Prática de exames de rastreio para câncer de mama e fatores associados – Inquérito de Saúde da Mulher em Uberaba MG, Brasil, 2014

Mariana Colombini Buranello Maria Cristina Cortez Carneiro Meirelles Isabel Aparecida Porcatti de Walsh Gilberto de Araujo Pereira Shamyr Sulyvan de Castro Sobre os autores

Resumo

Os objetivos deste estudo foram caracterizar o perfil socioeconômico e epidemiológico das mulheres em Uberaba, segundo a prática de exames de rastreio para câncer de mama, bem como verificar os fatores associados à prática. Pesquisa transversal de base populacional, parte do Inquérito de Saúde da Mulher em Uberaba MG. Coleta por entrevista domiciliar, referentes à questões socioeconômicas, epidemiológicas e prática de exames de rastreio para câncer de mama. Amostra foi composta por 1.520 mulheres acima de 20 anos. Após o processamento dos dados, foi realizada análise estatística com medidas de associação pelo teste Qui-Quadrado; regressão bivariada e multivariada de Poisson, significância de 5%. Os resultados demonstraram um perfil de prática de exames de rastreio para câncer de mama com mulheres de raça/cor branca (66%), escolaridade e renda per capita elevada, estado conjugal “em união” (67,5%), não chefes de família (64,4%) e não tabagistas (64,6%). Os fatores associados à maior prática dos exames foram a faixa etária de 40-49 e 50-69 anos (RP = 0,7 e 0,64), renda per capita maior que um salário mínimo (RP = 1,17) e fonte de pagamento da mamografia pública ou por plano de saúde (RP = 1,98 e 1,94). Conclui-se que existem fatores relacionados à prática de exames de rastreio na amostra estudada.

Saúde da mulher; Prevenção secundária; Inquéritos epidemiológicos

Introdução

Mundialmente, o tipo de câncer mais frequente em relação às mulheres é o de mama, correspondendo a 23% do total de novos casos dessa doença. No Brasil, em 2014 sua incidência esteve em torno de 57 mil novos casos11. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA). Estimativa 2014: Incidência de Câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA; 2014.. A maioria das mortes por esta causa ocorre em países em desenvolvimento, tornando-se um problema de saúde pública22. Torre LA, Freddie B, Siegel RL, Ferlay J, Lortet-Tieulent J, Jemal A. Global Cancer Statistics, 2012. CA Cancer J. Clin. 2015; 65(2):87-108.. O câncer de mama é responsável pela maior taxa de mortalidade por câncer nas mulheres brasileiras, com 11,1 óbitos para 100 mil mulheres. A mortalidade expressiva dessa doença ocorre não apenas devido à sua alta incidência, mas também ao fato de cerca de 60% dos casos serem descobertos tardiamente33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011..

O rastreamento e o diagnóstico precoce são as únicas formas de diminuir a mortalidade desta doença. As ações de diagnóstico precoce contribuem para a redução do avanço da doença em seus estágios subsequentes, sendo caracterizadas pela abordagem de pessoas com sinais e/ou sintomas da doença33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011.. As ações de rastreio envolvem a detecção do câncer em populações assintomáticas e são dirigidas às mulheres na faixa etária em que o balanço entre benefícios e riscos do rastreamento é mais favorável, com maior impacto na redução da mortalidade33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011..

No Brasil, o exame clínico das mamas (ECM) e a mamografia (MGG) são as estratégias de rastreio. A MMG possibilita a detecção de alterações ainda não palpáveis, o que facilita um tratamento mais efetivo44. Silva RCF, Hortale VA. Rastreamento do Câncer de Mama no Brasil: Quem, Como e Por quê? Revista Brasileira de Cancerologia 2012; 58(1):67-77., com a recomendação de que mulheres de 50 a 69 anos realizem a mamografia a cada dois anos e o exame clínico das mamas anualmente. Para as mulheres de 40 a 49 anos, o exame clínico anual e, em caso de resultado alterado, a mamografia diagnóstica são indicados. Já para grupos de risco, que envolvam histórico familiar e diagnósticos anteriores de câncer, recomenda-se o exame clínico das mamas e mamografia anuais a partir dos 35 anos55. Matos JC, Pelloso DM, Carvalho MDB. Fatores associados à realização da prevenção secundária do câncer de mama no Município de Maringá, Paraná, Brasil. Cad Saude Publica 2011; 27(5):888-898..

O acesso às ações de rastreamento do câncer de mama tem sido relacionado à algumas iniquidades em saúde. Alguns fatores podem influenciar positivamente e negativamente a realização dos exames de rastreio, como a situação econômica, a escolaridade, a renda, a etnia, o número de consultas médicas, a localização do domicílio e a fonte de pagamento dos exames de rastreamento66. Amorim VMSL, Barros MBA, César CLG, Carandina L, Goldbaum M. Fatores associados a não realização da mamografia e do exame clínico das mamas: um estudo de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica 2008; 24(11):2623-2632.. Neste contexto, a idade também deve ser considerada, visto que idosas acima de 70 anos não são incluídas nos programas de rastreamento mamográfico33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011..

Considerando o aumento na incidência de casos de câncer de mama no país, seu custo e impacto para os serviços de saúde e à sociedade como um todo, além da importância da detecção da doença em estágios precoces a fim de reduzir a mortalidade e possíveis fatores associados à prática dos exames de detecção precoce, é necessário conhecer o perfil de prática de exames de rastreio para câncer de mama na população e suas particularidades. Tais informações são valiosas para os serviços, profissionais e gestores em saúde, pois possibilita a formulação de estratégias mais específicas e abrangentes quanto às ações de detecção precoce do câncer de mama em Uberaba-MG. Para o campo de pesquisa essas informações possibilitam uma reflexão acerca de tais estratégias com a possibilidade de avaliação das atuais intervenções. Assim, o objetivo deste estudo é caracterizar o perfil socioeconômico e epidemiológico das mulheres em Uberaba, segundo a prática de exames de rastreio para câncer de mama, bem como verificar os fatores associados a essa prática.

Métodos

Esta pesquisa tem caráter transversal de base populacional, e é parte de um projeto maior – Inquérito de Saúde da Mulher em Uberaba MG (ISA Mulher Uberaba MG), aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), que tem por objetivo geral conhecer o perfil de saúde das mulheres a partir de 18 anos na cidade de Uberaba, MG. Os critérios de inclusão foram: mulheres residentes na cidade de Uberaba com idade a partir de 20 anos, que compreenderam o teor da pesquisa e estavam aptas a responder à entrevista após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Para a seleção da amostra, foi considerada uma amostragem probabilística em múltiplos estágios. No primeiro estágio, dentro de cada distrito sanitário foi selecionado, aleatoriamente, por meio de sorteio realizado por computador, 50% dos bairros, respeitando a proporcionalidade populacional de cada distrito em termos de quantidade de bairros. Depois, dentro de cada bairro sorteado, foram selecionados aleatoriamente 25% dos setores censitários, respeitando a proporcionalidade populacional de cada bairro em termos de quantidade de setores censitários. Dentro do setor censitário, os domicílios foram selecionados de forma sistemática a partir da seleção aleatória do primeiro domicilio e os demais foram aqueles na sequência entre 32 domicílios.

O cálculo amostral considerou a ausência de conhecimento a priori sobre as estimativas das prevalências dos eventos de interesse (todos foram considerados iguais à 50%); nível de confiança de 95% e margem de erro de no máximo 2,5% e 20% de perdas, resultando em uma amostra de 1.530. Na composição da amostra, foram respeitados os estratos de idade, renda, escolaridade e cor da pele, segundo os dados do Censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)77. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010. Famílias e Domicílios. Resultados da amostra. Rio de Janeiro: IBGE; 2012.. Ao final da fase de campo, foram realizadas 1.560 entrevistas, das quais 1.520 correspondiam à mulheres com 20 anos ou mais, que foram sujeitos da presente pesquisa.

A coleta dos dados foi feita por meio de questionário especificamente organizado para a pesquisa ISA Mulher Uberaba. Para a avaliação das características epidemiológicas e socioeconômicas e de saúde foi utilizado o bloco de identificação, os dados gerais e de atividade física.

O nível de atividade física foi avaliado pelo Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ) versão longa, validado para a população brasileira88. Matsudo S, Araújo T, Matsudo V, Andrade D, Andrade E, Oliveira LC, Braggion G. Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ):estudo de validade e reprodutibilidade no Brasil. Atividade Física & Saúde 2001; 6(2):5-16. e também para idosos99. Benedetti TRB, Mazo GZ, Barros MVG. Aplicação do questionário internacional de atividades físicas (IPAQ) para avaliação do nível de atividades físicas de mulheres idosas: validade concorrente e reprodutibilidade teste-reteste. Revista Brasileira de Ciência do Movimento 2004; 12(1):25-33., sendo utilizado o ponto de corte de 150 minutos, que considera ativas as mulheres com dispêndio de 150 minutos ou mais de atividade física semanal; inativos com dispêndio de zero a 149 minutos de atividade física semanal, tanto para as mulheres adultas1010. Craig CL, Marshall AL, Sjöström M. International Physical Activity Questionnaire:12-Country Reliability and Validity. Medicine & Science in Sports & Exercise 2003; 35(11):1381-1395. quanto para as idosas1111. Pate RR, Pratt M, Blair SN, Haskell WL, Macera CA, Bouchard C, Buchner D, Ettinger W, Heath GW, King AC. Physical activity and public health. A recommendation from the Centers for Disease Control and Prevention and the American College of Sports Medicine. JAMA 1995; 273(5):402-407..

Os dados antropométricos, correspondentes ao índice de massa corporal (IMC), foram obtidos através do peso em kilogramas dividido pela altura em metros elevado ao quadrado (peso/altura2), sendo os valores dados em kilogramas por metro quadrado (kg/m2), classificados em baixo peso: < 18,4 kg/m2, eutrofia: 18,5 ┤24,9 kg/m2, sobrepeso: 25,0 ┤ 29,9 kg/m2 e obesidade: > 30,0kg/m2 1212. World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic. WHO Consultation on Obesity. Geneva: WHO; 1997.. Para idosos, há uma classificação específica em baixo peso: < 22,0 kg/m2, eutrofia: 22,0 ┤ 27,0 kg/m2 e sobrepeso > 27,0 kg/m2 1313. Lipschitz SA. Screening for nutritional status in the elderly. Prim Care 1994; 21(1):55-67..

Para a análise da prática autorreferida de exames de rastreio para câncer de mama foi utilizado um questionário de livre acesso elaborado para inquérito de histórico de saúde, com o mesmo objetivo1414. ISA-SP. Inquéritos de saúde no estado de São Paulo. Metodologia. 2001. [acessado 2014 Nov 30]. Disponível em: http://www.fsp.usp.br/isasp/old/index_arquivos/Page627.htm
http://www.fsp.usp.br/isasp/old/index_ar...
. Este questionário abordou questões sobre a última data de realização do ECM e da MMG. Para determinar a prática de exames de rastreio para câncer de mama, utilizaram-se as recomendações do INCA33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011., que estabelecem para mulheres entre 40 e 49 anos o ECM anual e MMG se alterações e entre 50 e 69 anos o ECM anual e a MMG bianual. Para as demais faixas etárias considerou-se o ECM trianual para mulheres até 39 anos e o ECM anual e a MMG bianual para aquelas acima de 70 anos conforme sugerido pela Sociedade Brasileira de Mastologia1515. Gebrim LH, Elias S, Millen E, Silva BB, Sousa JA, Henke CH, Chagas R, Fernandes Júnior AS, Reis JHP, Santos LC, L‘Abatte RL, Urban LABD, Simões R. Câncer de Mama – Prevenção Secundária. São Paulo: Sociedade Brasileira de Mastologia, Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia, Projeto Diretrizes, Associação Médica Brasileira, Conselho Federal de Medicina; 2011.,1616. Kemp C, Petti DA, Ferraro O, Elias S. Câncer de Mama – Prevenção Secundária. São Paulo: Sociedade Brasileira de Mastologia, Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia, Projeto Diretrizes, Associação Médica Brasileira, Conselho Federal de Medicina; 2002..

A coleta dos dados, por meio de entrevistas domiciliares, foi realizada por 22 entrevistadoras do sexo feminino, especialmente treinadas para este estudo, no período de março a outubro de 2014. Houve supervisão de campo com conferência das entrevistas no recebimento, e a checagem aleatória via telefone de 10% das entrevistas realizadas. Os dados coletados foram processados pelo programa EpiData® versão2.0 (Odense, Dinamarca, EpiData Association). Houve a dupla digitação e a verificação da consistência entre os dois bancos.

A análise descritiva com teste de Qui-Quadrado foi realizada para determinar o perfil da amostra segundo a prática dos exames de rastreio para câncer de mama. Foi verificada a associação entre a prática de exames de rastreio de câncer de mama e as variáveis: renda per capita, escolaridade (em anos de estudo), histórico pessoal de neoplasias (malignas ou benignas) e idade. Tais associações foram analisadas inicialmente por regressão bivariada, com o objetivo de determinação da razão de prevalência bruta. O próximo processo foi a análise multivariada para detecção da razão de prevalência ajustada através da regressão de Poisson. As variáveis para ajuste foram selecionadas a partir de modelos de regressão bivariados com todas as variáveis pertinentes a estes objetivos; aquelas que mostraram significância 0,05 < p < 0,20 foram mantidas no modelo multivariado para efeitos de ajuste. A inserção das variáveis se deu pelo método stepwise backward, em que as variáveis são inseridas todas de uma vez no modelo e são retiradas uma a uma1717. Abbad G, Torres CV. Regressão múltipla stepwise e hierárquica em Psicologia Organizacional: aplicações, problemas e soluções. Estudos de Psicologia 2002; 7(n. esp.):19-29.. O nível de significância adotado foi de 5%. O software utilizado na análise dos dados foi o Stata®11 (College Station, EUA, StataCorp LP).

Resultados

A Tabela 1 apresenta o perfil das mulheres segundo a prática de exames de rastreio para câncer de mama.

Tabela 1
Caracterização sociodemográfica, epidemiológica e de saúde das mulheres em Uberaba,segundo a prática de exames de rastreio* para câncer de mama. ISA Mulher, Uberaba – MG, 2014.

A idade média das participantes foi de 50,7 anos (± 16,7). É possível observar predominância da prática dos exames de rastreio para câncer de mama na faixa etária entre 40-49 anos, reduzindo esta prevalência com o aumento da idade. Esta prática também aumentou com o incremento da escolaridade. A raça/cor mais frequente foi a branca, sendo esta a que também apresentou maior frequência da prática dos exames de rastreio.

Quanto ao estado conjugal, o mais frequente quanto à prática dos exames de rastreio para câncer de mama foi o “Em união”. Mais de 40% da amostra declarou ser chefe de família, Destas, 58,7% realizam a prática de exames de rastreio para câncer de mama. Além disso, a frequência da prática dos exames de rastreio aumentou em proporção direta à renda per capita. Grande parte da amostra (69,9 %) declarou-se não tabagista, e a prática de exames de rastreio também é maior entre as “não tabagistas”.

A Tabela 2 apresenta o modelo bruto com a regressão bivariada de Poisson. As variáveis renda per capita, escolaridade, neoplasias, neoplasias benignas da mama, faixa etária, fonte de pagamento da mamografia público, fonte de pagamento da mamografia por plano de saúde e estado conjugal foram associadas à prática de exames de rastreio para câncer de mama.

Tabela 2
Modelo de regressão bivariada de Poisson para a prática de exames de rastreio* de câncer demama para fins de determinação da Razão de Prevalência Bruta. ISA Mulher Uberaba – MG, 2014.

A maior renda per capita associou-se a uma maior prática de exames de rastreio, sendo que para a renda > 2,5 salários mínimos a prática dos exames foi 38% maior em relação à faixa de menor renda. Tal lógica também se aplica à escolaridade, em que podemos observar que para as mulheres com 12 anos ou mais de estudo houve uma maior prática de exames de rastreio de 63% em relação à faixa de menor escolaridade.

Os históricos de neoplasias gerais e de neoplasias benignas da mama também se comportaram da mesma forma, sendo que a prática dos exames de rastreio para câncer de mama foi respectivamente 28% e 51% maior em relação às mulheres que não apresentaram tais condições. A faixa etária demonstrou uma diminuição da razão de prevalências com o aumento da idade. A faixa entre 40-49 anos apresentou uma prática dos exames de rastreio 23% maior em relação à faixa etária base (entre 20-39 anos), já para a faixa entre 50-69 anos a prática foi 20% maior e para as de 70 anos ou mais a prática foi 19% menor em comparação à faixa etária base.

Sobre a fonte de pagamento do exame de mamografia, a realizada pelo Sistema Único de Saúde (SUS) apresentou 26% maior prática em relação a realizada pelo plano de saúde ou particular. Para a fonte de pagamento pelo plano de saúde a razão de prevalências demonstrou 23% a mais de prática dos exames de rastreio em relação ao não pagamento pelo plano de saúde. Já para a fonte de pagamento do exame via particular, os resultados não foram estaticamente significantes. O estado conjugal “Em união” demonstrou 27% a mais de prática dos exames de rastreio em relação ao “Solteiras”, sendo que para as outras classificações de estado conjugal não houve resultados estatisticamente significantes.

Na análise multivariada, após os ajustes, as variáveis que permaneceram associadas à realização dos exames de rastreio para câncer de mama foram a renda per capita, a faixa etária, a fonte de pagamento da MMG pública e por plano de saúde, permanecendo apenas variável neoplasias benignas da mama como variável de ajuste no modelo (Tabela 3). Tal análise permitiu verificar o comportamento da variável sob essa condição. Assim foi possível afirmar que em uma situação condicionada de ajuste, a renda per capita de > 1 – 2,5 SM e > 2,5 SM apresentou maior prevalência de realização de exames de rastreio para câncer de mama, demonstrando a tendência em aumentar em razão de prevalência com o aumento da renda. A faixa etária se comportou de maneira inversa, demonstrando que conforme a idade aumentou houve uma redução da prática dos exames de rastreio. Já para a fonte de pagamento do exame de mamografia, as realizadas pelo SUS e por plano de saúde demonstraram estar associadas à prática dos exames de rastreio para câncer de mama mesmo no modelo ajustado.

Tabela 3
Modelo de regressão multivariada de Poisson para a prática de exames de rastreio* de câncerde mama para fins de determinação da Razão de Prevalência Ajustada. ISA Mulher Uberaba – MG, 2014.

Discussão

A prática dos exames de rastreio para o câncer de mama apresentou uma prevalência de 62,3% na presente amostra. É importante lembrar que a construção desta variável levou em consideração o que é preconizado como estratégia de rastreamento pelo INCA segundo a faixa etária33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011.. As características do perfil da prática dos exames de rastreio para câncer de mama entre participantes da pesquisa evidenciam um perfil com uma maioria de mulheres entre 40-49 anos, escolaridade de 12 anos ou mais, renda per capita de > 2,5 SM, raça/cor branca, estado conjugal “união”, não chefes de família e não tabagistas.

O estudo de Schneider et al.1818. Schneider IJC, Giehl MWC, Boing AF, D’orsi E. Rastreamento mamográfico do câncer de mama no Sul do Brasil e fatores associados: estudo de base populacional. Cad Saude Publica 2014; 30(9):1987-1997. também observou um perfil de prática de MMG de mulheres com escolaridade alta (12 anos ou mais), raça/cor branca e estado conjugal com companheiro, corroborando os resultados da presente pesquisa. Lages et al.1919. Lages RB, Oliveira GP, Simeão Filho VM, Nogueira FM, Teles JBM, Vieira SC. Desigualdades associadas à não realização de mamografia na zona urbana de Teresina-Piauí-Brasil, 2010-2011. Rev Bras Epidemiol 2012; 15(4):737-747., avaliaram o perfil da não realização da MMG na capital do Piauí e encontraram maior prevalência de não realização na raça/cor parda, situação solteira, tabagistas, analfabetas e com renda familiar menor que dois salários mínimos. Tal resultado também é semelhante ao da presente pesquisa.

Estudos internacionais apontam que o perfil da prática dos exames de rastreio para câncer de mama difere entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento pelo tipo de programa de rastreamento (oportunístico ou organizado). Para os países em desenvolvimento de média e baixa renda, as iniquidades socioeconômicas, como maior renda, escolaridade, estado conjugal, são características de maior peso na prática dos exames de rastreio2020. Akinyemiju TF. Socio-Economic and Health Access Determinants of Breast and Cervical Cancer Screening in Low-Income Countries: Analysis of the World Health Survey. PloS One 2012; 7(11): e48834.. Já para os países ricos, o rastreamento oportunístico ainda apresenta diferenças socioeconômicas e a renda em especial, característica não observada no rastreamento organizado nos países desenvolvidos2121. Palència L, Espelt A, Rodríguez-Sanz M, Puigpinós R, Pons-Vigués M, Pasarín MI. Socio-economic inequalities in breast and cervical cancer screening practices in Europe: influence of the type of screening program. Int J Epidemiol 2010; 39(3):757-765..

Desta forma, os achados da presente pesquisa, bem como a literatura da área, evidenciam diferenças socioeconômicas na realização da MMG, reforçando o padrão desfavorável às mulheres em pior situação socioeconômica. Essas informações podem ser úteis à gestão em saúde, uma vez que mostram o perfil das mulheres com menos acesso à MMG, oferecendo oportunidade de planejamento de intervenções direcionadas.

As variáveis renda per capita, faixa etária, fonte de pagamento da MMG pública e por plano de saúde mostraram associação com a prática de exames de rastreio de câncer, confirmando outros relatos da literatura para a realização dos exames de MMG e ECM66. Amorim VMSL, Barros MBA, César CLG, Carandina L, Goldbaum M. Fatores associados a não realização da mamografia e do exame clínico das mamas: um estudo de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica 2008; 24(11):2623-2632.,1818. Schneider IJC, Giehl MWC, Boing AF, D’orsi E. Rastreamento mamográfico do câncer de mama no Sul do Brasil e fatores associados: estudo de base populacional. Cad Saude Publica 2014; 30(9):1987-1997.,2222. Lima-Costa FL, Matos DL. Prevalência e fatores associados à realização da mamografia na faixa etária de 50-69 anos: um estudo baseado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (2003). Cad Saude Publica 2007; 23(7):1665-1673.,2323. Rodrigues JD, Cruz MS, Paixão A.N. Uma análise da prevenção do câncer de mama no Brasil. Cien Saude Colet 2015; 20(10):3163-3176.. A renda desempenha um importante papel para a realização dos exames de rastreio, com relação diretamente proporcional entre si. Ao longo da história, as mulheres de maior renda possuem o acesso mais facilitado aos exames, às consultas médicas e ao pagamento de planos de saúde ou particular destes exames2424. Oliveira EXG, Pinheiro RS, Melo ECP, Carvalho MS. Condicionantes socioeconômicos e geográficos do acesso à mamografia no Brasil, 2003-2008 Cien Saude Colet 2011; 16(9):3649-3664.,2525. Brasil. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o financiamento dos serviços correspondentes e da outras providências. Diário Oficial da União 1990; 20 set.. De forma crítica, este achado demonstra a iniquidade desta prática em saúde, contrariando o que é proposto pelas diretrizes de equidade e igualdade do SUS2626. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: Princípios e Diretrizes. Brasília: Editora do Ministério da Saúde; 2011., e pela Política Nacional de Atenção à Saúde da Mulher2727. Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). TABNET. Informações em Saúde Suplementar. [acessado 2015 Out 31]. Disponível em: http://www.ans.gov.br/anstabnet/notas_taxa_cobertura.htm
http://www.ans.gov.br/anstabnet/notas_ta...
. É preciso ofertar os serviços de rastreamento ao câncer de mama de forma equitativa e a renda pode ser considerada um fator fundamental para a análise desta oferta.

A associação da prática dos exames de rastreio para câncer de mama com a fonte de pagamento pública do exame de MMG pode ser considerada um avanço para as ações voltadas ao rastreamento do câncer de mama no município. Na presente pesquisa mais de 50% das MMG realizadas pelas participantes tiveram pagamento público, sendo um fator associado à prática deste exame na cidade de Uberaba. Lages et al.1919. Lages RB, Oliveira GP, Simeão Filho VM, Nogueira FM, Teles JBM, Vieira SC. Desigualdades associadas à não realização de mamografia na zona urbana de Teresina-Piauí-Brasil, 2010-2011. Rev Bras Epidemiol 2012; 15(4):737-747. em um estudo feito no Piauí, demonstrou a fonte de pagamento da MMG via pública de 56,3%. Tal resultado é semelhante ao encontrado no presente estudo. Contrariamente, Amorim et al.66. Amorim VMSL, Barros MBA, César CLG, Carandina L, Goldbaum M. Fatores associados a não realização da mamografia e do exame clínico das mamas: um estudo de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica 2008; 24(11):2623-2632. em pesquisa realizada em Campinas/SP, encontraram o pagamento do exame de MMG pelo sistema público de 28,8% e por plano de saúde ou particular de 71,2%. Este achado pode refletir as características regionais de cada pesquisa e a forma de organização do SUS em cada região. Em Uberaba, pode-se considerar o resultado encontrado como uma provável consequência de ações que têm sido feitas no intuito de promover a realização do exame de MMG pelo SUS, como a campanha “Outubro Rosa”, que conta com grande mobilização dos serviços públicos de saúde para o estímulo do rastreamento do câncer de mama na cidade. Além disso, a cidade tem a característica de possuir em seu território diversas universidades, sendo uma delas pública, o que facilita o acesso da população aos exames de rastreamento através da parceria destas universidades com outros serviços de saúde públicos municipais.

Aproximadamente 23% das MMG feitas na presente pesquisa tiveram pagamento por plano de saúde e esta característica esteve associada à prática dos exames de rastreio. Associação semelhante foi encontrada no estudo de Schneider et al.1818. Schneider IJC, Giehl MWC, Boing AF, D’orsi E. Rastreamento mamográfico do câncer de mama no Sul do Brasil e fatores associados: estudo de base populacional. Cad Saude Publica 2014; 30(9):1987-1997.. Corroborando este resultado, de acordo com dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), aproximadamente 24% das mulheres de Minas Gerais são cobertas por plano de saúde2828. Urban LABD, Schaefer MB, Duarte DL, Santos RP, Maranhão NMA, Kefalas AL. Recomendações do Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem, da Sociedade Brasileira de Mastologia e da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia para rastreamento do câncer de mama por métodos de imagem. Radiol Bras 2012; 45(6):334-339.. Os planos de saúde contam com maior liberalidade na realização dos exames de rastreio, com maior frequência da realização da MMG e para uma faixa etária mais abrangente2929. Tesser CD. Cuidado(!) na prevenção do câncer: ética, danos e equívocos. Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade 2014; 9(21):180-182., ficando este critério de periodicidade sob decisão médica individual, em comparação ao preconizado pelo INCA33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011., fato que pode justificar esta associação.

A faixa etária demonstrou, na análise de regressão bivariada, ser um fator associado à prática dos exames de rastreio para as faixas entre 40-49 anos e 50-69 anos, com uma RP de 1,23 e 1,20 respectivamente. Desta forma, a faixa etária entre 40-49 anos demonstrou uma maior realização dos exames de rastreamento do que a faixa entre 50-59 anos que é a preconizada pelo INCA33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011.. Tal achado pode refletir de forma crítica uma superutilização dos exames de rastreamento por mulheres que não estão indicadas para rastreio, baseado em evidências cientificas e adotado pelo INCA33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011.. Para a faixa de 70 anos ou mais não houve associação entre a prática dos exames de rastreio. Este achado reflete a distribuição etária preconizada pelas ações de rastreamento do câncer de mama, de forma geral33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011.,2929. Tesser CD. Cuidado(!) na prevenção do câncer: ética, danos e equívocos. Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade 2014; 9(21):180-182.. A falta de associação para a faixa etária acima de 70 anos pode ser justificada pelo fato de ela não ser coberta pelas ações de rastreamento preconizadas pelo INCA. Na análise de regressão multivariada, em uma situação condicionada de ajustes, a faixa etária mostrou um comportamento com tendência a reduzir a prevalência de realização dos exames de rastreio com o aumento da idade.

Resultados semelhantes foram encontrados no estudo de Oliveira et al.2424. Oliveira EXG, Pinheiro RS, Melo ECP, Carvalho MS. Condicionantes socioeconômicos e geográficos do acesso à mamografia no Brasil, 2003-2008 Cien Saude Colet 2011; 16(9):3649-3664. que utilizaram os dados da PNAD 2008 e de Rodrigues et al.2323. Rodrigues JD, Cruz MS, Paixão A.N. Uma análise da prevenção do câncer de mama no Brasil. Cien Saude Colet 2015; 20(10):3163-3176.. Eles encontraram uma não linearidade nessa variável, ou seja, em um determinado momento da vida o aumento da idade diminuiu a probabilidade das mulheres realizarem a MMG. Os autores discutem ainda que o padrão de prevenção via idade tende a se reduzir com o tempo2323. Rodrigues JD, Cruz MS, Paixão A.N. Uma análise da prevenção do câncer de mama no Brasil. Cien Saude Colet 2015; 20(10):3163-3176.,2424. Oliveira EXG, Pinheiro RS, Melo ECP, Carvalho MS. Condicionantes socioeconômicos e geográficos do acesso à mamografia no Brasil, 2003-2008 Cien Saude Colet 2011; 16(9):3649-3664..

Estes achados demonstra a importância de ter-se um olhar especial ao envelhecimento da mulher com enfoque na prevenção do câncer de mama. É preciso levar em consideração o aumento longevidade e consequentemente o aumento da busca pelos serviços de saúde pela população idosa. Além disso, o envelhecimento é considerado um importante fator de risco ao desenvolvimento da doença, com aumento de sua incidência com o aumento da idade da mulher33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011.. Desta forma, os serviços e as políticas de saúde devem buscar o atendimento integral, inclusive relacionado ao câncer de mama2323. Rodrigues JD, Cruz MS, Paixão A.N. Uma análise da prevenção do câncer de mama no Brasil. Cien Saude Colet 2015; 20(10):3163-3176..

Com relação à análise da faixa etária e à prática dos exames de rastreamento é válido destacar, além da não linearidade desta associação, principalmente uma maior prevalência de realização dos exames entre as mulheres jovens (20-39 anos) do que nas mais idosas (acima 70 anos) e uma maior realização dos exames pelas mulheres entre 40-49 anos que aquelas com 50-69 anos, contrariando o que é estabelecido pelo INCA como idade alvo para rastreamento33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011..

Assim, mais do que discutir tipos de exames de rastreamento do câncer de mama e buscar cada vez mais aumentar a prevalência de sua realização e abrangência de faixas etárias, é preciso pensar o rastreamento de forma a integrar todos os recursos disponíveis de forma racional e segura à população, buscando o impacto na redução da mortalidade pelo diagnóstico precoce3030. Tiezzi DG. Rastreamento do câncer de mama no Brasil: ainda há tempo para refletirmos. Rev Bras Ginecol Obstet 2013; 35(9):385-387.. Segundo Tiezzi3030. Tiezzi DG. Rastreamento do câncer de mama no Brasil: ainda há tempo para refletirmos. Rev Bras Ginecol Obstet 2013; 35(9):385-387., o programa de rastreamento do câncer de mama no Brasil é ineficaz, possivelmente baseado no diagnóstico oportunístico e sem abrangência satisfatória. Desta forma, é preciso investir na conscientização da população, utilizando a estrutura disponível na atenção básica a fim de diminuir as elevadas taxas de diagnóstico em estádios avançados3030. Tiezzi DG. Rastreamento do câncer de mama no Brasil: ainda há tempo para refletirmos. Rev Bras Ginecol Obstet 2013; 35(9):385-387..

Apesar de não permanecer no modelo multivariado, discordando de outros estudos que encontraram tal associação, a escolaridade também é um fator relacionado com a prática dos exames1818. Schneider IJC, Giehl MWC, Boing AF, D’orsi E. Rastreamento mamográfico do câncer de mama no Sul do Brasil e fatores associados: estudo de base populacional. Cad Saude Publica 2014; 30(9):1987-1997.,1919. Lages RB, Oliveira GP, Simeão Filho VM, Nogueira FM, Teles JBM, Vieira SC. Desigualdades associadas à não realização de mamografia na zona urbana de Teresina-Piauí-Brasil, 2010-2011. Rev Bras Epidemiol 2012; 15(4):737-747.,2121. Palència L, Espelt A, Rodríguez-Sanz M, Puigpinós R, Pons-Vigués M, Pasarín MI. Socio-economic inequalities in breast and cervical cancer screening practices in Europe: influence of the type of screening program. Int J Epidemiol 2010; 39(3):757-765.,2323. Rodrigues JD, Cruz MS, Paixão A.N. Uma análise da prevenção do câncer de mama no Brasil. Cien Saude Colet 2015; 20(10):3163-3176.,2525. Brasil. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o financiamento dos serviços correspondentes e da outras providências. Diário Oficial da União 1990; 20 set. e está relacionada fortemente com a renda, apresentando uma relação direta com a prática dos exames de rastreio, sendo maior quanto maior a escolaridade1818. Schneider IJC, Giehl MWC, Boing AF, D’orsi E. Rastreamento mamográfico do câncer de mama no Sul do Brasil e fatores associados: estudo de base populacional. Cad Saude Publica 2014; 30(9):1987-1997.. No presente estudo, as analfabetas foram as que apresentaram prevalência menor da prática dos exames de rastreamento, sendo que esta prevalência aumenta à medida que a escolaridade melhora, chegando a quase 70% para aquelas com 12 anos ou mais de anos de estudo. A baixa escolaridade relaciona-se com um menor nível socioeconômico e implica culturalmente em menor acesso a serviços de prevenção a esta população3131. Damiani G, Federico B, Basso D, Ronconi A, Bianchi CB, Anzellotti GB, Nasi G, Sassi F, Ricciardi W. Socioeconomic disparities in the uptake of breast and cervical cancer screening in Italy: a cross sectional study. BMC Public Health 2012; 12(99):1471-1478.. Ela relaciona-se com o nível de compreensão da relevância de realização dos exames bem como o acesso a essas informações1818. Schneider IJC, Giehl MWC, Boing AF, D’orsi E. Rastreamento mamográfico do câncer de mama no Sul do Brasil e fatores associados: estudo de base populacional. Cad Saude Publica 2014; 30(9):1987-1997.,2525. Brasil. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o financiamento dos serviços correspondentes e da outras providências. Diário Oficial da União 1990; 20 set., sendo considerada sua relação com a prática dos exames de rastreamento uma iniquidade em saúde1818. Schneider IJC, Giehl MWC, Boing AF, D’orsi E. Rastreamento mamográfico do câncer de mama no Sul do Brasil e fatores associados: estudo de base populacional. Cad Saude Publica 2014; 30(9):1987-1997..

O estado conjugal em união também não permaneceu no modelo multivariado, no entanto outros estudos demonstraram sua relação com a prática dos exames de rastreio para câncer de mama1919. Lages RB, Oliveira GP, Simeão Filho VM, Nogueira FM, Teles JBM, Vieira SC. Desigualdades associadas à não realização de mamografia na zona urbana de Teresina-Piauí-Brasil, 2010-2011. Rev Bras Epidemiol 2012; 15(4):737-747.,2323. Rodrigues JD, Cruz MS, Paixão A.N. Uma análise da prevenção do câncer de mama no Brasil. Cien Saude Colet 2015; 20(10):3163-3176.. Apesar de não estar associado à prática dos exames de rastreamento após o modelo ajustado, o estado conjugal em união pressupõe uma vida sexual mais ativa e, em consequência disso, um maior cuidado com a saúde relacionada à necessidade de consulta ginecológica para problemas originados com a vida sexual ativa e para propostas de contracepção e não a uma perspectiva de atenção mais ampla à saúde da mulher. De forma inversa as mulheres sem companheiro utilizam menos os serviços de saúde neste sentido. Tal lógica justifica a associação do estado conjugal à prática dos exames de rastreamento ao câncer de mama2323. Rodrigues JD, Cruz MS, Paixão A.N. Uma análise da prevenção do câncer de mama no Brasil. Cien Saude Colet 2015; 20(10):3163-3176..

A associação, no modelo bruto, do histórico de neoplasias geral e em especial de neoplasias benignas na mama, indica que o cuidado com a realização deste tipo de exames já é parte da rotina dos cuidados com a saúde/doença propostos para essas mulheres, visto que para as neoplasias benignas da mama a detecção desta alteração se dá inicialmente pelos exames de ECM e MMG, e exigem controle e segmento periódicos1515. Gebrim LH, Elias S, Millen E, Silva BB, Sousa JA, Henke CH, Chagas R, Fernandes Júnior AS, Reis JHP, Santos LC, L‘Abatte RL, Urban LABD, Simões R. Câncer de Mama – Prevenção Secundária. São Paulo: Sociedade Brasileira de Mastologia, Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia, Projeto Diretrizes, Associação Médica Brasileira, Conselho Federal de Medicina; 2011..

Uma diferença entre os estudos citados e a presente pesquisa é a forma de avaliação da prática dos exames de rastreio. A presente pesquisa levou em consideração a estratégia de rastreio proposta pelo INCA33. Instituto Nacional De Câncer José Alencar Gomes Da Silva (INCA). Programa Nacional de Controle do Câncer de Mama, 2010. Rio de Janeiro: INCA; 2011., que é composta dos exames de MMG e ECM com periodicidades diferentes. Os demais estudos avaliaram a prática isolada da MMG ou do ECM a cada dois anos. Tal característica pode justificar as diferenças entre os resultados, apesar da semelhança em diversos fatores associados encontrados.

A presente pesquisa apresenta limitações que devem ser consideradas. Os dados foram coletados por entrevistas domiciliares, sendo a prática dos exames e da ocorrência do câncer de mama autorreferida. Desta forma, o viés de memória e informação pode interferir na resposta da participante. Adicionalmente, o desenho de estudo transversal limita a interpretação das associações como relações causa efeito. Outra limitação é o fato da pesquisa abranger diversas temáticas, restringindo a possibilidade de abordar maiores detalhes da prática dos exames de rastreio para o câncer de mama entre as mulheres de Uberaba – MG. Além disso, a taxa de não resposta para algumas variáveis pode ser considerada alta, mesmo para um estudo populacional.

Considerações finais

De acordo com os objetivos da pesquisa, o perfil das mulheres segundo a prática de exames de rastreio para câncer de mama em Uberaba, MG, é de mulheres de raça/cor branca, nível de escolaridade alto, maior renda per capita, e não chefes de família. Os fatores associados à prática dos exames de rastreio foram a faixa etária, reduzindo sua prática com o avançar da idade, renda per capita maior que um salário mínimo, e fonte de pagamento da mamografia pública e por plano de saúde.

Os achados da presente pesquisa geraram informações sobre a prática dos exames de rastreio para câncer de mama na cidade de Uberaba, fornecendo subsídios aos gestores e profissionais da saúde envolvidos no cuidado à saúde da mulher, para a formulação de estratégias de rastreio do câncer de mama mais efetivas. Além disso, a pesquisa ressaltou a necessidade de buscar atingir os preceitos de equidade SUS2626. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: Princípios e Diretrizes. Brasília: Editora do Ministério da Saúde; 2011., da Política Nacional de Atenção à Saúde da Mulher2727. Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). TABNET. Informações em Saúde Suplementar. [acessado 2015 Out 31]. Disponível em: http://www.ans.gov.br/anstabnet/notas_taxa_cobertura.htm
http://www.ans.gov.br/anstabnet/notas_ta...
, organizar os serviços levando em consideração a renda, a fonte de pagamento da MMG e, principalmente, as faixas etárias preconizadas nas recomendações do INCA e do Ministério da Saúde, de modo a propiciar maior equidade na oferta de serviços de rastreio do câncer de mama em Uberaba, MG.

Agradecimentos

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) pelo financiamento.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2018

Histórico

  • Recebido
    15 Fev 2016
  • Revisado
    23 Ago 2016
  • Aceito
    25 Ago 2016
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