Validação da versão brasileira do World Health Organization Disability Assessment Schedule 2.0 em indivíduos HIV/AIDS

Karolyne Stéfanie Sousa Barbosa Shamyr Sulyvan de Castro Camila Ferreira Leite Franciele Rodrigues Nacci Marilita Falangola Accioly Sobre os autores

Resumo

O WHODAS 2.0 (World Health Organization Disability Assesment Schedule) é um instrumento criado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para medida de funcionalidade e deficiência, fundamentado no modelo biopsicossocial e totalmente amparado no arcabouço teórico-conceitual da CIF (Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde). O objetivo deste artigo é validar a versão brasileira do WHODAS 2.0 para o uso em pessoas com HIV/AIDS. Participaram 100 pessoas com diagnóstico de HIV/AIDS. Foram utilizados dois instrumentos de avaliação, o WHODAS 2.0 na versão de 36 itens e o WHOQoL-HIV-Bref (World Health Organization Quality of Life em pessoas com HIV, versão abreviada). As propriedades psicométricas testadas foram consistência interna e validade de critério. A consistência interna foi adequada para todos os domínios, com exceção do domínio Atividades de Vida (α = 0,69) e Autocuidado (α = 0,32). A validade de critério foi adequada, com correlações moderadas aos domínios do WHODAS 2.0 com os domínios do WHOQoL-HIV-Abreviado. Os resultados indicaram o instrumento WHODAS 2.0 como válido para avaliação da funcionalidade de pessoas com HIV/AIDS. O uso dos dados do domínio de Autocuidado deve ser cuidadosamente considerado.

Palavras-chave
Estudos de Validação; Avaliação da Deficiência; Síndrome de Imunodeficiência Adquirida

Introdução

A avaliação da incapacidade nos permite obter uma visão minuciosa das implicações que uma condição de saúde tem no dia a dia de uma pessoa11 Silva C, Coleta I, Silva AG, Amaro A, Alvarelhão J, Queirós A, Rocha N. Adaptation and validation of WHODAS 2.0 in patients with musculoskeletal pain. Rev Saude Publica 2013; 47(4):752-758.. Isso se torna particularmente relevante porque as diversas condições crônicas existentes geram impactos diferentes na funcionalidade, sendo assim necessária uma avaliação mais completa que verifique de que forma as doenças crônicas estão afetando as atividades de vida dos indivíduos22 Moraes SA, Lopes DA, Freitas ICM. Avaliação do efeito independente de doenças crônicas, fatores sociodemográficos e comportamentais sobre a incapacidade funcional em idosos residentes em Ribeirão Preto, SP, 2007 - Projeto EPIDCV. Rev Bras Epidemiol 2015; 18(4):757-770..

A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), que segue o modelo biopsicossocial proposto pela Organização Mundial da Saúde (OMS), define incapacidade como um termo genérico para deficiências, limitações de atividade e restrições de participação. Ele indica os aspectos negativos da interação entre um indivíduo (com uma condição de saúde) e seus fatores contextuais (fatores ambientais e pessoais)33 Organização Mundial da Saúde (OMS). Como usar a CIF: Um manual prático para o uso da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF). Versão preliminar para discussão. Genebra: OMS; 2013..

Amparado no modelo teórico-conceitual da CIF, a OMS desenvolveu o World Health Organization Disability Assessment Schedule - WHODAS 2.0, um instrumento de fácil aplicação que fornece um modelo padronizado de mensuração da saúde e deficiência, adaptado transculturalmente, que avalia a incapacidade percebida associada à condição de saúde nos 30 dias que antecedem sua aplicação44 Castro SS, Leite CF. Translation and cross-cultural adaptation of the World Health Organization Disability Assessment Schedule - WHODAS 2.0. Fisioter Pesqui 2017; 24(4):385-391.. O WHODAS 2.0 também possibilita traçar e monitorar o impacto de intervenções em saúde ou relacionadas à saúde55 Ustün TB, Kostanjsek N, Chatterji S, Rehm J, editores. Measuring health and disability: manual for WHO Disability Assessment Schedule (WHODAS 2.0). Genebra: WHO; 2010..

Dentre as inúmeras doenças crônicas que geram incapacidade e consequente alteração da funcionalidade, está a infecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) e a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA/AIDS)66 Stenholm S, Westerlund H, Head J, Hyde M, Kawachi I, Pentt J, Kivimäki M, Vahtera J. Comorbidity and Functional Trajectories From Midlife to Old Age: The Health and Retirement Study. J Gerontol A Biol Sci Med Sci 2015; 70(3):332-338.. A infecção pelo HIV afigura-se como uma experiência com um profundo impacto biopsicossocial e que gera muitas mudanças no cotidiano do indivíduo77 Castanha AR, Coutinho MPL, Saldanha AAW, Oliveira JSC. Bio-psychosocial consequences of AIDS on the Quality of Life of HIV Serum-Positive People. DST J Bras Doenças Sex Transm 2006; 18(2):100-107.. No contexto psicossocial, a infecção pelo vírus traz repercussões desde que o indivíduo recebe o diagnóstico, gerando forte impacto psicossocial e comportamental, devido aos estigmas socialmente construídos em relação ao HIV, o que acarreta frequentemente em depressão, isolamento social, diminuição da autoestima, e da autopercepção, levando a uma alteração também nas suas atividades ocupacionais e integração social88 Carrapato JFL, Resende MHM, Santos NO. People living with HIV/AIDS: diagnosis of a death sentence? Rev Emancipação, Ponta Grossa 2014; 14(2):321-336.. Já no aspecto biológico, a infecção pelo vírus pode gerar perturbações fisiológicas e interferir na locomoção e na destreza do indivíduo, acarretando alteração na mobilidade, no nível de independência física e na sua capacidade para o trabalho77 Castanha AR, Coutinho MPL, Saldanha AAW, Oliveira JSC. Bio-psychosocial consequences of AIDS on the Quality of Life of HIV Serum-Positive People. DST J Bras Doenças Sex Transm 2006; 18(2):100-107.,99 Silva LC, Felício EEAA, Cassétte JB, Soares LA, Morais RA, Prado TS, Guimarães DA. Impacto psicossocial do diagnóstico de HIV/aids em idosos atendidos em um serviço público de saúde. Rev Bras Geriatr Gerontol 2015; 18(4):821-833..

HIV/AIDS tem impacto direto na funcionalidade da população infectada. Desta forma, torna-se importante a validação e uso de uma ferramenta de aferição da funcionalidade nesta população. A validação do instrumento WHODAS para esta amostra de sujeitos permitirá a abordagem do constructo sob uma perspectiva biopsicossocial, permitindo aos pesquisadores e clínicos a quantificação, avaliação e comparação da funcionalidade de indivíduos com HIV/AIDS. Sendo assim, o objetivo deste estudo foi validar a versão brasileira do WHODAS 2.0 para o seu uso na população com HIV/AIDS.

Métodos

Trata-se de um estudo de validação, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa. Todos os participantes da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A amostra do estudo foi obtida por conveniência, sendo que os participantes foram convidados a colaborar com a pesquisa enquanto aguardavam o atendimento no Ambulatório de Infectologia da Universidade Federal do Triângulo Mineiro - UFTM.

Para ser incluído na pesquisa o participante necessitava apresentar diagnóstico de HIV/AIDS, e realizar seu acompanhamento médico no Ambulatório de Infectologia. Foram excluídos da amostra aqueles participantes que apresentavam coexistência de qualquer doença ou distúrbio secundário ao HIV/AIDS, com potencialidade para interferir na sua funcionalidade, bem como os sujeitos que apresentaram dificuldade para compreensão dos instrumentos aplicados.

No total, foram 100 portadores de HIV/AIDS avaliados, o que permitiu a obtenção de um índice de confiança de 95% e um desvio padrão de ± 0,341010 Bland JM, Altman DG. Statistical methods for assessing agreement between two methods of clinical measurement. Lancet 1986; 8476(1):307-310..

Instrumentos

WHODAS 2.0

O WHODAS 2.0 é um instrumento genérico de avaliação, desenvolvido pela OMS, para fornecer um método padronizado de medir a saúde e deficiência de forma intercultural1111 Castro SS, Leite CF, editores. Measuring health and disability: manual for WHO Disability Assessment Schedule (WHODAS 2.0) [documento na Internet]. Genebra: WHO; 2015. [acessado 2017 Mar 10]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/43974/19/9788562599514_por.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
. Já foi traduzido e validado para ser utilizado em diferentes línguas e em diferentes condições de saúde. Possui sete versões distintas, que diferem quanto ao número de itens (12; 36 ou o modo híbrido, chamado de 12+24) bem como em relação à modalidade de aplicação, que pode ser autoadministrada, aplicada por entrevista ou administrada a um respondente substituto (proxy). Este instrumento aborda a funcionalidade segundo os domínios: cognição, mobilidade, autocuidado, relações interpessoais, atividades de vida e participação1111 Castro SS, Leite CF, editores. Measuring health and disability: manual for WHO Disability Assessment Schedule (WHODAS 2.0) [documento na Internet]. Genebra: WHO; 2015. [acessado 2017 Mar 10]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/43974/19/9788562599514_por.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
.

No presente estudo, foi utilizada a versão mais completa, com 36 itens, aplicada por meio de entrevistas. Esse instrumento permite gerar pontuações para os seis domínios de funcionalidade e calcular uma pontuação de funcionalidade geral, que pode variar de 0 a 100, sendo que quanto maior for o escore pior é a funcionalidade. Para realizar o estudo, o entrevistador passou por um treinamento, para a aplicação conforme o recomendado pela OMS1111 Castro SS, Leite CF, editores. Measuring health and disability: manual for WHO Disability Assessment Schedule (WHODAS 2.0) [documento na Internet]. Genebra: WHO; 2015. [acessado 2017 Mar 10]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/43974/19/9788562599514_por.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
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WHOQOL-HIV abreviado

Consiste em um instrumento de avaliação da Qualidade de Vida (QV) direcionado para portadores do HIV/AIDS desenvolvido pela OMS1212 THE WHOQOL-HIV GROUP. WHOQOL-HIV instrument users manual. Genebra: WHO; 2002., que já está validado para o uso no Brasil1313 Zimpel R, Fleck MPA. Quality of life in HIV-positive Brazilians: application and validation of the WHOQOL-HIV, Brazilian version. AIDS Care, Abingdon 2007; 19(7):923-930.. O WHOQOL-HIV é composto dos mesmos domínios da versão ampliada WHOQOL-100 - físico, psicológico, nível de independência, relações sociais, meio ambiente e espiritualidade/religiosidade/crenças pessoais. Com o objetivo de encontrar uma forma de avaliação da QV menos demorada, mas igualmente válida, o Grupo de Qualidade de Vida da OMS desenvolveu uma versão reduzida do WHOQOL-HIV: o WHOQOL-HIV-Abreviado. Este instrumento é constituído por 31 perguntas, duas de âmbito mais geral (que avaliam a qualidade de vida geral e a percepção geral de saúde) e 29 representando facetas específicas. Sua pontuação é dada em forma de escala Likert de cinco pontos, e os resultados dos domínios e da faceta geral são transformados numa escala de 0 a 100, de acordo com as recomendações originais, sendo que os resultados mais elevados corresponderão a uma melhor QV1212 THE WHOQOL-HIV GROUP. WHOQOL-HIV instrument users manual. Genebra: WHO; 2002..

Procedimentos

Dois entrevistadores treinados aplicaram os questionários acima citados, em um único momento e todas as entrevistas foram realizadas em salas específicas respeitando a privacidade do paciente. O primeiro procedimento realizado foi o preenchimento da ficha de dados pessoais, seguido da aplicação do WHODAS 2.0 e do WHOQOL-HIV-Abreviado.

Análise estatística

Para a determinação da consistência interna do WHODAS 2.0 usou-se o teste estatístico Alpha de Cronbach. Considerou-se os seguintes parâmetros de alpha: 0,70-0,90: adequado; e > 0,95: questões redundantes1414 Buist-Bouwman MA, Ormel J, De Graaf R, Vilagut G, Alonso J, Van Sonderen E, Vollebergh WA, ESEMeD/MHEDEA 2000 Investigators. Psychometric properties of the World Health Organization disability assessment schedule used in the European Study of the Epidemiology of mental disorders. Int J Methods Psychiatr Res 2008; 17(4):185-197.. Em relação à validade de critério foi usado o Coeficiente de Correlação de Spearman (r). Para esse estudo, r de 0,10 a 0,39 - fraca/baixa associação; r de 0,40 a 0,69 - moderada; r a partir de 0,70 - forte/alta1515 Dancey CP, Reidy J. Estatística sem matemática para psicologia. 5ª ed. Porto Alegre: Penso; 2013..

Para avaliar a validade externa (convergente e divergente), utilizamos o coeficiente de correlação de Spearman. Como pressuposto, estabelecemos a hipótese relacional (convergente/divergente) entre o questionário WHODAS e os domínios do WHOQOL-HIV-Abreviado como mostrado na Tabela 1.

Tabela 1
Hipótese para as relações entre os domínios do WHODAS e os domínios do WHOQOL HIV Abreviado.

Todas as modalidades envolvidas no processo de validação implicam em uma única aplicação de cada instrumento a ser comparado, e para todas as análises foi adotado um nível de significância estatística de 5% e não foram encontrados valores ausentes nas análises realizadas.

Resultados

Caracterização da amostra

Participaram do estudo 100 pessoas, com idade média de 42,3 (± 12,04) anos, sendo 58% do sexo masculino. A maioria dos participantes era solteiro (48%) seguido por pessoas atualmente casadas (16%), separadas (20%), divorciados (4%), em união estável (5%), e viúvos (7%). No aspecto relacionado à profissão, 32% dos participantes são aposentados, 25% exercem trabalho remunerado, 16% são autônomos, 1% estudante e 26% se enquadram na opção “outro” que envolve pensionistas, do lar, entre outras. Quanto à classificação do estágio do HIV, 54% se enquadram como assintomáticos, 37% sintomáticos e 9% como AIDS.

A Tabela 2 mostra as médias e desvios padrão para os domínios e totais dos instrumentos WHODAS e WHOQOL-HIV-Abreviado.

Tabela 2
Distribuição das médias e desvios-padrão segundo domínios do WHODAS e WHOQOL - HIV.

Propriedades psicométricas

Os dados dos 36 itens foram verificados estatisticamente em cada um de seus domínios e organizados em tabelas.

A Tabela 3 evidencia os resultados para a consistência interna, que variou de 0,32 a 0,87.

Tabela 3
α de Cronbach segundo domínios do WHODAS 2.0.

A Tabela 4 apresenta os dados para a validade de critério, onde foi realizada a correlação dos domínios do WHODAS 2.0 com os domínios do WHOQoL-HIV-Abreviado, mostrando que de modo geral os questionários apresentaram uma correlação moderada.

Tabela 4
Correlação WHODAS 2.0 com WHOQoL HIV Bref.

Discussão

Pode-se constatar que o WHODAS 2.0 tem adequada consistência interna para a maioria dos fins de investigação, coerente com trabalhos publicados com os mesmos objetivos em outros países1616 Kutlay S, Küçükdeveci AA, Elhan AH, Oztuna D, Koç N, Tennant A. Validation of the World Health Organization disability assessment schedule II (WHODAS-II) in patients with osteoarthritis. Rheumatol Int 2011; 31(3):339-346.

17 Magistrale G, Pisani V, Argento O, Incerti CC, Bozzali M, Cadavid D, Caltagirone C, Medori R, DeLuca J, Nocentini U. Validation of the World Health Organization Disability Assessment Schedule II (WHODAS-II) in patients with multiple sclerosis. Mult Scler 2015; 21(4):448-456.

18 Tazaki M, Yamaguchi T, Yatsunami M, Nakane Y. Measuring functional health among the elderly: development of the Japanese version of the World Health Organization Disability Assessment Schedule II. Int J Rehabil Research 2014; 37(1):48-53.
-1919 Chiu TY, Yen CF, Chou CH, Lin JD, Hwang AW, Liao HF, Chi WC. Development of traditional Chinese version of World Health Organization Disability Assessment Schedule 2.0 36--item (WHODAS 2.0) in Taiwan: Validity and reliability analyses. Res Dev Disabil 2014; 35(11):2812-2820..

Em relação ao domínio Autocuidado, que apresentou um coeficiente Alpha abaixo do esperado, indicando baixa consistência interna, recomenda-se cuidado no uso das informações obtidas a partir desse domínio, pois podem não apresentar fidedignidade ao aferir o constructo.

Em relação à consistência interna do domínio Atividades de vida, a mesma pode ter sido baixa devido ao perfil da população estudada, e devido a não aplicabilidade de respostas no domínio 5, em “atividades escolares ou de trabalho”, pois os participantes em sua maioria eram aposentados, assim, os itens relacionados ao trabalho tiveram suas informações prejudicadas. Desta forma, sugerimos o uso da versão de 32 itens, que foi utilizada em 6 estudos encontrados na literatura1919 Chiu TY, Yen CF, Chou CH, Lin JD, Hwang AW, Liao HF, Chi WC. Development of traditional Chinese version of World Health Organization Disability Assessment Schedule 2.0 36--item (WHODAS 2.0) in Taiwan: Validity and reliability analyses. Res Dev Disabil 2014; 35(11):2812-2820.

20 Garin O, Ayuso-Mateos J, Almansa J, Nieto M, Chatterji S, Vilagut G, Alonso J, Cieza A, Svetskova O, Burger H, Racca V, Francescutti C, Vieta E, Kostanjsek N, Raggi A, Leonardi M, Ferrer M, MHADIE consortium. Validation of the "World Health Organization Disability Assessment Schedule, WHODAS-2" in patients with chronic diseases. Health Qual Life Outcomes 2010; 8:51.

21 Meesters JJL, Verhoef J, Liem ISL, Putter H, Vliet Vlieland TPM. Validity and responsiveness of the World Health Organization Disability Assessment Schedule II to assess disability in rheumatoid arthritis patients. Rheumatology (Oxford) 2010; 49(2):326-333.

22 Guilera G, Gómez-Benito J, Pino O, Rojo E, Vieta E, Cuesta MJ, Purdon SE, Bernardo M, Crespo-Facorro B, Franco M, Martínez-Arán A, Safont G, Tabarés-Seisdedos R, Rejas J, Spanish Working Group in Cognitive Function. Disability in bipolar I disorder: the 36-item World Health Organization Disability Assessment Schedule 2.0. J Affect Disord 2015; 174:353-360.

23 Wolf AC, Tate RL, Lannin NA, Middleton J, Lane-Brown A, Cameron ID. The World Health Organization Disability Assessment Scale, WHODAS II: reliability and validity in the measurement of activity and participation in a spinal cord injury population. J Rehabil Med 2012; 44(9):747-755.
-2424 Küçükdeveci AA, Kutlay S, Yildizlar D, Öztuna D, Elhan AH, Tennant A. The reliability and validity of the World Health Organization Disability Assessment Schedule (WHODAS-II) in stroke. Disabil Rehabil 2013; 35(3):214-220..

No presente estudo foram encontrados valores de coeficientes de correlação negativos na maioria das associações, isso ocorreu, pois, o WHODAS 2.0 e o WHOQoL-HIV-Abreviado possuem pontuação inversa. E no que se refere à intensidade da relação dos coeficientes, não houve correlação forte entre os instrumentos, sendo encontradas em sua maioria correlações moderadas entre os domínios. Salienta-se diante destes resultados que os instrumentos se correlacionam e são complementares, sendo utilizados com objetivos diferentes - enquanto o WHODAS avalia medidas de funcionalidade, o WHOQoL-HIV avalia medidas subjetivas de bem-estar - além do que, os domínios de cada um dos instrumentos são similares, mas não idênticos.

No caso da validade convergente, podemos observar que o domínio Cognição do WHODAS 2.0 apresentou moderada correlação significativa com o domínio Psicológico, Meio Ambiente e Total do WHOQoL-HIV-Abreviado. Do mesmo modo, o domínio Mobilidade apresentou correlação moderada e significativa com o domínio Nível de Independência. O domínio Total do WHODAS mostrou correlação com o domínio Total do WHOQoL-HIV-Abreviado. Desta forma, os resultados mostrados acima suportam a validade convergente do WHODAS.

Para verificar a validade divergente alguns domínios não relacionados foram escolhidos para ilustrar esta propriedade psicométrica. Não houve correlação significativa entre os domínios Cognitivo e Mobilidade do WHODAS 2.0 com o domínio Físico do WHOQoL-HIV-Abreviado; entre o domínio Autocuidado do WHODAS 2.0 com os domínios Social e Religiosidade do WHOQoL-HIV-Abreviado; e entre o domínio Relações Interpessoais do WHODAS 2.0 com os domínios Físico e Meio Ambiente do WHOQoL-HIV-Abreviado.

Do mesmo modo que outros estudos encontrados na literatura que aplicaram a versão de 36 itens, a validação da versão brasileira do WHODAS 2.0 de uma forma geral mostrou propriedades psicométricas satisfatórias, permitindo seu uso para avaliar a funcionalidade em pacientes com HIV/AIDS1616 Kutlay S, Küçükdeveci AA, Elhan AH, Oztuna D, Koç N, Tennant A. Validation of the World Health Organization disability assessment schedule II (WHODAS-II) in patients with osteoarthritis. Rheumatol Int 2011; 31(3):339-346.,1818 Tazaki M, Yamaguchi T, Yatsunami M, Nakane Y. Measuring functional health among the elderly: development of the Japanese version of the World Health Organization Disability Assessment Schedule II. Int J Rehabil Research 2014; 37(1):48-53.,2020 Garin O, Ayuso-Mateos J, Almansa J, Nieto M, Chatterji S, Vilagut G, Alonso J, Cieza A, Svetskova O, Burger H, Racca V, Francescutti C, Vieta E, Kostanjsek N, Raggi A, Leonardi M, Ferrer M, MHADIE consortium. Validation of the "World Health Organization Disability Assessment Schedule, WHODAS-2" in patients with chronic diseases. Health Qual Life Outcomes 2010; 8:51.,2525 Federici S, Meloni F, Mancini A, Lauriola M, Olivetti Belardinelli M. World Health Organization Disability Assessment Schedule II: contribution to the Italian Validation. Disabil Rehabil 2009; 31(7):553-564.,2626 Downing NR, Kim JI, Williams KJ, Long JD, Mills JA, Paulsen JS. WHODAS 2.0 in prodromal Huntington disease: Measures of functioning in neuropsychiatric disease. Eur J Hum Genet 2014; 22(8):958-963..

Como pontos positivos salienta-se que o mesmo trouxe grande contribuição para a literatura científica, visto que, até o momento não existem ferramentas traduzidas para o português brasileiro que avaliem a funcionalidade da população HIV/AIDS, de modo abrangente e de acordo com as recomendações da OMS. Mais importante que isso, este estudo oportuniza a possibilidade do uso da funcionalidade como indicador de saúde para essa população. Esse constructo não podia ser aferido até agora, pois não existiam ferramentas que fizessem a abordagem segundo o modelo biopsicossocial. Os dois indicadores de saúde mais clássicos, mortalidade e morbidade, acompanhados da funcionalidade seriam mais adequados para a elaboração de estratégias de intervenção em saúde2727 Stucki G, Bickenbach J. Functioning: the third health indicator in the health system and the key indicator for rehabilitation. Eur J Phys Rehabil Med 2017; 53(1):134-138.. Saber como as pessoas vivem é mais importante do que saber porque elas morrem. A adoção da funcionalidade como um dos principais indicadores de saúde permitirá essa perspectiva em saúde favorecendo um melhor planejamento do serviço2828 Cieza A, Sabariego C, Bickenbach J, Chatterjj S. Rethinking Disability. BMC Med 2018; 16(1):14., cuidado e políticas de saúde para as pessoas com HIV/AIDS. O aumento progressivo na sobrevida de pessoas com o HIV/AIDS reforça essa proposição88 Carrapato JFL, Resende MHM, Santos NO. People living with HIV/AIDS: diagnosis of a death sentence? Rev Emancipação, Ponta Grossa 2014; 14(2):321-336.. Dessa forma, ao apresentar as propriedades psicométricas do WHODAS aplicado a pessoas com essa condição de saúde, disponibiliza-se uma ferramenta para viabilizar o uso da funcionalidade como indicador para a gestão em saúde.

Concluindo, a versão brasileira do WHODAS 2.0, com 36 itens mostrou que as propriedades psicométricas consistência interna, validade convergente e divergente são confiáveis e válidas para a avaliação da funcionalidade na população com HIV/AIDS. Ressalta-se a possibildalide de uso uma versão reduzida, com 32 itens, devido a não aplicabilidade de algumas perguntas, além do cuidado na utilização das perguntas do domínio Autocuidado.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Mar 2020
  • Data do Fascículo
    Mar 2020

Histórico

  • Recebido
    08 Abr 2018
  • Aceito
    30 Jul 2018
  • Publicado
    02 Ago 2018
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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