Centro de Referência e Treinamento DST/AIDS-SP. Coordenadoria de Controle de Doença, Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Guia de bolso para o manejo de sífilis em gestante e sífilis congênita. 2ª Edição. São Paulo: Secretaria de Estado da Saúde; 2016.

Isabela Colem Castelo Borges Carla Jorge Machado Sobre os autores
2016

A infecção por sífilis na gestação é um grave problema de saúde pública, relacionado ainda à sífilis congênita. A sífilis congênita, na maior parte dos casos, associa-se às gestantes que não realizam a triagem para sífilis, e/ou que não são tratadas adequadamente ou sem tratamento. Assim, sua detecção e manejo são de suma importância11 Padovani C, Oliveira RR, Pelloso SM. Sífilis na gestação: associação das características maternas e perinatais em região do sul do Brasil. Rev Latino-Am Enfermagem. 2018;26:e3019..

Em setembro de 2017, o departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das IST, do HIV/Aids e das Hepatites Virais lançou, pela Nota informativa Nº 2-SEI/2017-. DIAHV/SVS/MS22 Nota Informativa Nº 2 (MS/SEI). DIAHV/SVS/MS. Altera os Critérios de Definição de Caso para notificação de Sífilis Adquirida, Sífilis em Gestante e Sífilis Congênita. Disponível em: http://portalsinan.saude.gov.br/images/documentos/Agravos/Sifilis-Ges/Nota_Informativa_Sifilis.pdf
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, novos critérios para a definição de sífilis congênita, adquirida em gestantes, alinhando-se às recomendações da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) e da Organização Mundial de Saúde (OMS). Foram então definidas situações específicas para considerar a ocorrência de sífilis em gestantes, quais sejam: mulheres que não foram tratadas e apresentaram pelo menos um tipo de teste, treponêmico ou não, positivo durante não só na gestação, mas também no parto e puerpério; mulheres sintomáticas que apresentem pelo menos um dos tipos de teste positivo durante o mesmo período citado; e mulheres que foram tratadas, mas apresentaram ambos os testes reagentes, também no mesmo período. No caso da sífilis congênita, são definidos critérios diferentes para recém-nascidos, menores de treze anos e resultados de biópsias e necropsias. Entre as mudanças realizadas nesses critérios, propostas pela Nota informativa22 Nota Informativa Nº 2 (MS/SEI). DIAHV/SVS/MS. Altera os Critérios de Definição de Caso para notificação de Sífilis Adquirida, Sífilis em Gestante e Sífilis Congênita. Disponível em: http://portalsinan.saude.gov.br/images/documentos/Agravos/Sifilis-Ges/Nota_Informativa_Sifilis.pdf
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, encontram-se: ausência de consideração do tratamento da parceria sexual da mãe para definir tratamento inadequado, necessidade de se realizar pelo menos duas diluições para o teste não treponêmico, e, finalmente, possibilidade de se conseguir obter material de secreção nasal ou lesão cutânea para avaliação laboratorial22 Nota Informativa Nº 2 (MS/SEI). DIAHV/SVS/MS. Altera os Critérios de Definição de Caso para notificação de Sífilis Adquirida, Sífilis em Gestante e Sífilis Congênita. Disponível em: http://portalsinan.saude.gov.br/images/documentos/Agravos/Sifilis-Ges/Nota_Informativa_Sifilis.pdf
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Para análise epidemiológica da sífilis congênita e em gestante no Brasil, um documento de referência é o Boletim Epidemiológico de Sífilis, de 2017. De acordo com este boletim, as taxas de incidência de sífilis congênita e de sífilis em gestante aumentaram cerca de três vezes entre 2010 e 2016, e o aumento de 2015 para 2016 foi de, respectivamente, 4,7% e 14,7%. Entre os casos, pode-se destacar que cerca de 51,6% das gestantes com sífilis encontravam-se na faixa etária de 20 a 29 anos entre 2005 e 2007 e, em 2016, 53,6% das mulheres não tinham ensino médio completo. A doença, responsável por causar nas mães sinais como acometimentos ósseos, neurológicos e cardiovasculares e, nos bebês, nascimento prematuro, pneumonia e má formação, vem crescendo no país e necessita ser precisamente notificada para o delineamento adequado de ações governamentais. Considerando-se que a sífilis é um agravo 100% evitável com a aplicação das medidas adequadas à gestante33 Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde (MS). Boletim Epidemiológico - Sífilis. Brasília: Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das IST, do HIV/Aids e das Hepatites Virais - DIAVH/SVS/MS; 2017. Disponível em: http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2017/novembro/13/BE-2017-038-Boletim-Sifilis-11-2017-publicacao-.pdf
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, fica evidente a necessidade de se saber identificar e notificar a doença, assim como de ter conhecimento do manejo de mães e crianças afetadas.

Material importante que pode auxiliar médicos e outros profissionais da saúde é o Guia de Bolso para Manejo da Sífilis em Gestantes e Sífilis Congênita, publicado em 2016, pela Coordenadoria de Controle de Doenças de São Paulo44 Centro de Referência e Treinamento DST/AIDS-SP. Coordenadoria de Controle de Doença, Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Guia de bolso para o manejo de sífilis em gestante e sífilis congênita. 2a Edição. São Paulo: Secretaria de Estado da Saúde; 2016. Disponível em: http://www.saude.campinas.sp.gov.br/doencas/sifilis/guiadebolsodasifilis_2edicao2016.pdf
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. Seu conteúdo aborda o assunto de maneira organizada e completa, tratando desde a definição dos casos da doença até o diagnóstico clínico e laboratorial, tratamento, encaminhamento e vigilância epidemiológica. A sífilis exige atenção aos detalhes: sinais clínicos variam de acordo com as fases da doença, seu diagnóstico prescinde de testes sorológicos determinados que, além de variados, reagem com precisão diferente de acordo com a fase da sífilis e, como qualquer outra doença, o tratamento está sujeito a variáveis como a paciente ter perdido doses, ser alérgica ao medicamento ou estar infectada por outra doença, destacando-se, na sífilis, a infecção por HIV. Logo, a sífilis exige alto conhecimento técnico, acadêmico e científico para seu manejo correto, sendo apenas um dos diversos acometimentos que os profissionais de saúde precisam estar familiarizados, especialmente em seus cursos de graduação e especialização, o que valoriza o Guia como material de consulta.

Como exposto, a sífilis apresenta variadas formas de diagnóstico, posologia de medicamento e manifestação, e cada caso possui sua condução específica. Os fluxogramas e quadros presentes no Guia se tornam ferramentas valiosas, podendo ser citados: esquema de evolução da sífilis, que apresenta a reatividade de testes sorológicos e a chance de transmissão vertical; quadro de manifestações clínicas da doença por fases, que descreve o tipo de lesão, localização, entre outros aspectos; fluxogramas de atenção à gestante; fluxograma de condutas no recém-nascido. Ao colocarem as informações, geralmente técnicas e operacionais, de forma gráfica, alivia-se a carga de texto do Guia, facilita-se a compreensão do leitor e até contribui-se para uma melhor organização mental do conteúdo. Esses recursos, todavia, poderiam ser utilizados com mais frequência para substituir determinados textos, uma vez que se trata de um guia de bolso, nome este que sugere um objetivo de tratar o tema de forma concisa. No caso do tópico que trata do seguimento e controle de cura de recém-nascido com sífilis congênita, ou expostos a sífilis materna, por exemplo, muitas das informações se repetem no diagrama que vem logo depois do texto, sendo que tal diagrama apresenta as informações de forma mais clara e seria, por si só, suficiente.

Enquanto algumas seções poderiam ter sido mais sintéticas - sendo outro exemplo a nota explicativa de tratamento inadequado para sífilis materna, repetido menos de quinze páginas depois - o tópico Aspectos do Diagnóstico Laboratorix'1al (item 1.2.2) poderia ter sido aprofundado. São apresentados testes treponêmicos, ou seja, aqueles que reagem de acordo com anticorpos específicos para o Treponema pallidum e testes não treponêmicos, com esses últimos usados para monitoramento do tratamento, uma vez que os primeiros podem ser reagentes durante toda a vida, mesmo após a infecção ter cessado. A forma como esses testes não treponêmicos funcionam poderia ter sido explicada, o que contribuiria para melhor compreensão da diferença entre os dois tipos de testes e, também, do porquê das chances de falso-positivos nos testes não treponêmicos, situação apenas citada no Guia. Ademais, é indicado que o teste rápido deve ser o primeiro a ser realizado, como forma de triagem, mas, entre os testes posteriores, quais sejam, de confirmação ou acompanhamento, informa-se apenas se são ou não treponêmicos, sem indicar qual dos testes citados, como o FTA-Abs ou o ELISA, deve ser usado. Assim, a despeito de sensibilidade e especificidade de cada teste terem sido expostas em quadro, não ficou claro qual teste de cada tipo é o mais apropriado para uso recorrente e nem quais devem ser os critérios de escolha em cada situação, ou se devem ser utilizados de forma combinada.

Apesar disso, o Guia de Bolso para Manejo da Sífilis em Gestantes e Sífilis Congênita é, sem dúvida, muito bem escrito e estruturado. De fato, os guias, usualmente baseados em diretrizes clínicas, podem melhorar a qualidade das decisões clínicas, oferecendo recomendações explícitas para médicos que não têm certeza sobre como proceder, e ajudam, assim, a promover práticas atualizadas e melhoram a consistência dos cuidados55 Woolf SH, Grol R, Hutchinson A, Eccles M, Grimshaw J. Clinical guidelines: potential benefits, limitations, and harms of clinical guidelines. BMJ 1999;318(7182):527-530.. Nisso reside a maior virtude de ter disponíveis guias como este, que está, inclusive ao alcance do usuário em sítio de internet.

Finalmente, no Guia de Bolso para Manejo da Sífilis em Gestantes e Sífilis Congênita, as perguntas ao final das duas sessões tratam de casos mais complexos, que podem gerar dúvidas aos profissionais de saúde: a preocupação de colocá-las no guia demonstra a intenção do corpo técnico que o elaborou de, além de deixar a leitura mais dinâmica, elucidar quaisquer questões que podem aparecer no dia a dia de um centro de referência em infectologia. Também, destaca-se o Guia como iniciativa da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, que, com a sua elaboração, entrou em consonância com a Agenda de Ações Estratégicas para Redução da Sífilis no Brasil66 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais. Agenda de Ações Estratégicas para Redução da Sífilis no Brasil. Brasília: Ministério da Saúde; 2017. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/agenda-de-acoes-estrategicas-para-reducao-da-sifilis-no-brasil
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, a qual substituiu, em 2017, a Agenda de Ações Estratégicas para Redução da Sífilis Congênita no Brasil. Por fim, sugere-se a publicação de nova edição, pois alguns de seus conceitos se tornaram desatualizados com as alterações realizadas pela Nota informativa22 Nota Informativa Nº 2 (MS/SEI). DIAHV/SVS/MS. Altera os Critérios de Definição de Caso para notificação de Sífilis Adquirida, Sífilis em Gestante e Sífilis Congênita. Disponível em: http://portalsinan.saude.gov.br/images/documentos/Agravos/Sifilis-Ges/Nota_Informativa_Sifilis.pdf
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Referências

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    Padovani C, Oliveira RR, Pelloso SM. Sífilis na gestação: associação das características maternas e perinatais em região do sul do Brasil. Rev Latino-Am Enfermagem 2018;26:e3019.
  • 2
    Nota Informativa Nº 2 (MS/SEI). DIAHV/SVS/MS. Altera os Critérios de Definição de Caso para notificação de Sífilis Adquirida, Sífilis em Gestante e Sífilis Congênita Disponível em: http://portalsinan.saude.gov.br/images/documentos/Agravos/Sifilis-Ges/Nota_Informativa_Sifilis.pdf
    » http://portalsinan.saude.gov.br/images/documentos/Agravos/Sifilis-Ges/Nota_Informativa_Sifilis.pdf
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    Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde (MS). Boletim Epidemiológico - Sífilis Brasília: Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das IST, do HIV/Aids e das Hepatites Virais - DIAVH/SVS/MS; 2017. Disponível em: http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2017/novembro/13/BE-2017-038-Boletim-Sifilis-11-2017-publicacao-.pdf
    » http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2017/novembro/13/BE-2017-038-Boletim-Sifilis-11-2017-publicacao-.pdf
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    Centro de Referência e Treinamento DST/AIDS-SP. Coordenadoria de Controle de Doença, Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Guia de bolso para o manejo de sífilis em gestante e sífilis congênita 2a Edição. São Paulo: Secretaria de Estado da Saúde; 2016. Disponível em: http://www.saude.campinas.sp.gov.br/doencas/sifilis/guiadebolsodasifilis_2edicao2016.pdf
    » http://www.saude.campinas.sp.gov.br/doencas/sifilis/guiadebolsodasifilis_2edicao2016.pdf
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    Woolf SH, Grol R, Hutchinson A, Eccles M, Grimshaw J. Clinical guidelines: potential benefits, limitations, and harms of clinical guidelines. BMJ 1999;318(7182):527-530.
  • 6
    Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais. Agenda de Ações Estratégicas para Redução da Sífilis no Brasil Brasília: Ministério da Saúde; 2017. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/agenda-de-acoes-estrategicas-para-reducao-da-sifilis-no-brasil
    » http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/agenda-de-acoes-estrategicas-para-reducao-da-sifilis-no-brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Out 2019
  • Data do Fascículo
    Nov 2019
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revscol@fiocruz.br