Distribuição dos casos de tuberculose no Paraná: um estudo ecológico, 2018-2021

Lucas Vinícius de Lima Gabriel Pavinati Andressa Aya Ohta Nelly Lopes de Moraes Gil Débora Regina de Oliveira Moura Gabriela Tavares Magnabosco Sobre os autores

RESUMO

Objetivo:

analisar a distribuição dos casos de tuberculose no Paraná, Brasil, entre 2018 e 2021.

Métodos:

estudo ecológico e sobre dados secundários oriundos de notificações compulsórias; descrição das taxas de detecção por 100 mil habitantes segundo regiões de saúde do estado; cálculo das variações percentuais entre 2018-2019 e 2020-2021.

Resultados:

foram registrados 7.099 casos, observando-se maiores taxas nas regionais de Paranaguá (52,4/100 mil em 2018-2019; 38,2/100 mil em 2020-2021) e Foz do Iguaçu (34,4/100 mil em 2018-2019; 20,5/100 mil em 2020-2021), e menores em Irati (6,3/100 mil em 2018-2019; 8,8/100 mil em 2020-2021) e Francisco Beltrão (8,5/100 mil em 2018-2019; 7,6/100 mil em 2020-2021); em 2020-2021, houve queda nas variações percentuais dessas taxas em 18 regionais e aumento em quatro, destacando-se, respectivamente, Foz do Iguaçu (-40,5%) e Cianorte (+53,6%).

Conclusão:

foram observadas taxas elevadas nas regionais do litoral e da tríplice fronteira; houve declínio das taxas de detecção no período pandêmico.

Palavras-chave:
Tuberculose Pulmonar; Epidemiologia; Saúde Pública; Análise Espacial; Estudos Ecológicos

INTRODUÇÃO

A tuberculose (TB) é um dos principais problemas de saúde pública e causa de mortes por doenças infeciosas no mundo.11. World Health Organization. Global tuberculosis report 2021 [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2021 [cited 2022 May 18]. Available from: Available from: https://apps.who.int/iris/rest/bitstreams/1379788/retrieve
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Até o advento da pandemia da covid-19 em 2020, quando foram revertidos progressos históricos de controle e enfrentamento de diversas condições de saúde, a TB era a principal causa de mortalidade por um único agente infeccioso, superando a síndrome da imunodeficiência adquirida (ou aids, como é popularmente conhecida a doença, da sigla em inglês para adquired immunodeficiency syndrome).11. World Health Organization. Global tuberculosis report 2021 [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2021 [cited 2022 May 18]. Available from: Available from: https://apps.who.int/iris/rest/bitstreams/1379788/retrieve
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)-(33. Fukunaga R, Glaziou P, Harris JB, Date A, Floyd K, Kasaeva T. Epidemiology of tuberculosis and progress toward meeting global targets - worldwide, 2019. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2021;70(12):427-30. doi: 10.15585/mmwr.mm7012a4
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Em 2019, 7,1 milhões de pessoas foram diagnosticadas com TB no mundo, seguindo-se um declínio dos casos da doença para aproximadamente 5,8 milhões em 2020, número aquém dos 10 milhões esperados pela Organização Mundial da Saúde (OMS).11. World Health Organization. Global tuberculosis report 2021 [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2021 [cited 2022 May 18]. Available from: Available from: https://apps.who.int/iris/rest/bitstreams/1379788/retrieve
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O Brasil e mais 15 países responderam por cerca de 93% dessa queda;44. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Boletim Epidemiológico de Tuberculose - 2022. Brasília: Ministério da Saúde; 2022 [citado 2022 Maio 17]. Disponível em: Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2022/boletim-epidemiologico-de-tuberculose-2022
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em 2021, foram notificados no país pouco mais de 68 mil casos, 2,7% deles no estado do Paraná.44. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Boletim Epidemiológico de Tuberculose - 2022. Brasília: Ministério da Saúde; 2022 [citado 2022 Maio 17]. Disponível em: Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2022/boletim-epidemiologico-de-tuberculose-2022
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A End TB Strategy, programa lançado pela OMS em 2015, estabeleceu metas ambiciosas para a redução da incidência da infecção em 90% e da mortalidade em 95%, até o final do ano de 2035.55. World Health Organization. The end TB strategy. Geneva: World Health Organization; 2015 [cited 2022 May 18]. Available from: Available from: https://www.who.int/teams/global-tuberculosis-programme/the-end-tbstrategy
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No Brasil, a saúde pública pactuou recomendações formalizadas pelo Brasil Livre da Tuberculose: Plano Nacional pelo Fim da Tuberculose como Problema de Saúde Pública, programa de ações em saúde lançado no ano de 2017 e revisado em 2021.66. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Brasil Livre da Tuberculose: Plano Nacional pelo Fim da Tuberculose como Problema de Saúde Pública: Estratégias para 2021-2025. Brasília: Ministério da Saúde; 2021 [citado 2022 Maio 17]. Disponível em: Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-deconteudo/publicacoes/publicacoes-svs/tuberculose/plano-nacional-pelo-fim-da-tuberculose-comoproblema-de-saude-publica_-estrategias-para-2021-2925.pdf/view
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Embora tenham-se alcançado resultados exitosos no caminho pelo fim da TB, o declínio na notificação dos casos observado ainda é insuficiente para atingir as metas nacionais e globais.33. Fukunaga R, Glaziou P, Harris JB, Date A, Floyd K, Kasaeva T. Epidemiology of tuberculosis and progress toward meeting global targets - worldwide, 2019. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2021;70(12):427-30. doi: 10.15585/mmwr.mm7012a4
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) Isso requer mais esforços no sentido de aprimorar a capacidade dos sistemas de vigilância, alcançar os objetivos pactuados e, finalmente, a sustentabilidade no controle da TB.22. Hino P, Yamamoto TT, Magnabosco GT, Bertolozzi MR, Taminato M, Fornari LF. Impacto da covid-19 no controle e reorganização da atenção à tuberculose. Acta Paul Enferm. 2021;34:eAPE002115. doi: 10.37689/acta-ape/2021AR02115
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),(33. Fukunaga R, Glaziou P, Harris JB, Date A, Floyd K, Kasaeva T. Epidemiology of tuberculosis and progress toward meeting global targets - worldwide, 2019. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2021;70(12):427-30. doi: 10.15585/mmwr.mm7012a4
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Tais esforços (ou sobre-esforços) devem considerar a complexidade de fatores determinantes da infecção, incluindo recursos de saúde disponíveis, nível de escolaridade, renda e ocupação laboral, densidade populacional, condições climáticas e de vida dos brasileiros. Para tanto, faz-se necessário o direcionamento de intervenções em saúde e o controle da TB em particular dependem sobretudo da avaliação das populações em seu contexto espacial.77. Trauer JM, Dodd PJ, Gomes MGM, Gomes GB, Houben RMGJ, McBryde EM, et al. The importance of heterogeneity to the epidemiology of tuberculosis. Clin Infect Dis. 2019;69(1):159-66. doi: 10.1093/cid/ciy938
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),(88. Zhang Q, Song W, Liu S, An Q, Tao N, Zhu X, et al. An ecological study of tuberculosis incidence in China, from 2002 to 2018. Front Public Health. 2022;18(9):766362. doi: 10.3389/fpubh.2021.766362
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Nesse sentido, as dimensões continentais do Brasil e a existência de desigualdades regionais implicam a possibilidade de dessemelhanças nos níveis de transmissão da TB, apontando para a importância de estudos com diferentes recortes territoriais.

Este estudo teve por objetivo analisar a distribuição dos casos de TB no estado do Paraná, Sul do Brasil, no período de 2018 a 2021.

MÉTODOS

Estudo ecológico sobre as regiões de saúde do Paraná, desenvolvido com dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan)/Ministério da Saúde e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), acessados em 17 de maio de 2022 pelo Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus). A pesquisa se ancorou no REporting of studies Conducted using Observational Routinely-Collected Health Data (RECORD).99. Benchimol EI, Smeeth L, Guttmann A, Harron K, Moher D, Petersen I, et al. The REporting of studies Conducted using Observational Routinely-collected health Data (RECORD) statement. PLoS Med. 2015;12(10):e1001885. doi: 10.1371/journal.pmed.1001885
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As 27 Unidades da Federação (UFs) brasileiras encontram-se distribuídas em cinco grandes regiões nacionais: Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste. O Paraná, segundo estimativas do IBGE para 2021, é o estado mais populoso da região Sul, com 11.597.484 habitantes; divide-se em quatro macrorregionais e 22 regionais de saúde pelas quais, mediante essa organização administrativo-sanitária descentralizada, são implantados programas, ações e serviços de saúde voltados à população.1010. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Cidades e estados: Paraná. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2022 [citado 2023 Nov 23]. Disponível em: Disponível em: https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/pr.html
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),(1111. Santos L. Região de saúde e suas redes de atenção: modelo organizativo-sistêmico do SUS. Cien Saude Colet. 2017;22(4):1281-9. doi: 10.1590/1413-81232017224.26392016
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A população estudada constituiu-se dos casos novos de TB pulmonar notificados no Sinan, levantada entre as categorias “caso novo”, “não sabe” e “pós-óbito” diagnosticados no período de 2018 a 2021. O recorte do público-alvo teve como marco histórico o Brasil Livre da Tuberculose:66. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Brasil Livre da Tuberculose: Plano Nacional pelo Fim da Tuberculose como Problema de Saúde Pública: Estratégias para 2021-2025. Brasília: Ministério da Saúde; 2021 [citado 2022 Maio 17]. Disponível em: Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-deconteudo/publicacoes/publicacoes-svs/tuberculose/plano-nacional-pelo-fim-da-tuberculose-comoproblema-de-saude-publica_-estrategias-para-2021-2925.pdf/view
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foram contemplados os registros após a implementação do programa, em 2018, e os registros mais recentes disponíveis no Sinan, na data de acesso dos autores ao banco do sistema.

Foram analisadas as variáveis “ano de diagnóstico” e “região de saúde” de notificação. Os dados foram exportados para o software Microsoft Excel 2016® e as frequências absolutas e relativas estimadas. Realizou-se o cálculo das taxas de detecção (tx) ano a ano, a partir da razão do número de casos sobre a população estimada, para o mesmo período e região de saúde, e o resultado multiplicado por 100 mil habitantes.

Sobre as taxas calculadas, procedeu-se à construção de mapas coropléticos com o uso do software QGIS® em sua versão 3.26.3, tendo como base o shapefile com os limites das regiões, acessado no site do Portal Brasileiro de Dados Abertos. A distribuição espacial deu-se pelas quebras naturais, em que foram atribuídas cores definidas em uma escala: os tons mais escuros corresponderam às maiores taxas, e os mais claros, às menores.

Outrossim, os dados referentes às taxas foram agrupados em biênios. Com base na média aritmética dos anos inscritos nos períodos 2018-2019 e 2020-2021, estimou-se a variação percentual (VP) entre ambos os períodos. Esse cálculo consistiu da subtração entre as taxas do último biênio e do primeiro biênio, seguida pela divisão do valor obtido pelo primeiro biênio, e o resultado multiplicado por 100.

Por se tratar de um estudo que utilizou dados de domínio público, agregados e sem identificação dos participantes, seu projeto foi dispensado de apreciação por um Comitê de Ética em Pesquisa (CEP). Entretanto, foram cumpridas as normas e diretrizes recomendadas pela Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) nº 466, de 12 de dezembro de 2012.

RESULTADOS

Entre 2018 e 2021, foram registrados 7.099 novos casos de TB pulmonar no estado do Paraná, distribuídos no período da seguinte forma: 1.883 (26,5%; 16,6/100 mil hab.) em 2018; 1.915 (27,0%; 16,7/100 mil hab.) em 2019; 1.777 (25,0%; 15,4/100 mil hab.) em 2020; e 1.524 (21,5%; 13,1/100 mil hab.) em 2021 (dados não apresentados em tabela ou figura).

Quanto à distribuição espacial, foram observadas maiores taxas de detecção, principalmente, nas macrorregiões Noroeste e Norte do estado. Cumpre pontuar que as regionais de Paranaguá e Foz do Iguaçu apresentaram as maiores taxas para todos os anos analisados, enquanto os menores valores foram encontrados em Irati e Francisco Beltrão (Figura 1).

Sobre a variação percentual das taxas de detecção de TB, notou-se queda em todas as macrorregionais, maior para a Oeste (-22,8%). As regionais também apresentaram variação, havendo queda em 18, com destaque para Foz do Iguaçu (-40,5%), Apucarana (-32,3%), União da Vitória (-29,9%) e Paranaguá (-27,2%), e aumento em quatro, observando-se em Cianorte (+53,6%) o mais expressivo (Tabela 1).

Figura 1
Distribuição espacial das taxas de detecção da tuberculose pulmonar (por 100 mil hab.) segundo regiões de saúde, Paraná, 2018 (A), 2019 (B), 2020 (C) e 2021 (D)

Tabela 1
Taxas médias de detecção da tuberculose pulmonar (por 100 mil hab.) e variação percentual, segundo macrorregiões e regiões de saúde, Paraná, 2018-2019 e 2020-2021

DISCUSSÃO

A distribuição dos casos de TB demonstrou, entre os anos analisados, maior concentração nas macrorregiões Norte e Noroeste do Paraná, além de altas taxas nas regionais de Paranaguá e Foz do Iguaçu, e baixas em Irati e Francisco Beltrão. Em 2020-2021, houve queda para praticamente todas as regiões no período pandêmico, destacando-se Foz do Iguaçu.

Sabe-se que a TB é uma doença social de aspectos biológicos, cujas ocorrência e transmissão estão atreladas a desigualdade e determinantes socioeconômicos.88. Zhang Q, Song W, Liu S, An Q, Tao N, Zhu X, et al. An ecological study of tuberculosis incidence in China, from 2002 to 2018. Front Public Health. 2022;18(9):766362. doi: 10.3389/fpubh.2021.766362
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),(1212. Khan MK, Islam MN, Ferdous J, Alam MM. An overview on epidemiology of tuberculosis. Mymensingh Med J. 2019;28(1):259-66.),(1313. Prado Junior JC, Medronho RA. Spatial analysis of tuberculosis cure in primary care in Rio de Janeiro, Brazil. BMC Public Health. 2021;21(1):1841. doi: 10.1186/s12889-021-11834-1
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Essas características relacionam-se aos contextos nos quais os indivíduos se inserem, haja vista a alta incidência percebida em áreas de vulnerabilidade.88. Zhang Q, Song W, Liu S, An Q, Tao N, Zhu X, et al. An ecological study of tuberculosis incidence in China, from 2002 to 2018. Front Public Health. 2022;18(9):766362. doi: 10.3389/fpubh.2021.766362
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),(1414. Pereira TV, Nogueira MC, Campos EMS. Spatial analysis of tuberculosis and its relationship with socioeconomic indicators in a medium-sized city in Minas Gerais. Rev Bras Epidemiol. 2021;24(suppl 1):e210021. doi: 10.1590/1980-549720210021.supl.1
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No Paraná, evidenciou-se predomínio de casos nas macrorregiões Norte e Noroeste, próximas aos estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, bem como nas regiões de fronteira com dois países da América do Sul - Argentina e Paraguai - e nas regiões mais próximas ao litoral do estado.

As regiões de fronteira são consideradas áreas marginalizadas, periféricas e com déficit na integração socioeconômica, impactando diretamente na saúde da sociedade.1515. Nogueira VD, Xavier-Gomes LM, Barbosa TLA. Mortalidade por homicídios em linha de fronteira no Paraná, Brasil. Cien Saude Colet. 2020;25(8):3107-18. doi: 10.1590/1413-81232020258.28522018
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Sob o olhar epidemiológico, cumpre considerar as características comuns a essas regiões, especialmente entre cidades gêmeas, como na regional de saúde de Foz do Iguaçu.1616. Aikes S, Rizzotto MLF. Integração regional em cidades gêmeas do Paraná, Brasil, no âmbito da saúde. Cad Saude Publica. 2018;34(8):e00182117. doi: 10.1590/0102-311X00182117
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)

Portanto, a articulação das ações de vigilância entre os países é primordial, uma vez que, para a transmissão do agravo, não há limite territorial.1616. Aikes S, Rizzotto MLF. Integração regional em cidades gêmeas do Paraná, Brasil, no âmbito da saúde. Cad Saude Publica. 2018;34(8):e00182117. doi: 10.1590/0102-311X00182117
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O fluxo transfronteiriço intenso no sentido do Paraná reflete a busca por sistemas de saúde mais qualificados, sobrecarregando os serviços e repercutindo negativamente nos indicadores das regiões de saúde fronteiriças, no estado.1717. Hortelan MS, Almeida ML, Fumincelli L, Zilly A, Nihei OK, Peres AM, et al. Papel do gestor de saúde pública em região de fronteira: scoping review. Acta Paul Enferm. 2019;32(2):229-36. doi: 10.1590/1982-0194201900031
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Ademais, a maior detecção pode estar associada a fatores ecológicos. Territórios com altitudes mais baixas, caso da regional de Paranaguá, e temperaturas elevadas, como nas macrorregiões Norte e Noroeste, referem as maiores taxas de notificação de TB.1818. Gelaw YA, Yu W, Magalhães RJS, Assefa Y, Williams G. Effect of temperature and altitude difference on tuberculosis notification: a systematic review. J Glob Infect Dis. 2019;11(2):63-8. doi: 10.4103/jgid.jgid_95_18
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Todavia, não há consenso em torno desse tema.

Os resultados também revelaram queda na detecção da doença. A vigilância constitui ação primordial de saúde pública;1919. Magnabosco GT, Órfão NH, Brunello MEF, Wysocki AD, Lopes LM, Campoy LT. Novas doenças e ameaças antigas: a repercussão da covid-19 no manejo da tuberculose. Saude Coletiva (Barueri). 2020;10(54):2639-44. doi: 10.36489/saudecoletiva.2020v10i54p2639-2644
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),(2020. Siqueira TC, Martellet MG, Tavernard GLN, Silva VM, Moura STS, Silva LAF, et al. Percepção de enfermeiros: enfoque na família e orientação para a comunidade nas ações de tuberculose. Cienc Cuid Saude. 2020;19:e50175. doi: 10.4025/ciencuidsaude.v19i0.50175
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contudo, reconhece-se que sistemas de vigilância frágeis podem levar à subnotificação da TB.2121. Silva GDM, Duarte EC, Cruz OG, Garcia LP. Identificação de microrregiões com subnotificação de casos de tuberculose no Brasil, 2012 a 2014. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(1):e2018485. doi: 10.5123/S1679-49742020000100025
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É possível que tal fragilidade se acentue no contexto da covid-19. Estudos realizados na Índia e em Serra Leoa evidenciaram, respectivamente, redução de 63,3% e 70,0% nas notificações de TB.2222. Arentz M, Ma J, Zheng P, Vos T, Murray CJL, Kyu HH. The impact of the COVID-19 pandemic and associated suppression measures on the burden of tuberculosis in India. BMC Infect Dis. 2022;22(1):92. doi: 10.1186/s12879-022-07078-y
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),(2323. Lakoh S, Jiba DF, Baldeh M, Adekanmbi O, Barrie U, Seissay AL, et al. Impact of COVID-19 on tuberculosis case detection and treatment outcomes in Sierra Leone. Trop Med Infect Dis. 2021;6(3):154. doi: 10.3390/tropicalmed6030154
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A centralização das ações e dos serviços de saúde no enfrentamento da pandemia trouxe barreiras para o controle de condições preexistentes.2424. Souza ASR, Amorim MMR, Melo ASO, Delgado AM, Forêncio ACMCC, Oliveira TV, et al. Aspectos gerais da pandemia da covid-19. Rev Bras Saude Mater Infant. 2021;21(Suppl 1):529-46. doi: 10.1590/1806-9304202100S100003
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),(2525. Couto MT, Barbieri CLA, Matos CCSA. Considerações sobre o impacto da covid-19 na relação indivíduosociedade: da hesitação vacinal ao clamor por uma vacina. Saude Soc. 2021;30(1):e200450. doi: 10.1590/S0104-12902021200450
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Disto, apreende-se que a interrupção de atividades assistenciais gerou impactos significativos na detecção e no manejo da TB.2626. Jain VK, Iyengar KP, Samy DA, Vaishya R. Tuberculosis in the era of COVID-19 in India. Diabetes Metab Syndr. 2020;14(5):1439-43. doi: 10.1016/j.dsx.2020.07.034
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),(2727. Fei H, Yinyin X, Hui C, Ni W, Xin D, Wei C, et al. The impact of the COVID-19 epidemic on tuberculosis control in China. Lancet Reg Health West Pac. 2020;3:100032 doi: 10.1016/j.lanwpc.2020.100032
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Nesse cenário, percebe-se que as conquistas pelo controle da TB foram ameaçadas no cenário pandêmico.

É mister pontuar que a pesquisa apresenta limitações. O uso de dados secundários pode estar condicionado a erros no preenchimento e subnotificação/subdetecção dos casos, especialmente em um contexto agravado pela pandemia. Outra limitação deste trabalho refere-se às taxas de detecção calculadas com base em estimativas populacionais, as quais podem não refletir o real quantitativo da população.

Conclui-se que este estudo evidenciou queda da detecção da TB como possível consequência da sobrecarga assistencial e da vigilância epidemiológica, diante da emergência da covid-19. A análise da distribuição espacial apontou para maior detecção dos casos de TB em determinadas áreas do estado do Paraná, sugerindo relações dessas ocorrências com aspectos ecológicos e socioeconômicos.

Referências bibliográficas

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  • FINANCIAMENTO

    O presente trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior/Ministério da Educação (Capes/MEC) - Código de Financiamento 001 .
  • Editora associada:

    Amanda Coutinho de Souza - http://orcid.org/0000-0002-6362-8220

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    07 Set 2022
  • Aceito
    13 Dez 2022
Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente - Ministério da Saúde do Brasil Brasília - Distrito Federal - Brazil
E-mail: ress.svs@gmail.com