O nível de atividade física como um fator interveniente no estado cognitivo de idosos da atenção básica à saúde

Daniel Vicentini de Oliveira Veridiane Brigato de Oliveira Géssica Aline Caruzo Áurea Gonçalves Ferreira José Roberto Andrade do Nascimento Júnior Paolo Marcello da Cunha Cláudia Regina Cavaglieri Sobre os autores

Resumo

Este estudo propôs a avaliar o nível de atividade física e o estado cognitivo de idosos usuários das Unidades Básicas de saúde (UBS) do Município de Maringá, Paraná. Trata-se de um estudo epidemiológico descritivo, de corte observacional e transversal, realizado com 654 idosos, de ambos os sexos, usuários das UBS. Foi utilizado um questionário sociodemográfico, o Mini exame do estado mental e o International Activity Questionnaire (IPAQ), versão curta. A análise dos dados foi realizada mediante o teste Kolmogorov-Smirnov, Qui quadrado, Kruskal-Wallis e “U” de Mann-Whitney, adotando significância quando p < 0,05. Os idosos não realizam atividades físicas vigorosas e poucas atividades moderadas durante a semana. Porém, apresentaram alto escore na orientação temporal (Md = 5,0), Orientação espacial (Md = 5,0), memória imediata (Md = 3,0), evocação (Md = 3,0) e linguagem (Md = 8,0). Ao comparar o estado mental em função do nível de atividade física dos idosos verificou-se que os Muito ativo/ativo possuem melhor atenção e cálculo (p = 0,036), evocação (p = 0,001) e estado cognitivo geral (p = 0,002), se comparado aos irregularmente ativos e sedentários. Níveis adequados de atividade física podem estar relacionados a melhores escores de funções cognitivas de sujeitos idosos.

Palavras-chave
Atividade motora; Cognição; Gerontologia; Promoção da saúde

Introdução

O processo de envelhecimento é acompanhado por várias modificações, como alterações na composição corporal (redução da massa muscular, aumento de gordura corporal), redução da força muscular, flexibilidade, capacidade funcional e, associado à isso, ocorre um declínio de atividades físicas e desempenho cognitivo nesta população11 Zamboni M, Rossi AP, Fantin F, Zamboni G, Chirumbolo S, Zoico E, Mazzali G. Adipose tissue, diet and aging. Mech Ageing Dev 2014; 136-137:129-137.

2 Manini TM, Clark BC. Dynapenia and aging: an update. J Gerontol A Biol Sci Med Sci 2012; 67(1):28-40.

3 Janssen I, Heymsfield SB, Ross R. Low relative skeletal muscle mass (sarcopenia) in older persons is associated with functional impairment and physical disability. J Am Geriatr Soc 2002; 50(5):889-896.
-44 Prince M, Bryce R, Albanese E, Wimo A, Ribeiro W, Ferri CP. The global prevalence of dementia: A systematic review and metaanalysis. Alzheimer's Dement 2013; 9(1):63-75.. Esse quadro deletério observado no envelhecimento pode levar a possíveis complicações como a incapacidade física, o desenvolvimento de doenças cardiovasculares e metabólicas, as multimorbidades ou a síndrome da fragilidade44 Prince M, Bryce R, Albanese E, Wimo A, Ribeiro W, Ferri CP. The global prevalence of dementia: A systematic review and metaanalysis. Alzheimer's Dement 2013; 9(1):63-75.

5 Cruz-Jentoft AJ, Baeyens JP, Bauer JM, Boirie Y, Cederholm T, Landi F, Martin FC, Michel JP, Rolland Y, Schneider SM, Topinková E, Vandewoude M, Zamboni M; European Working Group on Sarcopenia in Older People. Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis: Report of the European Working Group on Sarcopenia in Older People. Age Ageing 2010; 39(4):412-423.
-66 Manini T. Development of physical disability in older adults. Curr Aging Sci 2013; 4(3):184-191..

Outro fator importante é a alteração cognitiva que o idoso irá apresentar ao longo do envelhecimento, levando a um déficit de memória e um declínio no desempenho em suas atividades diárias, como: leitura, raciocínio logico e abstrato, habilidades espaciais e capacidades verbais77 Raichlen DA, Alexander GE. Adaptive Capacity: An Evolutionary Neuroscience Model Linking Exercise, Cognition, and Brain Health. Trends Neurosci 2017:1-14.. Existem 3 tipos de alterações cognitivas, o envelhecimento cognitivo normal, o comprometimento cognitivo e a demência88 Petersen RC. Mild cognitive impairment as a clinical entity and treatment target. Arch Neurol 2004; 62(7):1160-1163; [discussion, n. 1167].,99 Winblad B, Palmer K, Kivipelto M, Jelic V, Fratiglioni L. Mild cognitive impairment - beyond controversies, towards a consensus?: report of the International Working Group on Mild Cognitive Impairment. J Intern Med 2004; (Sept. 2003):240-246..

A prática de atividade física no envelhecimento melhora a aptidão física e a função cognitiva dos idosos. A prática regular de exercício físico desenvolve alterações positivas, desencadeando a angiogênese e o aumento do fluxo sanguíneo cerebral, a sinaptogênese e a neurogênese1010 Gligoroska J, Manchevska S. The Effect of Physical Activity on Cognition - Physiological Mechanisms. Mater Socio Medica 2012; 24(3):198..

O exercício físico aumenta o desempenho cognitivo, podendo aumentar a atenção seletiva e a memória de curto prazo. Assim diversos estudos evidenciam a prática de atividade física moderada ou intensa pode ser um tratamento não farmacológico para a melhora da cognição. Um estudo realizado na cidade de Florianópolis com 875 idosos sedentários apresentaram piora da saúde mental e aumento significativo de quadro depressivo1111 Ribeiro AS, Avelar A, Schoenfeld BJ, Ritti Dias RM, Altimari LR, Cyrino ES. Resistance training promotes increase in intracellular hydration in men and women. Eur J Sport Sci 2014; 14(6):578-585..

A prática regular de exercício físico pode prevenir ou até reverter problemas frequentes encontrados nos idosos durante o envelhecimento, diminuindo os efeitos deletérios do declínio cognitivo1212 Nagamatsu LS, Handy TC, Hsu CL, Voss M, Liu-Ambrose T. Resistance training promotes cognitive and functional brain plasticity in seniors with probable mild cognitive impairment. Arch Intern Med. 2012; 172(8):666-668.

13 Nascimento CMC, Pereira JR, Pires de Andrade L, Garuffi M, Ayan C, Kerr DS, Talib LL, Cominetti MR, Stella F. Physical exercise improves peripheral BDNF levels and cognitive functions in mild cognitive impairment elderly with different bdnf Val66Met genotypes. J Alzheimers Dis 2015; 43(1):81-91.
-1414 Coelho FM, Pereira DS, Lustosa LP, Silva JP, Dias JM, Dias RC, Queiroz BZ, Teixeira AL, Teixeira MM, Pereira LS. Physical therapy intervention (PTI) increases plasma brain-derived neurotrophic factor (BDNF) levels in non-frail and pre-frail elderly women. Arch Gerontol Geriatr 2012; 54(3):415-420.. Porém é alarmante a quantidade de idosos inativos, que não praticam nenhuma atividade diária ou física, tornando-se a inatividade física como a quarta causa de morte no mundo1515 Lee I-M, Shiroma EJ, Lobelo F, Puska P, Blair SN, Katzmarzyk PT. Impact of Physical Inactivity on the World's Major Non-Communicable Diseases. Lancet 2012; 380(9838):219-229.,1616 World Health Organization. Preventing Chronic Diseases: a Vital Investment. World Health 2005; 202..

Estudos sobre a prática regular de atividade física em idosos e o perfil cognitivo desta população devem ser investigados devido à associação com os níveis de atividade física que podem ter impacto sobre funções cognitivas de idosos1212 Nagamatsu LS, Handy TC, Hsu CL, Voss M, Liu-Ambrose T. Resistance training promotes cognitive and functional brain plasticity in seniors with probable mild cognitive impairment. Arch Intern Med. 2012; 172(8):666-668.,1717 Bamidis PD, Fissler P, Papageorgiou SG, Zilidou V, Konstantinidis EI, Billis AS, Romanopoulou E, Karagianni M, Beratis I, Tsapanou A, Tsilikopoulou G, Grigoriadou E, Ladas A, Kyrillidou A, Tsolaki A, Frantzidis C, Sidiropoulos E, Siountas A, Matsi S, Papatriantafyllou J, Margioti E, Nika A, Schlee W, Elbert T, Tsolaki M, Vivas AB, Kolassa IT. Gains in cognition through combined cognitive and physical training: The role of training dosage and severity of neurocognitive disorder. Front Aging Neurosci 2015; 7(JUL):1-15.

18 Hillman CH, Erickson KI, Kramer AF. Be smart, exercise your heart: exercise effects on brain and cognition. Nat Rev Neurosci 2008; 9(1):58-65.
-1919 Erickson KI, Weinstein AM, Lopez OL. Physical activity, brain plasticity, and Alzheimer's disease. Arch Med Res 2012; 43(8):615-621.. Posto isso, este estudo propôs avaliar o nível de atividade física e o estado cognitivo (Mini exame do estado mental) de idosos usuários das Unidades Básicas de saúde do Município de Maringá, Paraná.

Métodos

Participantes

Segundo dados obtidos junto à Secretária de Saúde do município de Maringá, PR, a população alvo é composta por 42.258 idosos (2016). A amostra inicial a ser considerada foi de 595 idosos, com a adição de 10% de possíveis perdas a amostra final ficou composta por 654 idosos de ambos os sexos, considerando um nível de confiança de 95% e 4% de margem de erro. O software utilizado para obtenção dos cálculos foi o StatDisk versão 8.4.

As UBS das quais fazem parte os idosos foram subdivididos em quatro regiões: Leste (7 UBS), que contempla 21,8% da população, Norte (8 UBS), com 34,5% da população, Oeste (8 UBS), com 23,2% da população, e Sul (8 UBS), que contempla 20,4% da população total de idosos da cidade. Conhecendo a composição das regiões foram selecionadas por sorteio três UBS para serem avaliadas em cada uma das regiões.

Após definido o tamanho da amostra em cada região e selecionada a UBS, foi importante manter a proporção de idosos da população na amostra, sendo assim os cálculos para obtenção da amostra final por UBS de acordo com sexo foram proporcionais às populações.

Foram incluídos no estudo idosos de ambos os sexos com idade igual ou superior a 60 anos, com capacidade de fala e audição preservadas, que permitiram a aplicação dos questionários. Foi utilizado o Mini exame do estado mental (MEEM) para excluir idosos com déficits cognitivos importantes. O MEEM é composto por questões agrupadas em sete categorias: orientação temporal (escore máximo de 05), orientação espacial (escore máximo de 05), registro de três palavras (escore máximo de 03), atenção e cálculo (escore máximo de 05), recordação das três palavras - evocação (escore máximo de 03), linguagem (escore máximo de 08) e capacidade viso construtiva (escore máximo de 01). Quanto maior o escore em cada domínio, melhor o estado cognitivo no mesmo2020 Folstein MF, Folstein SE, McHugh PR. "Mini-mental state" A practical method for grading the cognitive state of patients for the clinician. J Psychiatr 1975; 12(3):189-198.. As notas de corte utilizadas para exclusão pelo MEEM foram: 17 para os analfabetos; 22 para idosos com escolaridade entre 1 e 4 anos; 24 para os com escolaridade entre 5 e 8 anos e 26 os que tiverem 9 anos ou mais anos de escolaridade. Estes pontos de corte foram baseados nos critérios de Brucki et al.2121 Brucki SMD, Nitrini R, Caramelli P, Bertolucci PHF, Okamoto IH. Sugestões para o uso do mini-exame do estado mental no Brasil. Arq Neuropsiquiatr 2003; 61(3B):777-781.. Correspondem à média obtida por esses autores para cada faixa de escolaridade, menos um desvio padrão. Idosos classificados abaixo do ponto de corte específico para sua escolaridade, foram excluídos.

Instrumentos

Para a caracterização do perfil sociodemográfico e de saúde dos idosos, foi utilizado um questionário semiestruturado, composto por informações referentes à idade (60 a 69 anos; 70 a 79 anos; 80 anos ou mais), sexo (masculino; feminino), estado civil (casado ou vive com o companheiro; solteiro; divorciado, ou desquitado; viúvo), raça (branca; negra; outra), renda mensal em salário mínimo (SM) de referência no Censo Demográfico 2016 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (R$ 880,00) (1 a 2 SM; 2,1 a 3 SM; mais de 3 SM), aposentadoria (sim; não), escolaridade (não estudou; ensino fundamental incompleto; ensino fundamental completo; ensino médio completo; ensino superior), autopercepção do estado de saúde (ruim; regular; bom; muito bom) e quantidade de medicamentos utilizados (nenhum; 1 a 2; mais de 2).

O nível de atividade física dos idosos foi avaliado utilizando-se a versão curta do Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ). O mesmo é composto por sete questões abertas e suas informações permitem estimar o tempo despendido, por semana, em diferentes dimensões de atividade física (caminhadas e esforços físicos de intensidades moderada e vigorosa) e de inatividade física (posição sentada). O nível de atividade física foi classificado em sedentário (idosos que não realizaram nenhuma atividade física por pelo menos 10 minutos contínuos durante a semana.), irregularmente ativo (idosos que realizam atividade física, porém, de forma insuficiente para serem classificados como ativos pois não cumpre as recomendações quanto à frequência ou duração), ativo (idosos que realizavam pelo menos 3 dias de atividade vigorosa, por no mínimo 20 minutos; ou 5 dias ou mais de atividade moderada ou caminha por no mínimo 30 minutos; ou pelo menos 5 dias e 150 minutos semanais de qualquer tipo de atividade física) ou muito ativo (idosos que realizavam atividades vigorosas por pelo menos 5 dias na semana, sendo 30 minutos por sessão; ou no mínimo 3 dias na semana de atividade vigorosa, no mínimo 20 minutos por sessão, mais atividades moderadas ou caminhada, por no mínimo 5 dias na semana e 30 minutos por sessão). O comportamento sedentário foi avaliado por meio do tempo médio sentado em um dia de semana, e em um dia de final de semana2222 Matsudo S, Araújo T, Matsudo V, Andrade D, Andrade E, Oliveira LC, Braggion G. Questionário Internacional De Atividade Física (Ipaq): Estudo De Validade E Reprodutibilidade No Brasil. Rev Bras Atividade Física Saúde 2012; 6(2):5-18..

Procedimentos de coleta de dados

Este estudo epidemiológico de corte transversal e base populacional foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário de Maringá (UNICESUMAR). Os dados foram coletados em 12 UBS, divididas nas quatro regiões (norte, sul, leste e oeste), das 33 UBS do município de Maringá, selecionadas por meio de sorteio após autorização da CECAPS. Os idosos voluntários foram abordados pelo pesquisador responsável ou pela equipe de pesquisadores, na própria UBS, informados quanto à justificativa, objetivos e procedimentos a serem realizados, conforme orientações para pesquisa com seres humanos constantes na Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde. Foram abordados os idosos que se encontravam na sala de espera da UBS. Após esses procedimentos, aqueles que aceitaram participar da pesquisa, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Foi optado pela entrevista direta na aplicação dos questionários, em razão da possível dificuldade de leitura, problemas visuais e de compreensão dos questionamentos. Os questionários foram respondidos, em média, com 15 minutos de duração.

Análise dos dados

Na análise dos dados, foi utilizado frequência e percentual para as variáveis categóricas. Para as variáveis numéricas, inicialmente, foi verificada a normalidade dos dados por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov. Como os dados não apresentaram distribuição normal, foram utilizadas Mediana (Md) e Quartis (Q1; Q3) para a caracterização dos resultados. Na estatística inferencial, o teste do Qui-quadrado foi empregado para investigar a associação entre o nível de atividade física e as variáveis sociodemográficas, de saúde e a prevalência de comorbidades dos idosos. Na comparação do nível de atividade física em função da quantidade de comorbidades associadas foi utilizado o teste de Kruskal-Wallis, seguido do teste “U” de Mann-Whitney para pares de grupos. Considerou-se um nível de significância de p < 0,05.

Resultados

Nota-se a prevalência de idosos do sexo feminino (56,0%), casados (61,3%), com idade entre 60 e 69 anos (59,2%), renda mensal de 1 a 2 salários mínimos (70,0%), da raça branca (81,0%) e aposentados (75,0%). Observou-se também que a maioria dos idosos possuem ensino fundamental incompleto (43,0%). Já em relação ao perfil de saúde dos idosos usuários da atenção básica a saúde do município de Maringá, verificou-se que a maioria possui percepção de saúde boa (48,5%), tomam de 1 a 2 medicamentos regularmente (43,9%), não tiveram histórico de quedas (83,7%) ou quase quedas nos últimos 6 meses (79,7%) e nível de atividade física ativo/muito ativo (60,7%).

Conforme os achados da Tabela 1, os idosos não realizam atividades físicas vigorosas e poucas atividades moderadas durante a semana. No entanto, nota-se que, em relação à caminhada, os idosos apresentaram nos dias de caminhada mediana de 3,0, como mediana de 40,0 e 140,0 nos minutos de caminhada por dia e semana, respectivamente.

Tabela 1
Nível de atividade física e estado mental dos idosos usuários da atenção básica a saúde do município de Maringá, PR.

Em relação ao estado mental (Tabela 1), os idosos apresentaram alto escore na orientação temporal (Md = 5,0), Orientação espacial (Md = 5,0), memória imediata (Md = 3,0), evocação (Md = 3,0) e linguagem (Md = 8,0), com escore moderado para atenção e cálculo (Md = 2,0). No estado cognitivo geral, os idosos apresentaram mediana de 25,0.

Ao comparar o estado mental em função do nível de atividade física dos idosos usuários da atenção básica à saúde do município de Maringá (Tabela 2), verificou-se diferença significativa entre os grupos no estado mental na atenção e cálculo (p = 0,036), estado mental na evocação (p = 0,001) e no estado cognitivo geral (p = 0,002). Este achado parece indicar que os idosos Muito ativos/ativos apresentam maior escore nestes domínios cognitivos em comparação aos com menor nível de atividade física.

Tabela 2
Comparação do estado mental em função do nível de atividade física dos idosos usuários da atenção básica a saúde do município de Maringá, PR.

Ao analisar a correlação entre as variáveis de atividade física e estado mental (Tabela 3), verificou-se as seguintes correlações significativas (p < 0,05): orientação temporal e dias de caminhada (r = 0,13); orientação espacial com dias de atividade vigorosa (r = -0,17), minutos de atividade vigorosa por dia (r = -0,16) e minutos de atividade vigorosa por semana (r = -0,16); atenção e cálculo com dias de caminhada (r = 0,12), minutos de caminhada por dia (r = 0,16) e minutos de caminhada por semana (r = 0,16); evocação com dias de caminhada (r = 0,20), minutos de caminhada por dia (r = 0,26), minutos de caminhada por semana (r = 0,25), dias de atividade vigorosa (r = 0,16), minutos de atividade vigorosa por dia (r = 0,16) e minutos de atividade vigorosa por semana (r = 0,14); linguagem com dias de caminhada (r = 0,11); estado cognitivo geral com dias de caminhada (r = 0,20), minutos de caminhada por dia (r = 0,16) e minutos de caminhada por semana (r = 0,19).

Tabela 3
Correlação entre o nível de atividade física e o estado mental dos idosos.

Discussão

Os principais resultados deste estudo mostram que idosos com maiores níveis de atividade física possuem melhores escores de estado cognitivo geral quando comparados com sujeitos que demonstraram baixo nível de atividade física e / ou sedentarismo.

Algumas variáveis podem impactar negativamente nas funções cognitivas no envelhecimento. Dentre estas, o grau de escolaridade apresentado pelos idosos neste estudo pode ter influenciado nos resultados aqui mostrados, já que 43% dos sujeitos não possuíam ensino fundamental completo.

Mas apesar disso, bons níveis de atividade física e pratica regular de exercícios pode ser uma ótima ferramenta para combater tais disfunções cognitivas nessa população. A literatura mostra que quantidades adequadas de atividade física e exercícios físicos podem melhorar aspectos morfológicos do cérebro, como por exemplo aumento da massa cerebral de várias regiões do cérebro, dentre as quais pode-se destacar o hipocampo (região responsável por funções de aprendizagem e memória). Além disso, podem ser observadas melhoras em mediadores bioquímicos que podem provocar alterações no cérebro e nas suas funções cognitivas1818 Hillman CH, Erickson KI, Kramer AF. Be smart, exercise your heart: exercise effects on brain and cognition. Nat Rev Neurosci 2008; 9(1):58-65.,1919 Erickson KI, Weinstein AM, Lopez OL. Physical activity, brain plasticity, and Alzheimer's disease. Arch Med Res 2012; 43(8):615-621.,2323 Lai KSP, Liu CS, Rau A, Lanctôt KL, Köhler CA, Pakosh M, Carvalho AF, Herrmann N. Peripheral inflammatory markers in Alzheimer's disease: a systematic review and meta-analysis of 175 studies. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2017; 88(10):876-882.,2424 Dinoff A, Herrmann N, Swardfager W, Liu CS, Sherman C, Chan S, Lanctôt KL. The Effect of Exercise Training on Resting Concentrations of Peripheral Brain-Derived Neurotrophic Factor (BDNF): A Meta-Analysis. PLoS One 2016; 11(9):e0163037., sendo que o aumento de alguns desses mediadores, como as neurotrofinas, podem ajudar na manutenção, crescimento dos neurônios e assim melhorando a plasticidade neural do sujeito.

Um fator importante para ter um envelhecimento saudável é sempre manter bons níveis de atividade física, tanto para a saúde física quanto para a saúde mental1919 Erickson KI, Weinstein AM, Lopez OL. Physical activity, brain plasticity, and Alzheimer's disease. Arch Med Res 2012; 43(8):615-621.,2525 Knaepen K, Goekint M, Heyman EM, Meeusen R. Neuroplasticity - exercise-induced response of peripheral brain-derived neurotrophic factor: a systematic review of experimental studies in human subjects. Sport Med 2010; 40(9):765-801.. A Organização Mundial de Saúde1616 World Health Organization. Preventing Chronic Diseases: a Vital Investment. World Health 2005; 202. afirma que a prática regular de exercícios tem o poder de prevenir, minimizar e/ou reverter muitos dos problemas que frequentemente acompanham o processo de envelhecimento.

O exercício físico pode influenciar na performance cognitiva e suas funções neurológicas por diversos motivos: a) em função do aumento nos níveis dos neurotransmissores e por mudanças em estruturas cerebrais (isso seria evidenciado na comparação de indivíduos fisicamente ativos x sedentários); b) pela melhora cognitiva observada em indivíduos com prejuízo mental (baseado na comparação com indivíduos saudáveis); c) na melhora limitada obtida por indivíduos idosos, em função de uma menor flexibilidade mental/atencional quando comparado com um grupo jovem1818 Hillman CH, Erickson KI, Kramer AF. Be smart, exercise your heart: exercise effects on brain and cognition. Nat Rev Neurosci 2008; 9(1):58-65.,2525 Knaepen K, Goekint M, Heyman EM, Meeusen R. Neuroplasticity - exercise-induced response of peripheral brain-derived neurotrophic factor: a systematic review of experimental studies in human subjects. Sport Med 2010; 40(9):765-801..

Partindo desse pressuposto, precisa ser destacado ainda que a ação do exercício físico sobre a função cognitiva pode ser direta ou indireta. Os mecanismos que agem diretamente aumentando a velocidade do processamento cognitivo seriam uma melhora na circulação cerebral e alteração na síntese e degradação de neurotransmissores. Além dos mecanismos diretos, outros, tais como diminuição da pressão arterial, decréscimo dos níveis de LDL e triglicérides no plasma sanguíneo e inibição da agregação plaquetária parecem agir indiretamente, melhorando essas funções e também a capacidade funcional geral, refletindo-se desta maneira no aumento da qualidade de vida2626 Antunes HKM, Santos RF, Cassilhas R, Santos RVT, Bueno OFA, Mello T. Exercício físico e função cognitiva: uma revisão. Rev Bras Med do Esporte 2006; 12(2):108-114..

Dados epidemiológicos sugerem que pessoas moderadamente ativas têm menor risco de ser acometidas por desordens mentais do que as sedentárias, mostrando que a participação em programas de exercícios físicos exerce benefícios na esfera física e psicológica, e que indivíduos fisicamente ativos provavelmente possuem um processamento cognitivo mais rápido44 Prince M, Bryce R, Albanese E, Wimo A, Ribeiro W, Ferri CP. The global prevalence of dementia: A systematic review and metaanalysis. Alzheimer's Dement 2013; 9(1):63-75.,1919 Erickson KI, Weinstein AM, Lopez OL. Physical activity, brain plasticity, and Alzheimer's disease. Arch Med Res 2012; 43(8):615-621..

Vale destacar que durante o processo de envelhecimento outras alterações ocorrem concomitantemente à essas alterações neurofisiológicas e cognitivas. Dentre essas, podemos destacar alterações na composição corporal, que por sua vez pode estar estritamente relacionado com piora nas funções cognitivas2727 Arnoldussen IAC, Kiliaan AJ, Gustafson DR. Obesity and dementia: Adipokines interact with the brain. Eur Neuropsychopharmacol 2014 ;24(12):1982-1999.,2828 Huang C, Mari DC, Whitehurst M, Slusher A, Wilson A, Shibata Y. Physiology & Behavior Brain-derived neurotrophic factor expression ex vivo in obesity. Physiol Behav 2014; 123:76-79.. Essa associação da composição corporal, principalmente aumento da gordura corporal e declínio cognitivo, está relacionada às alterações de mediadores inflamatórios provocados pelo acumulo de gordura2929 Singh-Manoux A, Dugravot A, Shipley M, Brunner EJ, Elbaz A, Sabia S, Kivimaki M. Obesity trajectories and risk of dementia: 28 years of follow-up in the Whitehall II Study. Alzheimers Dement 2017; 14(2):178-186.. Esse aumento da inflamação sistêmica pode alcançar níveis centrais, fazendo com que tais moléculas atravessem a barreira hematopoiética, que por sua vez, vão provocar inflamação no tecido cerebral e assim causando danos teciduais e fazendo com que haja morte de neurônios e por fim piorando funções cognitivas3030 Miller AA, Spencer SJ. Obesity and neuroinflammation: a pathway to cognitive impairment. Brain Behav Immun 2014; 42:10-21..

Ou seja, além da prática de exercícios físicos e atividade física já possuírem um impacto positivo sobre funções cognitivas, a manutenção de um peso corporal adequado é importante aliado contra essas disfunções do envelhecimento.

Dada a relevância dos achados sobre o tema e em razão do impacto que a prática de exercícios pode ter sobre a cognição e consequentemente sobre a qualidade de vida de idosos, é importante a realização de outros estudos na área. Especificamente no Brasil, onde essa relação é ainda pouco explorada, trabalhos sobre o tema podem ser relevantes para o conhecimento dos hábitos relacionados às atividades e de suas consequências para nossa população.

Conclusão

Os resultados deste estudo podem ajudar profissionais que atuam na prescrição de atividades físicas e exercícios, pois proporcionam informações relevantes, mostrando que idosos fisicamente ativos possuem uma maior chance de manter suas funções cognitivas durante o processo de envelhecimento.

Com isso, concluímos que níveis adequados de atividade física (~150 min/semana) podem estar relacionados a melhores escores de funções cognitivas de sujeitos idosos.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Out 2019
  • Data do Fascículo
    Nov 2019

Histórico

  • Recebido
    28 Set 2017
  • Aceito
    17 Abr 2018
  • Publicado
    19 Abr 2018
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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