Tendências e distribuição espacial da hepatite D no Norte do Brasil, 2009-2018: um estudo ecológico

Tendencias y distribución espacial de Hepatitis D en el Norte de Brasil, 2009-2018: un estudio ecológico

Adriano Benício Fernandes Yamada Polyanne Lopes de Freitas Rafael Fernandes da Silva Francisco José Dutra Souto Sobre os autores

Resumo

Objetivo:

Analisar a incidência anual de hepatite D no Brasil e na região Norte, no período 2009-2018.

Métodos:

Estudo ecológico de casos de hepatite D notificados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), analisados por sexo, idade e estados do Norte. Realizou-se análise de tendência temporal pelo método de Prais-Winsten, para estimar a variação percentual anual (VPA) das taxas de incidência.

Resultados:

No período, foram reportados 2.710 casos no Brasil, 74,5% na região Norte e 71,5% somente no Amazonas, Acre e Rondônia. Houve tendência de queda da VPA no país (-21,6% - IC95% -3,8;-36,2%), região Norte (-28,5% - IC95% -5,2;-46,1%,), Amazonas (-34,1% - IC95% -0,8;-56,2%) e Acre (-37,6% - IC95% -18,0;-52,6%). Verificou-se diminuição de casos nos estratos etários abaixo de 40 anos.

Conclusão:

Houve tendência de queda da incidência de hepatite D na Amazônia Ocidental, que impactou na incidência no país. Essa redução foi puxada pelos mais jovens, provavelmente resultado da vacinação para hepatite B.

Palavras-chave:
Hepatite D; Doenças Negligenciadas; Estudos de Séries Temporais; Monitoramento Epidemiológico; Incidência; Ecossistema Amazônico.

Resumen

Objetivo:

Evaluar la incidencia anual de casos de hepatitis D en Brasil y en la Región Norte, entre 2009-2018.

Métodos:

En este estudio ecológico, se utilizaron casos notificados al Sistema Nacional de Agravamiento de de Enfermedades (Sinan), analizados por sexo, edad y estados del Norte. Se utilizó la regresión de Prais-Winsten para análisis de la tendencia temporal y el cálculo de la variación porcentual anual (VPA) de tasas de incidencia.

Resultados:

En el periodo, se notificaron 2.710 casos, siendo 74,5% en el Norte e 71,5% en Amazonas, Acre y Rondônia. Hubo tendencia a disminución de la VPA en Brasil (-21,6% - IC95% -3,8;-36,2%), región Norte (-28,5% - IC95% -5,2;-46,1%,), Amazonas (-34,1% - IC95% -0,8;-56,2%) y Acre (-37,6% - IC95% -18,0;-52,6%). Hubo disminución de casos entre los menores de 40 años.

Conclusión:

Hubo tendencia a la disminución de la incidencia en la Amazonía Occidental, impactando en la incidencia en Brasil. Esta baja está relacionada con los más jóvenes, probablemente debido a la vacunación contra la hepatitis B.

Palabras clave:
Hepatitis D; Enfermedades Desatendidas; Estudios de Series Temporales; Monitoreo Epidemiológico; Incidencia; Ecosistema Amazónico.

Introdução

A hepatite D é causada por um vírus defeituoso que só infecta o homem na presença do vírus da hepatite B.11. Scarponi CFO, Silva RDN, Souza-Filho JA, Guerra MRL, Pedrosa MAF, Mol MPG. Hepatitis D prevalence in South America: a systematic review and meta-analysis. Rev Soc Bras Med Trop. 2018;52:e20180289. doi: https://doi.org/10.1590/0037-8682-0289-2018.
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A doença pode levar indivíduos com hepatite B mais rapidamente à falência hepática. É uma doença negligenciada e afeta, principalmente, países em desenvolvimento.22. Lempp FA, Urban F. Hepatitis delta virus: replication strategy and upcoming therapeutic options for a neglected human pathogen. Viruses. 2017 Jul 4;9(7):172. doi: https://doi.org/10.3390/v9070172.
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,33. Goyal A, Romero-Severson EO. Screening for hepatitis D and PEG-interferon over tenofovir enhance general hepatitis control efforts in Brazil. PLoS One. 2018 Sep 7;13(9):e0203831. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0203831.
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A Amazônia é uma das regiões de maior endemicidade das hepatites B e D no mundo.44. Viana S, Paraná R, Moreira RC, Compri AP, Macedo V. High prevalence of hepatitis B vírus and hepatitis D vírus in the western Brazilian Amazon. Am J Trop Med Hyg. 2005;73(4):808-14. doi: https://doi.org/10.4269/ajtmh.2005.73.808.
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,55. Cicero MF, Pena NM, Santana LC, Arnold R, Azevedo RG, Leal ES, et al. Is hepatitis D infections important in Brazil? BMC Infect Dis. 2016;16(1):525. doi: https://doi.org/10.1186/s12879-016-1856-9.
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No Brasil, casos fora da região Norte são reportados esporadicamente, sendo mais comuns em estados fronteiriços à região.66. Nunes JDC, Silva DLF, Fonseca LMB, Felipe IMA, Ferreira BR, Santana RC, et al. Unexpected findings of hepatitis B and delta infection in northeastern Brazil: a public health alert. Ann Hepatol. 2021;22:100272. doi: https://doi.org/10.1016/j.aohep.2020.09.016.
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,77. Ferreira-Junior PA, de-Oliveira EC, Martin TOG, Alves-Junior ER, Silva LJ, Mello FCA, et al. Prevalence of hepatitis B and D virus infection in a district of Mato Grosso, bordering Amazonas and Rondônia states. Rev Soc Bras Med Trop. 2020 Oct 21;53:e20190559. doi: https://doi.org/10.1590/0037-8682-0559-2019.
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Baixa escolaridade, falta de acesso à saúde e ausência de sintomas são alguns fatores que retardam o diagnóstico e o cuidado para populações vulneráveis.44. Viana S, Paraná R, Moreira RC, Compri AP, Macedo V. High prevalence of hepatitis B vírus and hepatitis D vírus in the western Brazilian Amazon. Am J Trop Med Hyg. 2005;73(4):808-14. doi: https://doi.org/10.4269/ajtmh.2005.73.808.
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,66. Nunes JDC, Silva DLF, Fonseca LMB, Felipe IMA, Ferreira BR, Santana RC, et al. Unexpected findings of hepatitis B and delta infection in northeastern Brazil: a public health alert. Ann Hepatol. 2021;22:100272. doi: https://doi.org/10.1016/j.aohep.2020.09.016.
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,88. Braga WSM, Castilho MC, Borges FG, Leão JRT, Martinho ACS, Rodrigues IS, et al. Hepatitis D virus infection in the Western Brazilian Amazon: far from a vanishing disease. Rev Soc Bras Med Trop. 2012;45(6):691-5. doi: https://doi.org/10.1590/s0037-86822012000600007
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,99. Souto FJD. Distribution of hepatitis B infection in Brazil: the epidemiological situation at the beginning of the 21st century. Rev Soc Bras Med Trop. 2016;49(1):11-23. doi: https://doi.org/10.1590/0037-8682-0176-2015.
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Apesar das dificuldades regionais, esforços têm sido feitos para controlar o agravo, assegurando-se a oferta de vacinas e medicamentos às comunidades mais remotas. Nos últimos anos, tem-se observado a queda da prevalência de hepatite B em todo o Brasil,99. Souto FJD. Distribution of hepatitis B infection in Brazil: the epidemiological situation at the beginning of the 21st century. Rev Soc Bras Med Trop. 2016;49(1):11-23. doi: https://doi.org/10.1590/0037-8682-0176-2015.
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,1010. Pereira LMM, Martelli CMT, Mérchan-Hamann E, Montarroyos UR, Braga MC, Lima MLC, et al. Population-based multicentric survey of hepatitis B infection and risk factor differences among three regions in Brazil. Am J Trop Med Hyg. 2009;81(2):240-7. doi: https://doi.org/10.4269/ajtmh.2010.09-0488.
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e, como consequência, é possível que a redução dos níveis de prevalência da hepatite D também esteja ocorrendo. A análise das notificações pode indicar se a instituição de medidas de controle da hepatite B ajudaram no combate à hepatite D.

O estudo teve por objetivo analisar a incidência anual de casos de hepatite D no Brasil e na região Norte, no período de 2009 a 2018.

Métodos

Estudo ecológico de análise de série temporal de casos notificados de hepatite D, por município de residência, realizado entre 2009 e 2018, considerando-se o Brasil e todos os estados da região Norte. Foram obtidas informações sobre números absolutos de casos por estado, sexo (masculino; feminino) e idade (dividida em três faixas etárias, em anos: <20; 20 a 39; ≥40), logo incluídas em planilhas eletrônicas. Dados oficiais do Ministério da Saúde, de livre acesso, foram acessados em 20 de setembro de 2020, nos endereços eletrônicos do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) e da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) do Ministério.1111. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde, Sistema de Informação de Agravos de Notificação [Internet]. [Brasília, DF]: MS; c2008 [acesso 28 nov. 2020]. Disponível em: Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sinannet/cnv/hepabr.def
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,1212. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Doenças Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Indicadores e dados básicos das hepatites nos municípios brasileiros [Internet]. [Brasília, DF: c2008; acesso 28 nov. 2020]. Disponível em: Disponível em: http://indicadoreshepatites.aids.gov.br
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Foram considerados e analisados casos notificados como agudos e crônicos. Os municípios com maior número de notificações foram representados em mapa.

Para cálculo de taxa de detecção (casos/população) por 100 mil habitantes, foram utilizadas estimativas populacionais, com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).1313. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. População residente: estimativas para o TCU 2017 [Internet]. [Brasília, DF]: IBGE; 2017 [acesso 22 nov. 2020]. Disponível em: Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9103-estimativas-de-populacao.html?=&t=resultados
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Os dados extraídos e as taxas calculadas foram incluídos em planilhas eletrônicas (Microsoft Office Excel, versão 2016). Para testar a tendência temporal, por estado e faixa etária, foram criados modelos lineares não paramétricos pelo método de Prais-Winsten,1414. Antunes JLF, Cardoso MRA. Uso da análise de séries temporais em estudos epidemiológicos. Epidemiol Serv Saude. 2015;24(3):565-76. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000300024.
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utilizando-se as transformações logarítmicas dos dados (Stata 6.0 - Statacorp, College Station, USA, 1999). As tendências foram classificadas como crescentes, decrescentes ou estacionárias, quando os coeficientes β fossem, respectivamente, significantes positivos, significantes negativos ou não significantes. A variação percentual anual (VPA) foi calculada utilizando-se o coeficiente β da regressão na seguinte fórmula:

VPA= (-1+10β)*100

Intervalos de confiança a 95% (IC95%) da VPA foram calculados. A significância estatística foi definida em <0,05. A estatística de Durbin-Watson (DW) foi utilizada para descartar resultados com autocorrelação.

Resultados

Foram registrados 2.710 casos de hepatite D no país entre 2009 e 2018, sendo 1.529 (56,4%) do sexo masculino. Na região Norte, foram notificados 2.019 (74,5%) casos, sendo 1.283 (63,5%) do sexo masculino. No Brasil e na região Norte, os casos aumentaram até 2011, mantiveram platô até 2014 e declinaram passado esse período (Tabela 1).

Em relação à idade, as séries temporais mostram decréscimo na incidência de casos de hepatite D no país, nas faixas etárias abaixo de 20 (VPA=-43,4% - IC95% -55,5;-28,0 - p-valor=0,001) e de 20 a 39 anos (VPA=-29,1% - IC95% -43,5;-11,0 - p-valor=0,008). Acima de 40 anos, a queda observada não foi estatisticamente significativa (VPA=-4,9% - IC95% -23,4;18,1 - p-valor=0,605).

A taxa de detecção anual de hepatite D na região Norte variou entre 0,23 e 1,27 por 100 mil hab., superior à taxa nacional, que variou de 0,06 a 0,20/100 mil hab. A maioria dos casos do Norte (1.189) foi notificada no Amazonas (58,9%) e no Acre (29,2%), estado que também foi o primeiro em concentração de casos, com taxa de detecção variando de 1,8 a 13,2/100 mil hab. (Tabela 1). Pará, Roraima, Amapá e Tocantins, somados, apresentaram 82 casos (4,1%), com baixas taxas de detecção (Figura 1).

A análise de série temporal (Tabela 1) mostrou tendência decrescente da incidência anual de hepatite D no período de 2009 a 2018, para o Brasil (p-valor=0,025), a região Norte (p-valor=0,025) e os estados do Acre (p-valor=0,004) e do Amazonas (p-valor<0,05). A estatística de Durbin-Watson mostrou que não houve autocorrelação. Para os demais estados do Norte, não houve significância estatística ou ocorreu autocorrelação. Na soma das outras quatro regiões do país, a taxa de detecção foi muito baixa e não mostrou tendência de alta ou queda no período (p-valor=0,339).

Entre os 60 casos notificados como hepatite D aguda, Amazonas (36) e Acre (12) registraram a maioria, sendo que apenas 16 (26,7%) foram detectados depois de 2013.

A análise por município de residência mostrou que, no Acre, 82,7% dos casos de hepatite D se concentraram em seis municípios, especialmente em Rio Branco -226 (43,8%) e Cruzeiro do Sul, 143 (27,5%). No Amazonas, 78% dos casos estavam concentrados em oito municípios. Já em Rondônia, 64 (40,2%) casos foram registrados em Porto Velho (Figura 2).

Tabela 1
- Análise de tendência pelo método de Prais-Winsten da taxa de detecção de hepatite D (casos por 100 mil hab.) e variação percentual anual, por estado da região Norte, região Norte e Brasil, 2009-2018

Figura 1
- Taxa de detecção de hepatite D (casos por 100 mil hab.) nos estados da região Norte e no Brasil, 2009-2018

Figura 2
- Amazônia Ocidental brasileira, com os municípios de residência dos casos nos três estados brasileiros com mais notificações de hepatite D, 2009-2018

Discussão

O presente estudo mostrou declínio na detecção de casos de hepatite D no país, como consequência da queda na região Norte, onde a doença foi identificada como endêmica desde os anos 1970.1515. Fonseca JC, Simonetti SR, Schatzmayr HG, Castejón MJ, Cesário AL, Simonetti JP. Prevalence of infection with hepatitis D virus (HDV) among carriers of hepatitis B surface antigen in Amazonas State, Brazil. Trans R Soc Trop Med Hyg. 1988;82(3):469-71. doi: https://doi.org/10.1016/0035-9203(88)90166-6
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Essa tendência foi significativa sobretudo entre os mais jovens. No período 2009-2018, houve maior proporção de notificações nos estados que correspondem ao sudoeste da Amazônia Ocidental (Acre, Amazonas e Rondônia), onde se encontram as maiores prevalências no país.11. Scarponi CFO, Silva RDN, Souza-Filho JA, Guerra MRL, Pedrosa MAF, Mol MPG. Hepatitis D prevalence in South America: a systematic review and meta-analysis. Rev Soc Bras Med Trop. 2018;52:e20180289. doi: https://doi.org/10.1590/0037-8682-0289-2018.
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,44. Viana S, Paraná R, Moreira RC, Compri AP, Macedo V. High prevalence of hepatitis B vírus and hepatitis D vírus in the western Brazilian Amazon. Am J Trop Med Hyg. 2005;73(4):808-14. doi: https://doi.org/10.4269/ajtmh.2005.73.808.
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,88. Braga WSM, Castilho MC, Borges FG, Leão JRT, Martinho ACS, Rodrigues IS, et al. Hepatitis D virus infection in the Western Brazilian Amazon: far from a vanishing disease. Rev Soc Bras Med Trop. 2012;45(6):691-5. doi: https://doi.org/10.1590/s0037-86822012000600007
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Análise das séries temporais mostrou queda significativa na taxa de detecção no Acre e no Amazonas, influenciando os números da hepatite D na região Norte e no país como um todo.

Alguns autores,66. Nunes JDC, Silva DLF, Fonseca LMB, Felipe IMA, Ferreira BR, Santana RC, et al. Unexpected findings of hepatitis B and delta infection in northeastern Brazil: a public health alert. Ann Hepatol. 2021;22:100272. doi: https://doi.org/10.1016/j.aohep.2020.09.016.
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,88. Braga WSM, Castilho MC, Borges FG, Leão JRT, Martinho ACS, Rodrigues IS, et al. Hepatitis D virus infection in the Western Brazilian Amazon: far from a vanishing disease. Rev Soc Bras Med Trop. 2012;45(6):691-5. doi: https://doi.org/10.1590/s0037-86822012000600007
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ao estudarem comunidades rurais na última década, identificaram elevada prevalência de hepatite D entre os portadores da hepatite B, que gera preocupação sobre o controle endêmico da doença. No entanto, os números da hepatite B vêm caindo no país,99. Souto FJD. Distribution of hepatitis B infection in Brazil: the epidemiological situation at the beginning of the 21st century. Rev Soc Bras Med Trop. 2016;49(1):11-23. doi: https://doi.org/10.1590/0037-8682-0176-2015.
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provavelmente em função da melhoria nas medidas de biossegurança, triagem de doadores e, principalmente, da vacinação universal de crianças.99. Souto FJD. Distribution of hepatitis B infection in Brazil: the epidemiological situation at the beginning of the 21st century. Rev Soc Bras Med Trop. 2016;49(1):11-23. doi: https://doi.org/10.1590/0037-8682-0176-2015.
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,1010. Pereira LMM, Martelli CMT, Mérchan-Hamann E, Montarroyos UR, Braga MC, Lima MLC, et al. Population-based multicentric survey of hepatitis B infection and risk factor differences among three regions in Brazil. Am J Trop Med Hyg. 2009;81(2):240-7. doi: https://doi.org/10.4269/ajtmh.2010.09-0488.
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Com o progressivo controle da hepatite B no país, seria esperado igual efeito sobre a hepatite D, dependente da primeira.

Dado que corrobora a impressão de controle gradual e a importância da vacinação é o “envelhecimento” dos casos, com tendência de queda significativa até os 39 anos e não acima dessa idade. Os segmentos mais jovens da população brasileira são os que mais se beneficiaram da vacinação, pois têm sido vacinados há mais tempo. A vacinação para todas as idades só foi liberada há poucos anos. A progressiva queda na detecção de casos de hepatite D aguda, igualmente, sugere controle paulatino da doença.

Os municípios do estado do Amazonas com mais notificações estão próximos à fronteira com o Acre, assim como os dois municípios mais afetados de Rondônia. A confluência desses municípios corresponde à área banhada pelos afluentes dos rios Juruá, Purus e Madeira, historicamente identificada como de maior endemicidade para as hepatites B e D no país.22. Lempp FA, Urban F. Hepatitis delta virus: replication strategy and upcoming therapeutic options for a neglected human pathogen. Viruses. 2017 Jul 4;9(7):172. doi: https://doi.org/10.3390/v9070172.
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,33. Goyal A, Romero-Severson EO. Screening for hepatitis D and PEG-interferon over tenofovir enhance general hepatitis control efforts in Brazil. PLoS One. 2018 Sep 7;13(9):e0203831. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0203831.
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,88. Braga WSM, Castilho MC, Borges FG, Leão JRT, Martinho ACS, Rodrigues IS, et al. Hepatitis D virus infection in the Western Brazilian Amazon: far from a vanishing disease. Rev Soc Bras Med Trop. 2012;45(6):691-5. doi: https://doi.org/10.1590/s0037-86822012000600007
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As limitações deste estudo são inerentes aos sistemas de notificação de agravos, universalmente sujeitos a subnotificação e inconsistências. Isso se torna mais preocupante na Amazônia, por conta de dificuldades logísticas para as ações de vigilância e oferta de assistência à saúde, em áreas de difícil acesso e com condições precárias para conservação de insumos e equipamentos. Ainda há o agravante da falta crônica de reagentes para diagnóstico da hepatite D, uma vez que os kits são caros e difíceis de obter, por se tratar de doença negligenciada, objeto de poucos investimentos da indústria de insumos biomédicos.22. Lempp FA, Urban F. Hepatitis delta virus: replication strategy and upcoming therapeutic options for a neglected human pathogen. Viruses. 2017 Jul 4;9(7):172. doi: https://doi.org/10.3390/v9070172.
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,33. Goyal A, Romero-Severson EO. Screening for hepatitis D and PEG-interferon over tenofovir enhance general hepatitis control efforts in Brazil. PLoS One. 2018 Sep 7;13(9):e0203831. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0203831.
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Provavelmente, o número real de casos é maior que o de notificações, especialmente porque a doença pode se manter assintomática por longos períodos. Porém, não há tendência de aumento de subnotificação, uma vez que o sistema brasileiro de vigilância epidemiológica vem se aperfeiçoando nas últimas décadas.1616. Oliveira CM, Cruz MM. Sistema de vigilância em saúde no Brasil: avanços e desafios. Saude Debate. 2015;39(104):255-67.doi: https://doi.org/10.1590/0103-110420151040385.
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A técnica de Prais-Winsten, para modelar séries temporais, pode induzir a erro pela autocorrelação de resíduos, especialmente em séries pequenas.1414. Antunes JLF, Cardoso MRA. Uso da análise de séries temporais em estudos epidemiológicos. Epidemiol Serv Saude. 2015;24(3):565-76. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000300024.
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Para evitar esse erro, utilizou-se a estatística de Durbin-Watson e foram desconsideradas as séries com autocorrelação.

Outra limitação do estudo encontra-se no desconhecimento de onde e quando essas pessoas foram infectadas. No entanto, os casos notificados como agudos são um indicativo de infecção recente. Como foi demonstrado aqui, esses casos estão diminuindo.

Apesar da tendência de queda, a hepatite D continua a ser detectada, principalmente entre os mais velhos. Muitos desses casos são fruto de infecções antigas, muitas vezes identificadas apenas em estágios avançados. Além de reforçar a vacinação contra hepatite B, é importante incrementar a busca ativa de casos de hepatite D entre os portadores da hepatite B, com o intuito de se implementar o tratamento em fases iniciais da doença.

A análise da incidência de hepatite D na região Norte, entre 2009 e 2018, sugere que a doença está em declínio, especialmente nos estratos mais jovens de sua população. O esforço de vacinação contra a hepatite B, iniciado décadas atrás, pode ser a razão dessa melhora. Manter altos níveis de cobertura vacinal, incluindo os estratos mais velhos da população, deve ser incentivado como estratégia fundamental para alcançar a eliminação do agravo na região.

Referências

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    Scarponi CFO, Silva RDN, Souza-Filho JA, Guerra MRL, Pedrosa MAF, Mol MPG. Hepatitis D prevalence in South America: a systematic review and meta-analysis. Rev Soc Bras Med Trop. 2018;52:e20180289. doi: https://doi.org/10.1590/0037-8682-0289-2018.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Out 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    12 Out 2020
  • Aceito
    15 Jun 2021
Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente - Ministério da Saúde do Brasil Brasília - Distrito Federal - Brazil
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