, de 2007 a 2009, para minimizar o aumento súbito de algum agravo em ano epidêmico.

Dos indicadores de vigilância epidemiológica avaliados em 2009, consideraram-se três atributos quantitativos. O primeiro foi a oportunidade, um atributo do sistema de vigilância epidemiológica que reflete a agilidade desse sistema para conhecer a situação epidemiológica e auxiliar na tomada de decisão. Para esse atributo, considerou-se o cálculo da (i) oportunidade de notificação (data de notificação - data de início dos sintomas) para o conjunto das doenças de notificação compulsória imediata (DNCI), cuja meta estabelecida foi de 80% de todas as DNCI notificadas em, no máximo, 24 horas a partir da suspeita inicial;1212. Ministério da Saúde (BR). Portaria no 201/GM de 03 de novembro de 2010. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, (DF), 2010 nov 4; Seção 1:88. e o cálculo da (ii) oportunidade de encerramento (data de notificação - data de encerramento) das cinco DNC1313. Ministério da Saúde (BR). Portaria no 104/GM de 25 de janeiro de 2011. Define as terminologias adotadas em legislação nacional, conforme o disposto no Regulamento Sanitário Internacional 2005 (RSI 2005), a relação de doenças, agravos e eventos em saúde pública de notificação compulsória em todo o território nacional e estabelece fluxo, critérios, responsabilidades e atribuições aos profissionais e serviços de saúde. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília (DF), 2011 jan 11;Seção 1:37. de maior registro no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) em cada Arco, sendo seu desempenho considerado aceitável quando 80% ou mais dos casos tivessem sido encerrados dentro do tempo estabelecido de 60, 90 ou 180 dias, segundo cada agravo.1313. Ministério da Saúde (BR). Portaria no 104/GM de 25 de janeiro de 2011. Define as terminologias adotadas em legislação nacional, conforme o disposto no Regulamento Sanitário Internacional 2005 (RSI 2005), a relação de doenças, agravos e eventos em saúde pública de notificação compulsória em todo o território nacional e estabelece fluxo, critérios, responsabilidades e atribuições aos profissionais e serviços de saúde. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília (DF), 2011 jan 11;Seção 1:37.

O segundo e o terceiro atributos considerados foram indicadores de programas específicos de vigilância epidemiológica: cobertura vacinal (CV) da vacina tetravalente (DPT+Haemophilus influenzae), representativa de uma ação básica de prevenção de DNC, calculada pela mediana de porcentagem de CV da tetravalente para o conjunto dos MLF de cada Arco; e o percentual de cura de tuberculose, representativo de uma ação básica de controle para as DNC, calculado pela soma das porcentagens de cura de tuberculose de municípios por Arco (para o Arco Norte, foi somado o valor da cobertura dos 39 municípios; para o Central, somado o valor de cobertura dos respectivos 25 municípios; e para o Arco Sul, somado o mesmo valor referente a seus 57 municípios), identificando-se, em seguida, o valor mediano da soma das porcentagens por Arco. Tomou-se o desempenho do indicador de cobertura vacinal aceitável quando 95% ou mais da população <1 ano tivesse sido vacinada.1414. Teixeira AMS, Mota ELA. Denominators for vaccine coverage estimates: a database study to estimate the population less than one year of age. Epidemiol Serv Saude. 2010 Sep;19(3):187-203.

Para o cálculo do indicador de percentual de cura de tuberculose, adotou-se a definição de caso novo de TB do Programa Nacional de Tuberculose:1515. Ministério da Saúde (BR). Instrutivo para preenchimento do Pacto pela Vida e da programação das Ações de Vigilância em Saúde - 2010/2011 - Tuberculose [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2009 [citado 2012 maio 27]. Disponível em: Disponível em: http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:0WsjkHGaQEoYJ:telelab.aids.gov.br/index.php/biblioteca-telelab/item/download/29_e02427f1da61b3269b38f05d22fb7b18+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br
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foram considerados os casos novos de tuberculose pulmonar bacilífera com situação de encerramento como cura no período avaliado, divididos pelo total de casos novos notificados no período, multiplicado por 100. Considerou-se um desempenho aceitável desse indicador quando 85% ou mais dos casos de tuberculose tivessem concluído o tratamento, evoluindo para cura.1515. Ministério da Saúde (BR). Instrutivo para preenchimento do Pacto pela Vida e da programação das Ações de Vigilância em Saúde - 2010/2011 - Tuberculose [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2009 [citado 2012 maio 27]. Disponível em: Disponível em: http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:0WsjkHGaQEoYJ:telelab.aids.gov.br/index.php/biblioteca-telelab/item/download/29_e02427f1da61b3269b38f05d22fb7b18+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br
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A comparação dos indicadores da vigilância epidemiológica foi procedida de duas maneiras: (i) verificação do alcance das metas nacionais pelo conjunto dos MLF - por Arco - e pelos demais municípios do país (excluídos os MLF); e (ii) comparação do percentual de MLF - por Arco - com o percentual correspondente aos demais municípios do país que alcançaram as metas estabelecidas.

Utilizaram-se como fontes de dados: Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan); Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Malária (Sivep-Malária); Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI); e Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os softwares utilizados foram EpiInfo(r) (versão 3.5.3.), Tableau Public(r) (versão 6.0), Tabwin(c) (versão 3.6b) e Microsoft Office 2010(r).

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Saúde Pública Sérgio Arouca/Fundação Instituto Oswaldo Cruz em 12 de janeiro de 2011 - Protocolo nº 287/11 -, confirmando o consenso estabelecido para pesquisas e antecipando-se à Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) nº 466, de 12 de dezembro de 2012.

Resultados

Entre 2007 e 2009, os municípios da linha de fronteira registraram 405.484 notificações de doenças de notificação compulsória, envolvendo 36 agravos (Tabela 1). O maior número de registros ocorreu em 2007: 166.057 notificações entre 32 agravos. Comparando-se as médias de casos notificados no período, as DNC de magnitude expressiva nos MLF foram: malária (98.959 casos); dengue (15.168 casos); atendimento antirrábico (8.129 casos); hepatites virais (3.609 casos); acidente por animais peçonhentos (2.354 casos); leishmaniose tegumentar americana (1.949 casos); e tuberculose (1.475 casos); as demais apresentaram médias abaixo de 1.000 notificações. Observaram-se duas notificações de varíola em 2008, provavelmente erros de digitação ou classificação, uma vez que a erradicação global da varíola ocorreu a mais de 30 anos.

Tabela 1
Número de registros de doenças de notificação compulsória nos municípios da linha de fronteira. Brasil, 2007 a 2009

Na estratificação por região, o Arco Norte compreendeu 58,0% das notificações, entre 31 agravos. O Arco Central contribuiu com 34,0% e o Arco Sul com 8,0% das notificações, entre 33 agravos em ambos. As dez doenças de notificação compulsória mais registradas por Arco representam 97,6% do total de notificações no Arco Norte, 90,7% no Arco Central e 69,8% no Arco Sul.

Observando-se as notificações por agravo nos MLF por Arco, a incidência média - IM - de malária no Arco Norte foi de 8.391,1 casos/100 mil habitantes, representando 88,6% das dez doenças de maior magnitude. As demais doenças foram: dengue (394,6 casos/100 mil habitantes); hepatites virais (219,1 casos/100 mil habitantes); leishmaniose tegumentar americana (197,2 casos/100 mil habitantes); e acidente por animais peçonhentos (140,8 casos/100 mil habitantes). No Arco Central, a malária (3.215,3 casos/100 mil habitantes) apresentou o maior número médio de notificações por município: 72,8% das dez doenças de maior magnitude (seguida da dengue: 891,0 casos/100 mil habitantes) e 20,2% do total das notificações. No Arco Sul, foi a dengue (258,0 casos/100 mil habitantes) a apresentar o maior número médio de notificações por município: 48,6% das dez doenças de maior magnitude (seguida pelas hepatites virais: 84,5 casos/100 mil habitantes) e 15,7% das notificações (Tabela 2).

Tabela 2
Incidência e distribuição das doenças de notificação compulsória em municípios de linha de fronteira, segundo Arco de Fronteira. Brasil, 2007 a 2009

Na comparação da incidência média dos principais agravos, a malária foi responsável por 75,0% dos casos confirmados para o conjunto dos Arcos; no Arco Norte, apresentou incidência média 2,6 vezes superior à IM do Arco Central. Já em relação à dengue, o Arco Central apresentou a maior IM, 2,3 e 3,4 vezes superior às registradas nos Arcos Norte e Sul, respectivamente. As hepatites virais apresentaram maiores IM no Arco Norte, seguido dos Arcos Sul e Central, nesta ordem. Os acidentes por animais peçonhentos representaram a terceira doença de notificação compulsória com maior IM na região do Arco Sul, ocupando a quinta posição nos Arcos Norte e Central. Outra situação diferenciada foi a da leishmaniose tegumentar americana e da sífilis em gestante, classificadas entre as dez DNC mais notificadas nos Arcos Norte e Central, porém ausentes na lista do Arco Sul. Situação similar aconteceu com a aids, presente apenas nos Arcos Central e Sul, com maior IM no Central.

Os municípios de linha de fronteira notificaram dez doenças de notificação compulsória imediata, ou DNCI (doenças exantemáticas, meningite, poliomielite, hantavírus, influenza, febre amarela, difteria, raiva humana, doença de Chagas aguda e síndrome da rubéola congênita), somando 535 registros em 2009. Ao se comparar a oportunidade de notificação nos MLF com a do restante do Brasil, nenhum Arco de Fronteira alcançou 80% da meta de notificação oportuna: os três Arcos apresentaram baixos percentuais, resultando em 16,6% para o conjunto da região dos MLF frente a 26,3% para o restante do país (Tabela 3). Estratificando-se o percentual por MLF, observou-se baixo desempenho na maioria dos MLF, em todos os Arcos. O Arco Norte apresentou melhor desempenho dos MLF para esse indicador: 25,0% dos seus municípios alcançaram a meta de oportunidade de notificação, seguidos pelos demais municípios do país com 10,8% (Tabela 3).

Tabela 3
Número e percentual de casos de doenças de notificação compulsória imediata registrados oportunamente e percentual de municípios da linha de fronteira com alcance da meta de oportunidade de notificação imediata, segundo Arcos de Fronteira e demais áreas do país. Brasil, 2009

Sobre o indicador de oportunidade de encerramento, observou-se o alcance da meta nacional de 80% para alguns agravos. Destacou-se o Arco Central, que atingiu a meta em quatro dos cinco agravos de maior notificação: tuberculose (94,6%); meningite (91,5%); hepatites virais (85,2%); e leishmaniose tegumentar americana (83,0%). O Arco Sul e os municípios do restante do país apresentaram três agravos a atingir a meta: malária (98,4%), hepatites virais (92,0%) e tuberculose (88,9%) no Arco Sul; e no restante do país, meningite (90,7%), tuberculose (89,9%) e hepatites virais (85,5%). O Arco Norte teve dois agravos para os quais a meta nacional foi alcançada: tuberculose (94,7%) e coqueluche (93,0%) (Tabela 4).

Tabela 4
Número e percentual de casos das cinco principais doenças de notificação compulsória encerrados oportunamente, segundo Arcos de Fronteira e demais áreas do país. Brasil, 2009

Na avaliação da cobertura vacinal para todos os MLF, foram encontradas maiores porcentagens medianas no Arco Central (100,0%), seguido pelo Arco Sul (97,2%) e pelo Arco Norte (96,3%), enquanto para os demais municípios do país, observou-se 98,7% de cobertura vacinal. Estratificando-se o percentual dos MLF por cada Arco, o Central apresentou 96,0% de municípios a alcançar a meta, seguido do Arco Sul (71,9%) e do Arco Norte (53,8%); para os demais municípios do país, essa proporção foi de 80,0% (Tabela 5).

Tabela 5
Mediana da cobertura da vacina tetravalente e percentual de cura de tuberculose nos municípios de linha de fronteira, segundo Arcos de Fronteira e demais áreas do país. Brasil, 2009

Comparando-se o percentual de cura de tuberculose nas regiões dos Arcos de Fronteira com o do restante do Brasil, nenhum Arco alcançou a meta nacional. O Arco Norte apresentou maior proporção de cura da TB (77,1%), seguido do Arco Sul (75,1%) e do Arco Central (71,1%); o conjunto dos demais municípios apresentou 72,9% de cura. Avaliando-se a proporção de MLF de cada Arco que alcançou a meta de cura da tuberculose, observou-se baixo percentual em todos os Arcos (47,6% a 58,1%), assim como para o conjunto dos demais municípios do país (49,9%) (Tabela 5).

Discussão

A avaliação da incidência das doenças de notificação compulsória nos municípios da linha de fronteira evidenciou tanto similaridades quanto diferenças entre os padrões epidemiológicos, representadas, respectivamente, pela elevada concentração de algumas doenças em todos os Arcos e pela importante diversidade na magnitude das principais DNC registradas. Entre as 45 DNC, as dez principais por Arco concentram mais de 90,0% dos casos confirmados nos Arcos Norte e Central, e aproximadamente 70,0% no Arco Sul. As dez DNC com maior número de casos confirmados foram: malária, dengue, atendimento antirrábico, hepatites virais, acidente por animais peçonhentos, leishmaniose tegumentar americana, tuberculose, hanseníase, aids e doenças exantemáticas.

A compreensão da distribuição espacial de ocorrência de malária na região da Amazônia Legal, que inclui todo o Arco Norte, não deve ser explicada tão-somente por um fator específico, de cunho climático, social, econômico ou de mudança da cobertura do solo.1616. Mourão CEF, Angelo J, Pilotto I, Dalla Nora E, Barbosa A. Análise espaço-temporal dos fatores ambientais associados à incidência de malária na Região da Amazônia Legal Brasileira. In: Anais do 16º Congresso Brasileiro de Metereologia [Internet]; 2010 set 13-17; Belém. São José dos Campos: Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais; 2010 [citado 2014 out 11]. Disponível em: Disponível em: http://www.sbmet.org.br/cbmet2010/artigos/519_50452.pdf
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Entretanto, há condições de vulnerabilidade para a ocorrência da doença, a exemplo do crescimento populacional, fluxo migratório e degradação ambiental, resultantes de intervenções humanas, bem como a proliferação do mosquito vetor, cujo ciclo de vida é favorecido pela umidade e temperatura na região.

Esses fatores, potencializados pelos novos padrões espaciais periurbanos de transmissão, também estão relacionados à ocorrência de leishmaniose tegumentar americana e à distribuição de seus vetores em grande parte do território brasileiro,1717. Basano SA, Camargo LMA. Leishmaniose tegumentar americana: histórico, epidemiologia e perspectivas de controle. Rev Bras Epidemiol. 2004 set;7(3):328-37. apresentando-se com diferentes incidências médias - IM -, maiores nas macrorregiões Norte e Centro-Oeste.

Para a dengue, as regiões de fronteira revelam padrões semelhantes quando comparados aos apresentados em estudos sobre a distribuição da doença no Brasil, sendo as maiores IM encontradas nas regiões Centro-Oeste e Norte, nos anos de 2007 e 2008.1818. Barreto ML, Teixeira MG. Dengue in Brazil: epidemiological situation and contribution to a research agenda. Estud Av 2008 Dec;22(64):53-72.

Com toda diversidade étnica, econômica e regional, a infecção pelas hepatites virais destaca-se por sua distribuição bastante heterogênea no país.1919. Universidade de Pernambuco. Núcleo de Pós-Graduação. Estudo de prevalência de base populacional das infecções pelos vírus das hepatites A, B e C nas capitais do Brasil [Internet]. Recife: Universidade de Pernambuco; 2010 [citado 2013 out 24]. Disponível em: Disponível em: http://www.aids.gov.br/sites/default/files/anexos/publicacao/2010/50071/estudo_prevalencia_hepatites_pdf_26830.pdf
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A região Sul, por exemplo, configura-se como área de baixa prevalência para a hepatite B, enquanto a Amazônia está entre as regiões de maior prevalência no mundo. Não obstante, já foram identificadas áreas de prevalência elevada de hepatites no Espírito Santo, Paraná e Santa Catarina, e de baixa prevalência no estado do Amazonas inclusive.1919. Universidade de Pernambuco. Núcleo de Pós-Graduação. Estudo de prevalência de base populacional das infecções pelos vírus das hepatites A, B e C nas capitais do Brasil [Internet]. Recife: Universidade de Pernambuco; 2010 [citado 2013 out 24]. Disponível em: Disponível em: http://www.aids.gov.br/sites/default/files/anexos/publicacao/2010/50071/estudo_prevalencia_hepatites_pdf_26830.pdf
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Outro aspecto importante sobre as hepatites é que a região Norte, especificamente a Amazônia, é hiperendêmica para o vírus da hepatite Delta, ou hepatite D (VHD), especialmente o Acre e o sul do estado do Amazonas.2020. Souto FJD, Fontes CJF, Oliveira SS, Yonamine Y, Santos DRL, Gaspar AMC. Prevalência da hepatite B em área rural de município hiperendêmico na Amazônia Mato-grossense: situação epidemiológica. Epidemiol Serv Saude. 2004 jun;13(2): 93-102. O VHD necessita da infecção pelo VHB para exercer sua ação patogênica e com isso, contribui para a maior incidência das hepatites virais no Arco Norte.2020. Souto FJD, Fontes CJF, Oliveira SS, Yonamine Y, Santos DRL, Gaspar AMC. Prevalência da hepatite B em área rural de município hiperendêmico na Amazônia Mato-grossense: situação epidemiológica. Epidemiol Serv Saude. 2004 jun;13(2): 93-102.

Os animais peçonhentos constituem uma fauna bastante diversa; porém, somente os acidentes por serpente, escorpião, aranha, lagartas e abelhas correspondem aos objetos de vigilância, contando com registros de casos no Sinan.2121. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Situação epidemiológica das zoonoses de interesse à saúde pública. Boletim Epidemiológico; 2009 jun;9(1): 2-17. As maiores IM de acidentes provocados por ofídios ocorrem nos municípios da região Norte, correspondendo à IM de acidentes por animais peçonhentos no Arco Norte. Para outros animais peçonhentos, a distribuição dos acidentes é diversa: casos de escorpionismo apresentam maior incidência na região Nordeste (32,6/100 mil hab.), seguida das regiões Sudeste (20,1/100 mil hab.), Norte (13,6/100 mil hab.), Centro-Oeste (10/100 mil hab.) e Sul (3,6/100 mil hab.); já os casos de araneísmo têm na região Sul maior concentração de óbitos, com incidência de 55,7/100 mil hab., principalmente nos estados de Santa Catarina e Paraná. Os acidentes provocados por lagartas também têm maior incidência no Sul do país.2121. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Situação epidemiológica das zoonoses de interesse à saúde pública. Boletim Epidemiológico; 2009 jun;9(1): 2-17.

Pesquisa realizada na faixa de fronteira encontrou as maiores incidências médias de aids no extremo Sul, seguido da faixa Central, e menores IM na faixa Norte.22. Rodrigues-Júnior AL, Castilho EA. AIDS e doenças oportunistas transmissíveis na faixa de fronteira Brasileira. Rev Soc Bras Med Trop. 2010 out;43(5):542-7 No presente estudo, os municípios do Arco Central apresentaram uma incidência média de aids ligeiramente superior à observada no Arco Sul.

Chama a atenção a elevada IM de coqueluche no Arco Norte, considerando-se que no Brasil, observou-se uma redução importante nessa incidência graças às altas coberturas vacinais com DPT e tetravalente. Entretanto, devido a bolsões de grupos populacionais com baixas coberturas em alguns estados, especialmente da Amazônia (populações indígenas), foram observados surtos da doença no país.

A elevada incidência média de doenças exantemáticas nos municípios da linha de fronteira do Arco Sul deve-se ao resíduo de casos registrados no país entre 2007 e 2008. A Campanha Nacional de Vacinação contra Rubéola realizada em 2008 imunizou aproximadamente 70 milhões de pessoas. Resultado imediato, enquanto haviam-se registrado 10.654 casos de rubéola em 2007 e 2008, nenhum caso da doença foi confirmado pelo Brasil em 2009, indicando impacto positivo da campanha de vacinação em relação à transmissão do vírus.2222. Penna GO, Domingues CMAS, Siqueira Júnior JB, Elkhoury ANSM, Cechine MP, Grossi MAF, et al. Doenças dermatológicas de notificação compulsória no Brasil. An Bras Dermatol. 2011 set-out;86(5):865-77.

A intoxicação exógena no Arco Sul destaca-se entre as dez doenças de maior incidência média nesse Arco, um importante achado. Estudo sobre registros de intoxicação por agrotóxicos revelou incidências médias desse agravo mais elevadas nas regiões Sul (Santa Catarina e Paraná) e Norte (Rondônia) do país, embora esses registros tenham-se mostrado escassos no Sinan para todo o Brasil.2323. Faria NMX, Fassa ACG, Facchini LA. Intoxicação por agrotóxicos no Brasil: os sistemas oficiais de informação e desafios para realização de estudos epidemiológicos. Cienc Saude Colet. 2007 jan-mar;12(1):25-38.

Por fim, a síndrome/corrimento uretral situou-se entre as dez doenças mais incidentes, ainda que apresentasse baixa incidência média nos municípios do Arco Norte. A mobilidade populacional nas regiões de fronteira da Amazônia é um fenômeno permanente e sazonal, diretamente ligado a atividades de agricultura, mineração e extrativismo.2424. Rocha EM. DST e Aids em região de fronteiras: um estudo com caminhoneiros no Estado de Rondônia [dissertação]. Brasília: Universidade de Brasília; 2008.,2525. Ministério da Saúde (BR). Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, Benzaken AS. Fluxo populacional entre países pode influenciar aumento da epidemia nas regiões de fronteira [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2005 [citado 2012 ago 18]. Disponível em: Disponível em: http://www.aids.gov.br/es/node/37324
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Essa mobilidade de pessoas também permite o intercâmbio e a difusão de agentes patogênicos. Nas regiões de fronteira, especialmente, os habitantes dos países vizinhos vivem os efeitos dessa proximidade, gerando comportamentos vulneráveis como a maior possibilidade de multiplicidade de parceiros sexuais. Nessas áreas, também é intenso o tráfico de drogas, o comércio ilegal de mercadorias e a prostituição, afetando alguns grupos populacionais específicos residentes em municípios fronteiriços.2424. Rocha EM. DST e Aids em região de fronteiras: um estudo com caminhoneiros no Estado de Rondônia [dissertação]. Brasília: Universidade de Brasília; 2008.,2525. Ministério da Saúde (BR). Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, Benzaken AS. Fluxo populacional entre países pode influenciar aumento da epidemia nas regiões de fronteira [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2005 [citado 2012 ago 18]. Disponível em: Disponível em: http://www.aids.gov.br/es/node/37324
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Quanto ao atributo 'oportunidade de notificação de DNCI', observou-se baixo desempenho no cumprimento das metas nacionais, nos três Arcos de Fronteira, assim como nos demais municípios brasileiros. Esse atributo permite avaliar a capacidade do serviço de vigilância epidemiológica em detectar o agravo oportunamente, possibilitando a adoção precoce de medidas de controle. Nesse sentido, os resultados apresentados evidenciam fragilidades dos serviços de vigilância epidemiológica, que podem implicar a ocorrência de epidemias ou de outras emergências de Saúde Pública.

Em estudo de avaliação das capacidades básicas nacionais estabelecidas pelo Regulamento Sanitário Internacional (2005) para detectar e dar resposta às emergências de Saúde Pública nos 27 estados do Brasil e em mais 76 municípios, focadas no período 2008-2009, também foram evidenciadas fragilidades na capacidade dos MLF para responder a essas emergências, quando comparados a outros municípios estratégicos.2626. Teixeira MG, Costa MC, Souza LP, Nascimento EM, Barreto ML, Barbosa N, et al. Evaluation of Brazil's public health surveillance system within the context of the International Health Regulations (2005). Rev Panam Salud Publica. 2012Jul;32(1):49-55. Entretanto, no presente estudo foram observadas fragilidades semelhantes nos demais municípios do país. Ressalta-se que o desenvolvimento dessas capacidades em regiões de fronteira internacional constitui um elemento fundamental para a implementação do Regulamento Sanitário Internacional em todos os países signatários.1010. Carmo EH, Penna G, Oliveira WK. Emergências de saúde pública: conceito, caracterização, preparação e resposta. Estud Av. 2008 dez;22(64):19-32.

Quanto ao atributo 'oportunidade de encerramento dos casos', alcançou-se a meta nacional para tuberculose em toda região de fronteira, enquanto para a dengue, essa meta não foi alcançada em nenhum dos Arcos, sequer no restante do país. Esse atributo avalia a eficiência do serviço de vigilância epidemiológica em agilizar o encerramento dos casos notificados e orientar a aplicação e avaliação das medidas de controle oportunamente.

Ambos os atributos de oportunidade constituem referência para uma atividade básica de vigilância epidemiológica relacionada ao uso adequado dos processos e dos sistemas de informações em saúde, assim como para as demais atividades necessárias à prevenção e controle das doenças.

Todavia, não fazem parte da rotina de todos os serviços o (i) processamento e análise dos dados e a (ii) disseminação das informações de forma sensível e oportuna, comprometendo a efetividade no uso da 'informação para ação', um dos objetivos da vigilância epidemiológica.2727. Cesse EAP, Freese de Carvalho E. Vigilância epidemiológica: evolução do conceito e institucionalização de práticas no contexto municipal. In: Freese de Carvalho E, organizador. Municípios: a gestão da mudança em saúde. Recife: Ed Universitária da UFPE; 2004. p. 91-110. Em geral, essa insuficiência está relacionada à falta de qualificação, carência e alta rotatividade de profissionais, e ao fato de os serviços não disporem de uma infraestrutura adequada ao desempenho da vigilância. A utilização das informações é mais efetiva quando profissionais são qualificados e mantidos em serviços cuja infraestrutura é compatível com suas atribuições.2828. Villa TCS. A vigilância epidemiológica e a perspectiva de trabalho no território - Secretaria Municipal de Saúde - Ribeirão Preto. Rev Latino-Am Enfermagem. 2002 jan;10(1):21-7.

A meta de cobertura da vacina tetravalente somente foi alcançada quando avaliada por grupos de Arco, sendo observado menor desempenho quando se estratificou essa análise para os municípios fronteiriços de cada Arco. No Arco Norte, quase metade dos municípios não alcançou a meta de cobertura vacinal estabelecida, evidenciando-se um elevado contingente populacional sem a proteção dessa vacina. Apenas o Arco Central apresentou um elevado percentual de municípios a atingir - acima de 100,0% - a meta de cobertura vacinal da tetravalente, feito possivelmente relacionado à vacinação de população não residente nos municípios e/ou de residentes em países vizinhos, incluídas no numerador do índice.

Quanto ao indicador de percentual de cura para tuberculose, nenhum dos Arcos de Fronteira alcançou a meta nacional, preconizada pela Organização Mundial da Saúde, embora essas regiões tenham apresentado percentuais de cura semelhantes ao observado para o conjunto dos demais municípios brasileiros. Além dos problemas enfrentados para o alcance dessa meta por todos os municípios do Brasil, o controle da tuberculose nessas regiões é particularmente difícil porque não depende apenas dos esforços de um país, senão de todos aqueles com fronteira comum.2929. Braga JU, Herrero MB, Cuellar CM. Transmissão da tuberculose na tríplice fronteira entre Brasil, Paraguai e Argentina. Cad Saude Publica. 2011jul;27(7):1271-80. A mobilidade populacional entre o Brasil e países vizinhos torna essa região particularmente vulnerável. Ademais, uma das dificuldades para o reconhecimento da magnitude da tuberculose nos municípios da linha de fronteira deve-se às precárias condições de vida de suas populações, dificultando o diagnóstico dos doentes.2929. Braga JU, Herrero MB, Cuellar CM. Transmissão da tuberculose na tríplice fronteira entre Brasil, Paraguai e Argentina. Cad Saude Publica. 2011jul;27(7):1271-80.,3030. Giovanella L, Guimarães L, Nogueira VMR, Lobato LVC, Damacena GN. Saúde nas fronteiras: acesso e demandas de estrangeiros e brasileiros não residentes ao SUS nas cidades de fronteira com países do MERCOSUL na perspectiva dos secretários municipais de saúde. Cad Saude Publica. 2007;23 supl 2:S251-66.

Este trabalho incluiu 121 MLF do Brasil, representativos de uma parcela da faixa de fronteira e dos Arcos, não sua totalidade. Outra limitação do presente estudo refere-se aos atributos utilizados para avaliar as ações da vigilância epidemiológica, muitas vezes incapazes de refletir aspectos específicos de programas de prevenção e controle das doenças de maior incidência nas regiões e localidades estudadas. Sugere-se a realização de outros trabalhos investigativos sobre as mesmas áreas geográficas, abordando os MLF e - complementarmente - outros atributos além dos considerados aqui, de maneira a permitir a avaliação de diferentes dimensões da vigilância epidemiológica.

A magnitude das doenças de notificação compulsória e a qualidade das ações da vigilância nesses municípios apresentaram diferenças importantes entre os Arcos, indicando que não se deve considerar a região uniformemente, do ponto de vista epidemiológico. A qualidade das ações da vigilância epidemiológica nos municípios das linha de fronteira também revelou algumas diferenças, na comparação com os demais municípios do Brasil, possivelmente relacionadas às diferenças epidemiológicas, bem como ao grau de desenvolvimento dos serviços de saúde por região.

Alguns indicadores evidenciaram fragilidades dos sistemas de vigilância epidemiológica municipais para detectar e notificar, oportunamente, doenças com poder de disseminação entre os municípios, gerando epidemias ou outras emergências de Saúde Pública. Essas fragilidades devem ser enfrentadas com a melhoria das capacidades nacionais para responder a essas emergências, conforme estabelece o Regulamento Sanitário Internacional.1111. World Health Organization. International Health Regulations (2005). 2nd ed. Geneva: WHO; 2008. A despeito das avaliações negativas sobre a região de fronteira na literatura, foram também observados resultados de indicadores de vigilância epidemiológica satisfatórios, alguns deles ainda melhores do que os correspondentes aos demais municípios brasileiros. As áreas geográficas de fronteira merecem um olhar diferenciado na avaliação e definição de políticas de saúde, especialmente das ações de vigilância epidemiológica, com vistas a um melhor conhecimento, utilização de estratégias mais adequadas à realidade, e aperfeiçoamento das mesmas ações sobre essas regiões.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    12 Jan 2015
  • Aceito
    31 Ago 2015
Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente - Ministério da Saúde do Brasil Brasília - Distrito Federal - Brazil
E-mail: ress.svs@gmail.com