Descrição dos casos hospitalizados pela COVID-19 em profissionais de saúde nas primeiras nove semanas da pandemia, Brasil, 2020

Descripción de los casos hospitalizados por COVID-19 en profesionales de salud en las primeras nueve semanas de la pandemia, Brasil, 2020

Magda Machado Saraiva Duarte Maria Isabella Claudino Haslett Leonardo José Alves de Freitas Nivreanes Tcherno Nulle Gomes Danielle Cristine Castanha da Silva Jadher Percio Marcelo Yoshito Wada Francieli Fontana Sutile Tardetti Fantinato Walquiria Aparecida Ferreira de Almeida Daiana Araujo da Silva Caroline Gava Giovanny Vinícius Araújo de França Eduardo Marques Macário Karla Freire Baêta Juliane Maria Alves Siqueira Malta Ana Julia Silva e Alves Sobre os autores

Resumo

Objetivo:

Descrever os casos hospitalizados pela COVID-19 em profissionais de saúde no Brasil.

Métodos:

Estudo descritivo de tipo série de casos; foram incluídos aqueles com adoecimento entre 21 de fevereiro e 15 de abril de 2020, registrados no Sistema de Informação de Vigilância da Gripe (SIVEP-Gripe).

Resultados:

Dos 184 casos, 110 (59,8%) eram do sexo feminino, com mediana de idade de 44 anos (mínima-máxima: 23-85); 89 (48,4%) eram profissionais da enfermagem e 50 (27,2%) eram médicos. Ainda, 92 (50,0%) apresentavam comorbidade, predominando cardiopatias (n=37; 40,2%). Dos 112 profissionais com registro de evolução, 85 (75,9%) alcançaram cura e 27 (24,1%) foram a óbito, 18 destes do sexo masculino.

Conclusão:

O perfil dos profissionais de saúde hospitalizados por COVID-19 é semelhante ao da população quanto à idade e comorbidades; porém, diferente quanto ao sexo. As áreas profissionais mais acometidas foram a enfermagem e a medicina.

Palavras-chave:
Pessoal de Saúde; Infecções por Coronavirus; Perfil de Saúde; Epidemiologia Descritiva

Resumen

Objetivo:

Describir los casos hospitalizados por COVID-19 en profesionales de salud, en Brasil. Métodos: Estudio descriptivo del tipo serie de casos; se incluyeron aquellos que enfermaron entre el 21 de febrero y el 15 de abril de 2020, registrados en el Sistema de Información de Vigilancia de la Gripe (SIVEP-Gripe).

Resultados:

De los 184 (1,76%) casos 110 (59,8%) eran del sexo femenino, con promedio de edad de 44 años (mínima-máxima: 23-85), 89 (48,4%) eran profesionales de enfermería y 50 (27,2%) médicos. Además, 92 (50,0%) presentaron comorbilidad, predominando las cardiopatías (n=37; 40,2%). De los 112 profesionales con un historial de evolución, 85 (75,9%) fueron curados y 27 (24,1%) murieron, 18 de los cuales era de sexo masculino.

Conclusión:

El perfil de los hospitalizados por COVID-19 es similar al de la población en edad y comorbilidades, aunque diferente con relación a sexo. Las áreas más afectadas fueron la enfermería y la medicina.

Palabras clave:
Personal de Salud; Infecciones por Coronavirus; Perfil de Salud; Epidemiología Descriptiva

Introdução

Até 16 de abril de 2020, o mundo registrou mais de 2 milhões de casos de COVID-19, com 156.141 óbitos.11. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Situação epidemiológica da COVID-19: doença pelo coronavírus 2019. Bol Epidemiol [Internet]. 2020 abr [citado 2020 ago 17];10. Disponível em: https://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2020/April/17/2020-04-16---BE10---Boletim-do-COE-21h.pdf
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A emergência da doença e a decorrente crise sanitária mundial ampliaram a demanda por serviços de assistência e, consequentemente, a exposição dos profissionais de saúde à infecção pelo SARS-CoV-2.22. Lopez FG, Palotti PLDM, Barbosa SCT, Koga NM. Mapeamento dos profissionais de saúde no Brasil: alguns apontamentos em vista da crise sanitária da COVID-19. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 2020 [citado 2020 abr 19]. 13 p. Disponível em: http://desafios2.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=35426:nota-tecnica-2020-marco-numero-30-diest-mapeamento-dos-profissionais-de-saude-no-brasil-alguns-apontamentos-em-vista-da-crise-sanitaria-da-COVID-19&catid=189:diest&directory=1
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O enfrentamento da doença expõe diversas situações de risco laboral: exposição repetida ao patógeno; extensas jornadas de trabalho, associadas com múltiplos vínculos; cansaço; estresse ocupacional; estigmatização; violências física e psicológica;33. World Health Organization - OMS. Coronavirus disease (COVID-19) outbreak: rights, roles and responsibilities of health workers, including key considerations for occupational safety and health 2020 [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2020 [cited 2020 Aug 17]. Available from: https://www.who.int/publications/i/item/coronavirus-disease-(covid-19)-outbreak-rights-roles-and-responsibilities-of-health-workers-including-key-considerations-for-occupational-safety-and-health
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e capacitação incipiente e da insuficiência/indisponibilidade de equipamentos de proteção individual (EPI).44. Associação Médica Brasileira - AMB.Faltam EPIs em todo o país [Internet]. São Paulo: Associação Médica Brasileira; 2020 [citado 2020 abr 19]. Disponível em: https://amb.org.br/epi/
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O espectro clínico da infecção pela COVID-19 inclui desde as infecções assintomáticas e síndromes gripais leves, podendo evoluir para condições respiratórias mais severas, como a síndrome respiratória aguda grave (SRAG), a depender do organismo e das comorbidades que ele apresenta. No Brasil, as infecções por vírus respiratórios constituem sistema de vigilância que tem como um de seus objetivos principais identificar, registrar e monitoraras características clínicas e epidemiológicas desses casos.55. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Guia de vigilância epidemiológica: emergência de saúde pública de importância nacional pela doença pelo coronavírus 2019. Vigilância integrada de síndromes respiratórias agudas doença pelo coronavírus 2019, influenza e outros vírus respiratórios [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2020 [citado 2020 abr 20]. Disponível em: https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/biblioteca/guia-de-vigilancia-epidemiologica-emergencia-de-saude-publica-de-importancia-nacional/
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Conhecer o perfil dos profissionais de saúde hospitalizados pela infecção do novo coronavírus no Brasil pode subsidiar a implementação de ações de prevenção e controle do adoecimento dessa população, tão essencial no enfrentamento da pandemia.

O objetivo deste estudo foi descrever os casos hospitalizados pela COVID-19 em profissionais de saúde no Brasil.

Métodos

Trata-se de um estudo descritivo dos casos hospitalizados por SRAG, confirmados para COVID-19 por exame de RT-PCR – teste de reação em cadeia da polimerase em tempo real.

A população brasileira é estimada em aproximadamente 212 milhões de pessoas, em 2020,66. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Diretoria de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Projeção da população do Brasil e Unidades da Federação por sexo e idade para o período 2000-2030 [Internet] Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2020 [citado 2020 ago 17]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?ibge/cnv/projpopuf.def
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e em janeiro deste mesmo ano, havia 1.535.523 profissionais de saúde atuando no país,77. Ministério da Saúde (BR). DATASUS. Recursos humanos: profissionais. Indivíduos segundo CBO 2002 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2020 [citado 2020 ago 17]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?cnes/cnv/prid02br.def
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distribuídos em cerca de 219 mil serviços de saúde, entre gestão pública e privada.88. Ministério da Saúde (BR). DATASUS. Estabelecimentos por tipo [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2020 [citado 2020 ago 17]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?cnes/cnv/estabbr.def
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Foram incluídos como participantes do estudo profissionais de saúde, identificados pelas variáveis ‘ocupação’ e ‘observações’, classificados conforme as categorias da Portaria do Ministério da Saúde MS/GM nº 639, de 31 de março de 2020, que dispõe sobre a Ação Estratégica ‘O Brasil conta comigo – Profissionais de Saúde’.99. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria MS/GM nº 639, de 31 de março de 2020. Dispõe sobre a ação estratégica ‘O Brasil Conta Comigo - Profissionais da Saúde’, voltada à capacitação e ao cadastramento de profissionais da área de saúde, para o enfrentamento à pandemia do coronavírus (COVID-19) [Internet]. Diário Oficial União, Brasília (DF), 2020 abr 2 [citado 2020 ago 17];Seção 1:76. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2020/prt0639_02_04_2020.html
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A fonte consultada foi o Sistema de Informação de Vigilância da Gripe (SIVEP-Gripe), cujos dados, de acesso público, estão disponíveis no portal eletrônico do Ministério da Saúde (https://covid.saude.gov.br/) e foram extraídos em 28 de abril de 2020.

Utilizou-se o conceito de Semana Epidemiológica (SE), padronização internacional para as semanas de domingo a sábado, a contar da primeira semana com mais dias de janeiro à última com mais dias de dezembro. O estudo abrangeu as SEs 8 a 17 de 2020.

As variáveis estudadas foram:

  1. a) data de início dos sintomas;

  2. b) Unidade da Federação (UF) de residência;

  3. c) idade (em anos: 23 a 29; 30 a 39; 40 a 49; 50 a 59; 60 ou mais);

  4. d) sexo (feminino; masculino; ignorado);

  5. f) raça/cor da pele (branca; preta; amarela; parda; indígena; ignorada);

  6. g) presença (não; sim; ignorada) de comorbidades (cardiopatia; asma; diabetes mellitus; obesidade);

  7. h) sinais e sintomas (febre; tosse; dor de garganta; dispneia; desconforto respiratório; baixa saturação; diarreia; vômito; outros);

  8. i) evolução (cura; óbito; ignorada);

  9. j) data de internação;

  10. k) data de internação na unidade de terapia intensiva (UTI);

  11. l) raio-X de tórax (normal; infiltrado intersticial; consolidação; misto; outro; não realizado; ignorado); e

  12. m) uso de suporte ventilatório (sim, invasivo; sim, não invasivo; não; ignorado)

Ressalta-se que a variável ‘ocupação’ foi adicionada ao SIVEP-Gripe em 31 de março de 2020.

As análises foram realizadas mediante cálculo de medidas de frequência absoluta e relativa, tendência central e dispersão, com auxílio dos programas Microsoft Excel®, Epi Info 7.2 e QGIS 2.18.

O estudo foi realizado exclusivamente com dados secundários, não identificados e de acesso público.

Resultados

No Brasil, no período analisado, 15.317 casos hospitalizados de SRAG foram confirmados para COVID-19, e destes, 379 (2,5%) registraram ocupação, sendo 184 (1,2%) profissionais de saúde. O primeiro caso entre esses profissionais adoeceu em 2 de março, durante a SE 10, e o maior acometimento ocorreu na SE 13 (Figura 1).

Figura 1
Distribuição dos casos hospitalizados por síndrome respiratória aguda grave confirmados para COVID-19 em profissionais de saúde (N=184), segundo semana epidemiológica de início dos sintomas, Brasil, 2020

As UFs com mais profissionais de saúde hospitalizados com COVID-19 foram São Paulo (n=101; 54,9%), Amazonas (n=15; 8,2%) e Santa Catarina (n=13; 7,1%) (Figura 2).

Figura 2
Distribuição dos casos hospitalizados por síndrome respiratória aguda grave confirmados para COVID-19 em profissionais de saúde (N=184), segundo Unidade da Federação de notificação, Brasil, 2020

A mediana de idade dos profissionais adoecidos foi de 44 anos (variação: 23 a 85), com maior concentração nas faixas de 30 a 49 anos (n=113; 61,4%). Houve predominância do sexo feminino (n=110; 59,8%) e raça/cor da pele branca (n=74; 40,2%). Para raça/cor da pele, 67 (36,4%) casos tinham essa informação em branco/ignorada. Metade dos profissionais da saúde internados (n=92) apresentaram comorbidade, sendo 37 cardiopatas (incluindo hipertensão), 24 diabéticos e 16 asmáticos.

Enfermagem (n=89; 48,4%) e medicina (n=50; 27,2%) foram as principais áreas de ocupação descritas. Outros 29 (15,8%) casos foram registrados apenas como ‘profissional de saúde’ (Tabela 1).

Tabela 1
Frequências absoluta e relativa dos casos hospitalizados por síndrome respiratória aguda grave confirmados para COVID-19 em profissionais de saúde (N=184), segundo variáveis sociodemográficas, Brasil, 2020

Febre (n=153; 83,6%), tosse (n=151; 82,5%) e dispneia (n=136; 74,3%) foram os sinais e sintomas mais frequentes, seguidos de desconforto respiratório (n=120; 65,6%), saturação de oxigênio menor que 95% (n=90; 49,2%) e dor de garganta (n=49; 26,8%). Dos 96 (52,2%) profissionais de saúde que realizaram raio-X de tórax, 39 (49,6%) apresentaram infiltrado intersticial; 23 (12,5%) profissionais não realizaram o exame e, para 65 (35,3%), essa informação se encontrava em branco/ignorada. Dos 87 (47,3%) que utilizaram suporte ventilatório, 31 (35,6%) eram do tipo invasivo, 74 (40,2%) não o utilizaram e 23 (12,5%) contavam com essa informação em branco/ignorada.

A mediana da diferença de dias entre os primeiros sinais e sintomas e a internação foi de 6 dias, variando de zero a 32. Para os casos internados em UTI, essa mediana foi de 7 dias, variando de zero a 19. Do total de casos de profissionais de saúde, 27 (14,7%) evoluíram para óbito e 85 (46,2%) para cura, enquanto 72 (39,1%) contavam com essa informação em branco/ignorada.

A mediana de idade dos óbitos foi de 44 anos (mínima-máxima: 35-85), com predominância do sexo masculino (n=18). A maioria era constituída de trabalhadores das áreas da enfermagem (n=12) e da medicina (n=9). Outrossim, 24 dos óbitos apresentavam comorbidades, sendo mais frequentes cardiopatias (n=12), diabetes mellitus (n=7) e obesidade (n=5). São Paulo registrou 11 óbitos, e o Amazonas, 9.

Discussão

Foram descritos os primeiros profissionais de saúde hospitalizados, notificados e confirmados para COVID-19 no Brasil. Os casos ocorreram, predominantemente, entre o sexo feminino, adultos jovens, profissionais da medicina e da enfermagem, que apresentaram febre, tosse e dispneia e relataram cardiopatia, diabetes mellitus e asma mais frequentemente.

Tais achados corroboram Wang et al., que descreveram 138 casos de COVID-19 atendidos em hospital de Wuhan, China, onde febre e tosse foram os sintomas mais relatados, além de as comorbidades apresentadas serem semelhantes.1010. Wang D, Hu B, Hu C, Zhu F, Liu X, Zhang J, et al. Clinical characteristics of 138 hospitalized patients with 2019 novel coronavirus–infected pneumonia in Wuhan, China. Jama [Internet]. 2020 Mar [cited 2020 Aug 17];323(11):1061-9. Available from: https://dx.doi.org/10.1001%2Fjama.2020.1585
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Tambémvalidam os achados de Grasselli et al., que descreveram 1.591 casos na região da Lombardia, Itália setentrional, com faixas etárias e comorbidades igualmente semelhantes.1111. Grasselli G, Zangrillo A, Zanella A, Antonelli M, Cabrini L, Castelli A, et al. Baseline characteristics and outcomes of 1591 patients infected with SARS-CoV-2 admitted to ICUs of the Lombardy region, Italy. Jama [Internet]. 2020 Apr [cited 2020 Aug 17];323(16):1574-81. Available from: https://doi.org/10.1001/jama.2020.5394
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A presente pesquisa ratifica, ademais, os dados sobre sexo, média de idade, raça/cor da pele e sinais e sintomas dos casos de COVID-19 em profissionais de saúde nos Estados Unidos, publicados pelo CDC (Centers for Disease Control and Prevention).1212. Burrer SL, de Perio MA, Hughes MM, Kuhar DT, Luckhaupt SE, McDaniel CJ, et al. Characteristics of health care personnel with COVID-19 – United States, February 12-April 9, 2020. MMWR Morb Mortal Wkly Rep [Internet]. 2020 Apr [cited 2020 Aug 17];69(15):477-81. Available from: https://doi.org/10.15585/mmwr.mm6915e6
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Apesar da predominância do sexo feminino, justificada pela maior presença de mulheres dedicadas a essas atividades,1313. Machado MH, Aguiar Filho W, Lacerda WF, Oliveira E, Lemos W, Wermelinger M, et al. Características gerais da enfermagem: o perfil sócio demográfico. Enferm Foco [Internet]. 2016 [cited 2020 ago 17];6(1/4):11-7. Disponível em: https://doi.org/10.21675/2357-707X.2016.v7.nESP.686
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,1414. Scheffer M, Cassenote A, Guilloux AGA, Biancarelli A, Miotto BA, Mainardi GM. Demografia médica no Brasil 2018: número de médicos aumenta e persistem desigualdades de distribuição e problemas na assistência [Internet]. São Paulo: Associação Médica Brasileira; 2018 [citado 2020 ago 17]. Disponível em: https://amb.org.br/wp-content/uploads/2018/03/DEMOGRAFIA-M%C3%89DICA.pdf
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os óbitos ocorreram, majoritariamente, no sexo masculino, confirmando, mais uma vez, os resultados dos trabalhos de Wang et al. e Grasselli et al.1010. Wang D, Hu B, Hu C, Zhu F, Liu X, Zhang J, et al. Clinical characteristics of 138 hospitalized patients with 2019 novel coronavirus–infected pneumonia in Wuhan, China. Jama [Internet]. 2020 Mar [cited 2020 Aug 17];323(11):1061-9. Available from: https://dx.doi.org/10.1001%2Fjama.2020.1585
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,1111. Grasselli G, Zangrillo A, Zanella A, Antonelli M, Cabrini L, Castelli A, et al. Baseline characteristics and outcomes of 1591 patients infected with SARS-CoV-2 admitted to ICUs of the Lombardy region, Italy. Jama [Internet]. 2020 Apr [cited 2020 Aug 17];323(16):1574-81. Available from: https://doi.org/10.1001/jama.2020.5394
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Uma proporção superior a 75% dos casos era de profissionais da medicina e da enfermagem, dada sua maior exposição nos atendimentos clínicos e emergenciais. A promoção e preservação da saúde desses profissionais é fundamental para a manutenção dos serviços essenciais, como o de atenção à saúde, em seus diversos níveis.

O processo e as condições de trabalho podem oferecer risco aos profissionais de saúde, enquanto potenciais fontes de exposição ao agente etiológico e, indiretamente, a seus familiares e demais contatos. Maior proximidade e mais tempo de atenção aos infectados, necessária a seus processos de trabalho, o uso e/ou disponibilidade de EPI inadequados, e por conseguinte, a exposição às diversas formas de transmissão do patógeno, podem levar ao adoecimento desses profissionais.1515. Ng K, Poon BH, Puar THK, Quah JLS, Loh WJ, Wong YJ, et al. COVID-19 and the risk to health care workers: a case report. 2020. Ann Intern Med [Internet]. 2020 Jun [cited 2020 Aug 17];172(11):766-7. Available from: https://doi.org/10.7326/L20-0175
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Assim, o uso de máscaras, a adequada higienização das mãos, o uso de óculos e toucas, entre outros procedimentos-padrão, são medidas recomendadas de proteção da infecção no ambiente de trabalho.1515. Ng K, Poon BH, Puar THK, Quah JLS, Loh WJ, Wong YJ, et al. COVID-19 and the risk to health care workers: a case report. 2020. Ann Intern Med [Internet]. 2020 Jun [cited 2020 Aug 17];172(11):766-7. Available from: https://doi.org/10.7326/L20-0175
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1919. Fiho JMJ, Assunção AA, Algranti E, Garcia EG, Saito CA, Maeno M. A saúde do trabalhador e o enfrentamento da COVID-19. Rev Bras Saúde Ocup [Internet]. 2020 abr [citado 2020 abr 20];45:e14. Disponível em https://doi.org/10.1590/2317-6369ed0000120
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A fonte de dados utilizada pelo estudo registra apenas os casos hospitalizados com evolução para SRAG; não reflete a magnitude real do acometimento de profissionais de saúde pela COVID-19, consequente afastamento laboral e proporção de casos leves.

Acrescentam-se a essa limitação as diferentes formas de notificação adotadas, desde o advento da epidemia: os primeiros casos foram notificados com uso do software REDCap (sigla em inglês para Research Electronic Data Capture); posteriormente, os casos leves (não hospitalizados) foram notificados no e-SUS VE, ferramenta recém-criada para o registro de casos suspeitos e confirmados de COVID-19, disponibilizada pelo Departamento de Informática do SUS (Datasus);55. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Guia de vigilância epidemiológica: emergência de saúde pública de importância nacional pela doença pelo coronavírus 2019. Vigilância integrada de síndromes respiratórias agudas doença pelo coronavírus 2019, influenza e outros vírus respiratórios [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2020 [citado 2020 abr 20]. Disponível em: https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/biblioteca/guia-de-vigilancia-epidemiologica-emergencia-de-saude-publica-de-importancia-nacional/
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e os casos com evolução para SRAG, notificados no SIVEP-Gripe. Até o momento desta publicação, não se realizou um linkage dessas bases.

Ademais, a recente inserção da variável ‘ocupação’ na ficha de notificação pode explicar o registro tardio de casos de COVID-19 em profissionais de saúde (cinco semanas após a notificação do primeiro caso confirmado no Brasil), como também o pequeno número de casos notificados na extração dos dados e a baixa proporção de ‘ocupação’ preenchida nos registros descritos; além do tempo de digitação das fichas no SIVEP-Gripe, nem sempre oportuno.

Cumpre lembrar que a densidade de profissionais de saúde no território, aliada a outras variáveis, contribui para identificar capacidades de resposta ao cenário pandêmico.22. Lopez FG, Palotti PLDM, Barbosa SCT, Koga NM. Mapeamento dos profissionais de saúde no Brasil: alguns apontamentos em vista da crise sanitária da COVID-19. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 2020 [citado 2020 abr 19]. 13 p. Disponível em: http://desafios2.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=35426:nota-tecnica-2020-marco-numero-30-diest-mapeamento-dos-profissionais-de-saude-no-brasil-alguns-apontamentos-em-vista-da-crise-sanitaria-da-COVID-19&catid=189:diest&directory=1
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Não obstante, é incerto o número real de profissionais de saúde atuando nesse contexto, tanto como o número desses profissionais adoecidos em virtude do trabalho. Tal conhecimento pode auxiliar na estimativa deinsumose equipamentos necessários para o atendimento em saúde, de maneira a garantir a segurança no ambiente de trabalho, além de revelar a real magnitude dos riscos em que se encontra esse grupo laboral.

Assim, recomenda-se (i) o monitoramento contínuo dos casos da COVID-19 em profissionais de saúde e sua descrição (síndrome gripal e SRAG); (ii) a realização de linkage dos bancos de dados (SIVEP-Gripe, e-SUS VE e RedCAP), com a finalidade de avaliar a real magnitude da COVID-19 nesses profissionais; e (iii) a padronização no uso da variável ‘ocupação’, nas notificações do SIVEP-Gripe.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Set 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    08 Maio 2020
  • Aceito
    08 Ago 2020
Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente - Ministério da Saúde do Brasil Brasília - Distrito Federal - Brazil
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